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segunda-feira, 29 de maio de 2017

Livro: inovacao na agricultura e na industria - Jose Eustaquio Ribeiro Vieira Filho e Albert Fishlow


 AGRO INOVAÇÃO
Agricultura e indústria no Brasil: inovação e competitividade
José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho e Albert Fishlow
(Brasília: Ipea, 2017, 314p.)


Organizado em dez capítulos, o livro  pretende contar a história da mudança tecnológica no setor agropecuário brasileiro, por meio da complexidade das trajetórias de inovação ao longo da cadeia produtiva. Trata-se de uma profunda análise sobre as políticas públicas brasileiras de inovação, enfatizando a importância do agronegócio no conjunto da economia.
Erroneamente, a agricultura é considerada por muitos economistas um setor que exerce influência marginal na geração de tecnologias e no crescimento produtivo. A obra demonstra, ao contrário, ao estudar o processo de inovação no Brasil, que a agricultura apresenta-se como um caso paradigmático, mesmo quando comparado aos exemplos mais tradicionais do setor industrial. A proposta do livro é justamente apresentar teoria e prática, ressaltando o que há de comum nas experiências bem-sucedidas brasileiras, seja na agricultura, seja na indústria. O objetivo é repensar até que ponto a experiência obtida no agronegócio brasileiro encaixa-se na abordagem teórica de inovação institucional induzida e em que medida tal evento compara-se aos modelos da indústria nacional.
O livro pode servir de importante subsídio à formulação de políticas públicas na economia e à reflexão do papel do Estado no contexto recente, passado o boom das commodities, e no estabelecimento de prioridades de desenvolvimento de longo prazo.






sábado, 20 de agosto de 2016

A Grande Destruicao na Industria: o governo se apropriou de 2/5 do faturamento - Carta IEDI

Não preciso me delongar na descrição do quadro de horrores enfrentado pelo setor industrial sob o reino dos companheiros, basta transcrever este trecho:

O governo se apropriou da maior parcela do valor adicionado pelo conjunto da indústria. Entre 2013 e 2015, a sua participação foi em média de 41,0% do total. Isto significou um volume de tributos da ordem de R$ 499 bilhões no acumulado do período. Os bancos, por sua vez, vêm logo em seguida, com uma parcela de apropriação do valor adicionado não muito diferente daquela do governo: R$ 443 bilhões ou 36% do total, no acumulado de 2013 a 2015. Já os empregados, em terceiro lugar, ficaram com R$ 297 bilhões do valor adicionado, isto é, 25% do total acumulado no período.

Não entendo como nossos capitalistas, nossos empreendedores industriais, nossos burgueses ainda continuem apoiando esses políticos vagabundos e irresponsáveis, continuem esperando favores do governo, continuem apoiando financeiramente esses partidos incompetentes, corruptos, essa classe política que vive de extorsão contra os únicos produtores de riqueza e criadores de empregos que são eles mesmos.
Não compreendo por que eles não fazem uma FRONDA EMPRESARIAL!
Covardes? Inconscientes? Estúpidos?
Um pouco de tudo isso.
Além de lutarem por preservar suas empresas num ambiente de negócios verdadeiramente estarrecedor de hostil e horroroso, o principal hobby desses empresários parece ser o de vir a Brasília, com o apoio de suas associações de classe e setoriais, para pedir favores ao governo, uma tarifa protetora ali, um subsídio privilegiado ali, um dinheirinho do BNDES, regras mais favoráveis no plano estritamente setorial, que o governo vai dando, apenas para cobrar a conta de toda a sociedade, inclusive deles todos, para pagar por todos esses favores, já que o governo não cria absolutamente nada, apenas retira TODOS os recursos que emprega para distribuir UMA PARTE para a sociedade de TODOS NÓS!
Quando é que os capitalistas brasileiros vão aprender?
E agora o sumário de um relatório constrangedor.
Paulo Roberto de Almeida

Quem Ganhou e Quem Perdeu na Distribuição do Valor Adicionado da Grande Empresa Industrial
Carta IEDI n. 738
20/08/2016

A economia brasileira enfrenta o segundo ano seguido de recessão. Do ponto de vista do equilíbrio financeiro das empresas não financeiras, observou-se a deterioração dos indicadores de rentabilidade e de endividamento.

Segundo os dados apresentados na Carta IEDI Nº 738, um fato característico do período após 2010 foi o contínuo aumento das despesas financeiras das empresas de capital aberto, fato este decisivo para a queda significativa dos indicadores de rentabilidade no período.

O aumento das despesas financeiras em um período de profunda incerteza conjuntural com queda da demanda agregada resultou na perda da capacidade do setor produtivo em reter lucros e, portanto, na dificuldade em vir a responder a uma eventual melhora conjuntural do cenário econômico com o aumento dos investimentos.

Os dados sobre distribuição do valor adicionado, levantados no presente trabalho, demonstram a mesma tendência, a partir dos resultados apresentados nos Demonstrativos de Valor Adicionado de 129 empresas industriais selecionadas.

Entre 2013 e 2015, o valor adicionado total das empresas da amostra permaneceu praticamente estagnado em termos nominais, na faixa de R$ 400 bilhões ao ano com pouca variação anual. O ano de 2015 foi o de maior valor com R$ 417 bilhões e o de menor foi 2014 com R$ 391 bilhões. Notou-se retração nominal significativa do valor adicionado gerado nas atividades ligadas à construção civil, mineração e siderurgia.

Embora o valor agregado total tenha crescido nos demais setores, o aumento da participação de remuneração do capital de terceiros não permitiu folga para o acréscimo dos lucros retidos, pelo contrário, dada a rigidez das demais divisões da distribuição do valor adicionado – gasto com pessoal, tributos e dividendos – os lucros retidos ficaram negativos, como forma de suportar o crescimento das despesas financeiras.

O governo se apropriou da maior parcela do valor adicionado pelo conjunto da indústria. Entre 2013 e 2015, a sua participação foi em média de 41,0% do total. Isto significou um volume de tributos da ordem de R$ 499 bilhões no acumulado do período. Os bancos, por sua vez, vêm logo em seguida, com uma parcela de apropriação do valor adicionado não muito diferente daquela do governo: R$ 443 bilhões ou 36% do total, no acumulado de 2013 a 2015. Já os empregados, em terceiro lugar, ficaram com R$ 297 bilhões do valor adicionado, isto é, 25% do total acumulado no período.

Houve um pequeno acréscimo na participação no valor gasto com pessoal durante o período, concentrado sobretudo no ano de 2015.

A participação dos tributos decaiu durante o período, acompanhando o ritmo da atividade econômica. Vale salientar que antes da queda, a participação dos tributos alcançou cerca de um terço no total do valor adicionado, excluindo a Petrobras da amostra: em 2013, ano de expansão econômica, a indústria destinou R$ 72,5 bilhões para tributos (33,8% do total).

Assim como a participação dos gastos com pessoal, a distribuição de resultados aos acionistas demonstrou também certa estabilidade durante o período, indicando que há certa regularidade na distribuição de resultados apesar das condições da economia.

Nota-se aumento significativo da participação da remuneração do capital de terceiros, sobretudo para o ano de 2015. Excluindo a Petrobras da amostra, a participação salta de 34,7% para 62% entre 2013 e 2015, o que demonstra o impacto do processo de fragilização financeira do setor industrial.

Embora o aumento das despesas financeiras tenha sido disseminado em todos os setores, houve concentração principalmente nos setores de bens intermediários, construção civil e material de construção. O impacto pode ser observado no comportamento dos lucros retidos durante o período, que atingiu no agregado participação negativa em 2015. Este resultado deveu-se exclusivamente a perda contabilizada na Vale da ordem de R$ 40 bilhões. Excluindo-se este valor, as empresas acumularam R$ 4,1 bilhões de lucros retidos com queda nominal de 56,5% em relação a 2014

Destacam-se prejuízos acumulados para um grupo significativo de setores em 2015, principalmente entre os setores de bens intermediários e para a construção civil e material de construção, mas de forma extensa houve a redução contínua dos lucros retidos nos resultados anuais para todos os setores.

A retração dos lucros acumulados impactou a capacidade de investir do setor industrial, que apresentou queda dos investimentos para um conjunto de setores, em especial, novamente bens intermediários, construção civil e material de construção.

A exceção fica por conta dos setores de papel e celulose e siderurgia, entre os bens intermediários, que aumentaram seus investimentos, mas também sua exposição financeira, acumulando, em alguns casos importantes, prejuízos significativos no período.

Excluídas as empresas dos setores de papel e celulose e siderurgia e a Petrobras, a Vale e a JBS, 121 companhias industriais adquiriram ativos imobilizados da ordem de R$ 24,4 bilhões em 2013. De lá para cá, este montante diminuiu para R$ 21 bilhões em 2014 e para R$ 19,5 bilhões em 2015 com queda de 20,1% no período. Dentre as categorias de uso, o pior desempenho foi em bens intermediários com queda de 44,6% entre 2013 e 2015 no agregado sem as empresas dos setores Siderúrgico e de Papel e celulose, a Petrobras e a Vale.

Os dados em conjunto sugerem que o agravamento da situação econômica no país inseriu algumas cadeias produtivas – em especial, bens intermediários, material de construção e construção civil – em um processo de fragilização financeira, em que as receitas operacionais correntes deixaram do cobrir as despesas financeiras.

