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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 28 de abril de 2022

Política internacional e relações econômicas internacionais do Brasil: podcast com alunos da UFPB - Paulo Roberto de Almeida

Política internacional e relações econômicas internacionais do Brasil: podcast com alunos da UFPB

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Notas para entrevista oral com alunos de Relações Internacionais da UFPB.

  

1) A identidade brasileira no sistema internacional depende da imagem que os outros países têm do Brasil. Nesse sentido, podemos relacionar a busca por uma participação mais frequente em foros multilaterais à uma vontade brasileira em consolidar a imagem de um país confiável e engajado, que não se preocupa somente com questões de segurança e de desenvolvimento, mas também com as “low politics” como as temáticas ambientais e de direitos humanos?

PRA: A imagem do Brasil já estava relativamente consolidada até 2018: a de um país desigual, injusto com os seus pobres, os seus índios, com os seus recursos florestais, com muita corrupção, mas também vibrante do ponto de vista de avanços sociais, democráticos e com uma diplomacia de alta qualidade, ativo participantes em todos os foros regionais e multilaterais, com propostas originais e sempre buscando o consenso entre todos os membros de organismos multilaterais e nas mais difíceis negociações, seja no plano econômico e comercial, no terreno ambiental, nos direitos humanos e sociais. Ou seja, elementos negativos e positivos de nossa identidade nacional e da imagem internacional, sem necessariamente se fazer uma distinção entre high ou low politics, assuntos de paz e segurança, por um lado, temas sociais e ambientais, por outro. Os demais países sabem exatamente o que é o Brasil, pois possuem representação no país e existem muitos correspondentes internacionais aqui. Eles sabem distinguir, por exemplo, as frases atribuladas de um presidente sem qualquer credibilidade externa e as declarações formais feitas na ONU e em outros foros internacionais e regionais; sabem que o Itamaraty não é, pelo menos agora, aquela confusão mental e os argumentos ridículos contra o globalismo do ex-chanceler acidental. Acredito que a maior parte dos países aguardam uma mudança de direção no país em 2023. 

 

2) Na atualidade, você acha que o Brasil, ao votar na ONU junto com países como a Arábia Saudita e junto aos EUA pelo embargo contra Cuba, tem comprometido as iniciativas multilaterais e o prestígio internacional do país?

PRA: De fato, a postura ideológica da gestão anterior no Itamaraty prejudicou muito a imagem internacional do Brasil, mas algumas correções foram feitas a partir de abril de 2021, no plano da diplomacia, com alguns resíduos bizarros que ainda ficaram na política externa. Alguns desses temas que destoam muito dos governos anteriores, sobretudo no campo dos direitos sociais, dos direitos humanos e da proteção às minorias, são identificados com esses resíduos ideológicos da postura pessoal do presidente, não expressando a postura real da diplomacia, e sim a postura pessoal do pequeno grupo  que cerca o presidente.

 

3) Dos cinco países do BRICS, apenas a China e a Índia despontam como promessas de grandes economias no futuro. Tendo em vista esse cenário, nós poderíamos afirmar que o BRICS fracassou?

PRA: O BRICS não é uma agência formuladora de políticas econômicas ou produtora de ideias elaboradas de governança, e sim um mero mecanismo de consulta e coordenação criado de maneira totalmente artificial, pois que resultando de uma assemblagem arbitrária feita por um economista de um grande banco, focando bem mais oportunidades de negócios para investidores institucionais, com base numa projeção conjunturalmente otimistas em torno de perspectivas de crescimento. O BRICS não pode ter fracassado porque ele não desenha políticas macroeconômicas ou setoriais, sequer oferece planos de investimentos, a despeito de um banco que se comporta como os demais bancos multilaterais: análise de custo e benefício quanto a projetos de investimento. O BRICS sempre foi bem mais a China do que todos os demais membros reunidos, embora a Índia tenha apresentado um ciclo dinâmico de crescimento econômico nas últimas duas décadas. O fato é que os países membros do BRICS não possuem nenhum acordo de comércio preferencial entre si, e praticamente não são convergentes nas grandes definições de políticas públicas fundamentais. 

 

4) Sobre a área comercial do multilateralismo, gostaríamos de perguntar sobre como tem sido a abordagem brasileira nesses espaços nas últimas décadas. FHC em sua gestão como presidente, por exemplo, lidou bastante com a inserção do Brasil no mundo globalizado e desde então essa passou a ser a grande linha de atuação do país nas instituições internacionais. O quanto dessa redefinição perdura até o contexto atual?

PRA: O liberalismo econômico da era FHC foi, de fato, plantado na curta era Collor, que deu início a uma revisão das grandes linhas das políticas comercial, industrial e até nuclear do Brasil, que perdurou, de forma surpreendente no curto governo Itamar Franco e foi expandido nos dois mandatos do governo FHC. A parte multilateral foi de certa forma continuada nos governos lulopetistas, mas não ocorreu mais abertura econômica ou liberalização comercial, como tampouco privatizações no plano interno. Mas foi reforçada a dimensão regional da política externa, mas praticamente sem nenhum conteúdo econômico, a não ser atuação do BNDES no financiamento – em muito casos misturados a corrupção – de grandes projetos em benefício de corporações brasileiras, na América Latina e na África, sobretudo. Mas essas mesmas empresas foram responsáveis por uma projeção externa exagerada da corrução nesses negócios com parceiros regionais e africanos. No cômputo global, houve poucos avanços no campo das cadeias de valor, ou seja, o Brasil continua ausente dos grandes intercâmbios globais, a não ser como fornecedor de commodities. 

 

5) Tratando do multilateralismo, sabemos que as instituições exercem um papel de grande importância. Em relação ao Brasil, podemos estabelecer que o nosso país pôde se beneficiar do multilateralismo através da expansão da sua diplomacia política, ainda que estivesse inserido em acordos não tão benéficos economicamente.

