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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 17 de abril de 2011

Mercosul aos 20 anos (2): crises e turbulências - Paulo Roberto de Almeida

Publiquei, no mês passado, o primeiro artigo desta série:

Mercosul aos 20 anos (1): um pouco de sua história
Paulo Roberto de Almeida
Especial para o iG, 28/03/2011

Agora, o segundo de não sei quantos, exatamente. Aguardem...
Paulo Roberto de Almeida

Mercosul aos 20 anos (2): crises e turbulências
Paulo Roberto de Almeida
Especial para o iG, 17/04/2011 (link)

A crise do Mercosul se deve a que os governos foram tímidos ou demoraram demais em fazer reformas necessárias e não prepararam os países para as etapas da continuidade e do aprofundamento da estabilização macroeconômica, ou para os ajustes setoriais vinculados aos requerimentos do processo de integração.

A crise no Mercosul foi frequentemente apontada como tendo sido causada pela “desvalorização” brasileira de 1999 e seus efeitos desastrosos sobre a balança bilateral com a Argentina, o que é absolutamente insuficiente como explicação. A Argentina já vinha acumulando desequilíbrios – fiscais, monetários, cambiais – desde muito tempo, tendo sido justamente “ajudada” pela primeira fase de estabilização brasileira, quando o real conheceu uma tendência à valorização relativa (deteriorando a própria balança comercial brasileira, e produzindo, justamente, superávits a favor da Argentina). A “desvalorização” não foi decidida “contra” a Argentina, uma vez que ela foi simplesmente imposta pela realidade dos desequilíbrios acumulados. Estes se manifestaram de forma aguda, no Brasil, mais do que de maneira sistêmica, como no caso argentino, que exibia um modelo de conversibilidade baseado na chamada paridade absoluta com o dólar, uma verdadeira camisa de força cambial.

A carência de análises, na esfera governamental, sobre as raízes profundas dos desequilíbrios monetários, cambiais e de balanço de pagamentos existentes tanto na Argentina quanto no Brasil, em 1999 e no seu seguimento imediato, assim como certo voluntarismo por parte de dirigentes políticos explicam a atmosfera de “crise política do Mercosul” então criada – mais na Argentina do que no Brasil – em torno da questão cambial e de seus reflexos no ambiente negociador ao seio do bloco, atmosfera que nunca chegou a ser recomposta no período subsequente, tanto pelo aprofundamento desses desequilíbrios quanto por divergências objetivas nas orientações de política econômica adotadas dali para a frente, para não mencionar questões prosaicas, como o relacionamento entre chefes de Estado. Mesmo a adoção de expedientes ad hoc para atuar como barreiras à propagação desse tipo de “crise” – como, por exemplo, a criação de um grupo de trabalho sobre a coordenação de políticas macroeconômicas em 2000, mais virtual do que efetivo – não permitiu retomar o processo de aprofundamento, ou de consolidação, do Mercosul comercial, enveredando-se logo depois para subterfúgios políticos e o desenvolvimento do que foi chamado de “Mercosul social”.

Não cabem dúvidas, porém, de que a passagem a um regime de flutuação cambial no Brasil – à falta de alternativas credíveis para sanar os desequilíbrios de transações correntes acumulados nos quatro anos anteriores – constitui apenas um episódio numa sucessão de descompassos efetivamente contrários aos objetivos estipulados no artigo 1º do TA, de “coordenação de políticas macroeconômicas”, cujo marco mais importante sempre foi a adoção pela Argentina de um regime de paridade absoluta – ou seja, de rigidez – em sua política cambial, sistema adotado no momento mesmo em que se tratava de construir o Mercosul. Ora, a coordenação cambial com a Argentina, nessas condições, implicava a adoção pelos demais países membros do mesmo regime de conversibilidade ao par, o que significava, de fato, o abandono de qualquer política cambial pelos Estados Partes do bloco, ou seja, uma não-solução a um problema real. Infelizmente, os dois grandes não conseguiram tampouco caminhar para esse tipo de coordenação quando, em 2001, a Argentina abandonou formalmente o regime de conversibilidade para também adotar um modelo de flutuação (embora administrada num viés de desvalorização desde então), ao passo que o Brasil, depois de comportamentos erráticos no momento das eleições de 2002, o câmbio seguia uma via de valorização gradual como tinha sido o caso no período anterior à flutuação (aliás, para maior conforto comercial da Argentina, que continua temendo uma desvalorização brasileira capaz de lhe retirar seu acesso privilegiado aos mercados do grande vizinho).

Em qualquer hipótese, não se pode atribuir a esses descompassos conjunturais nos ritmos ou processos de estabilização respectivos do Brasil e da Argentina a causa principal da crise no processo de integração, uma vez que eles já se manifestavam desde o início do processo e não impediram, de modo absoluto, o crescimento do comércio e o aprofundamento da integração nos primeiros oito anos do processo. Se eles se manifestaram negativamente depois foi porque, justamente, os governos foram tímidos nas reformas, demoraram demais em fazer reformas e não prepararam seus países para as etapas seguintes, seja a da continuidade e aprofundamento da estabilização, seja a dos ajustes setoriais para acomodar a agenda e os requerimentos do processo de integração, que representa uma espécie de mini-globalização controlada (já que em grande medida administrada pelas burocracias nacionais).