No caso de não haver um fator de aumento da demanda agregada ou dos preços em alguns setores vinculados ao mercado exterior, o processo de fragilização financeira deverá aumentar devido ao acréscimo dos níveis de endividamento.

Aqui começa a Carta 738: 

Introdução. A Carta IEDI Nº 738 “Sem lucro, Sem investimento” traçou um panorama do desempenho econômico-financeiro das grandes empresas de capital aberto no pós-crise global de 2008. O período cobriu a recuperação econômica de 2010 até a recessão de 2015. Constatou-se que a rentabilidade em todos os macrossetores sofreu expressiva e generalizada redução ao longo dos anos. No agregado das empresas industriais, excluída a Petrobras e a Vale, a margem líquida de lucro saiu de 8,3% para 0,5%, entre 2010 e 2015. No caso do setor de serviços, por sua vez, excluídas as empresas de energia elétrica, o recuo foi de 14,8% para 1,8% no mesmo período.

Esse desempenho refletiu as dificuldades de as empresas absorverem a alta nos custos de produção e as perdas financeiras, no contexto de elevação das taxas de juros, recessão econômica e desvalorização cambial. A expansão do endividamento, cuja relação entre o capital de terceiros e capital próprio dobrou entre 2010 e 2015, foi um fator adicional para o agravamento da situação financeira das companhias.

Se a deterioração econômica e financeira é um fato, agora é importante avaliar como se deu a apropriação do valor adicionado gerado pelas empresas. Ou seja, quem ganhou ou perdeu na distribuição da riqueza produzida pelas maiores empresas industriais do país. Este é o assunto da nossa Carta IEDI de hoje. A forma como ocorreu esta distribuição é um elemento importante para qualificar a capacidade de a economia reagir à crise econômica.

Leia a íntegra aqui: http://iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_738.html

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Economia: tres posts ultra-pessimistas, helas - Estadao, esse jornalao derrotista

Coitados dos companheiros: parece que existe um complô, no PIG -- ou seja, o partido da imprensa golpista, esse monstro fantasmagórico que eles inventarem para não responder a acusações de malversações, corrupção, falcatruas e outros malfeitos, que são reais -- tendente a só publicar más noticias econômicas (já nem falo das contínuas denúncias de incompetências administrativas e falta de ética na política).
Mas, também o que podem fazer esses jornalões conservadores do PIG: inventar outros números, outros índices, quando os reais estão aí: baixo crescimento econômico, inflação em alta, déficits correntes e fiscais, introversão das políticas econômicas, protecionismo comercial aberto e ilegal, enfim, deterioração geral das condições econômicas, visíveis nas matérias e editoriais postadas abaixo...
Paulo Roberto de Almeida

Crise de produtividade

26 de fevereiro de 2013 | 2h 07
Editorial O Estado de S.Paulo
 
A economia brasileira está em crise e nenhuma bravata do governo mudará esse fato. Depois de dois anos de estagnação, o País continua incapaz de acompanhar o passo dos outros emergentes. Mesmo um resultado um pouco melhor em 2013 será insuficiente para o Brasil ganhar posições, de forma relevante, na corrida internacional. As autoridades tentam atribuir as dificuldades do País às condições externas, mas só convencem quem se dispõe a ser enganado. O fiasco brasileiro, por enquanto visível principalmente no baixo desempenho da indústria, reflete uma crise de eficiência produzida com ingredientes nacionais, a começar pelos graves equívocos da política econômica. O principal efeito da crise global foi evidenciar os pontos fracos do País em seu sistema produtivo.
Até agora, a indústria tem sido o setor mais afetado pela crise de eficiência. No ano passado, a produção física do setor encolheu 2,7%, enquanto a folha de pagamento médio aumentou 5,8%, o número de horas pagas caiu 1,9% e a produtividade recuou 0,8%. O custo da mão de obra, resultante da combinação desses fatores, cresceu 6,6% em 2012, segundo cálculos do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Foi a maior taxa em 11 anos, embora o pessoal ocupado tenha diminuído 1,4%.
O desempenho variou entre os 19 segmentos industriais considerados na pesquisa. Alguns conseguiram ganhos de produtividade, mas o custo do trabalho aumentou em 18 deles, reduzindo um poder de competição já em queda há alguns anos e sem perspectiva de recuperação a curto prazo. O desemprego no setor ainda é limitado, no entanto, porque o custo das demissões é alto e a reposição do pessoal será complicada, no quadro de escassez de mão de obra minimamente treinada ou passível de treinamento.
Com a queda de 2,7% no ano passado, depois de um crescimento de apenas 0,4% em 2011, a produção da indústria praticamente voltou ao nível de 2008, primeiro ano da crise internacional. Em 2010 a indústria havia aumentado 10,5%, mas havia diminuído 7,5% no ano anterior. A estagnação, portanto, já dura alguns anos. A paralisação das grandes economias e o baixo ritmo de expansão do comércio global tornaram mais dura a competição e deslocaram a indústria brasileira. A valorização do real sem dúvida agravou a situação, mas esse foi só um fator a mais.
A empresa brasileira já operava com desvantagens consideráveis, bem conhecidas e muito mais importantes. Mas o problema do câmbio - superestimado também por muitos empresários - deu ao governo um pretexto para descuidar das questões mais graves e esconder sua inépcia atrás da retórica inútil sobre a guerra cambial. Essa retórica se mantém, porque a instabilidade cambial continua e provavelmente continuará enquanto os bancos centrais do mundo rico sustentarem políticas monetárias frouxas. Nenhum deles mudará de rumo por causa dos protestos brasileiros.
Se cuidasse menos dessa questão e mais de outros desafios, muito mais importantes e passíveis de solução internamente, o governo daria uma boa contribuição para o desencalhe da economia nacional.
A presidente Dilma Rousseff e sua equipe conhecem pelo menos de nome esses problemas. Por isso decidiram no ano passado, com muito atraso, lançar um programa de investimento em logística. Têm tropeçado, no entanto, em detalhes tanto de formulação quanto de execução, por preconceitos ideológicos e por incompetência gerencial.
A direção, pelo menos, é correta. Mas repetem erros bem conhecidos. São incapazes de ir além de programas limitados e mal costurados de desoneração fiscal. Insistem nos estímulos ao consumo, quando os entraves estão do lado da produção. Falam em expansão do crédito, mas são incapazes de ir além das práticas de favorecimento a grupos e setores selecionados para lucrar e crescer. Ao mesmo tempo, o governo se atola em trapalhadas, intervindo na formação de preços, administrando índices em vez de combater as pressões inflacionárias e revelando uma assustadora tolerância à inflação. Diante dos resultados, como resistir à tentação de atribuir os males à tal guerra do câmbio?
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O Brasil fora das cadeias produtivas globais

Opinião, O Estado de S.Paulo, 26 de fevereiro de 2013
Rubens Barbosa *
Nem o governo nem o setor privado parecem perceber as transformações que ocorrem no comércio internacional, com profundas repercussões no Brasil. E os novos desafios são, em geral, minimizados pelos formuladores de decisão nos ministérios da área econômica e no Itamaraty.

O governo declara ter uma "política comercial cautelosa" por não querer abrir mão de seu projeto nacional de desenvolvimento e por julgar que, tendo uma indústria diversificada, o Brasil não se deve engajar nos acordos de cadeias produtivas, que levariam a alguma especialização no contexto produtivo.

O processo de globalização vem sofrendo modificações aceleradas, com a tendência de concentração da produção de manufaturas em poucos países e a fragmentação da produção de bens industriais. Nos últimos 20 anos, o comércio das cadeias produtivas (supply chain trade) vem crescendo gradualmente. Trata-se do intercâmbio de bens, investimentos, serviços e tecnologia associado às redes internacionais de produção, que combinam a inovação dos países desenvolvidos com salários baixos dos países em desenvolvimento.

No comércio das cadeias de suprimento, o investimento produtivo dos países desenvolvidos só vai ocorrer desde que certas regras e reformas que garantem a proteção dos bens tangíveis e intangíveis das empresas sejam adotadas pelos países emergentes e em desenvolvimento e caso haja integração da cadeia produtiva no intercâmbio global.

As redes de inovação-produção-comercialização encontram-se dispersas em empresas e países. A ampliação das cadeias produtivas globais e o crescente intercâmbio de partes e componentes está mudando a forma de tratar as trocas tradicionais de bens e serviços. A industrialização e a produção de manufaturas dependerá da participação dos países em desenvolvimento nessas cadeias produtivas de maior valor agregado. Ao ficar de fora do circuito das cadeias produtivas globais, a maioria dos países em desenvolvimento, o Brasil incluído, passa a concentrar suas exportações em commodities e suas exportações de manufaturados tornam-se cada vez mais reduzidas.

A incorporação das cadeias de produção global nos mega-acordos de livre-comércio, como o eventual acordo EUA-União Europeia, representa um desafio adicional, pois traz de volta preocupações geopolíticas para o comércio internacional. Considerações de política externa levam as duas regiões a tentar superar diferenças comerciais em função de interesses comuns para a prevalência de normas internacionais e valores e para a contenção da China.

