O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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segunda-feira, 9 de maio de 2011

As eleicoes peruanas e a posicao de Vargas Llosa

Não li, ainda, o texto em que Vargas Llosa teria declarado apoio ao candidato "nacional-socialista" Ollanta Humala, como o define esta articulista americana.
Se isto for verdade, Vargas Llosa cai um ponto, ou vários pontos, em minha apreciação de sua inteligência, racionalidade, isenção, objetividade.
Como ele foi derrotado pelo pai da outra concorrente no segundo turno, Keiko Fujimori, ele se inclina pelo seu opositor, pensando derrotar o pai pelo menos uma vez.
Posição insustentável.
Ele deveria ter a dignidade de deixar os peruanos escolherem de acordo com suas consciências, fazendo a melhor análise possível dos dois candidatos.
Aparentemente ele não confia na justiça do Peru (ou no sistema político), acreditando que Alberto Fujimori possa ser solto, e ele acredita, em contrapartida, nas promessas vazias do candidato "nacional-socialista".
Triste posição, mas ele tem direito a ela.
Gostaria de ler seus argumentos a respeito.
Paulo Roberto de Almeida

THE AMERICAS
The Leftist Threat to Peru's Prosperity
By MARY ANASTASIA O'GRADY
The Wall Street Journal, MAY 9, 2011

Presidential candidate Ollanta Humala's party platform talks of nationalizing strategic 'activities' and 'revising' trade agreements.

If national socialist Ollanta Humala defeats center-right populist Keiko Fujimori in Peru's presidential runoff election on June 5, Brazil's Workers' Party will deserve much of the credit. The implications for the region are alarming.

Mr. Humala is by no means a shoo-in. In the days just after his first-round victory with 30% of the vote, his numbers surged. But last week an Ipsos Apoyo poll showed his backing had dropped to 39% from 42%. Ms. Fujimori's support rose to 38% from 36%. With 10% undecided, the race is now a statistical dead heat

domingo, 8 de maio de 2011

Japao, depois do 11 de Marco - Guy Sorman

Japan, After March 11
GUY SORMAN
The City Journal, vol. 21. n. 2, Spring 2011

The country, resilient as ever, remains Asia’s true power.

The earthquake that struck Japan’s Sendai region on March 11 was the most violent in the nation’s recorded history. The temblor shook the ground for more than two minutes, tilting the earth’s axis and unleashing an enormous tsunami that drowned thousands in northern Japan and left a path of destruction in its wake. Adding to the calamity, power outages caused cooling pumps to fail at the Fukushima nuclear power plant, risking multiple reactor meltdowns and leading to mass evacuations.

The crisis—described by Prime Minister Naoto Kan as his country’s “worst in the 65 years since the war”—has led some commentators to predict that Japan will never recover. This is an absurd contention, as was already evident in the immediate aftermath of March 11, when the remarkable characteristics of Japanese society shone through. Accustomed to natural disaster, the Japanese people showed little panic even at the peak of the horror. Looting, which one often sees after earthquakes in other societies, was nonexistent. Japan proved itself astonishingly well prepared: the quake itself, it turned out, caused relatively little direct damage to buildings, even in Sendai, thanks to strict construction codes imposed after the 1995 Kobe earthquake, which killed 6,000. Perhaps most striking of all was that the Japanese export machine was so little damaged. Production and delivery of many goods, ranging from computer chips to industrial components, were interrupted for only a matter of hours, though shortages have slowed things down sporadically.

But even before the earthquake, pundits often forgot that Japan remains Asia’s leading power and most successful society. True, as the press has trumpeted, the Chinese economy has grown larger than Japan’s and is now the world’s second-largest, after America’s. Yet China has ten times Japan’s population, which means that per-capita wealth in Japan is still ten times greater. And Chinese economic output is low-tech, completely different from the sophisticated products developed and made by Japanese industries. “Ultimately, we’re not in a race,” says Hideki Kato, one of Japan’s leading economists and president of the Tokyo Foundation, a free-market think tank.

Yet Kato doesn’t dismiss China’s challenge. “To have been overcome in 2010, even if those figures don’t mean much, has awakened the Japanese, given them a sense of crisis,” he says. And crises have energized the Japanese in the past, points out Naoki Inose, a vice governor of Tokyo and a respected historian. Indeed, they have provoked what many Japanese call the country’s two great historical “openings.” Will the disaster of March 11 and the rise of China together provoke a third?

(...)

leiam a íntegra neste link: http://www.city-journal.org/2011/21_2_japan.html

Como afundar um pais sendo imoral ate a medula: procuradores do bolsa-aluguel

Não existem, obviamente, explicações ou justificativas para esse tipo de comportamento, que apenas a suprema imoralidade, o desvio de caráter, a vontade de ser assaltantes declarados dos recursos públicos podem confirmar a existência.
Se trata, evidentemente, de uma entre muitas outras iniciativas de marajás do serviço público para engordarem seus já gordos salários.
Um país que assiste a esse tipo de imoralidade sem sequer um gesto de indignação é um país que perdeu qualquer sentido de ética pública. Um país que permite que continuem tais imoralidades é um país disposto a afundar numa decadência institucional que só pode levar à degradação moral e à decadência material.
Não está em meu poder modificar tais tipos de comportamentos. Mas está em meu poder denunciá-los pelos meios ao meu alcance. Este é um. Insuficiente, por certo, mas presente.
Paulo Roberto de Almeida

Bolsa-aluguel a promotor e procurador vira escândalo nacional
Domingo, dia 08 de Maio de 2011 às 12:10hs
Campo Grande News (Aquidauana News)

Após o auxilio moradia dos juízes de Mato Grosso do Sul ganhar o noticiário como mordomia estadual, agora os salários de promotores e procuradores sul-mato-grossenses viram manchete.

O jornal o Estado de São Paulo publicou reportagem sobre os vencimentos que superam a remuneração de ministros no Brasil, graças a bolsa-aluguel, paga até a promotores que já estão aposentados.

Investigação do Conselho Nacional do Ministério Público identificou que promotores incorporam como remuneração o auxílio-moradia, de R$ 2 mil a R$ 4,8 mil, e, em muitos casos, ultrapassam o teto constitucional de R$ 26,7 mil.

Em Mato Grosso do Sul, os 191 promotores e procuradores recebem salários de R$ 18 mil a R$ 24 mil. Todos ganham mais 20%, entre R$ 3,6 mil a R$ 4,8 mil, como auxílio-moradia, o que pode alcançar quase R$ 30 mil.

A análise é de que os servidores que deveriam fiscalizar o cumprimento das leis estão se valendo de legislação que eles mesmos criaram - e só eles podem mudar - para engordar os próprios salários.

Levantamento feito pelo jornal mostra que ao menos 950 promotores e procuradores do País recebem mensalmente uma espécie de "bolsa-aluguel".

O benefício é pago hoje, além de Mato Grosso do Sul, no Amapá, Mato Grosso, Rondônia e Santa Catarina. No total, são gastos, no mínimo, R$ 40 milhões por ano com essa despesa dos promotores, cujos salários vão de R$ 15 mil a R$ 24 mil.

Ainda segundo o Estadão, a justificativa é que leis estaduais permitem esse tipo de auxílio.

Como produzir inflacao, pensando fazer o bem: o governo muda de tatica (sem falar, claro...)

Poucas vezes deixo de fazer reparos a colunas de jornalistas, que me parecem cidadãos bem informados, mas por vezes com algum viés político qualquer.
Não creio que seja o caso de fazer reparos desta vez...

Posfácio sem boniteza
Nas Entrelinhas - Alon Feuerwerker
Correio Braziliense - 08/05/2011

Subir juros é fácil. Difícil é desindexar os preços dos oligopólios, atacar os exorbitantes custos financeiros lançados sobre o Estado, as pessoas e as empresas, enfrentar coerentemente os gargalos de infraestrutura e de tributação

Políticos, gente do poder, têm dificuldade para admitir erros, responsabilidade nos contratempos, ou que uma mudança de rota resultou de opção inadequada. O poder tem horror a sinais de fraqueza. Na luta titânica pelo mando, menos força é sinônimo de mais problemas. Também porque o aliado e amigo do governante forte costuma disputar simultaneamente um lugar na fila para destroná-lo.

Os últimos dias vêm assistindo a uma dança digna do sapo de Guimarães Rosa.

O governo Dilma Rousseff opera uma guinada de 180 graus na maneira como olha a inflação. Posa de ter estado certo lá atrás e de estar certo também agora. Mas é só fachada.

O sapo da política econômica não pula por boniteza, pula por precisão.

Vamos recapitular. Na largada, a nova administração definiu o controle inflacionário como variável não decisiva. Deveria estar subordinada a um patamar de crescimento.

O Brasil deixava na prática de ter uma meta de inflação (o disfarce era mirar no topo, e não mais no centro). Passava a ter uma de crescimento.

E de câmbio, como se notou no esforço da Fazenda e do Banco Central para evitar que o real subisse além de certo limite em relação ao dólar.

Inclusive porque segurar a subida do real ajuda as exportações, e portanto o crescimento e o emprego.

Tinha lógica. O país poderia suportar perfeitamente a inflação algo maior, para não sacrificar postos de trabalho.

Também porque parte da aceleração dos preços tem origem externa, e portanto precisaria haver um sacrifício ainda maior da demanda interna para compensar.

Além de lógica, a linha tinha tudo a ver com o dilmismo econômico, pois a hoje presidente nunca escondeu, desde quando ministra, as reservas à ortodoxia que costuma fluir do Banco Central.

O governo Dilma começou, por isso, com um inédito alinhamento entre Fazenda e BC, na comparação com o antecessor. Era a vitória do desenvolvimentismo sobre o anti-inflacionismo ortodoxo.

Finalmente o PT poderia reivindicar — e reivindicou — ter feito sua ruptura com a receita econômica que herdara.

Adotadas medidas macroprudenciais, de algum aperto no crédito, a inflação convergiria suavemente para a meta de 4,5%, atracaria nela em algum momento do ano que vem. Não seria necessário apertar demais nos juros.

O que deu errado? Duas coisas. A primeira é que as pessoas e as empresas acreditaram na previsão para este ano, de que a meta não seria respeitada, mas não compraram o vaticínio para o vindouro.

E as opiniões de mercado recolhidas semanalmente pelo BC começaram a mostrar inflação forte também em 2012.

A segunda — e tem a ver com a primeira — é que o Brasil possui certa característica peculiar. É um país ainda fortemente indexado. Especialmente nos setores privados que operam sob proteção estatal, como os concessionários de serviços públicos.

O liberalismo e o privatismo no Brasil são assim. Nossos liberais implantaram a correção monetária. Também privatizaram as estatais, mas garantiram aos felizes compradores contratos que se corrigem pela inflação passada.

Diante da pressão das expectativas, o governo piscou. Com apenas quatro meses de vida, engatou a ré.

Por uma razão eminentemente política. Como me disse na sexta-feira um prócer governista: “Seria um erro a gente ajudar a reunificar a oposição em torno de uma bandeira nacional e de caráter fortemente popular, como a luta contra a inflação”.

Fortíssimo em teoria no Congresso (onde tem ampla maioria) e na opinião pública (onde recebe uma simpatia não oferecida ao antecessor), o Planalto preferiu recuar a enfrentar riscos e sustentar
convicções.

Subir juros é fácil. Difícil é desindexar os preços dos oligopólios, atacar os exorbitantes custos financeiros lançados sobre o Estado, as pessoas e as empresas, enfrentar coerentemente os gargalos de infraestrutura e de tributação.

O governo Dilma precisa se cuidar para não iniciar prematuramente um longo e arrastado posfácio.

Como expulsar empresas do Brasil: manual de governo (idiota)

Imposto já espanta exportador do Brasil
FENACON, 5 Maio 2011

Empresas brasileiras fecham suas portas ou saem do País frente aos complexos e caros impostos a recolher. De acordo com o ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) Welber Barral, alguns setores, como o de calçados, mudaram seu endereço.