PRA: A política diplomática do Brasil já era multilateralista no período anterior à ONU e desde então a vertente multilateral tornou-se o eixo central da política externo do país, junto com a dimensão regionalista, mais afirmada a partir dos anos 1990. Houve certa letargia nas negociações de acordos comerciais e de investimentos, mas persistia uma inclinação favorável até o advento da diplomacia bizarra do governo Bolsonaro. Desde 2019, os sinais emitidos foram os mais contraditórios, sobretudo na vertente multilateral, justamente, e de forma ainda mais enfática no terreno do meio ambiente, contribuindo para isolar o Brasil no plano internacional. Pela ação exclusiva do seu presidente, e do anterior chanceler acidental, o Brasil realmente converteu-se num pária internacional, jamais consultado para tratar de alguns dos grandes temas da agenda internacional. Desacordos internos ao Mercosul também dificultaram avanços em novos acordos bilaterais ou plurilaterais. 

A partir de um novo governo, dotado de uma diplomacia “normal”, isto é, convergente com valores e princípios clássicos em nossa postura externa, será possível recuperar o terreno perdido em quatro anos de quase total nulidade diplomática.

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4138: 27 abril 2022, 3 p.


quinta-feira, 13 de agosto de 2020

A carreira diplomática e a diplomacia brasileira - Pod-RI, Unesp-Franca

A carreira diplomática e a diplomacia brasileira

Paulo Roberto de Almeida
Registros da entrevista gravada para o Pod-RI


         Recebi, dos alunos do curso de Relações Internacionais da Unesp-Franca, Leonardo, Gustavo e Enzo Golfetti, responsáveis pelo Pod-RI que eles criaram e mantêm, os links para o programa gravado com eles e por eles, no dia 5 de agosto de 2020. Primeiro o convite, depois a ficha do trabalho, cujo roteiro foi tentativamente respondido por mim, e transcrevo ao final de tudo, depois a gravação preliminar e em terceiro lugar, o podcast tal como editado por eles, postado no Facebook dessa brilhante iniciativa dos estudantes da Unesp-Franca (https://www.facebook.com/107203960975709/posts/161249412237830/).


Olá embaixador!
Que bom que gostou do nosso trabalho! Sem dúvidas faremos uma sua, se quiser deixar em anexo a foto, em breve montamos a ilustração.
Sobre data pensamos em Terça ou Quarta da próxima semana (dias 04/08 e 05/08) como opções. Gravamos sempre no horário do fim da tarde (18 ou 19 horas) ou a noite (20 ou 21 horas) para não chocar com outros compromissos, alguma destas datas e horários é possível pra você? OBS: nossas gravações nunca passam de 1h e 30 min contando possíveis erros de gravação. 
Caso não, articulamos outras sem problemas.
Sobre o conteúdo em si, propomos algo bem livre, uma conversa mais informal e deixo aqui alguns tópicos que queremos percorrer na conversa:
- Uma apresentação e breve história sua;
- Como ingressar no MRE;
- Quais funções tem-se de desempenhar na estrutura da instituição;
- Como é para ser indicado para os consulados e embaixadas;
- Qual a importância das funções;
- Uma conversa mais solta sobre os bastidores da função e sua passagem por elas;
-  Por fim, gostaríamos de um bate-papo rápido sobre como está o MRE hoje (se possível claro) sua opinião sobre as ações do Brasil etc.
No ademais estamos abertos a sugestões e dúvidas.
Att, Enzo Golfetti


(A) 3725. “A carreira diplomática e a diplomacia brasileira”, Brasília, 26 julho 2020, 3 p. Respostas a questões de alunos de RI da Unesp-Franca-SP; Gravação de podcast; Pod-RI; alunos de RI da Unesp Franca; (https://www.facebook.com/podcastRI/ ), na quarta-feira, dia 5/08, 18hs. Gravação de entrevista, disponível no Facebook (https://www.facebook.com/107203960975709/posts/161249412237830/), no Instagram (https://www.instagram.com/p/CD15Rc_DSNT/?igshid=l0v8zq3suh7) e no Spotfy (https://open.spotify.com/episode/1W8FWd9dKConYOOH6Zfa6X).






(C) Sejam bem-vindos a mais um Pod-RI! Neste episódio mais que especial, trouxemos um convidado pra lá de gabaritado! Com vocês Paulo Roberto de Almeida, embaixador brasileiro com mais de 40 anos experiência, conversou conosco sobre como é trabalhar no Itamaraty, tudo com muita graça, histórias e curiosidades. E deixamos pra vocês o link do blog dele onde estão disponíveis diversas de suas histórias e muitos de seus livros gratuitos! Vem com a gente nessa! https://www.facebook.com/podcastRI/posts/161249412237830?__cft__[0]=AZXsolDiONcLEyu_D0Sf_Njb_XRcmCUeI-XPXslVndkEoWBQrLAKgL9Gjcfrh44ex2ITcSavp2tLvUv6tlGN3I3tME9ZcJX98zysYf2X3iYHgmnOsoMoULbw7bw7UMRaA7hbnGj_hgAiYrEixYng1kco3LfjdjljQ9r5vSDbG2ViPQ&__tn__=%2CO%2CP-R



A carreira diplomática e a diplomacia brasileira


Paulo Roberto de Almeida
[ObjetivoGravação de podcastfinalidadePod-RI; alunos de RI da Unesp Franca; (https://www.facebook.com/podcastRI/ ), na quarta-feira, dia 5/08, 18hs]; alunos de RI da Unesp Franca; contato: Enzo Golfetti.


