TPP: um dos grandes problemas de analistas acadêmicos é o de achar que o Itamaraty é responsável pela diplomacia brasileira. Não, não é; se foi no passado, isso ficou muito distante no tempo.
Há muito tempo que o Itamaraty deixou de ser o formulador, e por vezes o aplicador, da política externa, sobretudo em sua vertente econômica, ou seja, comercial.
Não há uma relação de causa a efeito, como se costuma dizer, sequer uma correlação...
Paulo Roberto de Almeida
Matias Spektor
Em seguida ao anúncio do Tratado Transpacífico (TPP), o ministro das Relações Exteriores disse ter "preocupação sistêmica". Em diplomatês, significa que o problema é grave.
O novo mega-acordo comercial é um golpe duro contra a estratégia brasileira dos últimos 20 anos, quando o condomínio PT-PSDB optou por fazer uma abertura comercial lenta e parcial, sem combate aos grandes interesses protecionistas nacionais.
A preocupação do chanceler se justifica porque o TPP reduz o poder de fogo de grandes países em desenvolvimento e reconcentra a autoridade pelo comércio global nas mãos de um grupo pequeno de países e de suas empresas.
Não surpreende que o TPP reintroduza elementos que o Brasil e seus aliados haviam conseguido eliminar ou neutralizar nas negociações multilateral da última década.
Além de facilitar comércio, o TPP agora estabelece disciplinas de direito trabalhista, proteção ambiental, convergência regulatória, serviços legais, comércio eletrônico, propriedade intelectual e políticas de conteúdo nacional. Um mecanismo de solução de disputas outorga poderes inéditos a investidores estrangeiros diante de Estados nacionais.
A proposta do TPP é tão ambiciosa, e seus signatários tão poderosos, que o efeito do acordo será sentido em todo o mundo. E servirá como balão de ensaio para a introdução de temas polêmicos. Para o Brasil, o saldo de um acordo dessa natureza é muito negativo.
Não se trata apenas de mais um passo em direção ao isolamento na geopolítica do comércio, mas de algo mais grave. Com o Brasil fora de qualquer negociação relevante, os defensores do livre comércio em Brasília perdem força diante de interesses protecionistas representados no Congresso.
O impacto disso é brutal por um motivo simples. O protecionismo brasileiro beneficia um grupo pequeno de grandes indústrias subsidiadas. Elas custam caro à sociedade, embora empreguem cada vez menos trabalhadores, que via de regra são da classe média.
Quem perde é o resto da economia, onde trabalha a maior parte da população. Esta, apesar de ser composta em sua grande maioria por pessoas de renda baixa ou muito baixa, é forçada a pagar caro por produtos de má qualidade que seus impostos subsidiam.
Forças protecionistas utilizarão o TPP para denunciar o imperialismo americano. Afastando o país das cadeias globais de valor, porém, manterão a sociedade brasileira enquistada no atraso tecnológico e na baixa produtividade. Impedirão o surgimento de uma política industrial inteligente.
A retomada da liderança em negociações comerciais deveria ser objetivo central da diplomacia brasileira. Desta vez, o país precisaria fazê-lo pela via da abertura.
MATIAS SPEKTOR escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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