O mundo está se multipolarizando rapidamente e a produção e as cadeias produtivas estão se multilateralizando. A crescente aceitação desse novo modelo de desenvolvimento pelos países asiáticos e alguns latino-americanos representa um grande desafio para os países emergentes como a China, a Índia, o Brasil e a Rússia, que relutam em aceitar a lógica dos atuais fluxos de investimento e do comércio.

A Organização Mundial do Comércio (OMC) procura regular e facilitar o intercâmbio tradicional - que diz respeito a bens produzidos num determinado país e vendidos em outro - com regras que dificultem ou eliminem as barreiras na fronteira (tarifas) e visem a penalizar a competição desleal (subsídios e dumping) com medidas compensatórias. As novas regras do comércio das cadeias produtivas começam a ser definidas de forma ad hoc nos acordos de comércio regional (como os dos EUA com países da Ásia e com a Europa), tratados bilaterais de comércio e de investimento (como os dos EUA e da Europa com a Coreia do Sul e com o países da América Latina) e por meio de reformas unilaterais dos países em desenvolvimento.

Os acordos regionais de livre-comércio (10 acordos dos EUA, 11 do Japão e 58 da União Europeia, segundo a OMC) registram 52 regras, das quais 38 não estão incorporadas à OMC; 14 tocam em disciplinas cobertas pelas regras da OMC, mas vão além delas (OMC plus); 12 das 52 regras estão presentes em 80% dos acordos firmados pelos EUA. A maioria das disposições legalmente obrigatórias são uma ampliação das regras existentes na OMC sobre propriedade intelectual (Trips), garantia de investimento (Trim), serviços, movimentos de capital e cooperação aduaneira.

A nova governança global, portanto, está sendo formada à margem das discussões multilaterais da OMC, com profundas consequências para os países em desenvolvimento.

O Brasil, sem estratégia de negociação comercial e com dificuldades para criar um mercado regional para seus produtos, integrados numa cadeia produtiva regional com os demais países, a exemplo do que ocorre na Ásia e na Europa, está cada vez mais isolado e dificilmente poderá beneficiar-se dessas novas tendências do comércio internacional. Os países que integram a Aliança do Pacífico - México, Chile, Colômbia e Peru - firmaram acordos com os EUA, com a Europa e com a China e estão inseridos no contexto dinâmico dos acordos regionais de livre-comércio. A fragmentação da produção e a exclusão das negociações externas começam a afetar o comércio externo brasileiro de manufaturas pela perda de sua competitividade e pela concorrência da China.

Se a política do governo Dilma Rousseff visando ao fortalecimento da indústria nacional der certo, sem o Brasil estar integrado ao dinâmico intercâmbio da cadeia produtiva global, o máximo que o País pode almejar no longo prazo é manter a produção industrial para o mercado interno com medidas protecionistas, para compensar a maior competitividade dos produtos importados.

O mundo não vai esperar o Brasil. Ou o Brasil recupera o tempo perdido e reformula a sua estratégia de negociação comercial externa, ou vai tornar-se cada vez mais isolado no mundo real do comércio global e de investimentos.

* Rubens Barbosa é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp.
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Rumo ao pior ano da logística agrícola

Opinião, O Estado de S.Paulo, 26 de fevereiro de 2013
Marcos Sawaya Jank *
Este ano o Brasil está colhendo a maior safra da sua História. Serão 185 milhões de toneladas (MT) de grãos e oleaginosas, 11% mais do que na safra anterior. Viramos o primeiro produtor (84 MT) e exportador (41 MT) mundial de soja. Também tomamos dos americanos a posição de primeiro exportador mundial de milho (25 MT, ante 23 MT dos EUA), um fato inédito e surpreendente que decorre da terrível seca que atingiu aquele país em meados do ano passado e provocou uma quebra de safra superior a 110 milhões de toneladas de grãos.

Em recente evento de que participei nos EUA, a principal questão não era saber a estimativa de quanto o Brasil vai produzir nesta safra, mas sim os volumes de soja e milho que serão efetivamente escoados através de nossos portos até o início da próxima safra americana. Ninguém mais tem dúvida de que o Brasil consegue responder rapidamente na produção. Basta dizer que só na soja ampliamos a área plantada em quase 3 milhões de hectares em apenas um ano. A segunda safra de milho - erroneamente chamada de "safrinha" e plantada após a colheita de soja no mesmo ano agrícola - superou a safra de verão em mais de 6 MT nos dois últimos anos. Trata-se de uma notável vantagem competitiva da agricultura tropical, que jamais vai ocorrer em países de clima temperado.

Acontece que em apenas um ano aumentamos a nossa exportação "potencial" de milho e soja em 18 milhões de toneladas, 36% mais do que na safra passada. Vale notar que o grosso da expansão de soja e milho se dá nos Estados de Mato Grosso, Goiás e Bahia, em áreas que se situam entre 1.000 e 2.300 km de distância dos portos. Se somarmos ainda as exportações de 25 MT de açúcar e a importação de 18 MT de matérias-primas para fertilizantes, não é de espantar que este ano assistiremos, passivos e apavorados, à maior asfixia na logística de granéis da nossa História!

Neste momento, as filas de navios para atracar nos Portos de Santos e de Paranaguá estão duas a três vezes maiores do que há um ano. Na última quinta-feira havia 82 navios esperando para carregar grãos no Porto de Paranaguá, ante 31 nesta mesma época do ano passado. Em Santos havia 59 navios, ante 29 há um ano. O custo médio de demurrage de um navio parado esperando carga é de US$ 30 mil por dia. Em seminário do Banco Itaú-BBA realizado na semana passada, operadores relataram que para evitar 45 dias de fila de espera em Paranaguá eles decidiram mandar os caminhões para o Porto de Rio Grande, onde as filas duram menos de dez dias. Ou seja, depois de rodar 2.300 km do norte de Mato Grosso até Paranaguá, a soja ainda tem de rodar outros 1.100 km para pegar uma "fila mais rápida" no Rio Grande do Sul. Uma verdadeira insanidade!

Para complicar ainda mais, a Lei 12.619, que restringe a jornada de trabalho dos caminhoneiros e o tempo de condução dos veículos, teve o efeito prático de "retirar" mais de 500 mil carretas das estradas. Os fretes de cargas já subiram entre 25% e 50% este ano. Além disso, o processo de votação da Medida Provisória n.º 595 - a chamada MP dos Portos, que propõe novas regras para a modernização destes - tem produzido uma sucessão de greves em escala nacional, que só tende a piorar com o avanço das negociações.

Essa situação calamitosa nos leva a pelo menos três reflexões importantes. A primeira delas, e mais óbvia, é a necessidade urgente de votar os novos marcos regulatórios que modernizariam a logística brasileira, particularmente a MP dos Portos. Apesar da calamidade nas estradas, da insuficiência histórica de ferrovias e hidrovias e da falta de armazéns (nossa capacidade de armazenagem equivale a 72% da safra de soja e milho, ante 133% nos EUA), o pior gargalo do País neste momento, de longe, são os portos. É hora de vencer a reserva de mercado, a burocracia e o corporativismo de um dos setores mais atrasados da economia brasileira.

A segunda é a necessidade urgente de viabilização sistêmica da nova logística do Norte do País, traduzida no escoamento pelos Portos de Itacoatiara (Rio Madeira), Santarém (Amazonas), Marabá (Tocantins), Miritituba (Teles Pires/Tapajós) e Vila do Conde (confluência do Amazonas e do Tocantins, no Pará), na conclusão da pavimentação das rodovias BR-163 e BR-158 e das Ferrovias de Integração Norte-Sul (FNS), Centro-Oeste (Fico), Oeste-Leste (Fiol) e Transnordestina. Basta dizer que 60% da produção de grãos se concentra nos cerrados, que serão beneficiados pela nova logística, mas só 14% dela é hoje escoada pelos portos do Norte e Nordeste. A viabilização dos novos corredores permitiria exportarmos com navios Capesize, que transportam 120 mil toneladas de grãos, o dobro da capacidade dos navios Panamax, hoje utilizados. Com a futura passagem desses navios pelo Canal do Panamá, em 2014, será possível reduzir em pelo menos 20% o frete marítimo para a China, que já responde por 40% da nossa exportação de grãos, além da redução potencial dos fretes terrestres, pelo uso de ferrovias e hidrovias.

A terceira reflexão tem que ver com o longo prazo. Precisamos estudar qual seria o melhor modelo de inserção do Brasil no agronegócio global do futuro. Hoje estamos engargalados num sistema ineficiente de transporte de soja e milho por caminhões, portos velhos e caros e navios pequenos. Milho e soja servem basicamente para produzir ração para bovinos, suínos e aves, que vão produzir a proteína animal consumida por países que estão do outro lado do planeta.

Num momento em que vários países constroem políticas comerciais mais agressivas - vide o anúncio do novo acordo EUA-União Europeia e a miríade de acordos asiáticos -, não seria a hora de repensar as nossas cadeias de suprimento, buscando explorar a combinação de maior eficiência e valor dos grãos, carnes e lácteos que serão demandados no futuro?