"Alguns setores, como o calçadista, estão migrando para países como Argentina e Chile para conseguirem competir com os preços internacionais de suas mercadorias, inclusive dentro do Brasil. Outros setores, porém, que necessitam obrigatoriamente de matéria-prima brasileira não podem fazer o mesmo e muitas vezes fecham suas portas", argumentou Barral, em seminário realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Michael Lehmann, gerente-executivo de contabilidade e impostos da Volkswagem no Brasil, confirma essa tendência ao afirmar que a multinacional alemã paga entre R$ 4 bilhões e R$ 5 bilhões ao ano somente de impostos.

"Os nossos produtos ficam mais caros por conta dos impostos embutidos no preço final. Para nós isso é prejudicial, mas é pior ainda para o bolso do consumidor, que paga uma taxa maior, pois repassamos essa cobrança", declarou. Entre uma e outra piada sobre a situação tributária brasileira, Lehmann criticou o governo pelo fato de o Brasil não se enquadrar no modelo global de cobrança de impostos e não fazer parte da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (Ocde).

Outro ponto abordado durante o evento foi a bitributação na entrada e saída de produtos no País. Segundo o diretor de Controladoria da Embraer, Rodrigo Rosa, os lucros provenientes das filiais da multinacional brasileira no exterior, que já tem dedução de impostos nos países situados, são novamente descontados quando são encaminhados para a matriz.

"Os lucros das empresas brasileiras que têm filiais no exterior são novamente tributados quando voltam ao Brasil, fato que diminui o tamanho da folha de pagamentos, ou seja, é uma barreira para a contratação de novos funcionários, além de ser um freio para a expansão da empresa no seu próprio País", frisa.

Celulares OI: companhia incompetente, que pensa que somos idiotas

A OI, companhia que absorveu a Brasil Telecom, é tão ruim quanto qualquer outra companhia telefônica brasileira, essas empresas cartelizadas que prestam um serviço vagabundo, caro, a brasileiros vítimas desses cartéis pornográficos que fazem de conta que prestam serviços telefônicos.

Se eu fosse vocês, eu evitaria qualquer negócio com a OI, pois ela pode cobrar por serviços não prestados.
Explico: fazem dois meses que ela me manda faturas cobrando serviços de celular de um número que nunca usei, por uma razão muito simples: não tenho, nunca tive, nenhum celular da OI, jamais.
Não sei como ela conseguiu meus dados e me cobra por um celular que não tenho. Só pode ser fraude, ou golpe, com a conivência de funcionários da companhia.
Ou então, eles são incompetentes a ponto de confundirem serviços de telefonia fixa (sim, sou infeliz a ponto de ter um fixo Brasil Telecom, que passou ao domínio dessa horrível OI) com telefonia celular.

Abaixo uma resposta idiota a uma mensagem que mandei via página web, depois de ter tentado quatro vezes registrar, sem sucesso, minha reclamação por via telefônica. As atendentes também não conseguem fazer um serviço simples...

1) Minha mensagem online:

Mensagem: O numero de celular indicado acima (61-8xxx-xxxx) ja foi objeto de duas faturas, a mim dirigidas, sendo que desconheço tal número, nunca o utilizei e jamais possui qualquer celular OI. Rogo entrar em contato comigo.
Paulo Roberto de Almeida (e-mail, telefone)

2) Resposta idiota da OI:

On 07/05/2011, at 08:22, faleconosco@oi.com.br wrote:
Brasília,07 de Maio 2011
REFERÊNCIA: Atendimento
PROTOCOLO N°: 2011423257969

Oi Paulo,
Recebemos seu e-mail e pedimos desculpas pelos transtornos, mas para darmos continuidade ao seu atendimento e sua solicitação pedimos que entre em contato com a Central 1053 e solicite verificações.
Caso necessite de mais informações, entre em contato com a gente.
Acesse www.oi.com.br através do link Atendimento opção Fale conosco ou
Atendimento online.
Estamos sempre por perto, prontos a atender você.

3) Minha resposta, que não vai dar em nada, mas mandei mesmo assim:

Fale Conosco,
Voce está me chamando de idiota.
Ja tentei tres vezes registrar minha reclamacao via chamada telefonica ou online.
EM NENHUMA OCASIAO CONSEGUI.
Voces tem um sistema muito ruim, MUITO RUIM.
Como sao voces os interessados em receber, eu nao vou pagar até ser contatado por alguém responsavel.
---------------------------
Paulo R. de Almeida

Indulging with himself - a view from Harvard (Amorim na Carta Capital)

O mais recente dos colunistas regulares da Carta Capital volta a escrever sobre política internacional, desta vez desde Harvard. As potências ocidentais sempre devem algo à consciência universal, claro, pelo fato de também matarem inocentes. Que horror não é mesmo? Elas deveriam ficar quietas, e esperar que os ditadores desaparecem da face da terra por morte natural. Também, a pretexto de que suas ações acabam atingindo civis inocentes, elas deveriam deixar que os próprios ditadores eliminem as resistências...
O compasso moral é inatacável...
Paulo Roberto de Almeida

O panorama visto de Harvard
Celso Amorim
Carta Capital, 7 de maio de 2011

Da ampla janela do escritório/mansarda que me foi atribuído na Harvard Kennedy School enxergo o topo de outros edifícios que fazem parte do complexo da universidade. A forma abobadada e o colorido dos campanários fazem lembrar cúpulas que se veem em outras paragens, meridionais ou mesmo orientais (Maetternich dizia que o Oriente começava na Rnnweg, na saída de Viena).

Tudo isso dá um ar pacífico e multicultural à paisagem, conducente à reflexão e ao debate. É verdade que esta atmosfera leve não se reflete sempre nos temas dos debates, em geral concentrados em situações nada tranquilas, como as duas guerras em que este país está envolvido e em outros conflitos potenciais. A Líbia, embora muito presente no noticiário, surge menos nas discussões, possivelmente em razão do seu baixo valor estratégico, apesar da tragédia humanitária que a intervenção da Otan não diminuiu em nada, como bem assinalou o ministro Antonio Patriota.

Há neste país uma não disfarçada perplexidade com as mudanças imprevistas em operação no mundo, em especial no Oriente Médio. A estratégia dos EUA para essa região há anos está baseada em conceitos, como o de “árabe moderado” (por oposição a árabe fundamentalista ou radical, supõe-se), que hoje já não têm sustentação na realidade. Na verdade, nunca tiveram. O que significa ser um árabe moderado? Ou ser um árabe radical? A derrubada de Hosni Mubarak pela revolução popular tornou o paradigma de “líder árabe moderado”, que ele mais que ninguém encarnava, definitivamente obsoleto. A mudança no Egito, como assinalei desde o início – em que pese a brutalidade de outras situações, inclusive em tradicionais aliados dos EUA, como o Bahrein e o Iêmen –, é o fato de maior impacto geopolítico na questão que é chave para todas as outras: o conflito Israel-Palestina.

O acontecimento de maior relevo dos últimos dias, por suas implicações de médio e longo prazo, é o acordo entre as lideranças do Fatah e do Hamas. A reconciliação entre as duas facções antagônicas, resultado direto das outras mudanças na região, principalmente no Egito, mas, de forma paradoxal, também na Síria, é a única via para se chegar a uma paz duradoura entre árabes e israelenses. Claro, isso exigirá uma evolução por parte do Hamas, que terá de aceitar a existência do Estado de Israel, um fato da história que nenhuma ideologia pode pretender apagar. Já o governo israelense tem de compreender – e, quanto mais rápido o fizer melhor para todos, sobretudo para Israel – que um acordo que venha abarcar todos os segmentos representativos da população palestina terá muito mais possibilidade de ser um acordo durável. Isso era verdade antes das atuais mudanças. A expectativa de que Tel-Aviv pudesse chegar a um entendimento com a Autoridade Palestina, que somente controlava, ainda assim parcialmente, uma parte do território, que depois fosse imposto à outra facção (expectativa, diga-se de passagem, também nutrida pelos negociadores da Autoridade Palestina), sempre foi, a meu ver, ilusória.

Hoje, com um governo egípcio onde a opinião popular – inclusive aquela, muito ponderável, da Irmandade Muçulmana – terá em qualquer circunstância mais influência, em que a ilusão torna-se mera fantasia. Goste-se ou não, é essa a realidade que terá de ser enfrentada, não só por Israel, mas por qualquer potência que pretenda ter influência na região. E que ninguém se iluda, neste particular, com a situação na Síria. Todos (ou ao menos todos aqueles que se consideram democratas e progressistas, no Brasil e alhures) desejamos um desfecho que ponha fim à brutal repressão que Bashar al-Assad desencadeou (contrariando expectativas de muitos que, inclusive no Ocidente, viam nele um líder modernizador e aberto ao diá-logo que lutava para se libertar do aparato herdado do pai).

Mas um governo mais democrático em Damasco não significará necessariamente um governo mais fácil de lidar do ponto de vista de Washington e de Tel-Aviv, ao menos de acordo com a estratégia seguida até aqui. A maior repressão empreendida pelo pai de Bashar foi contra a Irmandade Muçulmana. Diferentemente dos filmes de mocinho e bandido, que parecem constituir a lente pela qual uma parte da opinião pública e, infelizmente, dos próprios tomadores de decisão, vê o mundo, a realidade é mais complexa.

Por falar nisso, passou despercebida, creio, da nossa mídia uma interessantíssima análise do ex-presidente sul-africano Thabo M’Beki sobre o ocorrido na Costa do Marfim. Para o ex-mandatário, mediador do conflito, antes dos trágicos episódios que culminaram com o bombardeio por helicópteros franceses – devidamente autorizados pela ONU, ao que parece – à residência presidencial, a história é bem diferente daquela contada pela mídia ocidental. Segundo M’Beki, os grandes perdedores teriam sido a ONU e a União Africana. Os ganhadores, naturalmente, os defensores de interesses coloniais e neocoloniais. Vale conferir.

NR: A coluna de Amorim foi escrita no sábado 30, antes da morte de Bin Laden. O fato não altera, porém, o teor das análises

Celso Amorim é ex-ministro das Relações Exteriores do governo Lula. Formado em 1965 pelo Instituto Rio Branco, fez pós-graduação em Relações Internacionais na Academia Diplomática de Viena, em 1967. Entre inúmeros outros cargos públicos, Amorim foi ministro das Relações Exteriores no governo Itamar Franco entre 1993 e 1995. Depois, no governo Fernando Henrique, assumiu a Chefia da Missão Permanente do Brasil nas Nações Unidas e em seguida foi o chefe da missão brasileira na Organização Mundial do Comércio. Em 2001, foi embaixador em Londres.

Artigos anteriores:

BRICS
Ser radical é tomar as coisas
A Velha Ordem está morrendo. Viva a Nova! Já não será possível que um grupo de potências ocidentais dite a vontade do mundo

Acordo Brasil, Turquia e Irã
A (f)utilidade das sanções
Em geral, elas atingem principalmente os setores mais frágeis

Radical Livre
Consequências de um voto
Dizer que o apoio à resolução da ONU contra o Irã não afetará a percepção que se tem da nossa postura internacional é tapar o sol com a peneira.