Em resumo, rejeitando as supostas insuficiências institucionais, as fantasmagóricas assimetrias estruturais e os reais, mas exagerados choques adversos advindos de crises conjunturais, tem-se que os fatores efetivos da crise no Mercosul e os impedimentos objetivos para o seu progresso continuado são constituídos: em primeiro lugar, pela incapacidade ou indisposição dos governos em empreenderem as tarefas mínimas associadas ao próprio processo de integração; em segundo lugar, pela falta de vontade, ou de coragem política, dos mesmos dirigentes, de implementar os acordos, normas e decisões adotadas nas reuniões de cúpula do bloco, depois de solenemente, ou de forma ingênua, em alguns casos, terem decidido avançar no processo por meio de medidas aceitas consensualmente, o que foi feito, supostamente, depois de um cuidadoso exame técnico sobre seu custo-benefício, ou seja, sobre os impactos e efeitos imediatos e delongados que as mesmas trariam para suas economias.

Avultam, dentre as inadimplências constatadas, os processos delongados de internalização das decisões adotadas solenemente pelo bloco – pois que quase nada é aplicado de maneira automática no Mercosul, sendo necessária cada uma das aprovações nacionais e sua confirmação pela chancelaria paraguaia – e os descumprimentos práticos, em grande medida ilegais, dos dispositivos regulando o acesso a mercados. Um dos anexos do TA, por exemplo, relativo à cláusula de salvaguarda, indica que os Estados Partes se comprometem a usar esse dispositivo só excepcionalmente, e apenas até o final do período de transição (31/12/1994).

Não é desconhecido por ninguém que, de forma abusiva e arbitrária, a Argentina contrariou seus compromissos sob o TA – e também desrespeitou o código pertinente, no âmbito do Gatt-OMC – ao passar a introduzir salvaguardas discriminatórias contra produtos brasileiros, de forma crescente a partir de 2003; a leniência demonstrada pelo governo brasileiro em relação a essas medidas ilegais, alegadamente para acomodar os projetos argentinos de recuperação econômica e de reindustrialização, em lugar de reforçar o Mercosul, na verdade fragilizam seu arcabouço institucional e enfraquecem a eficácia de suas normas mais relevantes. No regime europeu de violações aos instrumentos fundacionais, o país que rompe compromissos e regras comuns, sobre acesso a mercados, por exemplo, pode ser sancionado, inclusive pecuniariamente, pela corte de Justiça, recurso inexistente no caso do Mercosul (ainda que se admita levar o caso à arbitragem, hélas, não usada pelo Brasil).

Numa avaliação global, pode-se dizer que a distância entre a retórica da integração, excessivamente usada pelos chefes de Estado, e a marcha efetiva do processo, em seus encaminhamentos práticos, tem sido, no Mercosul e em outros esquemas regionais, uma realidade constante desde que líderes políticos se convenceram, ou foram convencidos por outros, de que o modelo integracionista – e não simplesmente livre-cambista, geralmente privilegiados pelos anglossaxões pragmáticos – de cunho europeu (ou seja, menu completo) era o mais adequado para impulsionar o desenvolvimento de seus países e a integração de suas economias no mainstream mundial. Na raiz dessa incompreensão – ou ilusão – está o fato de que o processo europeu foi de fato bem sucedido naquilo que ele pretendia atingir: o desarme “psicológico” e definitivo entre as duas maiores economias continentais e a realização formal, institucional, daquilo que já vinha ocorrendo naturalmente desde séculos: a integração física, econômica e social do mosaico europeu.

Poucos historiadores da Europa, ou de seu processo de integração, se dedicaram ao estudo dos custos – implícitos e explícitos – da integração europeia, preferindo enfatizar seus benefícios reais ou supostos (e eles, de fato foram muitos, mas cabe aos analistas equilibrados sempre fazer um balanço completo do experimento). Da mesma forma, poucos analistas do Mercosul colocam ênfase nas enormes diferenças entre os processos do Cone Sul e do continente europeu, tanto pelo lado positivo – disparidade de grandes conflitos geopolíticos entre os dois grandes – quanto pelo lado “negativo”, ou seja, inexistência de densidade suficiente nas interdependências recíprocas para fundar um processo real de criação de um espaço econômico conjunto.

No caso do Mercosul, em especial, o mimetismo não foi levado ao ponto alto de suas possibilidades teóricas – ou seja, um modelo reconhecidamente comunitário ou supranacional –, mas mesmo se julgarmos pelo outro modelo europeu de integração em nível de união aduaneira, o Benelux (Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo, desde 1948), os resultados alcançados são decepcionantes, ou mesmo irrisórios, pelos padrões de responsabilização – ou de accountability – pelos quais devemos medir projetos verdadeiramente “estratégicos”, e definidos como tal, por administrações sucessivas. O fato é que, sem ter alcançado seus objetivos primários – uma zona de livre-comércio completa e uma união aduaneira acabada – os países membros se deixam envolver em novos projetos mirabolantes – como um Fundo de Correção de Assimetrias, um Parlamento completo, institutos para diferentes causas sociais, e até um risível projeto de moeda comum – que representam, na verdade, uma “fuga para a frente” e um escapismo de natureza política à sua incapacidade de realizar o prometido e de cumprir os requisitos mínimos dos objetivos fixados nos instrumentos constitutivos.

Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas, mestre em Planejamento Econômico pela Universidade de Antuérpia, diplomata, professor de Economia Política nos programas de Mestrado e Doutorado do Uniceub. Site: www.pralmeida.org; Nenhum dos argumentos ou posições apresentados neste ensaio especulativo – em caráter exclusivamente pessoal – representa posições oficiais do governo brasileiro ou podem ser identificados a propostas do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.