1) Uma apresentação e breve história sua;
3683. “Preparação para a carreira diplomática: uma conversa com candidatos”, Brasília, 29 maio 2020, 2020, 6 p. Conversa online com candidatos à carreira diplomática, coordenada por Amanda do “Keep it blue podcast”, sobre as seguintes questões: 1) O que fez o senhor decidir ser diplomata?; 2) Como foi sua jornada para passar o CACD?; 3) Quais são os diferenciais para passar o concurso?; 4) Como o candidato deve abordar as atualidades em seus estudos?; 5) Como deveria ser o mindset para o estudo dos idiomas?; 6) Como foi o Instituto Rio Branco?; 7) O que se aprende por lá?; 8) Como é a vida no exterior?; 9) Como muda em relação a Brasília? Elaborada lista de 37 trabalhos que se encaixam nos critérios solicitados. Divulgado no blog Diplomatizando (29/05/2020; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/05/preparacao-para-carreira-diplomatica.html); disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/43192887/Preparacao_para_a_carreira_diplomatica_uma_conversa_com_candidatos_2020_).
3684. “Um diplomata desvio padrão: podcast para candidatos à carreira”, Brasília, 29 maio 2020, Audio Mpeg da Apple 1:31:13, 37, 2MB. Podcast gravado sobre os pontos enunciados no trabalho n. 3683. Disponível no Dropbox (link: https://www.dropbox.com/s/0kd91ucpgmlkhgn/3684DiplomataDesvioPadraoPodcast.m4a?dl=0); anunciado no blog Diplomatizzando (30/05/2020; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/05/uma-conversa-com-candidatos-carreira.html).
3691. “Uma carreira na diplomacia para jovens estudantes”, Brasília, 8 junho 2020, 4 p. Respostas a questões colocada por coordenadores do programa Explica ENEM (https://www.instagram.com/explicaenem/). Disponível no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/06/uma-carreira-na-diplomacia-para-jovens.html) e na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/43292605/Uma_carreira_na_diplomacia_para_jovens_estudantes_2020_). 

2) Como ingressar no MRE;
     Não existe nenhuma fórmula mágica, a não ser a do estudo intenso, constante, obsessivo, durante largos anos. Cursinhos preparatórios podem dar dicas, macetes, facilitar ao acesso de provas anteriores, indicar bibliografia e permitir interação com outros candidatos e professores, mas nada vai substituir a leitura de dezenas, centenas, milhares de páginas dos materiais de referência. Ademais, não se pode evitar o acompanhamento direto, também constante e seguido, da página do MRE e seus muitos materiais disponíveis, por mais aborrecidos que possam ser, alguns até abertamente indecentes e absurdos, na recusa do multilateralismo e do fantasma do globalismo. 

3) Quais funções tem-se de desempenhar na estrutura da instituição;
     As clássicas: informação, representação, negociação, mas distinguindo entre o que se faz na Secretaria de Estado, de onde saem as instruções, e o que se faz nos postos e missões. 

4) Como é para ser indicado para os consulados e embaixadas;
     Todo o processo está muito burocratizado atualmente; existem vagas que se abrem nos postos e os candidatos se oferecem indicando preferências, até cinco ao que parece. A administração então vai alocando os candidatos segundo critérios funcionais (mérito, ou seja, classificação na saída do IRBr), ou conveniências familiares ou individuais. Depois ocorre uma rotação no exterior entre ou mais postos, entre A, B, C, D e E, com alguma compensação nos postos de maior sacrifício. 

5) Qual a importância das funções;
     Não existem a prioris nessa área, pois as funções acompanham a hierarquia e a adequação de cada candidato ao posto ou função.

6) Uma conversa mais solta sobre os bastidores da função e sua passagem por elas;
      Já relatei minha experiência em muitos textos, dispersos, mas alguma coisa figura naqueles que estão indicados na primeira questão.

7) Por fim, gostaríamos de um bate-papo rápido sobre como está o MRE hoje (se possível claro) sua opinião sobre as ações do Brasil etc.
     Indico meus dois livros mais recentes sobre o Itamaraty sob o tacão dos Bolsonaros, o primeiro livremente disponível, o segundo em formato Kindle: 
          Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty, Boa Vista: Editora da UFRR, 2019, 165 p., Coleção “Comunicação e Políticas Públicas”, vol. 42; ISBN: 978-85-8288-201-6 (livro impresso); ISBN: 978-85-8288-202-3 (livro eletrônico; disponível nos links: https://docs.wixstatic.com/ugd/6e2800_3e88aadf851b4b2ba4b54c6707fd9086.pdf e do Google Books: https://books.google.com.br/books?id=tvqjDwAAQBAJ&printsec=frontcover&hl= pt-BR&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false). Incorporado à plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/39882114/Miseria_da_diplomacia_a_destruicao_da_inteligencia_no_Itamaraty_Ed._UFRR_2019_) e a Research Gate (https://www.researchgate.net/publication/334593501_Miseria_da_diplomacia_a_destruicao_da_inteligencia_no_Itamaraty).
         O Itamaraty num labirinto de sombras: ensaios de política externa e de diplomacia brasileira; Edição Kindle, 2020; 204 p.; 1302 KB; ASIN: B08B17X5C1; ISBN: 978-65-00-05968-7;
         E um trabalho mais recente, em meio a muitos outros disponíveis no meu blog: 
3724. “Posturas erráticas e irracionais do governo, grandes prejuízos para o Brasil”, Brasília, 26 julho 202, 3 p. Notas sobre os grande s desastres da política externa bolsonarista. Postado no blog Diplomatizzando (27/07/202; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/07/posturas-erraticas-e-irracionais-do.html); divulgado no site do Livres(27/07/2020; links: https://mla.bs/a53fbb21 e https://www.eusoulivres.org/artigos/posturas-erraticas-e-irracionais-do-governo-grandes-prejuizos-para-o-brasil/); plataforma Academia.edu (9/08/2020; link: https://www.academia.edu/43812909/3724_Posturas_erraticas_e_irracionais_do_governo_grandes_prejuizos_para_o_Brasil). Relação de Publicados n. 1359.  


Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3725, 28 de julho de 2020

quinta-feira, 31 de outubro de 2019

O Império se inquieta e indica seus atuais "inimigos" - Novo podcast do Belfer Center da Harvard University

Quando um império sente que entrou em decadência – que é o que ocorre atualmente com os Estados Unidos, processo acelerado pela gestão extraordinariamente desastrosa do governo Trump – suas elites começam a ficar paranoicas, e passam a ver inimigos mesmo onde eles não existem, ou mesmo que existem, quando eles não têm (por enquanto) nenhuma condição de enfrentar a supremacia estratégica do império até aqui dominante.
Parece ser o caso dos representantes do mais brilhante establishment de pensamento estratégico (junto com Yale e alguns think tanks de Washington, notadamente o CSIS), o Belfer Center da Universidade de Harvard.
Ele já identificaram os seus inimigos do momento: Rússia, China e Irã.
Não creio que qualquer um desses Estados, duas grandes potências e uma potência média, queira enfrentar o império americano, mas o problema é que o império PRECISA de inimigos, do contrário como viveriam os seus militares paranoicos do Pentágono e agora, também, os novos paranoicos da academia.
Em todo caso, vamos ouvi-los.
Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 31/10/2019

Dear Friends:
We are pleased to announce a new podcast by International Security, a quarterly journal edited and sponsored by the Belfer Center for Science and International Affairs at Harvard Kennedy School, and published by the MIT Press.
The podcast, IS: Off the Page,” will discuss recent research published in International Security, and more importantly, go beyond each article’s findings to engage in contemporary policy debate. To help move the conversation forward, each episode will feature the author of a recent IS article and 1-2 guests from the broader policy community.
This podcast, which I’m privileged to host, seeks to bridge the gap between policy-relevant academic research and the policy world itself.
We invite you to listen to our inaugural episode titled, “Weaponized Interdependence,” featuring guests Abraham Newman (Georgetown University) and Elizabeth Rosenberg (Center for a New American Security). How do sanctions work in a globalized world? When do private companies comply with state-imposed sanctions? Will American economic coercion against Russia, China, and Iran backfire? Listen to find out!
In the coming weeks, the podcast will explore issues related to Chinese policy in the South China Sea, the future of NATO, and the liberal international order. Future episodes will be released on a rolling basis and we encourage you to follow along.
Please join International Security in going “off the page”!
Sincerely,
Morgan L. Kaplan
Executive Editor, International Security
============

IS: Off the Page

Current Episode

01. "Weaponized Interdependence – Economic Networks, Sanctions, and State Coercion"

Contrary to traditional arguments that globalization and economic interdependence will lead to increasing international cooperation, this episode discusses how states can weaponize their position in global economic networks to engage in coercion.
How do sanctions work in a globalized world? When do private companies comply with state-imposed sanctions? Will American economic coercion against Russia, China, and Iran backfire? Listen to find out!
Guests:
Abraham Newman is a professor in the Edmund A. Walsh School of Foreign Service and Government Department at Georgetown University. He currently serves as the Director of the Mortara Center for International Studies.
Elizabeth Rosenberg is a Senior Fellow and Director of the Energy, Economics, and Security Program at the Center for a New American Security.
International Security Article:
This episode is based on, Henry Farrell and Abraham L. Newman, “Weaponized Interdependence: How Global Economic Networks Shape State Coercion,” Vol. 44, No. 1 (Summer 2019), pp. 42-79.
Additional Related Readings:
Originally aired on October 30, 2019

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Roberto Campos e a utopia constitucional - Paulo Roberto de Almeida

Paulo Roberto de Almeida: A Constituição Contra o Brasil

(Podcast) 

https://www.youtube.com/watch?v=V9cKqjispGI

O autor e diplomata Paulo Roberto de Almeida, esclareceu quantas constituintes o Brasil teve e porque a Constituição age contra o desenvolvimento do país. Resenha escrita: https://politicaedireito.org/br/2019/10/21/a-constituicao-contra-o-brasil/


“Na constituinte de 1988, a lógica econômica entrou de férias” – Roberto Campos. 

https://youtu.be/V9cKqjispGI


segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Relacoes internacionais do Brasil: 5 pontos essenciais para as eleicoes presidenciais de 2018 - Paulo Roberto de Almeida

Estas são as notas que havia elaborado previamente à entrevista concedida a jornalista do Instituto Millenium sobre possíveis temas eleitorais, mas que não utilizei na gravação, a não ser por defender ideias, digamos assim, "similares" às que vão aqui expostas. A leitura deste texto não dispensa, portanto, uma audição da gravação feita, que está disponível nas coordenadas abaixo: 

Relações internacionais do Brasil: 5 pontos essenciais para as eleições presidenciais de 2018

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: Entrevista em formato de podcast para o Instituto Millenium; finalidade: abordar questões de política externa relevantes nas eleições de 2018]


