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domingo, 3 de novembro de 2019

Perguntas em palestra na Liberty Conference - Paulo Roberto de Almeida


Perguntas em palestra na Liberty Conference


Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: responder a questões; finalidade: atender demandas da audiência]


Tendo sido convidado, pelo grupo liberal Students for Liberty, para fazer uma palestra sobre um tema escolhido por eles, que acolhi sem contestação, compareci, no último sábado 2 de novembro, ao local da conferência, onde deveria abrir um dos painéis. O tema era este: “Um diplomata liberal em face dos extremismos políticos”. Comecei por dizer que antes de ser liberal, e antes de ser diplomata, eu era um marxista, a coisa mais normal do mundo no ambiente de Guerra Fria e de estudos universitários no Brasil de meados dos anos 1960; depois fui evoluindo, com estudos, viagens, experiências, leituras, reflexões.
Numa breve introdução, para deixar mais tempo aos debates e perguntas e respostas, discorri, em primeiro lugar, sobre a distinção que caberia fazer entre políticas públicas, no plano interno, e posições diplomáticas do país no contexto internacional. O que vale no ambiente doméstico não necessariamente vale no plano da política externa. As posturas assumidas nesse âmbito devem ser avaliadas em sua dimensão própria, em função do interesse nacional, não porque sejam de direita ou de esquerda. Exemplifiquei com o caso da China, um país perfeitamente autocrático no plano interno, ainda que não mais totalitário como no passado, mas que não pretende impor a nenhum outro país seu modelo político, não pretende exportar autocracia, e cuja administração apenas pretende elevar o nível de bem-estar de seu povo, mediante comércio, investimentos, interações as mais diversas, enfim, ações perfeitamente compatíveis com o sistema multilateral de comércio, ainda que a China faça um uso malicioso de suas regras.
Como expliquei em seguida, apenas porque o tema sugerido da palestra prendia-se à minha condição pessoal, que eu era um antigo observador das posturas em política externa de todos os partidos políticos, e que desde muito antes da ascensão ao poder do PT eu já havia identificado perfeitamente as características específicas desse partido na configuração doutrinal dos partidos brasileiros: um típico partido esquerdista latino-americano, com todas as deformações que poderíamos esperar dessa tomada de posição: um terceiro-mundismo anacrônico, um anti-imperialismo infantil, um antiamericanismo démodé, receitas ultrapassadas em matéria de política econômica, enfim, o que se poderia esperar de um partido de esquerda congelado no tempo. Minha oposição à política externa do PT, e às suas políticas públicas em geral, que me valeram um longo período de ostracismo no Itamaraty, não derivaram em nada do fato de ser o PT um partido de esquerda, e sim o fato de que ele era inepto no plano administrativo e tremendamente corrupto, em contradição com sua mentirosa mensagem de campanha, na qual prometia “ética na política”.
Justamente, no plano externo, as opções do governo do PT no sentido de adotar o terceiro-mundismo anacrônico, o anti-imperialismo infantil, suas alianças ideológicas com países supostamente anti-hegemônicos e antiocidentais me pareciam ridículas e totalmente inconsistentes com os interesses nacionais do Brasil. Assim, em lugar de assumir a direção do programa de mestrado do Instituto Rio Branco, fiquei sem qualquer designação na Secretaria de Estado durante todo o longo período dos governos do PT, passando a maior parte do tempo na Biblioteca do Itamaraty. Numa fase inicial, até trabalhei para o governo, no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, embora nunca tivesse abandonado meu espírito crítico à muitas das propostas de políticas formuladas pelo PT e seus funcionários. Nunca hesitei em expressar minha opinião, dentro e fora do governo, dentro e fora do Itamaraty.’
Meu percurso do marxismo juvenil a um liberalismo bem temperado, no campo doutrinal, acompanhou a evolução de meus estudos, leituras e reflexões; no terreno da prática, fui observando todos os experimentos de políticas públicas, em todos os países que visitei ou nos quais vivi, sem qualquer catalogação primária do tipo esquerda-direita, apenas com a preocupação principal na eficácia do combate à pobreza. Deixei o registro dessa evolução em alguns textos que ainda se encontram disponíveis em meu blog Diplomatizzando, em especial nos textos “Sete Pecados da Esquerda” e “Contra a Anti-Globalização”, que resumem um pouco dessa experiência adquirida em viagens e estudos, com muita reflexão sobre as políticas mais eficazes, independentemente de sua coloração ideológica ou caráter mais privatista ou mercadista, ou estatal-dirigista.
Com isso encerrei a exposição inicial e dediquei-me a responder às primeiras perguntas, que tocaram nos temas mais esperados: antiglobalismo – que não hesitei em classificar como uma idiotice completa –, os desafios do Mercosul na sequência da derrota de Macri – que eu disse não ter muita relação com o futuro do bloco, e sim a inadimplência constante dos dois membros principais em cumprir os termos do Tratado de Assunção –, a questão da China – sempre presente em 100% das palestras e seminários que ocorrem desde vários anos – algumas questões que demandei que chegassem por escrito já antecipando que não teríamos tempo para responder a todas elas no tempo alocado para a palestra. De fato, recebe uma dúzia ou mais de questões que vou transcrever neste textos, sem que eu possa assegurar, neste momento, que terei tempo de responder a todas elas no tempo exíguo que me resta depois de uma extenuante jornada de palestras, conferências, encontros e conversas com algumas dezenas de colegas, amigos, estudantes, novos e velhos conhecidos de eventos similares a este a que assisti ou de que participei nos anos recentes. Tínhamos de interromper o nosso evento, uma vez que a mesma sala sediaria um outro encontro, e eu mesmo tinha de participar de um painel sobre o “Brasil no mundo”, mediado pelo professor de Relações Internacionais da USP, Leandro Piquet, com a participação da economista Sandra Polónio Rios e o deputado (e diplomata) Marcelo Calero.
Eu tinha tomado algumas notas preliminares para esse evento em forma de painel, como sempre faço, ainda que nunca leio o que escrevi, num hábito que apenas serve para organizar as ideias e deixar registro, justamente, desse tipo de evento, para o benefício daqueles que não podem estar presentes. As notas que fiz, imediatamente postadas em meu blog Diplomatizzando na madrugada anterior, receberam este registro:
3529. “Debate sobre o Brasil no mundo: questões de política externa”, São Paulo, 2 de novembro de 2019, 5 p. Notas para debate em conferência Liberty, São Paulo. Postado no Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/11/debate-sobre-o-brasil-no-mundo-politica.html).
Procedo agora à transcrição das perguntas manuscritas enviadas à mesa, retendo para mim eventuais endereços de correio eletrônico para envio posterior de minhas respostas, o que também vou fazer de forma genérica, postando minhas respostas e comentários adicionais no meu blog, para que todos possam acessar de forma independente.