Socialismo cubano com caracteristicas chinesas? Nao vai dar certo...

Os comunistas cubanos, responsáveis diretos por uma economia miserável e por uma das mais bárbaras ditaduras do hemisfério -- aliás a única que restou, embora um coronel esteja tentando criar outra ali por perto --, necessitam reformar urgentemente seu sistema anacrônico, esclerosado, corrupto, ineficiente, indecente.
Para isso querem preservar a ditadura do partido único -- e os privilégios da burocracia dominante -- e introduzir reformas cosméticas para permitir o renascimento do capitalismo na ilha. Esperam viver das rendas do capitalismo, e preservar sua autocracia senil.
Já vou avisando: não vai dar certo.
Aposto com quem quiser, como essa passagem vai ser caótica, desordenada e vai terminar em desordem, antes de voltarmos a um regime capitalista normal, ou seja, corrupto, deficiente, desigual, enfim, igualzinho ao que temos no resto da América Latina. Com a diferença que existem agora muitos cubanos ricos na Flórida. Eles vão apimentar o capitalismo cubano, com um pouco de tudo: capital, inovação, modernidade, mas também drogas, prostituição, corrupção, enfim, nada de muito diferente do que já existe, com a grande diferença que o povo não vai mais passar fome...
Paulo Roberto de Almeida

Começa o Congresso do Partido Comunista Cubano. Modelo econômico do país vai mudar
Raul Castro anunciou, em 2010, a necessidade de reduzir o paternalismo estatal
(17/04/2011)

Cuba está às vésperas de aprovar importantes medidas para a atualização do modelo econômico. Deste sábado até terça (16 a 19) ocorre o 6º Congresso do Partido Comunista Cubano, o primeiro em 14 anos. As mudanças econômicas vêm sendo tratadas em todo o país desde meados de 2010, quando o presidente Raul Castro anunciou a necessidade de reduzir o paternalismo estatal e garantir maior equilíbrio econômico. “A revolução é mudança permanente”, lembrou o dirigente que promoveu um amplo debate sobre a proposta em todo o país. “Temos o dever essencial de corrigir os erros que cometemos durante essas cinco décadas de construção do socialismo em Cuba”, explicou o presidente, que sucedeu o irmão Fidel Castro.

Associações, sindicatos, cooperativas, os Comitês de Defesa da Revolução e meios de comunicação da ilha realizaram intensas discussões sobre o projeto para abranger os 11,2 milhões de cubanos. Serão medidas duras, mas necessárias. Devem ser demitidos cerca de 500 mil cubanos inicialmente e mais de 1,2 milhão nos próximos anos.

Estima-se que 20% de um total aproximado de 5 milhões de servidores públicos estejam em funções obsoletas. A proposta é que sejam realocados para outras atividades estatais ou estimulados a atuar em 178 serviços privados, atuando por conta própria. Cerca de 300 mil “cuentapropistas” já estão registrados, sendo que a metade se inscreveu depois da abertura de novas condições de trabalho em outubro.

Também está na pauta a criação de uma rede de cooperativas urbanas e rurais para estimular a ida para este modelo associativo; maior autonomia das empresas estatais, descentralização do setor agroalimentar, redução dos subsídios e estabelecimento de um sistema fiscal. Talvez a mudança mais substancial seja a eliminação da cartela de abastecimento — “libreta” — uma cesta de alimentação subsidiada.

“Não podemos seguir adiante sem estas transformações. Precisamos produzir mais comida e mais bens”, reforça o líder da Central de Trabalhadores de Cuba, Raymundo Fernandez. E esclarece: ”É uma atualização do socialismo”

sábado, 16 de abril de 2011

O governo reindexa a economia, e alimenta a inflacao

Parece que o governo é sócio na inflação. Aliás, governos irresponsáveis, sempre foram os responsáveis pela inflação, que lhes trazem receitas crescentes, ao mesmo tempo em que pagam contas e salários em moeda desvalorizada.
Esse jogo foi interrompido durante certo tempo, após o Plano Real.
Mas parece que o governo atual voltou ao jogo outra vez...
Paulo Roberto de Almeida

Governo prevê salário mínimo de R$ 616 no ano que vem
- RENATA VERÍSSIMO E CÉLIA FROUFE
AGENCIA ESTADO, 15/04/2011
Valor é previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2012; valor chegaria a R$ 676,35 em 2013.

Preparem-se para o pior. Apertem os cintos para entrar na zona de turbulência.

Desigualdade nos Estados Unidos - The Economist, Joseph Stiglitz (Vanity Fair)

Três artigos sobre a desigualdade na sociedade americana:

INEQUALITY
Of the 1%, by the 1%, for the 1%

By Joseph E. Stiglitz
Vanity Fair, May 2011
http://www.vanityfair.com/society/features/2011/05/top-one-percent-201105?currentPage=all

American politics
Democracy in America
Inequality: The 1% solution

The Economist, Apr 15th 2011, 15:03 by M.S.
http://www.economist.com/blogs/democracyinamerica/2011/04/inequality&fsrc=nwl

Inequality and politics
Stiglitz and the progressive Ouroboros

The Economist, Apr 11th 2011, 21:30 by W.W.
http://www.economist.com/blogs/democracyinamerica/2011/04/inequality_and_politics


Leiam todos os três, na sequência inversa, neste post do meu blog Textos PRA:

Desigualdade nos Estados Unidos - The Economist, Joseph Stiglitz (Vanity Fair)
Artigos sobre a desigualdade na sociedade americana
Sábado, Abril 16, 2011
http://textospra.blogspot.com/2011/04/desigualdade-nos-estados-unidos.html

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Governo so usa 0,25% da verba do PAC: que alivio....