Introdução: a baixa incidência relativa das relações externas nas eleições de 2018
As relações internacionais do Brasil, à diferença talvez de ocasiões anteriores, não deverão assumir papel relevante na campanha presidencial e nos debates eleitorais em 2018, uma vez que não existem grandes crises que afetem o Brasil ou que tenham uma interface externa, como podem ter sido, por exemplo, o problema da dívida externa e dos acordos com o Fundo Monetário Internacional em ocasiões passadas. Ainda em 2002, para relembrar uma dessas ocasiões, o Partido dos Trabalhadores, junto com os chamados movimentos sociais, organizava manifestações, petições, plebiscitos contra o pagamento da dívida externa, contra o projeto americano de um acordo comercial hemisférico, a Alca, Área de Livre Comércio das Américas, assim como se manifestava de maneira geral contra supostas ameaças vindas dos investimentos diretos estrangeiros em setores considerados estratégicos pela esquerda brasileira.
Tudo isso ficou para trás agora, como a própria ameaça de uma suposta “crise internacional”, já amplamente superada em 2014, para justificar a deterioração da situação econômica brasileira, amplamente provocada pela gestão inepta e corrupta do mesmo Partido dos Trabalhadores nas eleições presidências daquele ano. A tremenda crise que o Brasil viveu entre 2015 e 2017, e que ainda exerce seus efeitos devastadores em termos do número de desempregados – mais de 13 milhões, sem falar do tradicional subemprego e dos já excluídos do mercado de trabalho –, essa crise que eu chamo de A Grande Destruição lulopetista da economia – depois da Grande Depressão dos anos 1930 e da Grande Recessão de 2008 – foi inteiramente fabricada no Brasil, mas os companheiros ainda tentavam atribuir seus efeitos a uma não existente crise internacional, totalmente inventada por uma propaganda distorcida.
Atualmente, a despeito do baixo crescimento europeu, a maior parte das economias nacionais vem crescendo a taxas satisfatórias, com destaque para países da Ásia Pacífico e mesmo para alguns vizinhos latino-americanos, que resolveram se integrar à economia mundial, como são, por exemplo, os membros da Aliança do Pacífico. O Brasil, infelizmente, vai demorar algum tempo para retomar taxas adequadas de crescimento econômico, em função dos problemas acumulados pela gestão incompetente do PT nos dez anos que vão de 2006 a 2016.
Não há, portanto, grandes culpas a atribuir à situação econômica internacional pelas nossas dificuldades presentes, o que deve deslocar o debate eleitoral para os problemas já detectados nos últimos dois anos, e que ainda demandam equacionamento adequado: a grave crise fiscal, as reformas estruturais não feitas, entre elas, em primeiro lugar, a da Previdência, uma rebaixa dos níveis extorsivos de tributação, a continuidade dos programas de redução das despesas públicas, excessivas e justamente responsáveis pelos desajustes atuais, na União e nos estados, assim como a melhoria dos péssimos indicadores de desempenho educacional, o principal fator que incide sobre os níveis de produtividade, notoriamente baixos no caso do Brasil.
Ainda assim, existem diversos pontos das relações internacionais do Brasil que podem ser suscitados na campanha eleitoral e que vale a pena abordar ainda que de maneira sintética, pois deles dependem um melhor desempenho econômico do país, capazes de contribuir para o emprego, para o crescimento, para o aumento da renda e para uma maior inserção internacional do Brasil. Vamos a eles.

1. Abertura econômica internacional e liberalização comercial
A primeira tarefa de uma política externa renovada, e consequentemente também a de sua diplomacia profissional, é a de contribuir para um processo de crescimento sustentado da produtividade na economia, pela redução do custo do capital e pelo aperfeiçoamento do capital humano, os dois elementos mais importantes da produtividade total de fatores, junto com as demais externalidades positivas que cabe ao Estado prover de forma eficiente.
A melhor maneira que eu vejo de atingir esses objetivos passa por uma abertura econômica ampla e pela liberalização comercial, ou seja, um acolhimento mais dinâmico de investimentos diretos estrangeiros e a redução de nossa ainda alta proteção tarifária. Ambas medidas constituem, essencialmente, decisões de política doméstica, bem mais do que de política externa, que pode porém auxiliar na implementação desses dois objetivos maiores. Mas a maneira de fazê-lo é necessariamente uma tarefa de política interna, tanto por razões estruturais quanto conjunturais, e é fácil identificar as razões.
O Brasil é hoje um país introvertido, o mais fechado do G-20, o grupo de nações economicamente mais importantes do mundo, que todas possuem coeficientes de abertura externa bem superiores ao exibido pelo Brasil. Ou seja, somos nós que estamos errados, não os outros, ao manter restrições ao capital estrangeiro e barreiras muito elevadas contra as importações. Grande parte de pequenos e grandes contrabandos, em nível individual ou já como obra de grupos criminosos, se deve, na verdade, ao enorme protecionismo comercial praticado pelo Brasil. Somos nós que somos fechamos ao mundo, somos nós que condenamos o povo a consumir produtos caros e de baixa qualidade, somos nós que obrigamos nossos empresários a se abastecer internamente a custos bem mais altos, o que os torna pouco competitivos externamente e que justamente redundou nessa desindustrialização precoce a que assistimos sob o desastroso regime econômico do lulopetismo, e que nos levou à maior recessão de toda a nossa história. Em resumo, somos estruturalmente, sistemicamente protecionistas e o mundo não tem absolutamente nada a ver com isso.
Temos, portanto, de corrigir isso, o que implica, obviamente tratar da questão da nossa incorporação às chamadas cadeias globais de valor, o fenômeno característico do atual estágio das relações econômicas internacionais. Todos os economistas sabem, mas os empresários também, que a maior parte do comércio internacional não se dá em nível de produtos acabados, mas sim com base em partes e peças, acessórios, bens e insumos intermediários, muitas vezes transacionados entre filiais das mesmas empresas, ou entre companhias associadas, componentes diversos fabricados nos mais diferentes países que depois são assemblados naquele que apresenta as melhores condições para sua fase final, com base na mão-de-obra ou na automação (mas as duas estão intimamente ligadas atualmente), que é a confecção última antes de se lançar o produto no mercado.
O Brasil está singularmente ausente dessas cadeias de valor, como existem hoje disseminadas em quase todos os continentes, com destaque para o Atlântico Norte e, crescentemente para a bacia do Pacífico, ou seja a Ásia oriental e a costa pacífica do hemisfério americano. A esse respeito, as políticas setoriais da gestão lulopetista entre 2003 e 2016 foram singularmente desastrosas, típicas reproduções do que já era inadequado em décadas passadas, que foram as políticas substitutivas de importações, tal como preconizadas pelo pessoal da velha Cepal e ainda hoje, pasmem, por certos economistas da UniCamp. Essas políticas, industriais e comerciais, se baseavam na proteção comercial das indústrias nacionais, no pesado apoio dado pelo Estado às empresas já instaladas no país – ainda que fossem estrangeiras, como as montadoras de automóveis – e em diversos outros mecanismos fiscais e financeiros de apoio e de generosos subsídios. Foi o caso, por exemplo, do Inovar-Auto, da dupla Guido Mantega-Fernando Pimentel, um típico exemplo daquilo que eu chamo de stalinismo industrial, ou seja, a tentativa ilusória de tentar fazer uma indústria de automóveis num circuito fechado ao próprio Brasil e os sócios do Mercosul.
Além de totalmente equivocada em suas concepções e efeitos práticos, essa medida ainda infringiu compromissos internacionais do Brasil no âmbito da OMC, em função dos quais o Brasil foi condenado no sistema de solução de controvérsias dessa organização, tendo de modificar vários pontos de sua legislação discriminatória. O governo ainda não anunciou como será o sistema substitutivo ao censurado pela OMC, mas minha postura é a de que políticas setoriais devem, não apenas serem o máximo possível homogêneas e universais – ou seja, sem beneficiar exclusivamente um ramo ou outro – mas também conformes a nossas obrigações internacionais.
Quanto ao método de se efetuar essa abertura econômica e essa liberalização comercial, muitos recomendam negociações externas com parceiros comerciais do Brasil, novos ou velhos, no plano multilateral ou regional, eventualmente bilateral. Eu diria que não vejo muito espaço, atualmente, para grandes negociações externas, uma vez que existe um retraimento no plano multilateral, depois do fracasso quase completo da Rodada Doha da OMC, compensado por um avanço nos arranjos minilateralistas, nos planos plurilateral e bilateral. Mas este é um caminho praticamente barrado para os membros do Mercosul, que se encontram ainda na etapa já superada do simples acesso a mercados, quando a maior parte dos países e dos blocos já se encontram envolvidos em acordos de segunda ou de terceira geração. Cabe ainda reconhecer a baixa disposição dos países do Mercosul e dos membros da União Europeia em oferecer reais concessões, mesmo em acesso a mercados, quando se constata o insucesso repetido das diversas fases do longuíssimo processo de negociações birregionais UE-Mercosul.
Esse cenário pouco propenso a barganhas negociadoras recomendaria, portanto, uma medida bem mais simples: a abertura unilateral, ou seja, a redução não negociada das nossas próprias tarifas aduaneiras, que muitos acusariam ser uma concessão sem barganha, o que me parece rematada bobagem. Cabe relembrar, se as pessoas ainda não sabem, que as tarifas são punições contra o nosso próprio bolso, pois somos nós que pagamos, não os exportadores, assim como é um completo absurdo a aplicação de PIS-Cofins sobre as importações, quando produtos importados não têm absolutamente nada a ver o financiamento da seguridade social nacional.
Tudo isso, ou seja, a imposição de tarifas aduaneiras proibitivas – ou seja, a continuação da substituição de importação do passado – e a extensão do PIS-Cofins a produtos importados – que os industriais brasileiros consideram ser apenas uma equalização das condições de concorrência, quando essa medida deveria ser considerada inconstitucional – ocorre porque os empresários nacionais afirmam não poder concorrer com a produção importada pois a carga tributária no Brasil é excessiva. Isso é mais um absurdo: se os industriais nacionais consideram que não podem concorrer com produtos estrangeiros isentos de tributação deveria lutar pela extinção da tributação extorsiva, não impor as mesmas condições aos bens importados, tornando-os mais caros aos consumidores nacionais.
Em outros termos, nessa e em outras áreas da economia nacional, o ambiente de negócios no Brasil se encontra completamente deformado, e é preciso mudar isso de forma urgente, pois os industriais brasileiros vêm perdendo mercados estrangeiros e nichos de mercado no próprio Brasil.

