Creio que não é preciso acrescentar nenhum comentário, basta ler esta nota de Roberto Ellery sobre gastos com educação. O Brasil, além de gastar muito, gasta mal, e gasta de forma totalmente ineficiente. O dinheiro, aliás, está indo para as mãos erradas, ou os bolsos errados.
Paulo Roberto de Almeida
Blog do Roberto Ellery, 11/08/2014
Sei que hoje em dia comparar o Brasil com qualquer país
virou crime de lesa pátria, a ideologia oficial determinou que o Brasil é um
país único e que não pode ser comparado com nenhum outro. Porém em um passado
recente não era assim, podíamos comparar o Brasil com outros países sem que
isto causasse comoção. Não que o Brasil fosse considerado igual a outros
países, mas entendia-se que a comparação era um exercício útil para ter uma
medida relativa dos efeitos de nossas políticas. Naquela época era comum
comparar o desempenho de longo prazo do Brasil com o da Coreia do Sul.
No início da década de 1950 a Coreia tinha uma renda per
capita próxima à do Brasil. É claro que a Guerra da Coreia (1950 – 1953) tem um
efeito nesta estatística, mas a proximidade entre a renda per capita dos dois
países permaneceu até bem depois do final da guerra. De acordo com os dados da
Penn World Table (PWT) a renda per capita da Coreia era 80% da brasileira em
1953, ano que terminou a guerra, em 1977 ainda estava no mesmo patamar. Entre
1953 e 1980 o maior valor da renda per capita da Coreia em relação ao Brasil
foi de 87% em 1979 e o menor foi de 61% em 1962. No começo da década de 1980 a
renda per capita da Coréia do Sul ultrapassou a do Brasil, em 1983 era 12%
maior, a partir daí começou a crescer em relação a nossa, em 2011 o coreano
médio tinha uma renda mais de três vezes maior que a do brasileiro médio. Os
números mudam a depender da medida de renda per capita, mas a história é sempre
a mesma. A partir da década de 1980 a Coréia do Sul ultrapassa o Brasil e segue
uma trajetória de crescimento enquanto nós ficamos quase estagnados. A figura
abaixo ilustra esta história.
Um motivo frequentemente apontado para explicar a diferença
nas trajetórias de Brasil e Coreia do Sul é o desempenho da educação. A tese é
que os coreanos investiram em educação e o Brasil não. Aceitando a tese temos
na Coreia um exemplo de como a educação pode colocar um país em uma trajetória
de crescimento sustentado. Não tardou para que alguns economistas comparassem o
gasto com educação no Brasil e na Coreia, de acordo com os dados da ONU o setor
público brasileiro em 2008 gastou 5,53% do PIB em educação enquanto na Coreia o
setor público gastou 4,76% do PIB, o padrão não é diferente de outros anos. De
posse destes números vários analistas alertaram que aumentar o gasto com
educação não é receita certa para resolver o problema da educação brasileira.
Os defensores do aumento dos gastos responderam que não é certo comparar o
gasto como proporção do PIB, como a renda da Coreia é maior que a brasileira se
os dois países gastam o mesmo percentual do PIB com educação então o gasto
absoluto da Coreia é maior. Com os números da PWT o governo da Coreia gasta, em
média, U$ 1.295 em educação por pessoa enquanto o governo brasileiro gasta, em
média, U$ 460 por pessoa.
O argumento procede, uma pessoa muito rica pode gastar menos
de 1% da própria renda para manter o filho na melhor escola da cidade, um
sujeito com uma renda mais modesta pode gastar 10% de sua renda para manter seu
filho em uma escola bem pior. No final o fato de um gastar menos de 1% da renda
com educação dos filhos e o outro gastar 10% da renda com educação não significa
que o que gastou mais está dando uma educação melhor e, mais importante, que
aumentar o percentual da renda gasta com educação não melhore a educação do
filho. Dessa forma, comparar percentual do PIB gasto em educação não ajuda
muito quando a renda per capita dos países é muito diferente. Porém, como
vimos, nem sempre a renda da Coreia foi tão maior que a do Brasil, pelo
contrário, de 1953 a 1982 a renda da Coreia foi menor que a do Brasil. Mais interessante,
se a disparada da Coreia em relação ao Brasil foi devida à educação então é o
gasto do período em que os coreanos eram “pobres como nós” que deve ser
observado, pois foi nesta época que a educação que proporcionou a disparada foi
construída.
Pois bem, de acordo com os dados da ONU entre 1975 (primeiro
ano da série que encontrei) e 1983 o governo da Coreia gastou, em média, 2,85%
do PIB com educação, bem menos do que o Brasil gasta hoje. Com exceção de 1982
(6,65%) e 2009 (5,02%) o gasto do setor público com educação na Coreia ficou
todos os anos abaixo de 5% do PIB. Infelizmente a base dados que usei não tinha
os gastos com educação do Brasil na época que nossa renda era maior que a da
Coreia, a série para o Brasil começa em 1989. Porém, se for considerado o
período com dados em comum (tive de fazer algumas interpolações) o Brasil via
de regra gastou mais que a Coreia em proporção ao PIB, a exceção é o período
entre 2001 e 2005. Os dados estão na figura abaixo.
Existem duas limitações importantes nos dados que usei: (i)
são considerados apenas gastos públicos em educação e (ii) não tenho os dados
para o Brasil no período em que nossa renda per capita era maior que a da
Coreia. Porém, mesmo com estas limitações, considero que é possível concluir
que o problema da educação no Brasil não é falta de dinheiro. Já passou da trocar
o mantra “mais dinheiro” por “melhor gestão”.
P.S. Considerar os gastos privados pode mudar a conclusão,
mas daí a conclusão seria que não é o governo que deve gastar mais com
educação...
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