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domingo, 26 de novembro de 2017

O Ajuste Justo: estudo do Banco Mundial sobre gastos publicos no Brasil - editoriais OESP, Valor

Dois editoriais que destacam a importância deste estudo do Banco Mundial para o processo de ajuste macroeconômico no Brasil, com ênfase na política fiscal, demonstrando, cabalmente, a necessidade de serem adotadas medidas urgentes, significativas e impactantes de corte de gastos no país.
O trabalho do Banco Mundial é este aqui:
O estudo está disponível, em português, no seguinte link: 
http://documents.worldbank.org/curated/en/884871511196609355/pdf/121480-REVISED-PORTUGUESE-Brazil-Public-Expenditure-Review-Overview-Portuguese-Final-revised.pdf
Paulo Roberto de Almeida

EDITORIAIS de 23/11/2017

O Estado de S. Paulo – Gastar menos e fazer mais / Editorial

Estudo do Banco Mundial contém material de alta qualidade para discussão na campanha eleitoral. Falta saber se haverá candidatos bastante sérios para tratar desses assuntos.
O governo pode fazer mais com menos dinheiro, produzindo serviços com mais eficiência e tratando os cidadãos com mais equidade, segundo um estudo recém-divulgado em Brasília pelo Banco Mundial. O trabalho contém material farto e de alta qualidade para discussão na campanha eleitoral do próximo ano. Falta conferir se haverá candidatos bastante sérios para tratar de assuntos como a melhora da administração, a reforma do Orçamento, a distribuição mais equilibrada e mais justa de encargos e benefícios e a definição mais pragmática e realista de metas e programas. As propostas são dirigidas a quem estiver disposto a enfrentar com seriedade e honestidade algumas questões tão simples quanto importantes. Exemplos: por que os pobres devem financiar ensino universitário gratuito aos jovens das classes mais abonadas? Por que o Tesouro deve conceder benefícios custosos e ineficientes a grupos empresariais mais interessados no conforto do que na busca de competitividade?
O governo brasileiro gasta mais do que pode e, além disso, gasta mal: essa “é a principal conclusão do estudo”. Nenhum remédio será satisfatório, portanto, se o problema do gasto mal executado ficar sem tratamento. Nesse caso, mais dinheiro à disposição do poder público será mais dinheiro desperdiçado. Não é uma questão ideológica, mas aritmética e pragmática.
As mudanças propostas no estudo podem servir a governos de várias orientações – se forem razoavelmente sérios. Afinal, o uso mais eficiente do dinheiro pode servir à execução de diferentes tipos de política. Mas a eficiência dependerá de algumas condições.
Uma delas é a reforma da Previdência, apontada como a fonte mais importante de economia no longo prazo. Não há como contornar os desafios impostos pelas mudanças demográficas, argumentam os autores do estudo, repetindo um argumento realista e bem conhecido. Além disso, a reforma poderá tornar mais equitativo um sistema caracterizado por distribuição desigual de benefícios entre ricos e pobres e entre servidores públicos e trabalhadores do setor privado.
Sem essa e outras mudanças, o teto de gastos ficará na lembrança como mais uma iniciativa bem-intencionada e de curtíssima utilidade. O limite constitucional dos gastos só terá um sentido prático se for invertida a tendência dominante nos últimos anos. Será necessário executar nos próximos dez anos um corte acumulado de quase 25% nas despesas primárias (isto é, sem juros) da administração federal. A contenção do gasto exigirá várias medidas além do combate ao déficit previdenciário.
As propostas incluem, entre os primeiros itens, a redução da massa de salários do funcionalismo público, medida tanto de eficiência como de equidade. A redução pode ser obtida pela diminuição do quadro de pessoal e pelo corte gradativo das vantagens. A remuneração do funcionário federal, segundo o relatório, é em média 67% superior à dos trabalhadores do setor privado (mesmo levando-se em conta diferenças de nível educacional).
O governo também poderá economizar melhorando seu sistema de compras e assim reduzindo desperdícios. Poderá abandonar políticas muito caras e ineficientes de estímulo às empresas, com custos equivalentes a 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015. A ineficiência dessas políticas, com escasso ou nenhum resultado em termos de crescimento, foi apontada várias vezes por analistas brasileiros. O governo apenas mexeu em alguns de seus componentes.
Algumas inovações são politicamente complicadas, caso da unificação dos programas de proteção social. A eliminação da gratuidade como padrão geral da universidade pública seria certamente recebida com muitas críticas, embora dois terços dos beneficiários pertençam aos 40% mais aquinhoados. A mudança seria compatível com programas de financiamento e de bolsas.
Racionalidade e eficiência são raramente populares. É muito mais fácil defender políticas populistas, mesmo quando inflacionárias e injustas, como tem sido no Brasil. Enfrentar o populismo, no entanto, é hoje indispensável para garantir o futuro do País.