Mediocrizacao do empresariado (depois da academia, os novos idiotas se apresentam)

Concedo em que a burguesia - como gostam de chamar os empresários seus mais novos e surpreendentes aliados -- lucrou barbaramente durante os oito anos do "nunca antes". Banqueiros e industriais em geral nunca ganharam tanto, como falou aquele mesmo que se aliou gostosamente aos "exploradores da classe operária". Eles podem ser gratos, assim, a quem lhes fez um pouco mais ricos (ainda que eles não tenham consciência de que entregaram um pouco dos seus novos ganhos àqueles mesmos que permitiram essa nova afluência, tanto diretamente, ou seja, pela via expropriatória, como oficialmente, via Receita Federal).
A única coisa que eu não entendo é como empresários medianamente inteligentes concedam pagar não sei quantas centenas de reais para ouvir banalidades, bobagens e outras gracinhas sem sentido.
Deve ser para se exibirem uns aos outros -- "Eu também estava lá!" -- ou para continuarem com a ilusão de que melhor esse regime de companheiros camaradas com o capital do que algum capitalista liberal, que poderia -- oh, ideia maluca -- introduzir um verdadeiro regime de mercado no Brasil.
Em todo caso, eu sempre fico surpreendido com pessoas que cultivam a burrice e a banalidade...
Paulo Roberto de Almeida

Empresários aglomeram-se em pé por uma hora para ouvir Lula no Fasano
Vanessa Adachi
Valor Econômico, 06/05/2011, p. A5

Lula em palestra para banqueiros: "Duvido que os bancos já tiveram mais lucro nesse país do que no meu mandato" (foto)

São Paulo - "Eu nunca votei no Lula e nunca votarei. Mas vim por causa dele." Essa era a afirmação mais repetida na noite de quarta-feira em dezenas de rodinhas formadas por empresários, banqueiros, executivos e advogados que lotaram o amplo salão da Casa Fasano, templo de festejos luxuosos da elite paulistana.
Pouco mais de 450 pessoas se espalharam pelo espaço de pé direito altíssimo e paredes de intrigante transparência, que deixam ver os aviões que cruzam o céu. O Bank of America Merrill Lynch, um dos maiores bancos dos Estados Unidos, era o anfitrião da noite e comemorava a autorização do Banco Central do Brasil para que a instituição passe a operar como banco múltiplo, ampliando sua atuação no país.

Alexandre Bettamio, presidente do BofA no Brasil, provavelmente também não votou em Lula em 2002 ou 2006. Mas elegeu o ex-presidente para ancorar o mais importante evento já realizado pela instituição no país apostando que seria um grande chamariz. A escolha foi certeira.

Lula tem cobrado cachê de "palestrante global". No caso, o valor não confirmado pelos assessores do presidente ou pelo banco, de quase R$ 200 mil, incluía discurso de 45 minutos seguido de mais meia hora de "social" pelo salão. O contrato foi cumprido à risca e, talvez sensível à praxe do setor financeiro, o ex-presidente concedeu um bônus aos banqueiros e falou por 1 hora e dois minutos. Parte da plateia nunca havia tido a oportunidade de estar tête-à- tête com o ex-presidente. Outros queriam vê-lo falar de novo e esperavam "se divertir" com o discurso bem humorado. Pouco depois das 20 horas o salão já estava cheio e, por volta das 21h30, quando Lula começou a falar, o público se aglomerou ao seu redor, abrindo um clarão ao fundo. Aguentaram firme, em pé, por mais de uma hora.

Na "primeira fila", dois ex-ministros de Lula: Luiz Fernando Furlan, que ocupou a Pasta do Desenvolvimento, Indústria e Comércio; e o ex-presidente do BC, Henrique Meirelles. Logo a seu lado, o atual presidente da Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, Ricardo Flores. Sentada à uma discreta mesinha ao lado direito do pequeno palco montado, dona Marisa assistiu a metade do discurso acompanhada de uma outra mulher. Lá pelas tantas, foi escoltada por seguranças até uma sala reservada e de lá não mais saiu.

Ao introduzir Lula à plateia, o presidente de mercados globais do Bank of America, Tom Montag, referiu-se a ele como "o político mais popular da Terra". O "gancho" para a presença de Lula em um evento do banco americano foi o enorme desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro durante seu governo. O BofA foi um dos bancos que lideraram a gigantesca capitalização da Petrobras no segundo semestre do ano passado. Único ponto de contato entre o ex-presidente e seu contratante, o fato foi fartamente lembrado nos discursos da noite.

Lula fez uma palestra sob medida para o público presente. Temas como a explosão do crédito consignado e o desenvolvimento do mercado de capitais foram cuidadosamente escolhidos para rechear a fala. Munido de um discurso oficial de cinco páginas, Lula fez a alegria dos presentes ao abusar de seus famosos improvisos. "He speaks very well", dizia um executivo brasileiro a outro, estrangeiro, no meio do salão.

Arrancou gargalhadas sinceras e mesmo aplausos, em diversos momentos, ao debochar do que seria o estereótipo da forma de pensar da elite brasileira. "Tem gente que fala: esse Lula colocou os pobres no lugar que só nós viajávamos", afirmou, por exemplo, ao referir-se ao fato de "os pobres" estarem viajando de avião. Mais tarde, disse que muita gente começa a falar inglês antes mesmo de sair do aeroporto, só para mostrar que sabe.

Apelou para a emoção e deixou a plateia silenciosa ao falar do Programa Luz para Todos e descrever que "quando chega a luz elétrica na casa de uma pessoa é como se você, num passe de mágica, pegasse uma pessoa do século 18 e trouxesse para o século 21. É como se fosse a máquina do tempo."

Lula queria provar, caso alguém ali ainda tivesse dúvida, que a política de seu governo fez bem ao empresariado. Já perto das 22h30 e do fim de sua palestra, quando a audiência se mostrava um pouco cansada com a longa fala do ex-presidente, ele arrematou: "Eu sei que tem gente que tem preconceito contra mim. Mas eu desafiaria qualquer um de vocês: eu duvido que algum empresário já ganhou mais dinheiro nesse país do que no meu mandato. Duvido que os bancos já tiveram mais lucro nesse país do que no meu mandato."

E nesse momento talvez tenha cometido a única gafe da noite, ao exemplificar: "Pode pegar qualquer empresa, pode pegar a empresa do Furlan." A Sadia, empresa antes controlada pela família do ex-ministro Furlan, como bem sabem todos os presentes, praticamente quebrou em 2008. Não por conta de políticas econômicas, é verdade, mas por problemas de gestão. Mas os cochichos ao pé do ouvido foram inevitáveis.

"Ele é muito bom", "ele é muito inteligente", "agora dá para entender [a sua popularidade]", saíram falando aqueles que nunca votariam nele.

Das poucas pessoas dentro da Casa Fasano que haviam votado em Lula, duas copeiras não escondiam a excitação com a presença de seu ex-presidente. Difícil foi encarar a frustração de não poder vê-lo: muito profissionais, não abandonaram o posto e ficaram confinadas no banheiro feminino durante quase toda a noite, prestando assistência às convidadas.

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Complemento (PRA):

Blog de Ricardo Noblat - 7.5.2011

Reli, há pouco, a frase do dia postada ontem neste blog. Dizia assim: "Quando peguei esse país só tinha miserável. E eu, operário sem um dedo, fiz mais que o Bill Gates, Steve Jobs e esses aí."

Foi pinçada da palestra dada por Lula na última quarta-feira para convidados do Bank of America/Merrill Lynch reunidos na Casa Fasano, em São Paulo.

Lula recebeu R$ 250 mil pela palestra. Onde disse coisas do tipo "Wall Street não gosta de mim, mas o chefe deles gosta". Ou "tem que falar português em aeroporto americano, eles têm que entender o que a gente fala".

A expressão "nunca antes neste país" deu lugar "a nunca antes neste planeta", anotou Sonia Racy, colunista de O Estado de S. Paulo.

Quando Lula resolveu falar sobre o principal problema que aflige o governo - a inflação - foi para dizer que Dilma saberá resolvê-lo porque é competente. Invocou o testemunho de Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central, ali presente.

E como de costume, elogiou o que fez em oito anos.

Perguntei então aos meus botões (não é só o jornalista Mino Carta que se socorre dos próprios botões): até quando empresários importantes continuarão pagando fortunas a Lula para só ouvir bobagens, disparates, autoelogios e trivialidades?

Como palanqueiro, falando para o povão, Lula é imbatível.

Como conferencista para platéias sofisticadas pode ser razoável quando lê o que lhe dão.

Mas se improvisa, é raso como um pires. No máximo provoca risadas. Algumas de puro constrangimento.

Republica Mafiosa do Brasil: os metodos de certo partido...

Um exemplo, entre outros, das muitas malfeitorias que vem sendo conduzidas no Brasil do capitalismo de Estado, na verdade uma situação de promiscuidade entre interesses privados e recursos públicos.

Brasil
De: Roger Para: Dilma
Hudson Corrêa, de Parauapebas (PA), e Leonardo Souza
Revista Época, 07/05/2011

Antes de cair, o ex-dirigente da Vale alertou a presidente sobre a estranha atuação de consultores ligados ao PT que faturam milhões com royalties. E eles continuam lá.

Trechos da carta de três páginas enviada por Roger Agnelli a Dilma, alertanto a presidente sobre as “altas quantias” recebidas por consultores, alguns deles alvos de investigações criminais (foto)

O município de Parauapebas, no sudeste do Pará, abriga a maior mina de ferro a céu aberto do mundo, a jazida de Carajás, explorada pela Vale. Pela riqueza mineral, a cidade recebeu R$ 700 milhões de royalties da mineradora nos últimos cinco anos. Trata-se de uma compensação pela exploração do solo. Apesar dos repasses milionários, Parauapebas é cercada por favelas, cujos barracos se expandem por uma sequência de morros. Bairros próximos ao centro têm esgoto a céu aberto e ruas sem asfalto, muitas com pedaços de madeira e sucata para evitar que motoristas desavisados atolem na lama.
Comandado pelo PT, o município integra um capítulo até aqui não revelado da campanha para tirar o executivo Roger Agnelli da presidência da Vale. Há nesse episódio suspeitas de desvio de milhões de reais de recursos públicos. É dinheiro pago pela mineradora, que entrou no caixa da prefeitura e que deveria ser aplicado na melhoria das condições de vida da população. De acordo com investigações de dois órgãos de fiscalização, esse dinheiro aparentemente foi parar em lugar impróprio.
Fortes indícios do caso chegaram à mesa da presidente Dilma Rousseff, numa carta assinada por Agnelli em 14 de março. No texto, Agnelli alerta que a disputa em torno dos royalties estava inserida em um “contexto político” e que havia “investigações criminais em andamento” sobre o suposto esquema da prefeitura de Parauapebas. s As assessorias da Vale e da Presidência da República confirmaram o envio e o recebimento da carta. A Vale informou, contudo, que não comentaria o teor do documento. O Palácio do Planalto afirmou que a cobrança dos royalties é feita pelas prefeituras e que a carta foi encaminhada ao Ministério de Minas e Energia.
A campanha contra Agnelli foi deflagrada no início de março por determinação de Dilma. Sem cerimônias, o Planalto despachou o ministro Guido Mantega, da Fazenda, a Osasco, em São Paulo, para convencer o Bradesco, principal sócio privado da companhia, a aceitar a substituição de Agnelli. Em outra frente, o ministro Edison Lobão, de Minas e Energia, pressionou publicamente a mineradora a pagar R$ 5 bilhões de royalties pela exploração do solo no país, soma além dos valores que a Vale recolhe regularmente todo ano. A empresa contesta o débito na Justiça.
É nesse contexto que entra Parauapebas. Do total da suposta dívida dos royalties, R$ 800 milhões caberiam ao município paraense, administrado desde 2005 pelo petista Darci José Lermen. Enquanto cobra a fatura da Vale, Lermen enfrenta o escrutínio do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará e do Ministério Público Estadual. Os dois órgãos querem saber onde foram aplicados os R$ 700 milhões que a cidade já recebeu da mineradora nos últimos anos.
A investigação envolve um contrato mantido por Lermen, desde 2006, com o advogado Jader Alberto Pazinato, filiado ao PR, partido da base aliada do governo. O escritório de Pazinato fica em Balneário Camboriú, em Santa Catarina, a mais de 3.000 quilômetros de distância do Pará. Pelo acordo, a que ÉPOCA teve acesso, Pazinato fica com R$ 20 de cada R$ 100 depositados nos cofres da prefeitura referentes a impostos e royalties da Vale. Desde 2007, ele já embolsou cerca de R$ 9 milhões, segundo o TCM. O Tribunal apura a legalidade do contrato, assinado sem licitação.
Há interesse de terceiros envolvidos, como consultores (...) pedindo altas comissões (...) razão pela qual a disputa adquire tal contexto político
ROGER AGNELLI, ex-presidente da Vale, na carta enviada em março para a presidente Dilma
Uma das tarefas de Pazinato é atuar na Justiça contra a Vale. Além da cobrança política feita pelo Planalto, o governo federal processou a mineradora para receber o valor que considera ser seu de direito. Nessas ações, as prefeituras podem atuar como assistentes do Departamento Nacional de Mineração (DNPM), encarregado de encabeçar os processos. Foi nessa brecha que o prefeito Lermen encaixou o escritório de Pazinato. O TCM não detalha a que se referem exatamente os valores recebidos por Pazinato até agora – se aos royalties em disputa ou aos pagamentos regulares feitos pela mineradora.
Como qualquer bom profissional liberal, Pazinato busca diversificar sua atuação. Para isso, conta com o apoio da Associação dos Municípios Mineradores do Brasil (Amib), cujo vice-presidente é Lermen. O presidente é outro petista, o prefeito de Congonhas, em Minas Gerais, Anderson Cabido. Pazinato presta assessoria jurídica à associação, mas não consegue oferecer seus serviços aos municípios mineiros. Lá, o Tribunal de Contas local proíbe contratos dessa natureza com municípios.
O prefeito Cabido diz acreditar que o embate pelos royalties foi “a gota d’água” para a queda de Agnelli. A cronologia dos fatos combina com a afirmação. No início de fevereiro, Lobão recebeu por escrito, da Amib, a reivindicação para que a Vale aceitasse pagar a mais pelos royalties. No fim daquele mês, a superintendência do DNPM no Pará, órgão subordinado a Lobão, abriu processo para cassar a concessão da Vale na mina de Carajás, com base nas multas lançadas em 2008 e 2009.
As penalidades haviam sido aplicadas sob o argumento de que a Vale não pagara o valor correto de royalties aos municípios. As mineradoras e o DNPM divergem sobre a forma de cálculo desses recursos. De um lado, as mineradoras entendem que, do valor a ser recolhido, podem ser descontados impostos e custos operacionais, como o transporte do minério. De outro, o DNPM afirma que não há previsão legal para esses abatimentos. No fim, a direção nacional do DNPM arquivou o processo de cassação da concessão. Mas o desgaste já estava consumado.
Na carta enviada a Dilma, Agnelli cita a “tentativa de ameaçar o direito minerário de Carajás, o que o próprio DNPM anulou por total ilegalidade”. No mesmo dia em que funcionários da Vale entregavam o documento no Planalto, Agnelli se reunia com Lobão. Gestava-se ali mais uma surpresa desagradável para ele e para a Vale: logo após o encontro, Lobão disse à imprensa que a Vale admitia finalmente a dívida.
ÉPOCA apurou que Agnelli ficou constrangido com a declaração. Ele dissera apenas que a Vale mantinha ações na Justiça contra a cobrança que considerava indevida, mas acataria eventuais decisões opostas. Agnelli entendeu que a iniciativa de Lobão era mais uma arma do governo para tirá-lo do cargo.
No fim, Agnelli caiu. Menos de 15 dias depois da carta e da reunião com Lobão, os acionistas da mineradora tornaram pública a decisão de substituí-lo. O governo interfere na gestão da mineradora por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e da Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, que, juntos, detêm 60,5% do bloco de controle da Vale.