* Marcos Sawaya Jank é especialista em Agronegócio e Bioenergia, e foi presidente da Unica e do Icone. E-mail: marcos@junk.com.br.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

O futuro da industria no mundo: estudo da McKinsey (resumido pelo IEDI)

Produzindo o Futuro Industrial: A Nova Era Global de Crescimento e Inovação
Sumário

A Carta IEDI elabora uma resenha de importante estudo da McKinsey&Company “Manufacturing the future: the next era of global growth and innovation”. O relatório pretende elucidar qual será a contribuição da indústria da transformação nas economias avançadas e em desenvolvimento no século XXI. Através de um modelo de segmentação, o estudo aponta quais serão as condições de sucesso em cinco segmentos gerais da indústria de transformação, apontando caminhos para políticas públicas.

Os segmentos que se diferenciam bastante entre si no que se refere às suas fontes de vantagens competitivas e em como os fatores de produção influenciam suas decisões de onde produzir, investir em P&D e chegar ao mercado, são:

1)    Produtos de inovações globais para mercados locais

2)    Produtos de processamento regional

3)    Commodities intensivas em recursos naturais e energia

4)    Produtos de inovação e tecnologias globais

5)    Produtos de bens comercializáveis trabalho-intensivos

Segundo o relatório a transição da atividade primária para a industrial ainda é a rota para aumentar a produtividade e elevar os padrões de vida das economias em desenvolvimento. No futuro, a indústria da transformação continuará tendo um papel muito importante na economia, e a próxima era de inovação e oportunidades inspirarão uma nova geração de empregados da indústria.

De acordo com a McKinsey, o setor manufatureiro que detinha apenas 16% do valor adicionado mundial em 2010, gerava 70% das exportações das maiores economias industriais emergentes ou desenvolvidas naquele mesmo ano. É também responsável por 77% das inovações privadas em grandes países industriais, além da China, e, segundo uma pesquisa entre os países europeus, sua participação no aumento de produtividade das economias chega a 37%, muito superior à participação da indústria no PIB dos países.

A McKinsey identifica as principais tendências para o futuro da indústria da transformação, algumas novas e muitas já em curso, relacionadas à demanda, oferta, regulação e políticas governamentais, inovação e tecnologia, riscos e incerteza.

A observação e a adaptação a essas tendências são primordiais para o sucesso de empresas e nações no futuro. Por isso o relatório apresenta ainda algumas estratégias de atuação no âmbito do setor privado e do setor público. Da parte das empresas será preciso recriar suas estratégias atendendo aos requisitos de granularidade, agilidade, adoção de novas abordagens e capacidades gerenciais e operacionais, investir em mudança organizacional e formação de talentos.

Do lado dos governos, o papel crucial do Estado para o desenvolvimento industrial é com relação à criação de um ambiente para empresas inovadoras e competitivas, gerando condições das empresas manufatureiras locais se sustentarem ao longo do tempo. Não se trata apenas de um estado regulador, mas de corrigir falhas de mercado, apoiar indústrias nascentes etc. Os setores público e privado terão de atuar mais conjuntamente, incluindo as empresas multinacionais, gerando um ecossistema que atraia os talentos e promova inovações.
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O Relatório. O recém-lançado relatório da McKinsey&Company “Manufacturing in the future: the next era of global growth and innovation”, de 180 páginas, foi elaborado pelo Instituto Global da McKinsey (MGI) e pelo departamento de práticas operacionais em novembro de 2012. Seu objetivo é elucidar qual será a contribuição da indústria da transformação nas economias avançadas e em desenvolvimento no século XXI. O relatório resultou de 10 meses de análises macroeconômicas e pesquisas junto a líderes e profissionais especializados da empresa e associados. Para tal, realiza antes uma radiografia do setor na atualidade e das novas tendências. Através de um modelo de segmentação, a empresa consegue entender quais serão as condições de sucesso em cinco segmentos gerais, trazendo insights úteis tanto para os líderes das empresas quanto para as políticas públicas.

A Indústria da Transformação Continua Importante, Mas Sua Natureza Está Mudando. A indústria da transformação continua crescendo, a taxas de 2,7% entre 2000 e 2007 em economias avançadas e 7,4% em economias em desenvolvimento – que estão cada vez mais importantes no ranking dos maiores produtores mundiais. Dos gastos em P&D mundiais, até 90% são realizados na atividade manufatureira. Devido à sua alta competitividade, a parcela da indústria da transformação é duas vezes maior do que a do emprego na União Europeia (15) e três vezes nos EUA. Essa tendência deve continuar no longo prazo.

Números da indústria de transformação em 2000:

- 16% do PIB global, 70% do comércio internacional;

- 62 milhões de empregos nos países avançados em 2000, 45 milhões em 2010 - ou 270 milhões globalmente em 2000, 300 milhões em 2010;

- Nos EUA, 30 a 55% dos empregos na indústria da transformação são de atividades do tipo serviços, sendo que 19 centavos de cada dólar produzido pela indústria destinam-se a serviços;

- 3 grupos industriais globais eram liderados pelos chineses e 2 pelos norte-americanos;

- déficit comercial das indústrias avançadas em bens trabalho-intensivos somava US$ 342 bilhões, mas o superávit em bens inovadores era de US$ 726 bilhões.

A McKinsey considera que construir o setor manufatureiro permanece sendo fundamental para o desenvolvimento nacional, aumentar o nível de renda e para prover as máquinas, ferramentas e equipamentos necessários para construir uma moderna infraestrutura e habitação. Não houve nação que se tornou rica sem se industrializar. Até mesmo a Índia, que é conhecida por se desenvolver apoiada no setor de serviços, paralelamente tem investido bastante na infraestrutura para apoiar o crescimento industrial e de sua produtividade.

A transição da atividade primária para a industrial ainda é a rota para aumentar a produtividade e elevar os padrões de vida das economias em desenvolvimento. A indústria da transformação é reconhecidamente o motor da dinâmica nessas economias, retirando populações agrárias da pobreza. Nas economias avançadas, os bens industriais são a expressão da capacidade de inovação e competitividade do país. O setor remunera altos salários e é o principal responsável pelo progresso técnico. Além disso, a relevância da indústria, à medida que o país se desenvolve, passa a ser principalmente seu potencial de alavancar a produtividade, as exportações e as inovações. A transformação industrial adquire também importância no que tange a redução dos níveis de consumo de energia e de recursos naturais.

É fato, também, que o papel da indústria de transformação vem mudando ao longo do tempo. Quando a economia atinge certo grau de desenvolvimento, em geral a parcela da indústria da transformação no emprego e no PIB chega ao seu máximo, passando, então, a decrescer a favor dos serviços (fato estilizado conhecido como curva do U invertido entre PIB per capita e parcela da indústria no PIB). Mas a separação entre serviços e indústrias está cada vez menos perceptível.

Atualmente, até mesmo países no mesmo grau de desenvolvimento apresentam diferenças quanto ao peso da indústria de transformação no PIB, o que depende das políticas industriais e regulatórias, da importância do setor de recursos naturais na economia, do acesso e custo dos fatores produtivos, da demanda doméstica por bens manufaturados, dos desequilíbrios na balança corrente e do regime macroeconômico, destacando a política cambial.





A manutenção de um setor industrial vigoroso depende de alguns aspectos fundamentais, como acesso a mão-de-obra qualificada, com o menor custo possível, proximidade aos mercados demandantes, estrutura logística eficiente, disponibilidade de matérias-primas e energia a preços competitivos, proximidade a centros de inovação.



Box 1 – O sucesso da indústria de transformação na Suécia

A Suécia é um dos poucos casos de nações desenvolvidas em que a indústria da transformação manteve sua parcela no produto nos últimos 25 anos, com aumento da produtividade superior ao dos países avançados. O foco se voltou para setores de auto crescimento, como equipamentos de comunicação, veículos automotores e químicos. Mas todos os setores em geral cresceram muito, o que é atribuído às reformas após a crise dos anos noventa. Tais reformas incluíram a desvalorização da moeda e estabelecimento de padrões salariais nos setores de exportação, além da adesão à União Europeia em 1995 – o que contribuiu para a internacionalização de suas multinacionais. Logo, em 2007 apenas 10 empresas transnacionais contribuíam com 20% do valor adicionado total e 35% do crescimento da indústria de transformação sueca. Além disso, houve um movimento de ascensão na cadeia de valor rumo a setores de alta tecnologia, com investimentos em pessoal, por exemplo, bem superior aos outros países da União Europeia.



Em termos de comércio internacional, os bens manufaturados continuam dominando o cenário, representando mais de 70% do comércio de bens e serviços em valor. Nos países avançados, os serviços contribuem mais para o comércio internacional (23%, de acordo com a amostra selecionada no relatório) do que os países em desenvolvimento (13%, excluindo a China). Porém estes dados nada dizem sobre os bens intermediários importados que entram na produção dos bens industriais exportados – por exemplo, na China, subtraindo a importação de bens intermediários, as exportações industriais se reduzem pela metade. E ainda, fatores de produção do tipo serviços estão contribuindo na exportação de bens manufaturados. Por exemplo, em 2009, 81% das exportações de bens da Alemanha era de manufaturas (ou 32% do PIB), sendo que serviços e bens intermediários importados corresponderam a mais da metade desse valor. Já as exportações de serviços, que equivaleram a 7% do PIB, geraram valor agregado integralmente doméstico. Considerando esses pontos, a contribuição das exportações de serviços passaria a ser 13% do PIB, bem semelhante aos 15% das manufaturas. Portanto, as comparações de comércio internacional e produção doméstica devem se dar em termos das cadeias de valor.

