Congresso
Sob críticas de especialistas, Plano Nacional de Educação é aprovado na Câmara com atraso de 4 anos
Estudiosos afirmam que projeto de lei não detalha estratégias para melhoria do ensino nem exige aprimoramentos na gestão dos recursos extras que virão
Bianca Bibiano
Veja.com, 28/05/2014
Discussão do - PL 8035/2010 que aprova o Plano Nacional de Educação para o decênio 2011-2020 (Gustavo Lima/Câmara dos Deputados)
A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira o texto-base do Plano Nacional de Educação (PNE), documento que estabelece 20 metas e mais de 200 estratégias para o setor no Brasil nos próximos dez anos (confira os principais pontos na lista abaixo). Destaques apresentados pelos partidos serão analisados na próxima semana. É o caso da proposta que obriga a União a complementar recursos de estados, Distrito Federal e municípios se estes não investirem o suficiente para cumprir padrões de qualidade. Depois, o projeto de lei seguirá para sanção presidencial. O PNE aprovado pelos deputados deveria ter entrado em vigor em 2011, como manda a Constituição. Contudo, o Executivo federal só entregou o projeto para o Congresso em dezembro de 2010. Deste então, ficou parado devido à falta de consenso sobre pontos como investimento em educação e metas de desempenho do ensino.
Em linhas gerais, o texto aprovado determina que o Brasil amplie o acesso à educação e melhore a qualidade do ensino até 2024. Isso inclui, entre outras metas, erradicar o analfabetismo, universalizar o ensino básico e oferecer escolas em tempo integral em metade das unidades do país. Também fazem parte dos objetivos a ampliação no número de vagas no ensino superior, incluindo pós-graduação, e a garantia de aprimoramento da formação e aumento do salário dos professores. As metas referentes à universalização do ensino e à erradicação do analfabetismo já constavam no PNE anterior (2001-2010) e não foram cumpridas.
Para especialistas, as estratégias relativas à melhoria do ensino deveriam ser mais detalhadas. "A baixa qualidade é o maior problema da educação brasileira e a falta de detalhamento sobre como garantir o avanço efetivo é uma falha do plano", afirma a consultora de educação Ilona Becskeházy. O economista Milton Pignatari, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, faz outra crítica, desta vez voltada à ampliação do investimento na área. "É claro que a educação precisa de mais dinheiro, mas o PNE não prevê a melhor gestão dos recursos, apenas dá mais verba para a área, sem definir como será realizado o monitoramento das despesas."
Segundo o plano, até 2024, o investimento em educação crescerá paulatinamente, atingindo o equivalente a 10% do PIB ao ano — quase o dobro do praticado atualmente (5,3%). No quinto ano de vigência do plano, o valor já deve estar em 7%. O plano prevê ainda complementação da verba com 75% dos royalties obtidos na exploração do pré-sal. O bolo será distribuído entre as 20 metas, de acordo com valores pré-definidos pelo projeto de lei. Para universalizar a pré-escola, por exemplo, o investimento em dez anos passará de 10,3 bilhões de reais para 16,8 bilhões de reais. Já para equiparar o salário dos professores com os de outros profissionais graduados, o valor chegará a 40,9 bilhões.
Para Priscila Cruz, presidente da ONG Todos Pela Educação, a aprovação do projeto de lei é uma vitória parcial. "Seria uma vitória completa se o plano tivesse sido aprovado antes. Sabendo que a tramitação poderia ser longa, o MEC deveria ter apresentando um projeto prévio, mas isso só foi feito apenas um mês antes de acabar a vigência do PNE anterior", diz Priscila. Em resumo, o Brasil perdeu tempo para resolver um problema urgente.
Ela salienta ainda problemas em ao menos uma das metas, a de número 5, que estabelece os objetivos para a alfabetização. "O texto diz que todos os alunos devem estar alfabetizados até o 3º ano do ensino fundamental, o que é muito tarde. Além disso, o correto seria determinar a idade da criança, não a série em que ela está, pois teremos crianças de 10 anos de idade ou mais sem saber ler nem escrever."
Assim que o projeto de lei for aprovado pela presidente Dilma Rousseff, Estados e municípios terão prazo de um ano para elaborar seus respectivos planos de educação, tendo como base o texto federal. "Essa etapa é vital para que o PNE não vire letra morta. O Ministério da Educação precisa mobilizar os dirigentes do ensino básico e superior para garantir que os avanços sejam feitos no prazo estabelecido", diz Mozart Neves Ramos, diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna e membro do Conselho Nacional de Educação.
As metas serão monitoradas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), autarquia do MEC responsável pela produção dos indicadores educacionais. A cada dois anos, a instituição deverá publicar um relatório com um balanço dos avanços. "Caberá às entidades organizadas e à sociedade cobrar o cumprimento das metas", diz Ramos.
1. Universalização do ensino básico
As três primeiras metas do PNE tratam da universalização do ensino básico a partir de 4 anos de idade.
Até 2016, o objetivo é atender, na educação infantil, todas as crianças de 4 e 5 anos e, no médio, todos os jovens entre 15 a 17 anos.
A universalização do fundamental (6 a 14 anos), só deverá ocorrer em 2024. Além disso, o plano prevê que 50% das crianças de 0 a 3 anos deverão estar matriculadas em creches até 2016.
Situação atual (porcentagem de matrículas em idade adequada):
. creche: 23,5%
. pré-escola: 82,2%
. ensino fundamental: 93,8%
. ensino médio: 81,2%
Valor do investimento até 2024: 115,9 bilhões de reais
2. Alfabetização na idade certa
A meta 5 do PNE diz que os entes federados devem "alfabetizar todas as crianças até o final do 3º ano do ensino fundamental". A regra é criticada por especislitas, pois abre margem para que crianças de 10 anos ou mais de idade fiquem na escola sem saber ler e escrever.
"Sabemos que existe distorção entre a idade dos alunos e a série em que deveriam estar. O ideal seria que a meta incluísse a necessidade de iniciar a alfabetização na educação infantil", afirma a consultora de educação Ilona Becskeházy.
Situação atual (porcentagem de crianças alfabetizadas até o 3º ano):
. aprendizagem adequada em leitura: 44,5%
. aprendizagem adequada em matemática: 33,3%
3. Qualidade do ensino
Apenas a meta 7 do PNE aborda a necessidade de melhoria da qualidade da educação. A expectativa é que as notas do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira) aumentem gradativamente para atingir os seguintes parâmetros em 2024:
Anos iniciais do ensino fundamental:
. nota atual: 5
. meta: 6
Anos finais do ensino fundamental:
. nota atual: 4,1
. meta: 5,5
Ensino médio:
. nota atual: 3,7
. meta: 5,2
4. Valorização do professor
Cinco metas (13, 15, 16, 17 e 18) tratam da ampliação da formação dos professores e da valorização salarial da categoria. O número de metas para esses dois tópicos é, na opinião de Claúdio Moura e Castro, colunista de VEJA, excessivo. "É evidente que essa situação foi criada por pressão de órgãos sindicais." Pelos valores pré-definidos, a valorização docente custará 110 bilhões de reais, valor do investimento previsto até 2024.
Valor do salário médio de um professor:
. atual: 1.697,22 reais
. meta: 3.652 reais
5, investimento em educação
A meta 20, principal alvo das críticas no início da tramitação do PNE no Congresso, determina que até 2024 o investimento em educação seja o equivalente a 10% do PIB ao ano. Atualmente, o valor investido no setor é de 5,3%.
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