Apenas a manchete:

Em 100 dias, governo Dilma usa só 0,25% da verba do PAC
Marta Salomon, de O Estado de S. Paulo - 15/04/2011

Promessas previstas na 2ª etapa do programa não saem do papel; só R$ 102 milhões foram liberados

Comento:
Ufa! Ainda bem.
Imaginem se o governo fosse só um pouquinho mais competente: a inflação já teria passado de 10%.
Ainda bem que temos um governo incompetente, incapaz de planejar, de fazer projetos decentes, totalmente incompetente para administrar obras, e mais ainda para fazer uso racional dos recursos "públicos" (que na verdade são nossos).
Se o governo fosse tudo o que ele não é, a situação seria muito pior.
Quremos mais governo incompetente, atrasado, relapso, preguiçoso...
(Claro, este, como o anterior, gasta muito dinheiro com bobagens, mas poderia ser muito pior...).
Paulo Roberto de Almeida

Agora o resto da matéria:

BRASÍLIA - Lançado em março de 2010 com discurso da então pré-candidata à presidência Dilma Rousseff, a segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC2, desapareceu na burocracia do governo da petista.

Propalada durante a campanha eleitoral, a implantação de centenas de unidades de pronto atendimento (UPAs) não saiu do papel. Na mesma situação, encontram-se também a construção de unidades básicas de saúde e a implantação de postos de polícia comunitária e de espaços integrados de esporte, cultura, lazer e serviços públicos, as chamadas "praças" do PAC.

Entre os gastos autorizados pela lei orçamentária para 2011, há quase R$ 1,3 bilhão destinados a esses projetos, voltados às populações das regiões metropolitanas. Mas, passados os primeiros cem dias de governo Dilma Rousseff, nenhum deles passou pela primeira etapa do processo de gasto público, o chamado empenho.

Levantamento feito pela ONG Contas Abertas a pedido do Estado mostra que, dos R$ 40,1 bilhões de gastos autorizados do PAC para 2011 - o Tesouro não faz distinção entre PAC1 e PAC2 -, valor que inclui as obras da primeira e da segunda versão do programa, apenas 0,25% (R$ 102 milhões) foram pagos até a última terça-feira, de acordo com registros do Siafi (sistema de acompanhamento de gastos da União).
A radiografia dos números mostra que as duas versões do PAC hoje avançam pela inércia, à custa de contratos realizados no ano passado, ainda no governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Assim, percebe-se que no mesmo período os pagamentos feitos foram dominados por obras e serviços contratados até o final do ano passado.

Esses pagamentos têm de ser feitos com o dinheiro arrecadado com tributos cobrados neste ano. Dos R$ 6,7 bilhões já pagos, R$ 6,6 bilhões referem-se a contas pendentes deixadas pelo governo Lula, inclusive da época em que Dilma Rousseff, na condição de chefe da Casa Civil, coordenava o PAC.

Paralisia. O projeto do PAC que recebeu o maior volume de dinheiro neste ano é mais um bom exemplo da situação de quase paralisia. Trata-se do Fundo de Arrendamento Residencial, dinheiro repassado às empreiteiras responsáveis pela construção de imóveis a famílias de baixa renda, selecionadas por prefeituras e governos estaduais.
O programa recebeu R$ 1,7 bilhão até 12 de abril. Esse dinheiro, no entanto, faz parte do saldo de contas pendentes deixadas por Lula, do qual faltam pagar mais R$ 5 bilhões. Os R$ 9,5 bilhões destinados ao programa pela lei orçamentária de 2011 nem começaram a sair do papel.

Grife. Com o programa patinando, o Ministério do Planejamento confirma que pode a mudança da nomenclatura PAC está em estudo no governo, que oficialmente insiste na tese de que não haverá cortes no programa.

Segundo o Planejamento, agora responsável pela coordenação do Programa de Aceleração do Crescimento, o próximo relatório de avaliação dos projetos será divulgado em julho. Até o final do governo Lula, os relatórios eram divulgados a cada quatro meses. Com Dilma na presidência, serão semestrais.

Sem registro do desempenho das novas ações, o portal do PAC ainda mantém a terminologia PAC 2, com explicações sobre o seu significado. "O PAC 2 chega com a missão de manter a roda da economia girando, investindo em obras e ações que diminuem as desigualdades e geram ainda mais qualidade de vida para os brasileiros".
O site não registra a mudança na periodicidade das avaliações. "A prestação de contas do PAC é feita para a sociedade através de balanços quadrimestrais."

Megainvestimento. O PAC 2 prevê investimentos de R$ 1,59 trilhão. São obras nas áreas de transportes e energia e também as que se destinam aos grandes centros urbanos, bairros populares e bolsões de pobreza. Entre os projetos do PAC 2 estão a ampliação do Minha Casa, Minha Vida e o Água para Todos, além do Cidade Melhor, segundo anúncio feito em março de 2010.

O novo foco em moradores das grandes cidades seria uma das novidades do PAC 2, se disse no lançamento do programa. Os investimentos seriam dirigidos a projetos de saneamento e mobilidade urbana. O Comunidade Cidadã ampliaria a presença do Estado em bairros populares. Haveria investimentos bilionários na construção de 500 unidades de pronto atendimento, 8,7 mil unidades básicas de saúde, mais de 10 mil quadras poliesportivas, 2,8 mil postos de polícia comunitária e 800 praças do PAC.