Nesse sentido, o relatório examina cinco grupos de atividades da indústria, que se diferenciam bastante no que se refere às suas fontes de vantagens competitivas e em como os diferentes fatores de produção influenciam suas decisões de onde produzir, investir em P&D e chegar ao mercado.

Os setores e os segmentos que cada um deles compreende são:

1)    De inovações globais para mercados locais: químicos, veículos automotores, outros equipamentos de transporte, maquinário elétricos, máquinas e equipamentos.

2)    Processamento regional: produtos da borracha e plástico, produtos fabricados de metais, alimentos, bebidas e tabaco, papel e impressões.

3)    Commodities intensivas em recursos naturais e energia: produtos da madeira, petróleo refinado e derivados, papel e celulose, minerais básicos, produtos baseados em metais.

4)    De inovação e tecnologias globais: computadores e equipamentos de escritório, semicondutores e eletrônicos, equipamentos de precisão, óticos e médicos.

5)    Bens comercializáveis trabalho-intensivos: têxteis, vestuário, produtos de couro, móveis, joias, brinquedos, outros.





O primeiro grupo, de inovações globais para mercados locais, é o maior de todos, responsável por 34% do valor agregado na indústria de transformação global em 2010. São indústrias de média a alta intensidade em P&D, cujas competitividades dependem de um fluxo contínuo de inovações. Para minimizar custos de transporte, costumam se localizar próximas ao mercado consumidor, são bastante influenciadas por aspectos regulatórios (como padrões de segurança e qualidade) e acordos comerciais. O subsetor de químicos é o mais importante em termos de geração de valor agregado, enquanto máquinas e equipamentos é o que mais emprega. A China é o principal produtor desse grupo, seguida por EUA e Japão; as economias desenvolvidas correspondem a 60% do mercado.

O segundo grupo, indústrias de processamento regional, representou 28% do valor agregado da transformação industrial em 2010, sendo o maior empregador em países avançados. Localizam-se próximas ao mercado consumidor e aos fornecedores de matérias-primas, com produção altamente automatizada, mas em geral, não intensivas em P&D e se destinam primordialmente aos mercados domésticos. O subsetor que gera maior valor adicionado e também é responsável por empregar mais trabalhadores é o de alimentos, bebidas e tabaco – sobretudo nos países em desenvolvimento. Os maiores produtores mundiais são China e EUA.

Para o terceiro grupo, das commodities intensivas em recursos naturais e energia, os preços das matérias-primas e da energia são fundamentais. Portanto, tentam maximizar a proximidade às fontes energéticas e aos mercados finais, devido aos altos custos de transporte. Estes bens equivaleram a 22% do valor agregado mundial de transformação industrial. O subsetor que mais contribui para a geração de valor agregado do segmento é o de metais básicos, enquanto o que mais emprega é o de produtos derivados de minerais. Os grandes países em desenvolvimento ricos em recursos naturais, como Brasil, Indonésia e Rússia concentram essas indústrias, mas o maior produtor é a China, seguido dos EUA.

Já o quarto grupo, de inovação e tecnologias globais, são dependentes das redes globais de produção e de geração de P&D, mas não necessitam se localizar perto de um mercado específico, tendo sua cadeia produtiva espalhada pelo globo conforme as vantagens de custos de cada etapa da produção. O grupo produz 9% do valor agregado mundial da indústria de transformação, sendo que os EUA é o principal produtor mundial, seguido da China. O subgrupo de maior peso é o de eletrônicos e semicondutores.

E o grupo de mão-de-obra intensiva corresponde a apenas 7% do valor agregado da indústria da transformação global, são bens altamente comercializáveis e sua produção privilegia a proximidade à localidades de mão-de-obra abundante e barata, com infraestrutura de transporte disponível. Esse segmento costuma ser o primeiro a se desenvolver durante a industrialização dos países, para depois perder a importância gradualmente perante as outras indústrias. O principal subgrupo em termos de geração de valor agregado e de emprego é o de têxteis, vestuário e couro. A China é a maior produtora mundial.


Box 2 – Metodologia de segmentação da indústria de transformação

A classificação levou em conta seis aspectos que influenciam os custos, a inovação e a comercialização dos bens de cada indústria. No que tange o critério de custos, considerou-se a intensidade em capital, trabalho e energia. Para inovação, adotou-se a variável gastos em P&D sobre o valor adicionado. E para comercialização, usou-se um parâmetro para intensidade de comércio (medido por exportações sobre o produto industrial) e o valor sobre o volume exportado.

A principal base de dados foi uma amostra de 75 países disponível no IHS Global Insight, e também dados internos da McKinsey, da OECD e do governo dos EUA.







Observa-se que estes grupos estão espalhados pelos continentes seguindo certa lógica de especialização, de forma que os países avançados concentram os produtos globais de tecnologias locais, e os países em desenvolvimento, concentram os trabalho-intensivos. Por sinal, a competição nesse último segmento é acirrada e suscita frequentes intervenções internacionais no campo da regulação, principalmente da OMC. Por exemplo, o acordo da OMC sobre têxteis e vestuário em 2004 alterou bastante a distribuição espacial da indústria no globo, acelerando a realocação para localidades de baixo custo como China, Camboja, Vietnã, Egito e Paquistão.

A estrutura do emprego em países avançados está atualmente concentrada em bens de processamento regional (37%) e bens globais de tecnologias locais (30%). Aliás, esta última categoria é a mais importante também nas economias em desenvolvimento (28%), seguida por bens de processamento regional (26%). As indústrias de commodities e trabalho-intensivas representam maior parcela do emprego nos países em desenvolvimento do que nas economias avançadas.








Vale notar que, como dito anteriormente, a separação entre indústria e serviços está cada vez mais turva, nos EUA 37% do emprego na indústria é em atividades do tipo serviços. A parcela varia em cada grupo industrial, sendo 55% nos bens de inovação e tecnologias globais, 40% nos de inovação global para mercados locais, 31% em processamento regional, 31% em commodities intensivas em recursos naturais e energia, e 30% nos intensivos em mão-de-obra. De acordo com o relatório, a relocação de empregos do setor trabalho-intensivo para outros países apenas explica 20% das perdas no emprego da indústria de transformação entre 2000 e 2010, o restante se deveu aos ganhos de produtividade.

Assim, o papel da indústria de transformação na criação de empregos tem diminuído conforme se eleva o investimento das firmas em novas tecnologias para aumentar a produtividade. Além disso, as empresas têm procurado mão-de-obra mais qualificada, substituindo postos de trabalho na produção por atividades do tipo serviços.

O crescimento do emprego no setor de indústria de transformação entre 2000 e 2010 (de 270 para 300 milhões) se processou totalmente nos países em desenvolvimento. Por outro lado, nas economias avançadas, o emprego na indústria de transformação vem se retraindo (com destaque para Japão e EUA) por conta também de fatores como realocação, automação, inovações tecnológicas e organizacionais e pelo próprio crescimento do setor de serviços. Até 2030, nessas economias, tal movimento deve continuar, de forma que o emprego da indústria de transformação se reduza dos atuais 45 milhões para 40 milhões.

A propósito, a remuneração em serviços nas economias avançadas está se tornando tão boa quanto na indústria. Na média, a remuneração na indústria é superior à de serviços. Mas quando se agrupa cada setor pela intensidade do fator em cada atividade, resulta que a remuneração é similar nos dois casos. Assim a média industrial apenas é superior do que a de serviços porque a primeira apresenta maior peso dos setores altamente tecnológicos. 




Box 3 – A perda do emprego na indústria de transformação dos EUA

A McKinsey decompôs a queda do emprego na indústria de transformação norte-americana, demonstrando a contribuição de cada uma das forças abaixo para as perdas de quase 6 milhões de postos entre 2000 e 2010:

- mudanças na demanda doméstica (6%)

- mudanças na posição comercial líquida (20%)

- diferenças de crescimento de produtividade (70%)

- outros (4%).

Examinando por setor, especificamente na questão da posição comercial, as maiores quedas do emprego na indústria dos EUA foram em eletro-eletrônicos e têxteis e vestuário. De acordo com os cálculos apresentados no relatório, se o déficit na conta corrente fosse eliminado, as perdas no emprego industrial seriam recuperadas.


A conclusão é a de que os setores de indústria de transformação e serviços são altamente sinérgicos, ambos apresentam fortes efeitos de transbordamento e constituem fontes de demanda uma para o outro, de forma que o desenvolvimento mútuo é uma tendência evidente que continuará no futuro.

Novas Oportunidades em um Cenário de Negócios Mais Incerto. Após a crise de 2008, a economia global adentrou em um período de alta volatilidade e incerteza que tem sido particularmente desafiador. A lenta recuperação econômica mundial traz consigo uma série de tendências - algumas já em curso, outras novas - que reconfigurarão a indústria no futuro.