2. O problema do Mercosul e da integração regional na América do Sul
O Mercosul, de 2003 a 2016, deixou de ser uma ferramenta para a inserção internacional do Brasil, tal como tinha sido concebido no início dos anos 1990, e tornou-se um problema triplo: diplomático, econômico e de política comercial. Os desvios quanto aos objetivos do TA, detectados ainda na fase 1995-1999, foram ampliados depois da crise argentina, e tremendamente potencializados pelo curso errático das políticas adotadas pelas administrações Kirchner e Lula a partir de 2003. O tripé essencial para a continuidade do bloco – liberalização comercial para dentro, política comercial unificada para fora e coordenação de políticas macro e setoriais – foi totalmente desvirtuado a partir daquela época, em favor de uma politização indevida das instituições próprias ao bloco, seguindo-se uma verdadeira anarquia institucional.
No campo das negociações externas, ocorreu um desastre incomensurável, ao se adotar uma postura defensiva baseada no mínimo denominador comum, que passou a ser o protecionismo ordinário argentino. A implosão ideológica da Alca e a crença ingênua num acordo com a UE foram dois passos irrefletidos no caminho da insensatez. Nada avançou a partir de então, a não ser acordos ridículos na dimensão Sul-Sul, e um com Israel, apenas para compensação visual. Não estranha, assim, que vizinhos mais sensatos tenham procurado suas próprias soluções para comércio e investimentos, ao negociar acordos com os EUA, com a UE e outros parceiros, e ao adotar seus próprios esquemas de liberalização real dos fluxos comerciais (Aliança do Pacífico), já pensando na grande integração produtiva que terá seu centro na bacia do Pacífico e até no Índico, reunindo todos os grandes atores do comércio internacional (dos EUA à Austrália e NZ, e toda a Ásia Pacífico integrada na globalização). Brasil e Mercosul estão totalmente ausentes desse novo universo absolutamente central da atual e futura economia mundial.
Pior ainda foi a expansão indevida, totalmente política, do Mercosul em direção de vizinhos pouco propensos a adotar os mecanismos básicos da união aduaneira tal como definida em 1991 e supostamente implementada (com defeitos) em 1995. O ingresso desastroso da Venezuela, a suspensão ilegal do Paraguai, a abertura apressada e injustificada a parceiros incapazes de cumprir os requisitos básicos do TA e do POP (como Bolívia, Equador, talvez Suriname) não apenas não retificam o que foi feito de errado no Mercosul, como acrescentam novos problemas ao edifício instável do bloco.
Existem diferentes problemas no e do Mercosul, nenhum deles derivado de mecanismos e instituições do próprio bloco, todos eles derivados de políticas, atitudes e comportamentos das administrações nacionais. Os problemas se situam na zona de livre comércio, mas também na união aduaneira. Nem consideramos aqui o problema da Venezuela, que derivou de seu próprio caos econômico: ela sequer deveria ter sido admitida, alias de forma irregular, e também demorou para que ela fosse colocada em quarentena e mantida isolada das negociações externas.
No plano do livre comércio, caberia fazer um mapeamento dos impedimentos práticos à sua total consecução, e isolar esses setores numa espécie de “caixa amarela”, para então começar a discussão sobre seu enquadramento ou dispensa semipermanente. No campo da união aduaneira, caberia, igualmente, contabilizar e identificar os fluxos que são levados ao abrigo e fora da TEC, para um diagnóstico mais detalhado da situação. O mais importante, porém, seria um exercício de exame das políticas comerciais dos quatro membros – uma espécie de TPRM-OMC, adaptado às configurações do bloco – com vistas a ter um panorama real, e realista, sobre todas as políticas nacionais compatíveis e incompatíveis com os objetivos do bloco. Apenas a partir desse diagnóstico mais preciso se poderá partir para o terreno das prescrições de políticas, algumas simplesmente diplomáticas, mas a maior parte dependente de definições nas próprias políticas comerciais e industriais do Brasil (e dos sócios).
Impossível fazer qualquer proposta realista sobre o maior problema diplomático do Brasil sem partir de uma visão muito clara quanto às demais definições de políticas nacionais, no campo econômico, certamente, mas também no das relações com a Argentina e com os demais parceiros prioritários do Brasil (que não são os do Ibas, do Brics, ou fantasias sulistas do gênero, mas), basicamente, EUA, UE, China, Argentina, demais sul-americanos, e todos os demais, nessa ordem. Em síntese, o Mercosul precisaria voltar a ser um componente na estratégia brasileira de inserção internacional na economia mundial, não o problema que ele é hoje. 