As faturas de obras já contratadas deixadas pelo governo Lula não param de pressionar os novos gastos do PAC. Até terça-feira, restavam por quitar contas de R$ 26,4 bilhões, quatro vezes o valor já pago nos primeiros cem dias de governo Dilma.

As mentiras contadas pelo poder - Demetrio Magnoli

Um artigo do sociólogo -- meu colega de "tribo", portanto, mas eu não me considero muito membro dessa confraria, por não exercício de função, a não ser analítica -- Demétrio Magnoli sobre as mentiras políticas que circulam atualmente no Brasil.
Como sempre, a versão (deformada) da história passa por verdade política. Mas ela precisa ser denunciada.
Destaco este trecho, que tem a ver com política externa:
Num “país de todos”, a política externa subordina-se a valores consagrados na Constituição, como a promoção dos direitos humanos. Sob o lulismo, a palavra constitucional vergou-se diante de ideologias propensas à celebração de ditaduras enroladas nos trapos de um visceral antiamericanismo. Em Cuba, Lula comparou os prisioneiros políticos do castrismo aos presos comuns brasileiros. Na ONU, os representantes do País opuseram-se a investigações e denúncias sobre violações de direitos humanos. Na América Latina, o Brasil deu cobertura ao enrijecimento do autoritarismo chavista, flertou com a reivindicação de concessão às FARC do estatuto de “força combatente” e engajou-se na aventura burlesca promovida por Hugo Chávez em Honduras. Alhures, numa iniciativa desastrosa, o Brasil tricotou o fracassado acordo tripartite com o Irã, escarnecendo da política internacional de não proliferação nuclear.

Fiquem com uma leitura crítica e reflexiva
Paulo Roberto de Almeuda

Partido Único
DEMÉTRIO MAGNOLI
Revista Interesse Nacional (n. 13, abril-junho 2011)

Há quase um ano, Dilma Rousseff deflagrava as atividades públicas de sua campanha presidencial com um périplo em Minas Gerais. O estado parecia, para petistas e tucanos, o terreno onde se travaria uma batalha eleitoral decisiva. Contudo, entre tantos lugares, a candidata de Lula embrenhou- -se pelas veredas de São João del Rei, até o túmulo de Tancredo Neves, no qual depositou flores. O gesto era mais que oportunismo eleitoreiro paroxístico. Havia, nele, uma declaração sobre a história. Meses depois, na primeira semana de horário eleitoral gratuito, José Serra colou um retrato de Lula à sua imagem, sugerindo uma associação política. O gesto, ilustração de manual de um truque oportunista autodestrutivo, continha uma declaração sobre a história. Tanto quanto a declaração de Dilma, era uma narrativa falsa, essencialmente mentirosa.

Em princípio, num plano superficial, as duas mentiras evidenciam a pobreza política de uma campanha presidencial na qual os protagonistas desdenharam a capacidade de discernimento dos eleitores. É um equívoco analítico, porém, tratá-las como falsificações simétricas. O triunfo de Dilma e a derrota de Serra revelam a desigualdade entre as duas mentiras. A produção de uma narrativa falsa sobre a história recente do Brasil serve ao projeto hegemônico do lulismo. Quando o governo Dilma completou cem dias, a oposição praticamente desapareceu da paisagem nacional, não como resultado de algum tipo de restrição das liberdades pelo governo, mas como fruto da falência política do PSDB e do DEM.

No túmulo de Tancredo
Lula e o PT acercaram-se de Delfim Netto, celebraram com Jader Barbalho, aliaram-se a José Sarney, trocaram figurinhas com Paulo Maluf, assopraram as cicatrizes de Fernando Collor, uniram-se a Renan Calheiros. O que é um Tancredo, perto disso? Uma diferença, entre tantas, está na circunstância de que a figura homenageada por Dilma na sua peregrinação a São João del Rei deixou o mundo dos vivos para ingressar no firmamento dos símbolos.

Tancredo é uma representação: o ícone da transição pactuada que deu origem à Nova República. O PT vilipendiou aquela transição e decidiu não fazer parte da ordem que nascia. Primeiro, expulsou seus três deputados que votaram por Tancredo no Colégio Eleitoral. Depois, recusou-se a homologar a Constituição de 1988. O que fazia a candidata de Lula no berço simbólico de tudo o que o PT queimou na maior encruzilhada de nossa história recente?

A coerência absoluta é privilégio das seitas políticas, responsáveis apenas perante seus próprios dogmas. Todos os partidos de verdade, aqui e alhures, experimentam ambivalências ao olhar para trás, na direção de seu passado. Mas o lulopetismo encontra-se numa categoria separada. A narrativa histórica implícita na peregrinação ao túmulo de Tancredo situa-se em algum ponto entre a esquizofrenia e o distúrbio bipolar. E, no entanto, há método na loucura.

O PT surgiu como leito de confluência de muitas águas e diferentes histórias. Na média, identificava-se como um partido de ruptura, socialista mas avesso ao “socialismo real”. Os trabalhadores, numa vertente, e o “povo de Deus”, em outra, formavam a base social imaginada do petismo original. Depois, à medida que se aproximava do poder, o PT converteu-se num partido da ordem. A conversão, contudo, jamais assumiu as formas de uma releitura honesta de seu passado e de uma crítica política das ideias originais.