A McKinsey analisa as novas tendências, enfatizando os aspectos principais da demanda, oferta, políticas e regulação, tecnologia e inovação, e risco e incerteza. A seguir, comentam-se com mais profundidade as tendências essenciais desses aspectos.

a)    Demanda

A demanda está aceleradamente se deslocando para mercados emergentes

Nos próximos 15 anos, mais 1,8 bilhões de pessoas pelo mundo farão parte do mercado de consumo (provenientes principalmente da Ásia e África) enquanto o consumo quase dobrará nesse mesmo período, somando U$ 64 trilhões. A tendência de globalização da produção continuará e o crescimento dos bens industriais continuará sendo puxado pelas economias em desenvolvimento, que representarão 70% do mercado em 2025 - sendo tão importantes enquanto demanda, como quanto fornecedoras da cadeia produtiva. Deve haver crescimento também das vendas por internet, tanto entre empresas e consumidores finais, quanto entre produtores de diferentes estágios da cadeia de valor.

Observa-se que poucas multinacionais estão preparadas para essa transformação. Uma pesquisa recente da McKinsey junto às cem maiores multinacionais do mundo com matriz em economias avançadas revela que suas vendas nos países em desenvolvimento correspondem, em média, a apenas 17% do total.

Maior fragmentação da demanda e customização

A tendência de proliferação de produtos para atender à fragmentação da demanda já está acontecendo. Esse fenômeno está relacionado ao anterior, já que os novos entrantes no mercado global terão diferentes necessidades a serem atendidas pelos produtos. Há que se considerar que mercados como Índia, Brasil ou China são extremamente diversificados, o que abre flanco para a proliferação de produtos. Também, nas economias avançadas, os consumidores demandarão mais variedade e produtos com ciclo de vida mais curtos, acentuando a tendência à customização.

Por exemplo, no setor de automóveis, entre 2002 e 2011, a BMW ampliou seu portfólio de carros de 12 modelos para 22, reduzindo o ciclo de vida dos produtos em 19%. A Ford ampliou sua linha de 71 para 81 modelos, também reduzindo o ciclo de vida dos produtos em 6%.

Crescente demanda por serviços relacionados à indústria de transformação

Mais e mais os produtos da indústria da transformação carregarão serviços em sua produção, especialmente nos mercados de business-to-business (B2B). Os serviços já correspondem até 55% do valor dos produtos, sendo particularmente representativos no setor de bens de capital. A crescente importância de serviços de maior valor agregado implica o aperfeiçoamento tecnológico e a proliferação de centros de inovação, não apenas nas atividades de alta tecnologia, mas em termos gerais.

b)    Oferta

Crescentes salários em regiões de baixo custo

Espera-se que a maior riqueza e produtividade dos países em desenvolvimento acarretem em aumento dos salários. Entre 2000 e 2008, enquanto nos países avançados os salários cresceram menos de 1% ao ano, nos asiáticos o aumento foi superior a 7% ao ano. Na China e na Índia o custo unitário do trabalho expandiu 16% e 8% ao ano entre 2003 e 2010, respectivamente. Já a produtividade cresceu 14% na China e 17% na Índia.

O incremento dos salários atinge especialmente os segmentos intensivos em mão de obra, de bens transacionáveis e as montadoras dos produtos de alta tecnologia. A solução mais comum, nas indústrias que a permitem, é a transportação da produção para regiões de menor custo. Mas esta possibilidade ficará cada vem menos viável.

Escassez de talentos

Vislumbra-se maior escassez de técnicos para desenvolver e operar ferramentas e sistemas industriais, com elevação dos salários em regiões de baixos custos. Os cálculos da McKinsey apontam para a falta de mais de 40 milhões de empregados altamente qualificados em 2025, principalmente na China e outras economias em envelhecimento. Os trabalhadores com qualificação média também estarão “em falta”, enquanto os de baixa qualificação apresenta a demanda inferior à oferta. As profissões com maior déficit são engenharia, vendedores de comércio internacional e técnicos.

Uma pesquisa da empresa revelou que em 2011 quase 80% das indústrias japonesas reportaram a dificuldade de encontrar mão-de-obra altamente qualificada. Esse percentual é de 26% na Europa, Oriente Médio e África. Mesmo nos EUA, 43% das firmas de indústria de transformação investigadas revelavam ter vagas de alta qualificação disponíveis por longo tempo, sem que se encontrassem funcionários para as vagas.

Preços de commodities mais elevados e voláteis

Os preços das commodities já estão em níveis altos, sem precedentes na história. E a expectativa é de contínua escalada, pois a demanda deve crescer de 30% a 80% nos próximos 20 anos. A razão fundamental é o ingresso de mais chineses e indianos aos mercados, com aumento do consumo diário de calorias.

E ainda, a volatilidade dos preços também deve aumentar, o que pode ser repassado para preços principalmente no segmento de firmas globais mas atuação local, como alimentos, bebidas e tabaco (onde a matéria-prima corresponde a até 65% do custo total) ou a de aço (70 a 80%). Esse componente pesa negativamente na decisão de investimento em capacidade produtiva, por isso deve-se encontrar soluções inteligentes para contornar os riscos associados.

Maiores custos de transporte e gargalos logísticos

Essa tendência está associada com o crescimento dos mercados, principalmente nos países em desenvolvimento – em que ocorrem paralelamente processos de acelerada urbanização. Mesmo as economias avançadas têm dificuldade em lidar com o maior volume de trocas de bens, tanto que nos EUA o tráfego rodoviário cresce 3% ao ano – ao passo que a capacidade se eleva 1%.

O peso desse custo é particularmente oneroso em produtos de baixo valor agregado. É por isso que empresas como a P&G, IKEA e Emerson estão regionalizando suas operações em praças próximas aos mercados consumidores.

c)    Políticas e regulação públicas

Persistência de políticas comerciais restritivas

Recentemente, os fluxos de comércio crescem a taxas mais de duas vezes maior do que a do crescimento da produção mundial, em um contexto onde as redes de negócio estão se tornando mais complexas. A Europa e os EUA deixaram de ser os principais polos, isolados, do comércio mundial – pois o trânsito de mercadorias e negócios na Ásia vem progressivamente aumentando.

O comércio mundial disparou, também, incentivado pela queda de barreiras e redução de tarifas, de um lado, e pelo aumento de mais de 5 vezes dos acordos comerciais entre 1980 e 2010, de outro. Mas políticas como a de conteúdo nacional continuam sendo bastante utilizadas, facilidade de financiamento, subsídios etc. As intervenções são comuns nas indústrias correlatas à energia e aos recursos naturais.

Contínuo declínio dos impostos sobre as empresas.

Os impostos sobre as empresas já vinham caindo desde os anos oitenta, como por exemplo, na França, Alemanha e Reino Unido – onde eram de cerca de 50% e hoje são inferiores a 30% (média OCDE é 23%). As taxas mais elevadas são nos EUA, que em 2012 eram de 39%, seguido do Japão (38%), França (30%) e Índia (32%).

Há casos em que os países reduziram as taxas seguindo políticas industriais de fomento de segmentos industriais específicos. Mas dificilmente somente este fator justifica a escolha de um local para a implantação de uma fábrica.

d)    Inovação e tecnologia

Inovações em materiais, em design de produto e processos produtivos

Espera-se, também, uma forte onda de inovações em materiais (como biotecnologia, nanotecnologia e compostos de baixo peso – como fibra de carbono), tecnologias da informação, processos produtivos e operações da indústria da transformação (por avanços da robótica, de visualização dos bonecos de produtos, additive manufacturing - das impressões em 3D – e a indústria de transformação “verde”). Esses avanços colaboram para elaboração e escolha de protótipos, dos sensores e da chamada “internet das coisas”.

Haverá maior engenhosidade nos processos e acabamento dos produtos para diminuir uso de recursos e monitorar a cadeia de valor. Nesse ponto se enquadra a questão do uso de matérias-primas, cujas fontes estão mais disputadas. Por isso, as inovações como o shale gas nos EUA, são fundamentais para mudar os custos relativos de energia – conferindo grande vantagem competitiva às indústrias que acessam os novos recursos. Por exemplo, de 1990 para cá, o custo da automação diminuiu 40 a 50% dos custos de trabalho nas economias avançadas. O setor automotivo, em 2010, adquiriu cerca de 33 mil robôs industriais, e o de eletrônicos 31 mil.

e)    Riscos e incertezas

Volatilidade da demanda

O ambiente internacional, de acordo com a McKinsey, apesentará mais riscos e incerteza do que o atual, tornando-se mais complexo. A combinação de rápido crescimento do consumo global, com fragmentação de demanda e resultante proliferação de SKUs, crescentes demandas para investimentos em bens de capital devem aumentar a volatilidade da demanda mundial no futuro.

Algumas indústrias, como semicondutores e eletrônicos, estão acostumados com a rotina de produtos de ciclos de vida curtos; mas outras como a aeroespacial, automóveis, máquinas e equipamentos estão mais expostas aos ciclos de negócios relacionados a fatores externos como o regime macroeconômico e a política industrial.

Volatilidade do preço das commodities

Como dito anteriormente, além dos altos patamares que os preços das commodities alcançaram nos últimos anos – e que devem continuar se elevando nos próximos, a tendência é maior volatilidade. Por exemplo, na última década, a volatilidade de produtos como petróleo, trigo, cacau e o PET (polietileno tereftalato) superou a média em mais de um desvio padrão. A principal causa é a maior correlação entre os preços dos recursos naturais, de forma que um choque de oferta em um deles afeta mais rapidamente o preço dos outros.

Além disso, inovações continuamente contribuem para a reorganização das estruturas de mercado das commodities. Um exemplo é o shale gas, cuja tecnologia está impactando a geração, transporte e exportações de energia, concorrendo com o carvão, a hidroeletricidade, o petróleo e até mesmo a energia nuclear e eólica.