3. O problema do Brics: o que fazer com um grupo heterogêneo?
Trata-se, provavelmente, do primeiro agrupamento que surgiu nos anais da diplomacia mundial não por indução interna, mas por sugestão externa. A sugestão não tinha qualquer caráter diplomático, mas se tratava de uma assemblagem de oportunidades visando unicamente altos ganhos para investidores privados, conjunção efetuada sob o signo de uma sigla atraente, que possuía apelo suficiente, do ponto de vista jornalístico, para seduzir até mesmo experientes diplomatas e um ou outro homem de Estado. 
O problema do Brics, para o Brasil, é que ele não deveria existir, pelas “leis naturais” da diplomacia, ou em função dos interesses nacionais do Brasil. O Brasil seria um país suficientemente maduro, pelo menos no que toca sua diplomacia, para atuar em completa independência, sem muletas de qualquer grupo, formal ou de ocasião, no plano multilateral, bilateral, regional. Mas este já é um outro problema, de mentalidade, ou comportamental, que caberia examinar em outro contexto. Vamos ficar no problema do Brics para o Brasil.
A constituição do grupo engaja a responsabilidade internacional do Brasil, enquanto nação respeitada na comunidade de nações. A complicação é dupla: o Brics amarra o Brasil a propostas e iniciativas que não teriam e não têm nada a ver com os seus interesses nacionais, bilaterais, regionais ou multilaterais, com países que diferem amplamente, por suas características, do tipo de ação diplomática que conviria conduzir nesses âmbitos, e em função de agendas que seriam melhor conduzidas em total autonomia de ação, em quaisquer frentes que se possa pensar: na governança mundial, nas questões da paz e da segurança internacional, nos valores humanitários e dos direitos humanos, na gestão dos recursos naturais, nas negociações multilaterais, enfim, num sem número de terrenos.
O Brics não é um problema para o Brasil, que pode manter suas relações com cada um deles mediante canais já testados por sua diplomacia. Mas o Brics representa uma camisa de força que pode comprometer sua margem de ação internacional. Os ganhos aparentes de presença e de visibilidade internacional são claramente ofuscados pela amarras contraditórias que se tem de fazer no contexto do grupo. Um balanço de ganhos e perdas pode comprovar esse diagnóstico.

4. Relações com os países desenvolvidos
Existem muitos desafios nas relações com os países desenvolvidos, quaisquer que sejam eles; mas as oportunidades são ainda maiores. Na última década e meia, sob o lulopetismo, o Brasil se orgulhou de conduzir uma política externa voltada para o Sul. Não consigo imaginar como alguém pode se demonstrar satisfeito com andar com uma perna só, ou usar uma única mão nas tarefas diárias, ou tapar voluntariamente um olho, para conduzir o seu carro assim, de forma caolha. Sempre achei isso uma atitude de restrição unilateral incompreensível,na medida em que, sendo o mundo amplo, diverso e diversificado, não haveria nenhum motivo para se amputar a si próprio, preferindo uma situação de menores escolhas, do que uma outra, totalmente aberta ao leque de oportunidades oferecidas por todos os países do globo, aliás, mais do que um leque, um círculo inteiro de possibilidades de cooperação e de intercâmbio, em total liberdade mental. Os que escolhem usar tal tipo de viseira só podem fazê-lo por preconceito ideológico ou por discriminação política.
Todo determinismo geográfico é, por natureza, contraproducente. Não se poderia esperar, por exemplo, obter o estado da arte em ciência e tecnologia quando se restringem as escolhas a determinados parceiros do globo, ainda que eles sejam chamados de “parceiros estratégicos”.
A primeira inconsequência é justamente a de dividir o mundo entre desenvolvidos e em desenvolvimento, como se duas únicas categorias mentais, dois universos puramente conceituais, fossem capazes de resumir e abranger toda a complexidade e multiplicidade das situações humanas e sociais, num planeta variado que exibe todos os tipos de avanços civilizatórios, um continuum histórico que vai de tribos primitivas a sociedades do conhecimento, baseadas em inteligência artificial. O capital humano nunca teve pátria, apenas os governos é que limitam a liberdade do capital humano. As grandes descobertas, as maiores invenções acabam beneficiando o conjunto da humanidade.
Mas, alguns espíritos tacanhos consideraram que, em virtude do fato bem estabelecido de que a maior parte das invenções, descobertas e inovações ocorrem bem mais nos países já avançados, isso consagraria algum monopólio natural, uma tendência à concentração do conhecimento, e do seu desfrute, e que os países menos avançados só poderiam ser “explorados” pelos primeiros. Assim, passam a recomendar esquemas de cooperação no âmbito Sul-Sul, como se duas ignorâncias pudessem ser substitutos a uma grande sabedoria. A Constituição brasileira já caiu nessa erro monumental, ao consagrar no seu texto de 1988 a proibição de que universidades brasileiras tivessem em seu corpo docente professores estrangeiros, equívoco felizmente eliminado alguns anos depois.
Não se pode dispor de nenhuma fórmula mágica para impulsionar o processo de desenvolvimento brasileiro contando apenas com a cooperação internacional, seja ela com países avançados ou com “parceiros estratégicos” do Sul maravilha. Os desafios principais estão mesmo no próprio país, pois as evidências relativas aos ganhos de escala permitidos por uma educação de qualidade são tão notórios que não seria preciso insistir neste ponto. O Brasil precisa empreender uma revolução educacional, em todos os níveis. De onde sairão os ensinamentos adequados para esse empreendimento monumental? Ora, as respostas são tão evidentes que sequer me concedo o direito de expressar qualquer preferência geográfica. Se alguém aí pensou em Xangai, não na China, mas Xangai, como exemplo e modelo de uma educação de qualidade, tal como refletido nos exames do PISA, estou inteiramente de acordo: façam como Xangai, que já é, para todos os efeitos práticos, mais avançada do que qualquer país desenvolvido em matéria de educação de qualidade. 