A antiga corrente interna liderada pelo deputado José Genoíno bem que tentou, mas o PT não seguiu a dura trilha de aggiornamento pela qual, ao longo de meio século, os partidos marxistas da Segunda Internacional se transfiguraram na atual social-democracia europeia. Na hora do triunfo de Lula, a distância incomensurável entre palavras e atos teve de ser vencida pelo recurso a um salto fraudulento: a Carta aos Brasileiros, articulada por Antonio Palocci, escrita por ex-trotskistas e assinada pelo candidato como negação do programa partidário. Não é trivial encarar o passado quando se joga esconde-esconde com o presente.

A esquizofrenia salta aos olhos. Nos seus dois mandatos, Lula pilotou a política econômica com o software elaborado por FHC e foi buscar no ninho tucano o operador dos manetes do Banco Central. Em campanha, Dilma jurou que rezará as três orações do livro da ortodoxia: câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário. Paralelamente, as resoluções do Congresso do PT de 2007 lamentavam a queda do Muro de Berlim e reiteravam tanto as “convicções anticapitalistas” quanto o compromisso com a “luta pelo socialismo”.

No partido, desde as crises da cueca e do caseiro, ninguém mais ousa sugerir um aggiornamento – uma carência que se traduz pelo agravamento dos sintomas de esquizofrenia. A dicotomia desenvolve-se como uma bifurcação de negações complementares: a prática de governo lulopetista não pode encontrar expressão na plataforma partidária e as palavras escritas pelo partido não podem encontrar correspondência nos programas de governo.

O lulopetismo fabricou não uma, mas duas versões da história do Brasil. A original, apoiada na chave da ruptura, diz que a nação alcançou a independência quando Lula subiu a rampa do Planalto, após a longa noite de “500 anos” na qual “a elite governou este país”. Uma segunda, apoiada na chave da continuidade, diz que Lula restaurou uma estrada de emancipação projetada por Getúlio Vargas (“o presidente que tirou toda a nação de um estágio de semiescravidão”), implantada por Juscelino Kubitschek (“quem conscientizou o país de que o desenvolvimento nacional é uma prerrogativa intransferível de um povo”) e pavimentada por Ernesto Geisel (“o presidente que comandou o último grande período desenvolvimentista do país”). As duas versões, contraditórias entre si, convivem numa harmonia perfeita regulada pelas necessidades e circunstâncias políticas.

As versões contraditórias contêm, ambas, um elemento invariante, que é o conto de uma queda. De acordo com ele, a presidência de FHC representou uma catástrofe nacional: a venda do templo e a conspurcação dos lugares santos. Nessa linha, diante do túmulo de Tancredo, Dilma crismou o ex-presidente tucano como chefe dos “exterminadores do futuro”. A peregrinação da candidata lulista a São João del Rei cumpria uma função de produção de sentido. Ela estava lá para escrever algumas novas linhas na versão continuísta da narrativa histórica do lulopetismo. O Brasil, informa-nos a versão revisada, moveu-se continuamente na direção do futuro, numa jornada inaugurada por Getúlio Vargas, que prosseguiu com Juscelino Kubitschek, Ernesto Geisel e a Nova República, até desviar-se tragicamente de seu rumo, na hora da ascensão de FHC. À luz dessa versão, Lula surgiu para, providencialmente, resgatar a nação do abismo, mostrando-lhe a senda de volta à estrada principal.

Da Carta aos Brasileiros à homenagem prestada por Dilma ao fundador da Nova República, o lulopetismo percorreu um longo caminho e eliminou bagagens pesadas, que representavam fardos políticos. O socialismo, embalsamado nas resoluções partidárias, foi expurgado da cena pública. Os radicais do “povo de Deus” deixaram o partido, rumo ao PSOL, ou foram acomodados na periferia buliçosa, mas inefetiva, do MST. O novo partido da ordem ocupou o centro do palco político, tecendo a coalizão com o PMDB e forjando um bloco de poder extraparlamentar que, sob o influxo das empresas estatais e dos fundos de pensão, abrange uma fatia significativa do grande empresariado, as centrais sindicais e os chamados movimentos sociais. Em São João del Rei, Dilma depredava a história – mas a mentira fazia sentido.

O retrato de Lula
Depois da peregrinação de Dilma, Serra tinha a oportunidade de fazer uma declaração esclarecedora sobre a história, na abertura de sua campanha na televisão. O principal candidato oposicionista poderia colar no muro, ao lado do seu, os retratos de Tancredo Neves, Itamar Franco e FHC. Legitimamente, poderia ir adiante, enfileirando no lado oposto os retratos de José Sarney, Fernando Collor, Lula e Dilma Rousseff. Entretanto, escolheu colar no seu muro o retrato de Lula. A decisão – adotada pelo próprio candidato ou por seu marqueteiro genial, tanto faz – condensa a falência política da oposição.

O gesto farsesco teve um impacto avassalador, palpável o suficiente para ser registrado tanto nas pesquisas quanto nas conversas de rua: nos dias seguintes, milhões de eleitores de Serra desertaram indignados, declarando-se fartos do baile de máscaras promovido pelo candidato. Os eleitores tinham razão: aquele não era um equívoco episódico, mas o prolongamento e a conclusão lógica de uma estratégia de campanha alicerçada sobre a abdicação do direito de fazer oposição.

