GAZETA DO POVO - PR - 07/10/2015
Ao
confessar ter combinado antecipadamente com Evo Morales a expropriação
de unidades da Petrobras na Bolívia, o ex-presidente mostra que ele vê o
patrimônio estatal como se fosse propriedade pessoal
À
medida que o tempo passa, mais se sabe quem é, de fato, o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva. O exemplo mais recente data da última
segunda-feira, quando, em palestra em São Paulo para uma plateia formada
por partidos de esquerda, ele abertamente confessou ter “doado” para a
Bolívia as instalações que a Petrobras mantinha naquele país para
extração de gás. A camaradagem já havia sido combinada com o ainda então
candidato à presidência boliviana, Evo Morales – que, eleito, meses
depois de sua posse pôs suas tropas para confiscar o patrimônio
brasileiro, em maio de 2006.
Foi
bem simples, segundo relato do próprio Lula: “O Evo me perguntou: ‘como
vocês ficarão se nós nacionalizarmos a Petrobras?’ Respondi: ‘o gás é
de vocês’. E foi assim que nos comportamos, respeitando a soberania da
Bolívia”. O presente que Lula deu à Bolívia valia nada menos do que US$
1,5 bilhão. E agora se sabe também que a ocupação militar das refinarias
não passou de uma patética encenação para dar pretexto à colossal e
despropositada oferenda.
É tosco o raciocínio de Lula para justificar a doação. Ele não
tinha o direito, senão pisando sobre a soberania do país que governava,
de alienar um bem do Estado. É de se perguntar: a seguir seu
entendimento, bastaria deslocar nossos navios de guerra para tomar dos
estrangeiros as plataformas instaladas para explorar o “nosso” petróleo?
Evidentemente, nenhuma das opções pode nem sequer ser aventada por um
chefe de Estado. No mundo civilizado devem prevalecer regras contratuais
de direitos e deveres que regulam as relações entre nações.
O
ex-presidente foi além em suas tardias confissões ao falar para o Foro
de São Paulo, organização que reúne representantes de esquerda da
América Latina. Ele deixou patente que, ao colaborar com o arroubo de
Morales, sua pretensão era a de fortalecer os regimes bolivarianos que
floresciam no continente – isto é, Lula foi movido por uma causa
ideológica e, em nome dela, transferiu a outro país um patrimônio de que
ele não podia dispor como se fosse sua propriedade particular.
Absolutamente
nada autoriza um presidente da República a usar desta forma um
patrimônio do Estado, dando sinal verde informal – como Lula atesta com
suas próprias palavras – a um ato de expropriação por parte de um
governo estrangeiro. Na verdade, ele confessou ter sido cúmplice de um
atentado à soberania nacional, preferindo o interesse boliviano ao
interesse brasileiro. A esquerda – nela incluída o próprio Lula – adora
repetir que estatais são “do povo brasileiro”. Segundo a lógica das
esquerdas, então, a conclusão é evidente: Lula entregou à Bolívia algo
que era “do povo brasileiro”. Claro, sabemos que na realidade estatais
pertencem ao Estado, e não ao povo. Mesmo assim, isso não autoriza o
mandatário de plantão a dispor dos bens do Estado como bem lhe aprouver,
especialmente quando isso significa um ataque à soberania brasileira.
Não
causa surpresa, porém, o desdém que Lula dedicou à Petrobras no caso
boliviano. A estatal foi contínua e permanentemente pilhada ao longo de
seu governo e do mandato da presidente Dilma Rousseff, como bem
demonstra a Operação Lava Jato. Fez-se dela, durante esse período, um
caixa livre para abastecer partidos e enriquecer políticos, diretores e
operadores que se fartaram de propinas. A empresa também foi sangrada
como instrumento de política econômica; represava-se sua rentabilidade
para conter a pressão inflacionária, impunham-se à estatal prejuízos
reais ou tolhia-se sua capacidade de investimentos.
A
Petrobras encontra-se, na prática, privatizada: foi transformada em
propriedade do PT para fins partidários e eleitorais. E, agora, ficamos
sabendo pela boca do próprio Lula que ela também foi usada para
camaradagens ideológicas. Não por outras razões a empresa que já foi uma
das maiores do mundo frequenta hoje posições muito mais modestas no
ranking – liderança global, agora, só em endividamento.
Analisando
apenas os valores, a “doação” de parte do seu patrimônio para o amigo
Evo Morales poderia até ser considerada um “mal menor” diante de tudo
quanto se fez para levar a Petrobras ao triste estágio em que hoje se
encontra. Mas o significado do episódio vai muito além das cifras. Ele
mostra como, desmoralizada e desvalorizada, a Petrobras se tornou o
retrato pronto e acabado da ideologização irresponsável da administração
petista.
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