Flutuações cambiais

A taxa de câmbio é um fator primordial para a competitividade e os resultados financeiras das indústrias. Tanto é que a internacionalização das empresas japonesas após meados da década de oitenta se deveu, em grande medida, à valorização contínua do iene após o Acordo de Plaza em 1985. O câmbio afeta principalmente as indústrias de alta tecnologia e as empresas domésticas de processamento, como alimentos.

Empresas do setor automotivo, máquinas e equipamentos têm usado a sua pegada global para se proteger contra tal volatilidade, aprofundando sua internacionalização e participação nos mercados locais.

Riscos da cadeia produtiva

Dada a intensificação da complexidade das cadeias produtivas globais, a habilidade em administrar os riscos relacionados se constituirá num fator competitivo crucial. Nas palavras do CEO da Caterpillar, “na nossa indústria, o executivo que melhor administra a cadeia produtiva provavelmente será o competidor mais bem-sucedido ao longo do tempo” (McKinsey, 2012, p. 99).

De acordo com pesquisas da McKinsey, executivos de diversas empresas globais afirmam que administrar cadeias produtivas tem se consolidado uma atividade mais frequente e 82% deles acreditam que os riscos associados à cadeia produtiva das empresas devem aumentar nos próximos cinco anos. Esses riscos afetam todas as indústrias, principalmente as mais globais.

Riscos de localidade

Desastres naturais que geram perdas tremendas como terremotos, tsunamis, inundações etc. têm aumentado desde 1980 a uma taxa de 3%, de acordo com estatísticas de seguradoras. Esses acidentes tornam as indústrias globalizadas mais vulneráveis, não apenas por causa das suas cadeias produtivas interconectadas, mas também porque em alguns casos o fornecimento de matérias-primas é concentrado em uma só região.

Incertezas quanto aos custos e acesso ao capital

Nos últimos 30 anos os custos de capital convergiram na maior parte dos países, com finanças globalizadas e taxas de juros de longo prazo menores. Um dos fatores principais para tal declínio foi o menor investimento em infraestrutura e maquinário, que globalmente decaiu de 26.1% do PIB em 1970 para 20,8% em 2002.

O capital barato fez com que as empresas não priorizassem tanto a eficiência nesse fator. Porém, inevitavelmente quando o crescimento da economia internacional se firmar novamente e o custo do capital se elevar, tal questão se tornará mais relevante. Projeta-se uma demanda por capital em 2030 recorde na história, com o agravante de que a poupança global não acompanhará o ritmo desse crescimento. Então haverá um cenário de maior escassez de capital e taxas de juros mais elevadas. As empresas terão, então, de melhorar a eficiência e a gestão desse recurso.

Implicações para as empresas multinacionais

Esses desafios e oportunidades tendem a transformar os processos empresariais de busca de novos mercados e fornecedores, de expansão da produção e da sua pegada tecnológica. Em termos de segmentos, as decisões estratégicas quanto a cada tendência serão ponderadas pelos diferentes desafios em que cada um deles precisa se concentrar, a saber:





As empresas terão de literalmente recriar suas estratégias, sendo chave os seguintes requisitos:

a) “Granularidade”: as indústrias precisam conhecer bem o contexto produtivo e mercadológico, desenvolvendo uma visão altamente detalhada e granular dos novos requisitos do mercado para traçar estratégias apropriadas de negócios.

Primeiramente, as empresas deverão entender a dinâmica dos seus segmentos produtivos, atentando-se para as novas tendências, de forma a adquirir e sustentar vantagens competitivas. Em segundo lugar, deverão também ter uma visão granular dos segmentos de seus clientes, para identificar e customizar produtos e estratégias. Terceiro, as empresas precisarão combinar essa visão granular com operações granulares. Não apenas os fatores de arbitragem nos custos da mão-de-obra serão privilegiados, mas a produtividade total dos fatores. Além disso, o planejamento deve ser aprimorado, deixando de contar apenas com previsões pontuais, evoluindo para projeções de cenários. Nessa empreitada, o uso de grandes bancos de dados será bastante relevante, melhorando as resposta das empresas às demandas dos seus clientes, e também de suas operações e utilização do maquinário em geral.

b)  Agilidade: a nova era será marcada por empresas muito ágeis e interconectadas, que utilizam a informação e análises disponíveis em muito maior escala tão bem quanto empregam talentos e maquinário avançado para trazer aos diversificados mercados globais bens e serviços de alta qualidade.

A busca por processos de produção mais enxutos deve continuar, sendo a maior produtividade um objetivo fundamental para manter-se competitivo, de forma que o empenho em consolidar, simplificar, reduzir ineficiências nas operações das empresas deve continuar e expandir para outras áreas, destacando a produtividade nos recursos. Por isso o gerenciamento de dados, sobretudo em uma era de rápido progresso da tecnologia da informação, é um eixo estratégico muito relevante para as empresas do futuro.



Box 4 – Método para aumentar a agilidade da empresa

A McKinsey propões uma metodologia de quatro passos para conferir maior agilidade aos processos produtivos e de decisão: preempção (escolha de procedimentos que evitam descontinuidades operacionais), detecção (de problemas e oportunidades), fortalecer reação (criando claros direitos e procedimentos decisórios e de intervenção), capturar oportunidades (habilidade de efetivamente usar a volatilidade para ganhar vantagens competitivas).


c)    Adotar novas abordagens e capacidades: as empresas precisarão aprender novas formas de gerar ideias de negócios, contando cada vez mais com seu ecossistema de fornecedores e parceiros comerciais. Utilizarão uma abordagem baseada no desempenho de todos os fatores para elevar a produtividade.

A competitividade estará muito além de meros ganhos de arbitragem sobre custos do trabalho, precisando considerar todos os fatores envolvidos na produtividade total dos fatores: trabalho, capital, transporte, talentos de liderança, materiais e componentes, energia, políticas de comércio e regulação. Os empresários deverão assumir compromissos de maior responsabilidade em um cenário de maior risco, e para isso precisarão realizar investimentos diversos e ágeis, traçando um planejamento dos investimentos de longo-prazo condizente com as transformações em curso na demanda. A diversificação do portfolio será importante para tornar cada decisão estratégica menos crítica, menos permanente e mais fácil/ menos custosa de reverter.

d)    Investir em mudança organizacional e formação de talentos: para operar num ambiente mais complexo, com agilidade e granularidade, as empresas precisam remover barreiras organizacionais e construir novas capacidades e mentalidades de negócio. Para tal empreitada, precisam de empregados com as habilidades certas.

Implicações para o setor público

Do lado do setor público, será preciso encarar o setor industrial não apenas como um grande empregador, mas também como crucial para a elevação da produtividade, das inovações e da competitividade. Deve-se levar em conta que a indústria carrega um grande setor de serviços associados, cada vez mais relevantes na produção doméstica e também no comércio exterior. Além disso, as cadeias produtivas ficarão mais complexas, de forma que as políticas industriais precisam ter amplo conhecimento dos segmentos das indústrias e das interconexões existentes.

O papel crucial do Estado para o desenvolvimento industrial é com relação à criação de um ambiente para empresas inovadoras e competitivas, gerando condições das firmas manufatureiras locais se sustentarem ao longo do tempo. Não se trata apenas de um estado regulador, mas corrigir falhas de mercado, apoiar indústrias nascentes etc. Diante da maior competição internacional para atrair empresas globais e encorajar sua expansão, os governos que atuarem mais fortemente junto ao setor privado (incluindo empresas multinacionais e encorajando sua expansão), gerando um ecossistema que atraia os talentos e promova inovações, terão maiores chances de por em marcha modelos econômicos bem-sucedidos.

Uma prioridade para política, neste sentido, é a educação e a qualificação da mão-de-obra, tanto em termos sociais e públicos, quanto no âmbito das empresas, para ampliar a capacidade da nação de pesquisa e desenvolvimento – o que requer maior aproximação entre o setor público, privado e as instituições de ensino.

Em termos práticos, o relatório propõe um modelo de elaboração de políticas públicas que conta com os seguintes estágios:

i)    Realizar o benchmark da posição competitiva no contexto das novas tendências: é preciso entender o ponto de partida do país, os custos de fatores, as novas demandas dos mercados; apoiar inovação – com suporte à pesquisa, criação e difusão; administrar os riscos e colaborar com o setor privado de maneira ágil.

ii)    Estabelecer objetivos e alinhamentos: em termos econômicos, tecnológicos, sociais. É preciso ser realista e envolver todos os agentes relacionados a cada objetivo. 

iii)    Escolher a política certa para a tarefa: há quatro categorias de políticas, com diferentes graus de intervenção. A primeira é a imposição de regras e direcionamentos, a segunda é a construção de viabilizadores dos objetivos, a terceira é a coordenação de intervenções localizadas e a quarta é ser o principal agente.

Nesse sentido, o quadro abaixo apresenta exemplos dessas quatro categorias de políticas em diversos países, por segmento industrial.





iv)    Monitorar o progresso das políticas e corrigir desvios.

sábado, 14 de julho de 2012

O financiamento de longo prazo no Brasil - IEDI, Instituto Talento


A Reforma do Financiamento de Longo Prazo


Sumário

A Carta IEDI apresenta trechos de estudo recentemente concluído em parceria com o Instituto Talento Brasil e que foi apresentado na semana passada ao Ministro da Fazenda Guido Mantega e ao Presidente do BNDES Luciano Coutinho. A íntegra do trabalho pode ser acessada no site do Instituto.