Bem antes do gesto catastrófico, a campanha já se equilibrava precariamente sobre uma corda frouxa, trançada com os fios complementares da arrogância e da covardia. A arrogância transparecia na crença quase mística nos efeitos da comparação entre as biografias de Serra e da candidata oficial. A covardia, na decisão inabalável de não confrontar o lulismo com uma visão alternativa sobre o governo, o Estado e a nação. Sob o manto de uma estratégia supostamente eficaz, derivada dos altos níveis de aprovação do governo e da figura de Lula, Serra apresentava-se como o gerente mais confiável do continuísmo. No fim, a derrota não representou um fracasso eleitoral, mas o sintoma epidérmico de uma doença grave que corrói o organismo dos partidos de oposição. O mal de que padecem o PSDB e o DEM é a incapacidade de oferecer à nação uma plataforma alternativa à do lulopetismo.

Algo de curioso aconteceu quando, na contagem de votos do segundo turno, desenhou-se inequivocamente o resultado final. Então, rompendo um protocolo da democracia, Serra retardou o discurso de reconhecimento da derrota, escolhendo pronunciar-se depois de Dilma. No seu pronunciamento, o candidato oposicionista não se referiu à presidente eleita como presidente de todos os brasileiros, preferindo conclamar seus seguidores a ocuparem a “trincheira” da “luta pela democracia”. Desse modo, encerrou num diapasão sectário, inadequado à vigência indiscutível das liberdades políticas, uma campanha marcada pela hesitação em fazer oposição.

Naquele discurso final, Serra jactou-se dos 44% de votos válidos obtidos no segundo turno e os dirigentes do PSDB enfatizaram o valor dos triunfos em São Paulo e no Sul. Há algo aí, sem dúvida, mas o quadro inteiro é bastante diferente daquilo que sugeria o partido derrotado. Dilma venceu esmagadoramente no Nordeste, mas triunfou também no Sudeste, graças aos resultados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, e obteve um empate técnico no Rio Grande do Sul. As bancadas oposicionistas no Senado e na Câmara sofreram severa redução, produzindo esmagadoras maiorias governistas.

Os números frios não contam a história eleitoral inteira. A passagem de Serra ao segundo turno, graças ao crescimento de última hora da candidatura de Marina Silva, decorreu de fatores largamente estranhos às campanhas dos candidatos. Segundo todos os indícios disponíveis, Dilma resolveria a eleição no primeiro turno não fossem os efeitos de uma tripla conjunção: o escândalo do tráfico de influência de Erenice Guerra na Casa Civil, os ataques verbais destemperados de Lula contra a imprensa e uma polêmica sobre o tema do aborto que emergiu nas igrejas e na internet.

Derrotas eleitorais são eventos normais nas democracias. A derrota eleitoral de Serra é maior do que sugerem as estatísticas e os mapas publicados no final das apurações. Contudo, ainda mais expressivo é o fracasso político da oposição. Da campanha de 2010 não emanou um discurso coerente de ação política oposicionista. A conclamação patética à “trincheira” da “democracia” evidenciou o vazio. Hoje, diante dos olhos de todos, ele é preenchido pelas guerrilhas personalistas intestinas que, destituídas de algum conteúdo de interesse público, desmoralizam os partidos de oposição.

A candidata de Lula tinha o favoritismo desde o início da disputa eleitoral. Contava com o apoio do presidente, que a classificou como seu “pseudônimo”, e também da maior parte das elites política e empresarial. Além disso, crucialmente, beneficiava-se das altas taxas de crescimento econômico dos últimos anos, nos quais o Brasil surfou a “etapa chinesa” da globalização. Para ter uma chance de mudar o cenário previsível, Serra precisaria agir como estadista – isto é, como a figura que se ergue acima das circunstâncias, desafia o senso comum, afronta setores de sua própria base partidária e oferece aos eleitores uma narrativa política transparente, equilibrada e franca. Em campanha, o candidato tucano não se furtou a dirigir críticas fragmentárias ao governo e à sua candidata. Porém, como estilhaços de uma granada perdida, elas nunca formaram um conjunto coerente, capaz de sintetizar uma aspiração de mudança.

Serra não tem, contudo, a responsabilidade integral pelo fracasso político de sua campanha. A abdicação de agir como oposicionista tem um precedente tão próximo quanto ainda vívido. Nas eleições presidenciais de 2006, a campanha de Geraldo Alckmin entrou em colapso logo após o primeiro turno, quando o candidato cobriu-se com os logotipos das empresas estatais para sublimar o debate sobre as privatizações de FHC. Alckmin e Serra, cada um na sua hora, destruíram suas campanhas por meio de gestos paralelos de rendição política. Há, nisso, bem mais que uma coincidência.

De olho no retrovisor
No primeiro debate televisivo da campanha, Serra afirmou que não disputa eleições “de olho no retrovisor”. A frase de efeito não apenas denota desconforto com o passado como também veicula uma canhestra tentativa de passar uma borracha sobre a história. De mais a mais, evidencia uma surpreendente incompreensão da democracia: eleição é o momento no qual a nação revisita suas opções pretéritas e reflete sobre as diferentes estradas que conduzem ao futuro.

Atrás da frase, estava a esperança de circundar a discussão sobre o governo FHC – a mesma esperança que conduziu Alckmin a fantasiar-se como campeão das empresas estatais. O governo FHC representou o ápice da aventura política do PSDB. Nas duas eleições sucessivas, o repúdio tácito à própria herança, com seus acertos e erros, impediu que os tucanos analisassem criticamente o governo Lula e o PT, inscrevendo-os numa narrativa inteligível da trajetória recente do Brasil. A candidatura de Dilma Rousseff, tal como arquitetada por Lula, convertia a eleição num plebiscito sobre o lulismo. Não era viável, a não ser pela renúncia a fazer oposição, driblar a natureza plebiscitária do pleito. A alternativa era aceitá-la – mas mudando seus termos, por meio de um debate político esclarecedor.