Moradores de Parauapebas pediram um inquérito para saber onde são aplicados os royalties pagos pela Vale (foto)

Em Parauapebas, ainda resta uma ponta sem desfecho. Danyllo Pompeu Colares, promotor de justiça do Pará, diz que moradores pediram abertura de um inquérito civil para apurar onde são aplicados os royalties depositados na conta do município. Colares afirma que, cinco meses após o início da investigação, a prefeitura nada esclareceu.
O investimento público que mais chama a atenção de quem chega à cidade é o prédio da prefeitura, inaugurado em dezembro de 2009. Com quatro andares, no alto de um morro, custou cerca de R$ 12 milhões, segundo o prefeito. Lermen afirma que faz investimentos maciços na infraestrutura da cidade (construção de escolas, estradas, saneamento e hospitais), mas que os recursos não são suficientes diante do crescimento populacional. “Quando assumi a prefeitura (em 2005) , a cidade tinha 90 mil habitantes. Hoje, recebi a informação de agentes comunitários de que são 200 mil pessoas”, diz. Oficialmente, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Parauapebas tem 154 mil moradores. Lojas comerciais, como concessionárias de veículos, se expandem na cidade, que também vai ganhar um shopping, ainda em construção.
Lermen não vê desperdício do dinheiro dos royalties e defende o contrato com Pazinato. “Precisávamos de um escritório especializado para fazer frente à Vale. Somos o único município que tem obtido vitória na Justiça para receber (os royalties) . Não é um contrato ruim para o município”, afirma. Ele nega qualquer relação política com Pazinato. Diz que os valores pagos ao escritório “são pautados pela execução dos serviços” e ganhos da prefeitura.
O advogado Carlos Alberto Pereira, que trabalha com Pazinato, diz que seu colega não tem nenhuma ligação partidária: “Ele nunca participou de reunião política. Trabalho com ele há dez anos. Ele disse nem se lembrar de ter assinado ficha de filiação”. Segundo Pereira, a forma de contratação do escritório pela prefeitura é amparada por decisão do Supremo Tribunal Federal.
A explicação não convence Wellington Alves Valente, ex-procurador de Parauapebas. Na função, Valente era responsável por defender os interesses da prefeitura na Justiça. “Pazinato pegou o bonde andando”, diz. Valente afirma ter sido o responsável por levantar os débitos atribuídos à Vale a partir de 2001. Segundo ele, Pazinato encontrou o serviço pronto. Além disso, haveria outro agravante. Parauapebas tem um quadro fixo de procuradores municipais. Eles são advogados concursados e poderiam perfeitamente tocar ações sem necessidade de contratação de um escritório particular.
Nos próximos dias, o mandato de Agnelli na Vale se encerra. Apesar da demissão, ele entra para a história da empresa como responsável por uma gestão de sucesso. Na semana passada, foram anunciados os resultados da Vale no primeiro trimestre deste ano. A mineradora lucrou R$ 11,21 bilhões, 292% acima do que ganhou no mesmo período de 2010. O recorde, influenciado pelo aumento de preço do minério de ferro, é 13% maior que o último trimestre do ano passado. Caberá agora a seu substituto, o executivo Murilo Ferreira, escolhido por Dilma, decidir como vai lidar com o governo na discussão sobre os royalties.

sábado, 7 de maio de 2011

Ainda o debate sobre a oposição - Alberto Carlos de Almeida

Artigo de algumas semanas atrás, plenamente válido para o debate atual sobre o papel das oposições. O sociólogo em questão participou do fórum em que também estive na semana passada, organizada na FAAP-SP, pelo Instituto Millenium, sobre liberdade e democracia (no dia 3 de maio, dia da liberdade de imprensa).
Cabe corrigir de imediato um deslize do autor,quando se refere ao livro-entrevista de FHC, O Presidente Segundo o Sociólogo, que é de 1998, não de 1988.
Paulo Roberto de Almeida

Discurso da Oposição
Alberto Carlos de Almeida
Alerta Total, 23 de abril de 2011

No excelente livro de 1988 "O Presidente Segundo o Sociólogo", no qual Fernando Henrique Cardoso concedeu uma longa entrevista ao jornalista Roberto Pompeu de Toledo, o então presidente tinha total clareza do que era o seu governo e, consequentemente, do que deveria ser a oposição caso o PT chegasse ao poder. Essa clareza de FHC está retratada nas páginas 207 a 209 do livro, nas quais ele se refere a seu governo e à política brasileira:

"Se você voltar ao discurso do Mário Covas chamado 'choque de capitalismo', verá que as ideias gerais do atual governo estão lá. Alguém disse: 'Vocês estão fazendo o que o Collor fez'. Não, antes do Collor já dizíamos isso". Fernando Henrique continua: "Alguns se assustavam com qualquer grito da chamada esquerda. Não tinham convicção do que estávamos fazendo, sentiam vergonha. Não tem que ficar se desculpando"

O mais interessante é quando Fernando Henrique trata da necessidade de modernizar e inovar na política brasileira: "Costumo dizer que se devem fazer duas perguntas ao político brasileiro. A primeira é: ele sabe que existe mercado? Uma boa parte acha que o mercado depende do governo, e que o governo fabrica dinheiro. Segunda: ele sabe que o Estado não foi feito para seus amigos e familiares?" De acordo com o depoimento do ex-presidente em um livro de 1988, não precisa mais nada para fazer oposição: é preciso defender o choque de capitalismo e o mercado, ter coragem, isto é, não ter medo da esquerda, e modernizar o Estado brasileiro, cujo principal sinal de atraso é o nepotismo. A melhor maneira de dar forma prática a essa correta visão de FHC é defender a redução de impostos sobre o consumo.

Vamos à proposta concreta.

A oposição poderia começar o ano, rigorosamente sempre em janeiro, atacando o governo federal por não reduzir os impostos do material escolar. Cada mãe, tanto do povão quanto da classe média, paga 43% de impostos quando compra uma agenda escolar, ou uma borracha, ou um apontador, ou um bastão de cola. O imposto é de 35% para o caderno, o lápis e o pincel necessário para as aulas de arte, 44% do preço de uma régua vai para o governo, 40% da caneta, 40% do estojo e 36% da tinta guache. Finalmente, 38% do preço da folha de fichário e do papel sulfite vai para o governo desperdiçar em obras inacabadas e mordomias.

Passada a temporada de compra do material escolar, a oposição poderia mirar no Carnaval. O folião é mais do que explorado pelo governo quando vai se divertir: ele paga 46% quando compra um colar de havaiano, 48% no confete e na serpentina, 36% na fantasia, 54% na cerveja, 77% na caipirinha e 82% na cachaça. Nem os instrumentos musicais escapam. As baterias de escola de samba são monumentos vivos da carga tributária: 39% de imposto sobre o agogô, 35% no apito do mestre da bateria, 38 no reco-reco, 39% no tamborim e 38% no pandeiro e no cavaquinho.

Aliás, Carnaval lembra praia e futebol. A oposição poderia fazer uma pelada e utilizar uma bola na qual esteja escrito 46% de imposto que se paga quando ela é comprada. Nossos deputados de oposição poderiam também protestar na praia de Boa Viagem, no Recife, levando cadeiras de praia com 40% escrito, referente ao imposto que se paga quando ela é obtida.

Passado o Carnaval, há os 40 dias sagrados da quaresma. No domingo de Páscoa, as famílias brasileiras se confraternizam trocando ovos de Páscoa. As crianças adoram comer chocolate e a oposição perde mais uma oportunidade de criticar o governo. O imposto sobre o ovo de Páscoa atinge a impressionante marca de 38% e se você quiser escrever um carinhoso cartão de Páscoa terá que deixar nos cofres do governo esses mesmos 38% dos ovos. Todas as datas comemorativas de nossa população são também muito comemoradas pela ineficiência, pelo desperdício e pela corrupção governamentais, esse ente intangível que drena os recursos de toda a população, em particular dos pobres, e não tem opositor algum no sistema político.

A campanha da oposição teria como alvo o material escolar em janeiro, o Carnaval em fevereiro, a Páscoa em março e abril, o Dia das Mães em maio, as festas juninas em junho, é possível pular julho, mas também é possível incluí-lo por meio dos gastos com viagens de férias, em seguida o Dia dos Pais em agosto. Nem o 7 de Setembro escapa. Se você quiser empunhar uma bandeira do Brasil e sair pelas ruas comemorando a nossa emancipação frente a Portugal, terá que pagar 36% de imposto para comprar uma bandeira. Em outubro é chegado o Dia da Criança e os impostos sobre os brinquedos são escorchantes 40%. O governo nos dá um alívio no Dia de Finados, em novembro. As flores que muitos brasileiros colocam nos túmulos de seus parentes queridos que saíram desta para melhor deixam 18% de impostos nos cofres do governo.