Para dizer o mínimo, o financiamento no Brasil é inadequado. O crédito corrente é um dos mais caros do mundo, o que vale para as famílias, onde a taxa média de juros chega a 38,8% ao ano, e também para as empresas, que pagam em média 25% ao ano. Isto significa que os dois principais agentes econômicos carregam dívidas excessivamente inchadas pela renda capturada na intermediação financeira por intermediários financeiros e o próprio governo. Por consequência, o comprometimento da renda familiar necessário para honrar as dívidas rapidamente se torna excessivo, o que em certos momentos, como agora, retarda a evolução do crédito e restringe o aumento do consumo.

Do lado das empresas, em razão do alto custo do capital de terceiros, estas se veem obrigadas a fugir das dívidas, limitando investimentos ou balizando por meio de elevado autofinanciamento o seu acesso às linhas convencionais do sistema financeiro. Nesse sentido, as ações da atual política econômica para reduzir tanto a taxa básica de juros quanto os “spreads” bancários são importantes. Em tendo êxito, elas abrirão caminho para que um novo ciclo de crédito facilite a retomada do consumo e dos investimentos na economia.

Não se esgota nesses pontos a inadequação do modelo de financiamento. As fontes voluntárias voltadas a amparar os investimentos em capital fixo praticamente não existem internamente, o que aprofunda a dependência aos recursos oficiais e ao endividamento externo. As empresas brasileiras têm pouco acesso ao mercado de ações, o crédito bancário com recursos domésticos de prazo mais longo é escasso e é flagrante a limitação da colocação de títulos corporativos (debêntures). Para ilustrar, como proporção do PIB, o estoque de títulos corporativos em 2010 era de 20% nos EUA, 17% no Japão, 11% na Alemanha, 9% na China e 3,4% no México. No Brasil, mal chegava a 0,5%.

A conclusão é que, praticamente só no BNDES estão disponíveis fundos a longo prazo, o que é muito pouco por mais que esta instituição tenha aumentado suas operações nos últimos anos. Em razão deste deficiente modelo de financiamento o investimento e o desenvolvimento das empresas do país ficam para trás. Setores pesados da indústria e a infraestrutura são segmentos na linha de frente dentre os mais atingidos.

O estudo realizado pelo IEDI e pelo ITB procura indicar caminhos para potencializar o mercado de debêntures, antecipando oportunidades abertas com a redução da taxa Selic. É proposto um “Programa de Emissões de Títulos Corporativos Incentivados” tendo como meta a colocação de R$ 50 bilhões em debêntures de empresas de qualquer setor de atividade lastreadas em bons programas de investimento ou de pesquisa tecnológica e inovação. Esses títulos usufruiriam de incentivos fiscais já existentes (muito embora hoje restritos ao setor de infraestrutura, uma limitação que precisaria ser removida) e contariam com especial atuação dos bancos públicos para dar garantia firme a uma parcela substantiva dos lançamentos, que só seria exercida caso as emissões não sejam totalmente distribuídas aos investidores. É um passo na direção da reforma do financiamento da economia brasileira.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Senado faz audiencia sobre sistema financeiro internacional: dia 8/08, 18hs (TV Senado)

Um debate importante e necessário, do qual vou participar: TV Senado, Segunda-Feira, dia 8, as 18hs.
Paulo Roberto de Almeida

SENADO - COMISSÕES - RELAÇÕES EXTERIORES
Debate sobre sistema financeiro internacional reabre ciclo de audiências da CRE
Comissão de Relações Exteriores do Senado, 3/08/2011

No momento em que diversas economias europeias enfrentam sérias dificuldades e os Estados Unidos acabam de afastar o risco de calote, com a ampliação do teto de sua dívida, a saúde do sistema financeiro internacional será o tema da primeira audiência pública do semestre da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE). A partir das 18h de segunda-feira (8) a comissão debaterá o tema "O Sistema Financeiro Internacional: do Pós-Guerra aos dias de hoje".
Entre os convidados para o debate estão o diretor do Banco Mundial para o Brasil, Makhtar Diop; o diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Luiz Awazu Pereira da Silva; o diplomata Paulo Roberto de Almeida, professor do Uniceub; e a secretária de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Tatiana Prazeres.
Outras audiências
Cinco outras reuniões já estão marcadas pela comissão para as próximas semanas, dentro do ciclo de audiências sobre "Os Rumos da Política Externa Brasileira", iniciado no primeiro semestre. A experiência dos espaços econômicos internacionais, como a União Europeia e a Área de Livre Comércio da América do Norte (conhecida pela sigla inglesa Nafta) será o tema da segunda audiência, no dia 15. Na semana seguinte serão discutidas as negociações comerciais internacionais, com foco na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), com a presença de dois ex-ministros, Celso Lafer e Pratini de Morais.
Nas semanas seguintes os senadores da comissão ainda debaterão temas como a crise econômica mundial de 2008, as dificuldades enfrentadas por economias europeias como as de Grécia e Portugal e o panorama do setor de energia em todo o mundo. Um dos convidados para esta última audiência, prevista para 19 de setembro, é o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli. Ao longo do primeiro semestre, foram realizadas oito audiências públicas dentro do mesmo ciclo, com a presença de 35 convidados.

Marcos Magalhães / Agência Senado
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Agricultura, industria, servicos - valor agregado e preconceitos bobos

Um leitor deste blog, Felipe Xavier, comentando sobre o post (abaixo) da "economia política da idiotice", formulou-me a seguinte pergunta"

Na sua opinião, professor, existe algum motivo razoável para essa preterição da agricultura em favor da indústria? O Sr. concorda com a visão de que ser um produtor de commodities representa um atraso para o país??

Respondo rapidamente, por falta de tempo, mas recomendo que o Felipe leia mais sobre a repartição setorial da economia -- eu mesmo já escrevi a respeito, em meu livro O Brasil e o Multilateralismo Econômico -- e sobre as noções de valor agregado e de produtividade em economia, que são simples, mas é preciso entender exatamente do que se está falando.

O preconceito contra a agricultura é tão velho quanto a revolução industrial, ou seja, tem mais de 250 anos; isso a despeito do fato que a agricultura movimentou todas as sociedades nos últimos 10 mil anos, continua fazendo seu dever de alimentar a humanidade e contribui também para os equilíbrios ambientais (quando administrada de forma correta, no plano ambiental e ecológico).

Os fisiocratas tinham a agricultura em alta conta, e acham que ela era a verdadeira criadora de riqueza. Não, não é, mas pelo menos eles não cometeram a bobagem de considerar, como Marx, que os serviços era "improdutivos", porque eles supostamente não agregavam valor ao produto (segundo sua concepção totalmente equivocada de basear a extração de mais-valia no ato físico da transformação da mercadoria.

É certo que o crescimento da produtividade apresenta taxas mais altas na indústria do que na agricultura (que é mais lenta a reagor a melhorias nos processos e nos produtos), mas os serviços também são de difícil mensuração metodológica, e nem por isso deixam de representar a maior parte da criação de valor em praticamente todas as sociedades. É certo também que a industria apresenta maiores efeitos em cadeia -- backward and forward linkages -- do que a agricultura, mas isso não é motivo para desprezá-la, ou achar que ela não pode desenvolver um país.

Pode. Não só pode, como o fez, com sociedades que se desenvolveram basicamente sobre a base de uma agricultura de alta produtividade, como a Dinamarca, a Nova Zelândia, a própria Holanda, assim como a Inglaterra de antes da revolução industrial. O Brasil, aliás, é uma prova disso, ainda que de maneira não convencional.
Nossa agricultura foi um setor muito atrasado da economia durante mais de 4 séculos, por deficiências estruturais e outras características que não vem ao caso, agora, explicitar.
Mas é um fato que a agricultura no Brasil tornou-se um setor bastante avançado, com muita agregação de valor, e incorporação plena de insumos e produtos da indústria e dos serviços. É ela praticamente que sustenta nosso saldo de transações correntes, é ela que nos projeta no mundo com tal força que seremos, pela primeira vez em cinco séculos, um país verdadeiramente estratégico, o que NUNCA fomos. E isso não apenas pela agricultura de alimentação, mas também pela produção de combustível de biomassa, os renováveis substituindo os fósseis, tão denegridos nestes tempos de preconceitos contra o aquecimento global...

Ser produtor de commodities não é necessariamente um atraso para o país, se ele possui capacidade "instalada" e vantagens comparativas nessa área. Mas se recomenda -- e qualquer pessoa inteligente diria isto -- que o país abandonne rapidamente as commodities (que possuem pouco valor agregado) e subam na escala tecnológica, para auferir mais renda do comércio internacional.
Assim, em lugar de minério bruto, produtos siderúrgico; em lugar de soja em grãos, alimentos processados; em lugar de carne in natura, cortes finos; em lugar de café em grãos, solúvel e processados, ou cafés especiais. Enfim, a agricultura NÃO tem por que ser atrasada, pois ela não é.
Quem são atrasados são os homens...
Isso dá para mudar...

Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 30.08.2010)