1) Por que o discurso de Bolsonaro é tão atrativo?
2) Como e quando surgiu a atuação/pensamento Sul-Sul no Brasil e qual seria a inclinação diplomática no atual período?
3) O Brasil, como membro “extra-Otan”, faria o país ter algumas obrigações com a organização, como fazer parte de coalizões em guerra?
4) O Sr. acha que com uma possível abertura do mercado externo brasileiro irá (?) desgastar as ideias e sandices ditas por pessoas como o Felipe G. Martins, Ernesto Araújo, etc.?
5) Gostaria de saber se o Sr. vê o mundo político-discursivo em cinco ou dez anos como moderado; se o Sr. enxerga uma superação dos discursos e das políticas extremistas (principalmente na extrema-direita) que vemos no mundo de hoje.
6) Estou ajudando Relações Internacionais em uma faculdade de ideias majoritariamente coletivistas. Qual a sua perspectiva para a entrada de estudantes de RI, que defendem a liberdade na diplomacia do futuro?
7) Em minha universidade, os docentes têm uma visão desenvolvimentista nacionalista, inclusive muitos denominam-se anti-imperialistas. Segundo ele, o Brasil ser um país agroexportador é um erro, portanto devemos incentivar a nossa indústria, como no passado. É realmente necessário forçar nossa industrialização? Temos alguma vantagem diplomática graças à agroexportação?
8) Numa recente entrevista, Celso Amorim falou que não há nada errado com o empréstimo do BNDES dos governos petistas; queria que você comentasse sobre isso e se pudesse sobre a questão dos calotes.
9) O Sr. acha realmente necessária a “tortura” (?) de acordos bilaterais com outros países para estabelecer comércio? Se eu fosse o presidente, eu simplesmente abriria as portas do Brasil. Teria algum efeito negativo?
10) Conforme seu [meu] livro, como a inteligência da diplomacia brasileira se tornou miserável? E como isso pode ser revertido?

Todas perguntas altamente interessantes, como se vê, para cujas respostas eu vou pedir a leniência dos seus autores para responder nos próximos dias, dado o adiantado da hora nesta madrugada do domingo 3 de novembro e uma longa viagem de volta a Brasília, contando ainda com aula, banca de mestrado e outras obrigações acadêmicas e profissionais a partir desta segunda-feira 4/11/2019. Voltarei às questões tão pronto possível.
Grato pelo prestígio, pelo interesse, e pelas questões interessantes, que me permitirão aprofundar um pouco mais esses temas de interesse geral.
Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 2-3 novembro 2019.
Brasília, ??/11/2019

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