A oposição teria muito assunto em dezembro. Poderia exigir a redução dos impostos de 39% que incidem sobre a árvore de Natal, 36% sobre o presépio, 42% sobre as imagens de santos, 48% sobre os enfeites da árvore de Natal e 30% sobre chester, peru e pernil. Na noite do réveillon a oposição, em vez de ir para Paris ou Nova York, poderia fazer um grande ato de protesto na praia de Copacabana brindando com 59% de imposto o champanhe que comemora a entrada de janeiro e consequentemente o início da temporada de compra do material escolar. E aí começaria tudo de novo.

Falta à oposição criatividade. Falta, acima de tudo, coragem. A propósito, o PT jamais poderá ser criticado por se acovardar diante de seus adversários. O PT cresceu fazendo oposição sistemática durante 22 anos. Na eleição de 2010, além de conquistar pela terceira vez consecutiva a Presidência, o PT partiu para o ataque na eleição para o Senado. Hoje tem a segunda maior bancada. Muito mais importante do que isso é o próximo ataque. Vários senadores serão candidatos competitivos nas eleições de governador de 2014: Gleise Hoffman, no Paraná; Lindberg Farias, no Rio; Walter Pinheiro, na Bahia; e Humberto Costa, em Pernambuco.

Lula está empenhado em conquistar terreno nas eleições municipais visando conquistar o governo de São Paulo. O PT joga no ataque, faz falta, entra duro e dá carrinho. A oposição joga na defesa.

Para jogar no ataque é preciso encarar o tema da redução dos impostos sobre o consumo.

Lula foi (e é) o grande empreendedor político à la Schumpeter. Lula fundou um partido e correu riscos. Perdeu três eleições consecutivas e passou a ser questionado internamente. Quase foi parar no ostracismo. Mário Covas correu riscos com o seu discurso do choque de capitalismo. FHC correu riscos com o artigo recém-publicado no qual faz críticas e aponta caminhos para a oposição.

É preciso que algum líder de oposição seja tão empreendedor quanto Lula. É preciso que surja um tomador de risco na oposição. Quem leu a curta biografia de Winston Churchill escrita por Paul Johnson e recém-publicada no Brasil verá que ele correu muitos riscos e chegou a cair no ostracismo. Chegou a sair da política e a tirar seu sustento dos artigos que escrevia para os jornais. Hoje Churchill é considerado uma das figuras públicas mais importantes do século XX. Quem toma riscos pode se dar muito mal; todavia, também pode se dar muito bem. Mais uma vez Lula é o principal exemplo brasileiro dessas duas faces da mesma moeda.

Em todos os países democráticos existe alternância de poder. Assim, cedo ou tarde uma situação de crise econômica aguda levará a oposição de volta ao governo federal. Ela terá o PT, enorme e combativo, como opositor. O PT na oposição terá bancadas grandes na Câmara e no Senado, o controle de muitas prefeituras e governos estaduais. A atual oposição precisa se treinar hoje jogando no ataque e na combatividade, porque, ao chegar ao governo, terá o PT como opositor.

Aqueles que frequentam os estádios de futebol já devem ter pedido raça aos seus respectivos times. Eu mesmo me enquadro nessa situação. Foram muitas as vezes que a torcida do Fluminense gritou em coro para o time: "Queremos raça, queremos raça". Isso acontece toda vez que a torcida acha que o time deveria se empenhar mais, deveria ousar e jogar no ataque, deveria entrar duro, utilizar o carrinho, dar chutão para fora na defesa. Aqueles que torcem para a oposição poderiam agora fazer o mesmo coro: "Queremos raça, queremos raça".

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo". E-mail: Alberto.almeida@institutoanalise.com - www.twitter.com/albertocalmeida. Artigo originalmente publicado no caderno Eu & Fim de semana do Valor Econômico de 22 a 24 de abril de 2011.

A frase da semana - Romain Rolland

Em 1917, pacifista convencido, Romain Rolland, escritor francês, manifestou-se da seguinte forma em relação às unanimidades "patrióticas" a que assistia à sua volta:

"Todo homem de verdade deve aprender a ficar só no meio de todos, a pensar só por todos. A humanidade pede àqueles que a amam de fato que, sempre que necessário, sejam capazes de guiá-la e revoltar-se contra ela".
Romain Rolland, "L'Un contre tous", publicado parcialmente em 1917, depois transformado em Clérambault, histoire d'une conscience libre pensant la guerre.

Publicado no Brasil como História de uma consciência - Clérambault (4a. edição: Rio de Janeiro: Editora Ponguetti, 1948).

(informações retiradas da biografia escrita por Alberto Dines: Morte no Paraíso: a tragédia de Stefan Zweig (3a. edição, ampliada; Rio de Janeiro: Rocco, 2004), p. 204.

Talvez a mesma advertência devesse se aplicar ao contexto de 1933-34, quando da ascensão do nazismo, ou mesmo antes, nos anos 1920, quando da ascensão do fascismo italiano. As unanimidades assistidas na Alemanha e na Itália, em relação aos dois totalitarismos ascendentes contribuíram para que ditadores desequilibrados conduzissem seus respectivos países, a Europa inteira e grande parte do mundo a um ciclo infernal de destruições e mortes que até hoje nos causam horror.

Em escala diferente, mas com igual pertinência, creio que cabe alertar contra descaminhos que nos parecem conduzir nossa sociedade a recuos ou pelo menos à estagnação, no plano econômico e material, quando não a retrocessos nos planos político ou cultural. Nessas horas, talvez seja útil seguir a lição de Rolland e ficar sozinho contra todos, e cumprir o papel de mensageiro do desastre, não tendo medo do isolamento, mas respondendo exclusivamente à sua própria consciência.

Uma historia da divida mundial - FMI no YouTube

Vejam esta apresentação: 120 anos de dívida externa...

Back to the Future: a History of the Global Debt
http://www.youtube.com/watch?v=jeIanMdkUj0

The policy choices and decisions countries face as they emerge from the worst economic crisis in 80 years have a lot to do with their past habits. And to make good decisions, they need good data.

The IMF staff has built a comprehensive and dynamic new database on public debt. The data covers 174 countries over a period of 120 years, and will help policymakers understand the past and chart a future course to sustainable economic growth.

The data shows how government debt has risen and fallen over the years as important events, such as wars and stock market crashes, affect a country's decisions about when to save and when to spend.

It turns out the relationship between debt and economic growth has changed over time; historically, fast growing countries had low debt ratios, while slow growers struggled under higher debt. In the past 30 years that relationship has altered as advanced economies' debt levels have risen and their economies have grown.

The data also debunks some old clichés, for example that African countries have the highest debt levels. In fact, low income countries in Africa today have lower debt ratios than do advanced economies in Europe and North America.

Mais mudancas no governo: nem sempre para melhor...

Querem reescrever a História
Arthur Virgílio
O Estado de S.Paulo, 07 de maio de 2011

O lulopetismo intenta "reescrever" a História recente do País. Começa com a apropriação do Plano Real, sem lhe citar o nome, e da estabilidade econômica dele advinda. Passa pela demonização das reformas estruturais do período Fernando Henrique Cardoso, mesmo sabendo que foi à custa delas e da conjuntura internacional benigna que Lula surfou nas ondas da popularidade. Desemboca na tentativa de convencer a opinião pública de que não houve mensalão nem desvio ético algum do "comissariado".

As trapaças de Erenice Guerra, braço direito de Dilma Rousseff na Casa Civil, caem no esquecimento. A atual presidente certamente sabe que, no seu gabinete anterior, foi elaborado torpe dossiê contra Ruth Cardoso, e não inexplicável "banco de dados".

Cristovam Buarque, por suposta incompetência, foi demitido por telefone da pasta da Educação. José Dirceu, acusado pelo Ministério Público de ser o chefe da "quadrilha do mensalão", jamais deixou de frequentar rodas palacianas ou de ser atendido, pelos diversos escalões da administração, em seu mister de "consultor".

Não tenho Cristovam como incompetente. Mas se o julgamento do Planalto é esse, o que dizer de Fernando Haddad, que desmoralizou o Enem? E dos executores do PAC, a começar por sua "gerente", que gastaram absurdos em propaganda de obras incompletas ou que nem saíram do papel? E do monte de ministros, cujo nome a população ignora?

Beneficiam-se da Lei de Responsabilidade Fiscal, contra a qual votaram e que questionaram no Supremo Tribunal Federal (STF). Criticavam a dívida pública interna deixada por Fernando Henrique, como se não houvesse preço a pagar pela estabilidade: resgate de esqueletos, como o BNH da ditadura; renegociação das dívidas de Estados e municípios; saneamento dos bancos estatais estaduais, que, na prática, até moeda emitiam em favor do clientelismo e da corrupção; duas capitalizações num Banco do Brasil quebrado e uma na Caixa Econômica Federal, que foi profissionalizada e despolitizada.

Hoje a dívida pública é mais que o dobro da que herdaram: R$ 1,7 trilhão, sem desencavar nenhum esqueleto. Eleitoralismo, "esquerdismo" pelego, falta de espírito público.

Mistificam, confundem, mentem. Comparam o medíocre crescimento que obtiveram nos anos da bonança internacional com os números da luta contra a inflação e do enfrentamento de uma dezena de crises externas sistêmicas que danificaram a economia brasileira, recém-saída da hiperinflação. Esquecem-se de cotejar a evolução do PIB brasileiro, entre 2003 e 2010, com a de países vizinhos nossos, com os Brics, com o mundo desenvolvido. Olvidam que o "brilhante" 2010 (crescimento de 7,5%) nasceu da artificialização do crédito, do incremento assustador dos gastos públicos, coroando a crise fiscal, que se foi tornando mais aguda a cada ano do segundo mandato de Lula. Não tomam a América do Sul e a América Latina como parâmetros, opondo a evolução de seus respectivos PIBs aos períodos 1995-2002 e 2003-2010: aí o Brasil praticamente não alterou sua participação porcentual.

Lula melou as mãos de petróleo, alardeando autossuficiência que jamais houve. Mágico de circo, "trouxe" o pré-sal para o presente, dando a impressão de que os benefícios seriam para o hoje, quando mil dúvidas, a começar pelo marco regulatório, rondam o êxito das operações.

Apropriou-se da rede de proteção social, que visava à emancipação dos beneficiários, criando o Bolsa-Família. Jamais reconheceu méritos: procurava constranger Fernando Henrique ("ex-presidente não deve falar"), ao mesmo tempo que se beneficiava de palavras e votos congressuais de Collor e Sarney.

Gramsciano que não leu Gramsci, planejou minimizar a democracia, pelo aparelhamento da máquina pública e pela desmoralização das instituições. Um parasita de cargo comissionado de cota partidária se satisfaz com seus "proventos" e fica à disposição da "chefia" para gritar palavras de ordem nas ruas do Brasil. O cérebro do lulopetismo pretende mais. Seu espelho é o que foi o PRI mexicano. Sonha com amordaçar a imprensa e reinar sem oposição.

A desenvoltura palaciana de Dirceu, a fraternidade com Delúbio e a imposição de João Paulo Cunha para presidir a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados não são obra do acaso. A ideia é apresentar fato consumado ao STF, intimidar a Corte, desmontar o processo do mensalão.

Fascistas enquistados no Ministério da Educação foram denunciados por imporem livros didáticos que criticam Fernando Henrique e endeusam Lula. Lavagem cerebral. Tentativa criminosa de "miliciar" a juventude, pondo-a a serviço de projeto de poder que jamais quis ser projeto estratégico de Nação. Fizeram isso na Argentina e deu em ópera cinematográfica; no getulismo do Estado Novo, em deposição do ditador; na Itália e na Alemanha, guerra e fim funesto para os ditadores.

Desde o início foi assim. Os discursos atrasados de Lula e do PT levaram os mercados à desconfiança em 2002 e os números da economia se deterioraram. Felizmente, souberam seguir as políticas macroeconômicas com que se depararam. Foi quando nasceu a "herança maldita", mil vezes repetida até a culpa sair dos vencedores e cair nas costas de quem deixava o poder.

