domingo, 10 de fevereiro de 2013

A journey Inside the Whale: explaining the title

Muitos leitores deste blog, pelo menos os mais atentos, ou os mais literários, digamos assim, podem ter questionado o título dado a alguns dos meus posts, os mais diretamente pessoais, sob a rubrica repetida já três vezes de
A Journey Inside the Whale

Posso explicar, mas a razão é puramente fortuita, ou alegórica, e não tem a intenção de reproduzir nenhuma grande obra literária, ou aventura pessoal.
Journey remete a aventura, périplo, caminho, andança, recorrido, percurso, itinerário, ou qualquer equivalente funcional ou conceitual. Ou seja, trata-se simplesmente de uma estada ou excursão.

A palavra remete a várias obras literárias, ou aventuras exóticas, a primeira das quais é o périplo cientifico do suíço-americano Louis Agassiz ao Brazil, a partir de Harvard, onde ele já ensinava. Seu livro foi publicado em Boston, no começo ou meados dos anos 1860 (e pode ser facilmente encontrável na internet, em versão digital), e nele ele relata sua estada de vários meses no Brasil, para pesquisas científicas. O naturalista, apesar de antidarwinista, é considerado um dos país do establishment cientítico americano, pela sua imensa capacidade de trabalho na classificação de espécies e de pesquisas de terreno, em várias áreas, inclusive geologia, mineralogia, botânica, zoologia e outras, destacando-se ainda sua correspondência e amizade com o imperador D. Pedro II, também um humanista interessado nas ciências naturais. A Journey to Brazil é uma descrição sincera de todas as suas andanças, inclusive o confronto com a escravidão e a falta de cultura literária (ou seja, ausência completa de livros), até hoje, aliás, em nosso país.

A segunda referência é ao romance realista de Louis-Ferdinand Céline, Voyage au Bout de la Nuit, um livro inovador para a época (1932), no qual ele relata todo o horror que tinha da Primeira Guerra Mundial, das experiências colonialistas na África e até na América fordista de Detroit, e seu capitalismo desenfreado. Em inglês, o romance se chama A Journey Inside the Night, e nesse título se pode tomar inspiração para qualquer reflexão sobre aventuras, jornadas, passeios e outros percursos que expressem a descrição de lugares e situações com intenções reflexivas e intelectuais. Obviamente, não existe nada que o conecte com o percurso ulterior desse grande autor, no sentido de se aproximar dos fascismos ambientes nos anos 1930 na Europa e de sua experiência colaboracionista, ou simpática, em relação ao regime de Vichy e ao próprio nazismo na França ocupada, postura que quase lhe rendeu uma condenação à morte na Libertação.

A terceira referência é ao livro de memórias e de críticas literárias de George Orwell, Inside the Whale, no qual ele relata suas andanças por Paris e Londres, na maior miséria, por sinal.
Pode-se também remetar à famosa frase do nacionalista cubano José Marti, que dizia conhecer  as "entranhas do monstro", ou seja, do Império, por ter vivido em New York, como exilado político da então dominação espanhola sobre sua ilha natal.

Nenhuma dessas referências é exclusiva, ou deve ser tomada em seu sentido próprio, uma vez que as palavras possuem existência própria e diversos significados. Eu juntei esses conceitos para descrever alguns aspectos de minhas andanças e reflexões no coração do império, embora não esteja bem no coração, e já não tenho certeza de que estou no império (não assumido, em todo caso).
Os EUA são, inquestionavelmente, o centro do mundo, para qualquer coisa que se possa imaginar, menos para a maldade absoluta (isso fica com a Coréia do Norte), para a desfaçatez autoritária (deixemos isso para a pobre Cuba), para a tristeza incomensurável e o sofrimento humano (creio que o recorde ainda pertence ao Congo ex-belga), ou para a mentira institucional (aqui a concorrência é forte, havendo vários latino-americanos na competição, mas talvez a China seja o melhor exemplo).

Os EUA são o império da inovação, da modernidade e, sobretudo, da liberdade, em todos os seus sentidos, inclusive aquele de carregar armas mortíferas que nas mãos dos malucos se convertem em instrumentos ocasionais de morte e sofrimento.
São também o império do pragmatismo, mesmo ao preço do charme e da non-chalance, que pertencem inquestionavelmente à Europa, bem mais rica culturalmente, mas mais difícil materialmente falando.
Enfim, estou no coração do império, pelos próximos três anos, e nele pretendo aproveitar todas as possibilidades de enriquecimento intelectual que aqui existem em tal abundância que não podem ser comparadas a qualquer outro continente ou país, mesmo a Europa e suas instituições seculares.
Vale a experiência, vale uma vida, vale um artigo, como este, modesto e sintético.
Vale!

Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 10 de fevereiro de 2013

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