5. A necessidade de reformas estruturais e o pedido de ingresso na OCDE
O Brasil necessita de reformas estruturais importantes, a serem implementadas nos planos interno e externo, e é nesse contexto que se situa a importante decisão tomada pelo atual governo no sentido de solicitar adesão plena do Brasil à OCDE. Ela constitui, não um “clube de países ricos”, mas um “clube das boas práticas”, e pode contribuir para esse processo de reformas profundas que o Brasil deve perseguir no seu próprio interesse nacional. A OCDE possui notória expertise e vasta experiência nos terrenos das reformas fiscais, setoriais e sociais, com destaque para as áreas de políticas comercial, industrial, tecnológica e educacional, ou seja, tudo o que o Brasil necessita para deslanchar um novo salto no plano do crescimento sustentado. Os requerimentos de entrada podem, aliás, apoiar as reformas.
As reformas mais difíceis são, sem dúvida alguma, a fiscal e a tributária, uma conectada à outra, mas aqui também o know-how acumulado pela OCDE nessa área pode se revelar valioso, em várias dimensões. Na política comercial, os estudos da OCDE já provaram fartamente que restrições a um comércio mais livre redundam sempre num declínio da produtividade do trabalho, e portanto dos padrões de vida. O protecionismo comercial brasileiro dificulta, e de fato impede, uma maior integração de nossas empresas às cadeias globais de valor, que constituem o lado mais conspícuo da globalização microeconômica, que é onde se processa, junto com as ferramentas de comunicação social, o lado mais relevante desse fenômeno abrangente e inescapável.
A política externa brasileira sempre teve como princípio organizador uma mal definida “diplomacia do desenvolvimento”. Tratava-se, na verdade, mais de um slogan e, mesmo, uma ideologia, do que propriamente uma doutrina adequadamente elaborada, resultando de uma combinação improvisada de prescrições vagamente influenciadas pelo desenvolvimentismo latino-americano da CEPAL e de demandas de tratamento preferencial e mais favorável para países em desenvolvimento emanadas da UNCTAD. Ao abrigo dessas correntes de pensamento, ocorriam vibrantes discursos defendendo “espaços de políticas econômicas” em prol de “projetos nacionais de desenvolvimento”, o que servia de razão, de justificativa e de defesa para o protecionismo tarifário, para as restrições aos investimentos estrangeiros em determinados setores, para os monopólios estatais em indústrias ditas “estratégicas”, para restrições aos fluxos de bens, de serviços e de capitais em nome do equilíbrio do balanço de pagamentos, da preservação da autonomia tecnológica, ademais de diversos outros expedientes, mal coordenados entre si, mas que de fato atuaram contrariamente ao grande objetivo pretendido, que era o de romper a barreira do subdesenvolvimento para alcançar o patamar das nações ricas.
O Brasil não esteve sozinho nesses experimentos desenvolvimentistas, já que acompanhamos os mesmos tipos de políticas da maioria dos países latino-americanos, que, se bem sucedidas em sua implementação reiterada e teimosa ao longo de décadas, deveriam levar o continente àquele grande objetivo. Ora, o que se assistiu, ao longo do período, foi a superação gradual dos países latino-americanos pelos da Ásia Pacífico, praticamente uma troca de lugares na economia mundial, tanto em termos de pautas exportadoras, de diversificação industrial, de ofertas competitivas em bens e serviços, quanto da atração de investimentos diretos estrangeiros. A América Latina, e com ela o Brasil, reduziu seus índices de participação nos intercâmbios mundiais, ao passo que os países da Ásia Pacífico começaram a ocupar frações crescentes desses fluxos globais.
Está, portanto, mais do que na hora de substituir essa mal definida “diplomacia do desenvolvimento com preservação da autonomia nacional” por uma vigorosa política de “integração à economia mundial”, com a adoção consequente de medidas econômicas e de políticas setoriais visando à inserção das empresas brasileiras nos padrões competitivos da globalização. A OCDE poderá subsidiar a redefinição dessas políticas no novo sentido pretendido, mesmo quando a adesão formal não se realize, pois nada deveria impedir o Brasil de reformar soberanamente o conjunto de políticas nas áreas industrial, comercial e tecnológica na direção da integração mundial, abandonando o prejudicial nacionalismo pretensamente autonomista, mas que é de fato redutor de nossas possibilidades de progresso econômico.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 18 de janeiro de 2018