Agora, às voltas com renitente inflação gerada pela farra fiscal que fez Lula popular e elegeu Dilma, vivem momento difícil e não têm bode expiatório para execrar. Tergiversam. Candidatam-se a delirante Nobel de Economia falando em conter a inflação sem reduzir o ritmo de crescimento. A que ponto não chegarão quando a dura realidade lhes bater à porta?!

Temo turbulências. Que a democracia saia vencedora de qualquer desafio que se anteponha à sua consolidação plena.

DIPLOMATA, FOI MINISTRO-CHEFE DA SECRETARIA-GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, LÍDER DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO E DO PSDB NO SENADO

Continuidades de governo: diarias para passar o fim de semana...

Quem disse que o governo mudou?
Eu vejo uma indisfarçável continuidade, sempre, entre práticas de políticos, e até de não políticos, como é o caso dessa ministra da Cultura.
Como é mesmo o nome dela?
Paulo Roberto de Almeida

Ministra recebe diárias por fins de semana no Rio
Leandro Colon
O Estado de S.Paulo, 07 de maio de 2011

Ana de Hollanda ganha ajuda de custo, mesmo tendo imóvel na cidade; agenda inclui eventos fora de Brasília nas sextas e segundas

BRASÍLIA - Desde que assumiu o cargo, em janeiro, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, recebe do governo diárias em fins de semana sem compromissos oficiais no Rio, cidade onde tem imóvel próprio. O Estado cruzou os dados do Portal da Transparência, que publica as despesas do governo, com a agenda oficial divulgada no site do Ministério da Cultura.

A análise das planilhas revela o hábito da ministra de marcar compromissos oficiais fora de Brasília, principalmente no Rio, às sextas e segundas-feiras, e receber a ajuda financeira não só pelos dias de trabalho fora da capital federal como pelos sábados e domingos não trabalhados.

Em quatro meses, Ana recebeu cerca de R$ 35,5 mil por 65 diárias, sendo que a agenda não registra compromisso oficial em, no mínimo, 16 desses dias. O custo em passagens aéreas foi de R$ 17,3 mil. A ministra ficou em Brasília em no máximo 4 dos 17 fins de semana desde a posse.

A ministra admitiu ao Estado ter recebido diárias em fins de semana no Rio sem agenda oficial, mas alegou que receber esse dinheiro sai mais barato para os cofres públicos que fazer nova viagem de ida e volta para Brasília. A ministra costuma fazer essa rota na sexta-feira à noite, marca algum compromisso e recebe a diária por todos os dias. Foi o que ocorreu, por exemplo, em dois fins de semana em janeiro e outros dois em abril.

A agenda oficial registra embarque de Brasília para o Rio às 20h29 de 14 de janeiro, uma sexta-feira. Não há registro de compromissos oficiais no sábado e domingo seguintes – as datas são omitidas no site do ministério. Após uma segunda-feira de reuniões no Rio, a ministra retornou a Brasília num voo das 9h42 da terça-feira, dia 18. Segundo o Portal da Transparência, ela recebeu R$ 2.558,53 por 4,5 diárias – pela estada de sexta a terça de manhã. A ministra admitiu à reportagem que pelo menos R$ 871,50 se referem a períodos não trabalhados. O mesmo ocorreu no fim de semana anterior, também em viagem ao Rio.

Reuniões. Há cerca de um mês, a prática se repetiu. A agenda, divulgada no site do ministério, informa que Ana embarcou para o Rio às 19h24 de 7 de abril, uma quinta-feira. No dia seguinte, há relatos oficiais de compromissos na cidade. Não há atividades registradas no fim de semana, entre os dias 9 e 10 – as datas nem são mencionadas. Na manhã da segunda-feira, a ministra foi a São Paulo e, à noite, retornou a Brasília. Ana ganhou R$ 2.558,53 por 4,5 diárias. Ela admitiu ter recebido diária de R$ 581 pelo domingo, não trabalhado, e disse que, no sábado, teve uma reunião não inserida na agenda.

A ministra recebeu R$ 3.584,70 por 6,5 diárias de 15 a 21 de abril. O dia 15 era uma sexta-feira. A agenda relata o embarque para o Rio às 11h12 para um evento às 17h. Não há menções a trabalho no fim de semana. Ana admitiu que recebeu, no mínimo, uma diária de R$ 581,50 em dia sem agenda. A ministra, de acordo com a agenda oficial, ficou no Rio até quarta-feira, quando foi a Ouro Preto participar de evento na quinta-feira, em homenagem ao Dia de Tiradentes.

Cartões. A diária dos ministros foi regulamentada pelo Ministério do Planejamento em 2009, após o escândalo dos cartões corporativos. Os créditos dos cartões eram usados de maneira abusiva por servidores e autoridades, incluindo ministros. O governo decidiu estipular o uso de diárias para hospedagem e alimentação. O valor vai de R$ 458 a R$ 581, dependendo do destino.

Do "nunca antes" ao "agora vamos fazer assim": mudancas na politica externa

Declarações retóricas sobre direitos humanos pode até ser uma evidência, prima facie, de que algo está mudando, mas nem sempre para melhor, pois deixar de fazer grandes bobagens feitas antes é apenas uma evidência, enviesada, de que se está corrigindo o que de errado se fez antes (retirando o bode da sala), não necessariamente de que se vai passar a fazer as coisas certas a partir de agora.
Os verdadeiros testes ainda não vieram. Pode ser que apareçam proximamente.
Paulo Roberto de Almeida

Radares atentos à visita de Chávez
Coluna Conexão diplomática - Silvio Queiroz
Correio Braziliense, 07.05.2011

Observadores tentarão uma vez mais discernir o que muda e o que se mantém na política externa brasileira com a troca de governo

Muita gente vai estar de olhos e ouvidos atentos para os mínimos detalhes do encontro desta terça-feira entre a presidente Dilma e o colega Hugo Chávez, que volta a Brasília depois de um galante beija-mão na posse e duas visitas adiadas. Em diferentes círculos diplomáticos, observadores tentarão uma vez mais discernir o que muda e o que se mantém na política externa brasileira com a troca de governo. Até aqui, uma das linhas de continuidade mais enfatizadas é justamente a prioridade para a integração sul-americana — uma empreitada na qual Lula teve de empenhar repetidas vezes seu prestígio em operações deixa-disso envolvendo o presidente venezuelano, muito especialmente com a Colômbia sob governo de Álvaro Uribe.

Para os Estados Unidos, o Brasil tem sido nos últimos anos um intermediário precioso com o bloco bolivariano, que inclui ainda Bolívia, Equador e Nicarágua, sem falar em Cuba. Mais de uma vez, a diplomacia americana fez notar o conforto de contar com um líder regional sob comando “equilibrado” e “responsável” em uma vizinhança que, por desatenção de Washington, habituou-se a seguir rumos próprios. Mas também os europeus, que sempre sondaram com interesse a relação Brasília-Caracas, acompanham agora o primeiro encontro bilateral entre Dilma e Chávez na expectativa de divisar quais serão as linhas de colaboração e até onde os conselhos do Planalto continuarão a ter ouvido em Miraflores.

Noves fora, depois do evidente ajuste de tom na relação com o Irã, marcada pela aprovação ao envio ao país de um relator da ONU para a situação dos direitos humanos, a Venezuela é vista como um novo teste sobre o alcance da reorientação. Na China, o tema foi claramente esquivado. E logo mais, em algum momento, será o momento de aferir como Dilma se comportará em relação a Cuba.

Rédea curta
Uma mudança que não escapou à vista dos círculos diplomáticos é a sintonia mais estreita entre Planalto e Itamaraty desde o começo do novo governo. Ao menos nesses primeiros três meses, ficou evidente que Dilma e o ministro Patriota conversam com intensidade e frequência. Segundo circula, a autonomia de outros ministérios para contatos externos está sendo visivelmente disciplinada. “Já falou com o Patriota?”, é a resposta-padrão que os titulares das diversas pastas têm recebido quando anunciam à presidente alguma iniciativa além-fronteiras.

O galho de cada um
Igualmente sintomático tem sido o perfil bem mais discreto do assessor internacional do Planalto, Marco Aurélio Garcia, em especial nas relações com os governos vizinhos. É verdade que foi ele fez uma visita inaugural estratégica a Cuba, no início de março. Mas, ao contrário do que foi uma constante nos anos Lula, foi Patriota em pessoa quem começou a estabelecer elos com os vizinhos sul-americanos, uma área que o ex-presidente gostava de explorar mais de perto, enviando seu assessor para colher impressões e transmitir mensagens.

Burca justa
E foi justamente de Chávez, afinal, que veio a nota dissonante na reação à morte de Osama bin Laden. Enquanto os primeiros governos começavam a congratular-se com Barack Obama, o presidente venezuelano antecipou-se até mesmo a Fidel Castro na condenação da operação dos comandos americanos no Paquistão.

E, se Caracas chamou a atenção pela eloquência, a reação brasileira foi vista em certas áreas como acanhada demais, quase envergonhada. Embora o chanceler tenha falado sobre o tema, a ausência de uma nota oficial do governo foi notada. E a impressão de alguns diplomatas foi de que o país pareceu pouco à vontade para dizer como viu a notícia propriamente dita.

A imoralidade erigida em sistema: politica no Brasil

Sem comentários. (E precisa?)

PT prepara churrasco e shows para a volta de Delúbio
Denise Madueño
O Estado de S.Paulo, 7/05/2011

Uma semana depois de ser reintegrado ao PT, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, réu no processo que apura o esquema do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), será homenageado hoje em Buriti Alegre (GO), sua cidade natal. O diretório municipal do partido, com a ajuda do prefeito da cidade, o petista João Alfredo Mello Neto, vai promover uma grande festa para o ex-tesoureiro, expulso em 2005 por “gestão temerária”.

Essa será a primeira mostra de boas-vindas. No dia 26, uma megacelebração está em preparação pela direção municipal do PT em Goiânia, com shows de artistas locais, discursos e apoios políticos.

Petistas amigos de Delúbio apostam que seu futuro político será sair como candidato a uma vaga de deputado federal por Goiás em 2014. O irmão do ex-tesoureiro, Carlos Soares, já anunciou sua candidatura à vereador de Goiânia. Soares não conseguiu se reeleger a uma vaga na Câmara Municipal nas últimas eleições, mas, com a ajuda de Delúbio, espera voltar ao cargo.

“Vamos dar as boas-vindas a Delúbio. O PT virou uma grande família e estamos recebendo o nosso filho de volta”, afirmou Ivanor Florêncio, ex-presidente do PT de Goiânia, assessor da prefeitura da cidade e um dos organizadores da festa de boas-vindas. O petista espera reunir em torno de 500 pessoas no dia 26. “Delúbio é muito querido. É uma pessoa muito especial em Buriti Alegre e em Goiânia.”

Em Buriti Alegre, distante cerca de 150 quilômetros de Goiânia, a festança deve reunir em torno de 15 prefeitos da região, companheiros de partido e familiares do petista no ginásio de esportes da Paróquia Nossa Senhora Abadia, alugado pelo diretório municipal do PT. “Como ele ficou fora do partido, queremos fazer um ato de boas-vindas para ele”, justificou o prefeito João Alfredo.