Valor Econômico – A lição de casa do ajuste, segundo o Banco Mundial / Editorial

As políticas do Estado brasileiro produzem déficits crescentes, frutos de gastos ruins, que concentram renda, beneficiam os mais ricos e tolhem a economia. Sem profundas reformas, ele caminha para a insolvência. O estudo do Banco Mundial, "O ajuste justo", aprofunda o diagnóstico das causas do grande endividamento público, feito por vários economistas do país, e aponta, com mais diversidade do que de costume, linhas de soluções para o problema. À sombra dos números, há a inquietante percepção de que o país anda já há um bom tempo na trilha errada e da dificuldade de corrigir a rota.
A reforma da previdência é o pilar das mudanças e o item que poderia proporcionar a maior economia de despesas, de 1,8% do PIB até 2026, se a proposta aprovada por comissão da Câmara fosse integralmente executada. Não será, e a conta de redução de despesas em relação a uma trajetória sem mudanças cairá de R$ 600 bilhões para algo em torno de R$ 360 bilhões em 10 anos, em cálculos aproximados. É vital, porém, desvincular o piso da previdência do salário mínimo, diz o banco.
A reforma da previdência, porém, é insuficiente, e é necessário uma rearrumação e redução geral dos gastos. O Banco Mundial analisou 8 áreas, que somam 80% dos gastos públicos, e sugeriu medidas que podem melhorar em 7% do PIB as contas públicas federais em uma década. As sugestões, a maior parte corretas, são um pesadelo para políticos acostumados a expedientes de ocasião para compor interesses díspares dos grupos de pressão. É possível, aponta o documento, encontrar soluções alternativas, mas é difícil fugir dos alvos propostos.
O governo federal precisará fazer uma correção de gastos da ordem de 5% do PIB no médio prazo para deter primeiro, e reduzir depois, o endividamento, hoje em 74% do PIB. O teto de gastos é importante para isso e pode encolher as despesas em 25% em uma década, jogando-as de volta ao nível de 2000. O teto não para em pé sem a reforma da previdência, o que é sabido, mas será também praticamente inexequível sem mudanças nos gastos obrigatórios. Com o limite aplicado apenas a "despesas primárias agregadas (e não a componentes e programas específicos) ele não oferece orientação sobre onde reduzir os gastos", conclui o estudo. A reação automática, diante das vinculações e amarras, como em outras situações de aperto dos cintos, foi cortar investimentos, o que não é sustentável.
O banco afirma, após análise ampla de subsídios e programas, que a política fiscal brasileira é regressiva e não beneficia, como poderia, as camadas mais pobres. Para corrigi-la, é imprescindível reduzir a massa salarial dos servidores públicos, 77% dos quais se situam entre os 40% mais ricos do país. Como porcentagem do PIB, ela excede a média dos países de renda alta. Segundo o estudo, o total da folha de pagamentos do setor público subiu de 11,6% do PIB em 2006 para 13,1% do PIB em 2015 e superou Portugal e até a França, a pátria por excelência da burocracia de Estado.
Os servidores federais recebem, em média, 70% mais que os trabalhadores do setor privado. Ajustando-se a comparação por idade, experiência, educação etc, ganham um prêmio salarial de 67% em média - o mais alto da amostra de 53 países. Por esse motivo o banco recomenda que se reduzam as vantagens desse grupo na reforma previdenciária e que ele contribua com parcela do ajuste, via maior tributação. Sugere também, ao contrário do que fez o presidente Temer, que não se conceda aumentos reais para o funcionalismo até que esse prêmio caia. Se ele fosse reduzido à metade, alinhando os salários federais aos estaduais (mantendo prêmio de 31%), "a economia anual resultante seria de 0,9% do PIB (R$ 53 bilhões). A equiparação do prêmio à média internacional de 16% reduziria a massa salarial em 1,3% do PIB ao ano (R$ 79 bilhões).
As demais recomendações trazem ganhos menores, mas ainda assim significativos. Uma ideia é unificar salário-família, Bolsa Família, benefício de prestação continuada e aposentadoria rural, para evitar sobreposições, o que pouparia gastos de 0,7% do PIB. O seguro-desemprego apenas seria concedido após o uso do FGTS, sobre cujo saldo deveriam incidir juros de mercado. Uma economia de até 1,2% do PIB seria obtida com reforma do Simples, mais 0,4% com o fim da desoneração da folha e outros 0,4% com reforma dos benefícios da Zona Franca de Manaus. O conjunto compõe uma plataforma ousada à espera de políticos que a defendam.

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