Hugo Chavez na UnB: grande contribuicao ao pensamento politico mundial

O fato de Hugo Chavez comparecer na UnB para uma palestra cujo tema é "Independência e Revolução: o Continente Rebelde" -- e que antecipamos será um sucesso total, com atropelos entre estudantes ávidos de saber e uma imprensa avassaladora na cobertura -- representa, sem dúvida alguma, uma enorme contribuição para uma reflexão profunda sobre o sentido da revolução e do pensamento rebelde para os dias de hoje.
Exatamente o que necessitamos, desesperadamente, no Brasil de hoje, um país relutante em engajar reformas e em revolucionar ideias arcaicas que ainda perduram por ai.
Hugo Chávez vai demonstrar com todas as letras, e no seu estilo peculiar, que é possível, sim, revolucionar todo um país e provocar transformações profundas em suas estruturas econômicas, políticas, sociais, morais, educacionais, produtivas, filosóficas (you name it...), de maneira tão profunda, que não se deixa pedra sobre pedra do sistema corrupto, moralmente degradante, economicamente injusto, politicamente oligárquico que vigia anteriormente.
O Brasil está precisando de uma transformação similar.
Hugo Chávez veio para nos dizer exatamente o que fazer, como fazer: resistir contra o império é não só possível, como necessário.
Ele vai ter sucesso, podem crer. Vai ser um sucesso, total e absoluto.
Mas, não assistirei: excesso de gente, atropelos, desconforto. Prefiro ler, depois, o que ele disser. Vai confirmar tudo aquilo que eu penso dele e de seus experimentos.
Aliás, a proposta do DCE, que convidou Chávez, "é rediscutir o desenvolvimento latino americano", no que eles tem muita razão. Hugo Chávez é a melhor pessoa para fazer isso.
Um must, de verdade.
Paulo Roberto de Almeida

O Diretório Central dos (as) Estudantes, em parceria com a Fundar (Fundação Darcy Ribeiro) e Embaixada da Venezuela, convidam para uma palestra do presidente Hugo Chávez: "Independência e Revolução: o Continente Rebelde".
Nossa proposta é rediscutir o desenvolvimento latino americano, este será o primeiro de uma série de encontros com representantes dos países da região.

Dia: 10/05
Horário: 18hs
Local: Memorial Darcy Ribeiro
Cartaz: http://twitpic.com/4u7okp

O evento será transmitido por um telão na parte externa do Memorial.

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O governo "produz" inflacao - Raquel Landim (OESP)

Não, não é ela quem diz que o governo produz inflação. Sou eu.
Trata-se de uma acusação grave, aos olhos de alguns.
Não na opinião dos monetaristas (eu não sou um, adianto de imediato), para quem toda inflação é um problema (ou processo) essencialmente monetário.
E quem "produz" dinheiro? O governo! Logo...
Enfim, o governo produz inflação ao não atacar de imediato fatores que ele CONTROLA (e não são os preços das commodities, obviamente) e que ele até estimula na expansão: como o crédito exagerado, os gastos públicos irresponsáveis, essa ânsia de criar empregos e produzir crescimento da renda que beira à insanidade, pois ele quer fazer tudo sozinho, e para isso precisa do dinheiro da sociedade, que ele vai buscar nos nossos bolsos, compulsoriamente (via impostos diretos, indiretos, taxas, contribuições, adicionais disso e daquilo), e no caixa das empresas (pelos mesmos expedientes, só que obrigando cada empresa a gastar horas, centenas delas, apenas se dedicando a uma tarefa perfeitamente inútil: recolher impostos, provar que o fez e guardar todas as provas de sua fiabilidade fiscal).
Um governo assim só pode ser maluco, além de irresponsável quanto aos mecanismos inflacionários.
Estamos pagando o preço de um governo ativista.
Mas o que mais me chamou a atenção nesta "crônica" econômica dessa jornalista do Estadão, foi esta frase, anódina, ao final:

"A ata do Copom deve ser lida nas entrelinhas, dizem os especialistas. As entrelinhas não deixam dúvida que a percepção do BC sobre a gravidade da inflação mudou."

Duas coisas: eu também acho, e acho que o BC perdeu tempo acreditando que essas tais medidas macroprudenciais iriam funcionar, antes de voltar aos velhos juros cruéis e exorbitantes.
Mas, isso me lembra um minitratado que fiz, alguns anos atrás, sobre as entrelinhas, neste link:

Minitratado das entrelinhas

Divirtam-se com um, desesperem-se com o outro, espero que corretamente...
Paulo Roberto de Almeida

O fim da “louvação” das medidas macroprudenciais
Raquel Landim, Blog O Estado de S.Paulo
28 de abril de 2011 | 18h04

Fiz agora um exercício simples: comparar a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada hoje e o mesmo documento que veio a público no mês passado. Na verdade, comparei mais detalhadamente a seção de implementação da política monetária, na qual o Copom dá mais dicas de sua visão sobre a inflação e seu comportamento futuro. Por essa leitura, parece que o entusiasmo do Banco Central com as chamadas medidas macroprudenciais ficou para trás.

O BC menciona em ambas as atas que as ações macroprudenciais (aperto do crédito) e as ações convencionais (alta dos juros) ainda terão seus efeitos incorporados à dinâmica de preços. Na ata de março, no entanto, a autoridade monetária utilizava um aposto para falar das medidas macroprudenciais: “um instrumento rápido e potente para conter pressões localizadas de demanda”. Na ata de abril, o aposto desapareceu. Em seu lugar, o BC diz que as ações macroprudenciais, e PRINCIPALMENTE as ações convencionais ainda vão impactar a inflação.

Na ata de março, o BC dedicou um parágrafo inteiro ao final do documento para ressaltar um cenário alternativo, no qual “a desaceleração da atividade doméstica, a complexidade do ambiente internacional e a eventual introdução de ações macroprudenciais” poderiam criar “oportunidades” para que a “estratégia de política monetária seja reavaliada”. Ou seja, com mais medidas macroprudenciais talvez fosse possível parar ou subir menos os juros. Na ata de abril, isso desapareceu.

Em seu lugar, o BC acrescentou que a melhor estratégia para garantir que a inflação perca fôlego e fique dentro da meta em 2012 é promover “ajustes das condições monetárias” por um período “suficientemente prolongado”. “Ajustes nas condições monetárias” significa subir os juros. As justificativas para um aperto “prolongado” são ”o balanço de riscos da inflação”, o “ritmo ainda incerto de moderação da atividade doméstica” e a “complexidade do cenário internacional”.

E mais um ponto importante. Logo no início do documento divulgado ontem, o BC repetiu que a inflação de serviços continua em patamar elevado, mas fez um comentário importante. No acumulado em doze meses até março, a alta dos preços do cabelereiro, borracheiro, médico, empregada doméstica, etc, atingiu 8,53%, maior variação desde agosto de 1997. Assim, a autoridade monetária demonstra preocupação com um conjunto de preços que reflete apenas a força da demanda interna e que não tem nada a ver com o crédito – ou seja, um setor no qual as medidas macroprudenciais não tem nenhum efeito.

A ata do Copom deve ser lida nas entrelinhas, dizem os especialistas. As entrelinhas não deixam dúvida que a percepção do BC sobre a gravidade da inflação mudou. O problema é que a teoria ainda não foi transformada em prática. Apesar de tudo que foi dito na ata divulgada hoje, na última reunião, o BC diminuiu a intensidade do aperto monetário e subiu a Selic apenas 0,25 ponto, abaixo dos 0,5 ponto do encontro anterior.

Mercosul 20 anos (2): desvio dos objetivos primordiais - Paulo Roberto de Almeida

Anuncio a publicação de meu mais recente trabalho:

Uma história do Mercosul (2): desvio dos objetivos primordiais
Revista Espaço Acadêmico (vol. 10, n. 120, maio 2011, p. 112-117; ISSN: 1519-6186)
Link: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/13250/6976
Relação de Originais n. 2258; Publicados n. 1032.

Esclareço que o primeiro desta série, tinha sido publicado nesta forma:

Uma história do Mercosul (1): do nascimento à crise
Revista Espaço Acadêmico (vol. 10, n. 119, abril 2011, p. 106-114; ISSN: 1519-6186)
Link: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/13086/6864
Relação de publicados n. 1028.

A esquizofrenia economica do G20 comercial -- protecionismo agricola chines

Quando o G20 (comercial) foi constituído, em Cancún, em setembro de 2003, o governo Lula (o presidente, o chanceler e outros iludidos) saíram alardeando por aí as virtudes eméritas do novo grupo de países em desenvolvimento. O presidente, que gosta de figuras ilustrativas (geralmente erradas) chegou a falar que "tínhamos dado um truco nos países desenvolvidos". Um erro crasso, pois a única coisa que fizemos foi impedir que europeus e americanos consumassem um acerto agrícola às nossas custas na Rodada Doha da OMC.
Mas eu alertei, desde o início, para o caráter totalmente esquizofrênico do G20 comercial, composto de exportadores agrícolas competitivos, que pretendiam reduzir o protecionismo agrícola e o subvencionismo renitente dos países avançados, ao mesmo tempo em que se calava, e de fato protegia, o subvencionismo e o protecionismo agrícolas de alguns dos seus próprios membros, a começar pelos gigantes China e Índia.
Ora, todos sabemos que se houver expansão da demanda agrícola no mundo ela virá sobretudo de países emergentes, como os dois citados.
Defender, ocultar, até proteger as práticas deletérias desses dois grandes nos mercados agrícolas mundiais só pode ser visto, assim, como uma burrice monumental, como uma ação deletéria do ponto de vista dos interesses nacionais, como uma traição à pátria.
Sempre me surpreendeu que jornalistas não chamassem a atenção para esse fato, no entanto tão evidente. Parece que agora começam a fazê-lo.
Não sei se burrice é contagiosa, mas no caso de certas pessoas do governo anterior, a motivação era puramente ideológica e totalmente estúpida, para sermos mais claros...
Paulo Roberto de Almeida

O protecionismo agrícola chinês
Raquel Landim
O Estado de S.Paulo, 4 de maio de 2011

Não é nenhuma novidade contar que a China é um grande comprador de commodities brasileiras. O país asiático se tornou o maior parceiro comercial do Brasil adquirindo minério de ferro, soja e petróleo. Esses produtos respondem por mais de 80% das exportações brasileiras para a China. Em sua recente viagem a Pequim, a presidente Dilma Rousseff arrancou um compromisso – ainda teórico – dos chineses de aumentar as compras de manufaturados do Brasil.

Fica a impressão de que a China é um excelente cliente dos agricultores brasileiros, que vendem matérias-primas. É verdade, mas apenas em parte. A China é hoje o principal comprador de soja brasileira e absorveu 66% do grão vendido pelo País no exterior no ano passado, o equivalente a US$ 7,92 bilhões. O problema é que esse produto responde por mais de 90% das exportações agrícolas do Brasil para a China. Não parece, mas os chineses são extremamente protecionistas na agricultura.

“Se a China exporta manufaturados para o Brasil, tem que compensar e permitir a entrada de nossos produtos agrícolas. É nesse setor que somos competitivos”, disse ao blog Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação dos Exportadores de Carne Suína (Abipecs). “Queremos que o governo demonstre aos chineses as dificuldades que a nossa agroindústria enfrenta com as barreiras sanitárias”, completou Carlos Gilberto Farias, presidente do conselho da agroindústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Vejam o exemplo da própria soja. Mais de 90% das exportações brasileiras são de grão, ao invés de farelo e óleo, que possuem valor agregado mais alto. Os chineses praticam uma “escalada tarifária” no complexo soja: cobram 3% de imposto de importação do grão, 5% do farelo e 9% do óleo. O setor também desconfia de outras barreiras informais, como isentar apenas o grão de impostos internos. Com essas políticas protecionistas, os chineses desenvolveram uma robusta indústria processadora de soja e desestimularam essa atividade no Brasil. A China é hoje o quarto maior produtor mundial de soja, com 17 milhões de toneladas, mas esmaga 50 milhões de toneladas.

A avaliação do agronegócio brasileiro hoje é que a melhor estratégia é tentar viabilizar a exportação de carne para a China. A produção de carne bovina, suína e de frango representa uma agregação de valor ainda maior, porque os animais são alimentados com ração a base de farelo de soja e milho. Mas não é tarefa fácil. Na visita de Dilma, foi liberada a importação de carne suína proveniente de treze frigoríficos. A batalha de conquista desse imenso mercado deve ser dura.

A China já permite a entrada de carne bovina e de frango do Brasil, mas os volumes exportados ainda são insignificantes por conta das retrições de cotas e do pequeno número de frigoríficos habilitados a exportar. No ano passado, os chineses absorveram 130 mil toneladas de carne de frango e apenas 1,4 mil toneladas de carne bovina do Brasil. As exportações totais do País chegam a 3,8 milhões de toneladas de carne de frango e 1,2 mihão de toneladas de carne bovina.

A pedido do blog, André Nassar, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone) , calculou quanto o Brasil perde com o protecionismo agrícola chinês. Ele avaliou os setores de soja, carnes, açúcar e algodão. O levantamento considerou que, sem as barreiras, o Brasil pode alcançar nas importações chinesas a mesma participação nesses produtos que detém no mundo. Isso significa US$ 1 bilhão a mais em exportação por ano.

É importante vender mais manufaturados para a China, país cujo consumo cresce exponencialmente. Mas a verdade é que pouquíssimos setores tem condições de competir com a máquina de produção chinesa. O agronegócio é um deles. Vale a pena o governo brasileiro pressionar pela derrubada do protecionismo agrícola chinês.

A bolivarianizacao do Brasil? Talvez, segundo Klauber Pires

Eu não acho que o Brasil "conseguirá" chegar no estado (lamentável) em que se encontra hoje a Venezuela. Enfim, se dependesse apenas das mentes preclaras que comandam o governo talvez sim.
Mas acredito que a sociedade brasileira possui alguns anticorpos contra bobagens econômicas muito grandes. Permitimos as pequenas e médias bobagens econômicas -- por incompetência manifesta do governo -- mas parece que evitamos as grandes bobagens, nas quais incorrem ainda, por exemplo, os argentinos, com uma sofreguidão que chega a constranger qualquer pessoa que possua um mínimo de racionalidade.
Espero que meu amigo Klauber não esteja totalmente certo. Mas certamente ele tem razão quanto ao fundo...
Paulo Roberto de Almeida

Começou a bolivarianização do Brasil
Klauber Cristofen Pires
Blog Libertatum, 06 May 2011

A recente escassez no abastecimento de álcool (recuso-me a chamá-lo de "etanol") tem proporcionado à Sra Stela a propícia condição de aproveitar a crise criada pela sua própria gestão para justamente desferir dois golpes marcantes no bom funcionamento do livre mercado: passará o controle da comercialização e da estocagem do álcool para a ANP e colocará a Petrobras para participar mais intensamente da cadeia da produção, com a meta de triplicar de 5% a 15% sua fatia no mercado até o fim deste mandato presidencial, a concorrer em pé de franca desigualdade com o empresariado. Seguindo a estratégia militar soviética do ataque em pinças, enquanto a primeira ficará encarregada de sabotar a concorrência, a segunda virá para estatizar o setor.

O álcool tem uma história a contar: lá pelos idos nos anos 80, uma grande campanha promovida pelo governo como parte de uma política de substituição de importações lançou o programa do álcool, constituída de generosos incentivos aos usineiros, especialmente os nordestinos, a ser distribuídos e gerenciados pela imaculada Sudene.

Eram tempos difíceis aqueles. O petróleo constituía o principal item de importação, sobrepujando sozinho todos os demais produtos e causando grande impacto na balança comercial, a exercer forte pressão desvalorizadora da moeda e causadora de inflação. Não que tudo devesse ser obrigatoriamente assim, mas as políticas de então geravam este tipo de resultado.

De qualquer forma, havia, de fato, sim uma crise internacional do precioso líquido, e o Brasil buscava por meio da iniciativa estatal alguma solução alternativa, que no caso, veio pelo Proálcool. O programa teve relativo sucesso, a ponto de a frota de veículos de passeio movida ao biocombustível ter quase chegado a cem por cento da produção. Entretanto, como dizem, o inferno é cheio de gente de boas intenções, e o empreendimento teve o seu calcanhar-de-Aquiles atingido pelos rombos das dívidas impagáveis dos usineiros, resultantes de uma combinação de preços controlados, concessões de créditos mal-administradas, falta de liberdade comercial e também por muitas fraudes.

Com a derrocada deste malogrado arranjo, crises sucessivas de abastecimento do álcool foram frustrando severamente os consumidores, que foram assim retornando ao consumo da gasolina. Ainda me lembro razoavelmente bem do tom jocoso que um certo ministro empregou para dar a solução rogada pelo repórter à constante escassez do produto: "- em casa, temos dois carros, um a álcool e o outro a gasolina", então quando um dos dois está em falta, eu uso o outro". Disse isto de forma acintosa e debochada, como se fosse algo muito simples e trivial, isto é, como se cada brasileiro tivesse mais de um carro na garagem. Agradeço a quem vier recordar a mim e aos demais leitores o nome deste ilustre cretino.


Há que se adiantar a isto que até então a própria indústria automobolística gozava de uma espécie de oligopólio e em decorrência deste fato agia como se vender um carro fosse um favor prestado ao consumidor, daí ter entregado ao "mercado" autênticas carroças (Sim, FCM tinha razão) com uma qualidade tal que a adaptação ao motor a álcool era feita com materiais pouco resistentes à corrosão e o ato de efetuar a partida era extenuante, com sucessivas falhas e a exigir que os motoristas ficassem vários minutos para "esquentar" o seu automóvel antes de tirá-lo da garagem.

Enfim, um belo dia, a história do carro a álcool simplesmente desapareceu, com proálcool e tudo...
........................

Alguns anos mais tarde, partindo do zero, alguns empresários de São Paulo começaram a reviver a produção alcooleira com a finalidade de oferecer uma alternativa à pior gasolina do mundo, que não por acaso ainda é fornecida por uma empresa estatal. Foram crescendo, no vácuo do preço do combustível fóssil, e desta vez em estreita sintonia com uma indústria automobilística renovada pela abertura do mercado, que passou a aferecer a fantástica tecnologia "flex", tanques, dispositivos e dutos bem resistentes e além disso, partidas instantâneas a qualquer tempo e o pronto desempenho do motor mesmo nos dias mais frios.

Tudo isto aconteceu sem sem planos mirabolantes, sem reservas de mercado, sem linhas de financiamento privilegiadas, enfim, sem nenhuma "ajuda" estatal. Somente o mercado pelo mercado, e quem não quisesse, que continuasse com seu carro a gasolina.

Pois, eis que em um momento quando novamente o álcool está na dianteira, o governo cresce o olho!

Desde então, foram retomadas as políticas públicas de acompanhamento de preços, de controle de estoques, enfim, do controle sobre as áreas de plantio, com especial prejuízo para os agricultores amazõnicos, só para atender à sugestão do Sr Fidel Castro, Al Gore e Bill Clinton, que saíram à rua com o trombone na mão para protestar que a atividade que consome somente 1% da área de plantio utilizada estava roubando espaço para a produção dos alimentos!

Enfim, o governo Lula e agora, o governo Dilma, tão sedizentes preocupados com o preço e com a garantia do abastecimento, estão conseguindo proporcionar aos consumidores novos períodos de prolongada escassez e de remarcações seguidas.

A bolivarianização do Brasil já vem seguindo um longo e suave cronograma, e agora começa a dar os seus desfechos práticos, afinal. Quem até aqui estava cochilando, acordará com tickets de racionamento à moda de como hoje acontece na Venezuela.

Situacao economica continua preocupante - Rolf Kuntz (Estadao)

Um resumo da atualidade econômica, pelo principal editorialista econômico do Estadão.
eu até deveria dizer "desatualidade", pois o governo insiste em reincidir nos mesmos erros de um passado que se esperava remoto, quando era o próprio governo que produzia a incompetência que redundava na inflação, na fuga de capitais, no ágio cambial e outros fenômenos nocivos.
Pensava que tínhamos aprendido com isso.
Eu pelo menos aprendi.
Mas o governo não parece ter aprendido, e continua a fazer as mesmas bobagens do passado.
Deve ser por atavismo "desenvolvimentista" mal fundamentado.
Paulo Roberto de Almeida

A festa e a conta
Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 27 de abril de 2011

A economia brasileira continua em festa, e a conta, naturalmente, vai subindo. A inflação passa de 6% e pode superar o limite da banda oficial, 6,5%. Nas contas externas, o déficit em transações correntes bate recordes – US$ 5,7 bilhões em março, US$ 14,6 bilhões no primeiro trimestre e US$ 50 bilhões em 12 meses. A atividade cresce, as empresas lucram, os juros permanecem altos e a inundação de capital estrangeiro continua. Entraram US$ 42,6 bilhões entre janeiro e março, em termos líquidos. Esse dinheiro bastaria para cobrir quase o triplo do déficit em conta corrente do período. O investimento direto estrangeiro, US$ 27,3 bilhões, foi o principal componente da enxurrada financeira. Compensaria quase o dobro do buraco nas transações correntes. Esse tipo de investimento, em geral considerado o mais benéfico para a economia, deve chegar a US$ 60 bilhões em 2011, segundo o governo. Pelos prognósticos oficiais, o setor externo continuará seguro, o ajuste interno será conduzido gradualmente e no fim do próximo ano a inflação estará no centro da meta, 4,5%. Tudo se arranjará maciamente e sem dor.

Seria bom viver nesse mundo imaginado pelo ministro da Fazenda e por seus colegas de governo. Mas o gradualismo, até agora, produziu pouco ou nenhum resultado no combate à inflação. Ao contrário: os indicadores só pioraram desde o trimestre final do ano passado. A inflação tem um importante componente externo – as cotações das matérias-primas, afetadas pela quebra de safras, pela forte procura dos emergentes e pela crise no Oriente Médio. Mas quase dois terços dos preços têm subido, no mercado brasileiro, e esse dado só é explicável se for levada em conta a demanda interna muito forte. Essa mesma demanda se reflete na expansão das importações. A valorização do real sempre afeta as contas externas, barateando os produtos estrangeiros e encarecendo os nacionais. Mas não há como atribuir o desequilíbrio na conta corrente só ao desajuste cambial, quando todos os dados apontam para um mercado interno ainda muito aquecido.

O grande influxo de capital externo produz efeitos com sinais opostos. Permite cobrir o buraco das transações correntes. Assim se acomoda parte do excesso da demanda interna. Sem esse fator a inflação seria maior. Mas essa mesma enxurrada financeira mantém o real valorizado e mina o poder de competição dos produtores nacionais, pondo em xeque a sobrevivência não só de uma ou de outra empresa, mas de segmentos industriais.

Apesar do amortecedor propiciado pelas importações e pelo influxo de capitais, a inflação permanece elevada e tende a crescer. O gradualismo adotado pelo Banco Central (BC) desde o fim do ano passado pode ser insuficiente para a contenção da alta de preços. Aumentos maiores de juros poderão, no entanto, atrair volumes maiores de dólares.

Os controles de capitais produziram efeito pouco sensível até o mês passado. Neste mês, segundo o presidente do BC, Alexandre Tombini, entradas e saídas estão empatadas – um sinal, segundo ele, da eficácia das novas barreiras adotadas pelo governo. Pode ser, mas será necessário algum tempo mais para se confirmar essa avaliação. Além disso, controles de capitais nunca produzem mais do que efeitos temporários. Essa tem sido a lição mais comum da experiência internacional.

Fatores externos, como o baixo nível de atividade no mundo rico e o excesso de dinheiro nos mercados podem explicar em parte o problema cambial do Brasil. Fatores de atração, como o crescimento econômico, a lucratividade empresarial e os juros altos também entram na conta. Mas o dado politicamente mais importante é outro: o Brasil entrou na armadilha cambial bem antes da crise, por causa da teimosia de um governo disposto a gastar demais e acostumado a deixar ao BC o custo do combate à inflação. O real já estava supervalorizado antes do agravamento da crise em setembro de 2008. Só se depreciou por um período muito curto. A deterioração da conta corrente havia começado em 2007, foi contida por pouco tempo e acelerou-se quando a demanda interna voltou a se expandir velozmente. Os números são claros.

Para tirar o País da armadilha, o governo terá de aceitar um ajuste fiscal de verdade, muito mais sério que esse alardeado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento. Mas ninguém pode acreditar numa séria intenção de austeridade quando lê, por exemplo, o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias. Quanto ao resultado obtido pelo governo central em março, é insuficiente para confirmar a adoção de uma nova política. Além de uma boa dose de seriedade fiscal, o governo precisará cuidar para valer das condições de competitividade, passando da conversa às ações concretas. O resto é espetáculo.