O governo FHC inscreve-se, como o governo Lula, na trajetória brasileira pós-redemocratização. Nessa trajetória, firmaram-se consensos nacionais: o império da lei, das liberdades públicas e da democracia; a estabilidade econômica, a inserção do País na corrente da globalização; o resgate da “dívida social” gerada pelo modelo de crescimento implantado na ditadura militar. Tais consensos se consolidaram na “era FHC”. A política econômica seguida por Lula foi, no essencial, uma continuidade do programa delineado com o Plano Real. As políticas sociais de Lula foram, basicamente, desdobramentos das de FHC, com ampliações relevantes derivadas da conjuntura internacional favorável.

A oposição tinha a oportunidade de narrar essa história, apontando passo a passo a resistência do PT aos avanços obtidos no passado recente. O PT expulsou seus deputados que foram ao Colégio Eleitoral votar em Tancredo. O PT rejeitou o Plano Real. O PT denunciou, pela voz de Lula, o Bolsa-Escola como “bolsa esmola”. As conversões tardias do lulopetismo, queimando o que adorava e adorando o que queimava, deveriam ser expostas aos eleitores, a fim de traduzir em outros termos o debate sobre o passado proposto pelo próprio PT. A oposição não fez nada disso, em duas eleições, porque perdeu o rumo desde o segundo mandato de FHC.

Na moldura propiciada pela política de equilíbrio macroeconômico, o governo FHC redefiniu o lugar do Estado na economia, por meio do programa de privatização e da implantação das agências reguladoras. Além disso, avançou na profissionalização da burocracia e da gestão públicas, iniciando a desmontagem do Estado patrimonial herdado da “era Vargas”. No plano político, cautelosa e lentamente, começou a libertar a máquina administrativa da vasta rede de interesses clientelistas tecida por elites regionais e grupos partidários.

Contudo, o impulso das reformas arrefeceu na hora da aprovação da emenda da reeleição, que demandou compromissos em arco, abrangendo justamente as elites ameaçadas pelo programa de modernização do Estado. No segundo mandato, o sistema político enrijeceu-se e as forças inerciais fizeram sentir seu peso. As reformas política, eleitoral, sindical e trabalhista, tão necessárias, foram sacrificadas em nome da governabilidade. Sob o impacto das crises financeiras internacionais e de graves erros de gestão da política energética, o governo sofreu desgastes sucessivos, que prepararam o triunfo de Lula em 2002.

Uma derrota eleitoral não significa, necessariamente, uma derrota política. Mas, já na campanha eleitoral de 2002, o PSDB e o DEM relutavam em fazer uma defesa clara, contundente defesa da obra do governo FHC. O PT, pelo contrário, engajava-se na construção de uma narrativa oportunista, presa à dupla âncora do nacionalismo e do corporativismo, que atribuía às privatizações os problemas sociais do País. Ali, os principais partidos da atual oposição decidiam ignorar “o retrovisor”, cedendo o terreno doutrinário e ideológico ao petismo.

A renúncia à defesa do legado ajudou o lulopetismo a pintar em cores farsescas toda a política brasileira dos últimos oito anos. Lula governou com software macroeconômico de seu antecessor, mas seu partido jamais reconheceu essa dívida, que propiciou o crescimento com estabilidade. Lula não reverteu as privatizações de FHC, mas seu partido continuou a exibi-las como uma abominação. Lula ampliou vastamente as transferências sociais de renda que condenara, mas passou a acusar a oposição de classificá-las como “bolsa esmola”. A destruição sistemática da inteligibilidade da linguagem política serviu à construção da atual hegemonia do lulopetismo – mas apenas porque o PSDB e o DEM fugiram do campo de batalha das ideias.

A crítica à campanha de Serra em 2010 não é apenas inevitável, mas também necessária. Contudo, ela se transfigurará em novo subterfúgio escapista dos partidos de oposição se não se olhar para “o retrovisor”. No fim das contas, o candidato do PSDB foi fiel a seu partido, reproduzindo os hábitos e costumes inaugurados antes ainda da passagem da faixa presidencial de FHC para Lula.

A oposição que não temos
O lulismo, que prossegue com Dilma Rousseff,¬ não é a política macroeconômica do governo, tomada de empréstimo de FHC, mas uma concepção sobre o Estado e a nação. A sua vinheta de propaganda diz que o Brasil é “um país de todos”. Eis a mentira a ser exposta. O Estado remodelado ao longo dos dois mandatos de Lula é um conglomerado de interesses privados. Nele se acomodam a elite patrimonialista tradicional, a nova elite política petista, grandes empresas associadas aos fundos de pensão, centrais sindicais chapa-branca e movimentos sociais financiados pelo governo.

Num “país de todos”, a administração pública é conduzida por uma burocracia profissional. Sob Lula, a tradição de colonização privada da máquina pública amplificou-se e assumiu formas singulares, que resultam da emergência das novas elites oriundas do PT, dos sindicatos e dos movimentos sociais. Mais do que nunca, o Brasil precisa de uma reforma do Estado. O lulismo, que conferiu a José Sarney o estatuto de “homem incomum”, não a fará. A oposição, entretanto, não levanta essa bandeira, que se choca com o patrimonialismo entranhado em todos os partidos políticos.

Num “país de todos”, o movimento sindical expressa a vontade dos trabalhadores organizados. O lulismo repaginou o imposto sindical de origem varguista para estender o financiamento compulsório às centrais sindicais. A nova burocracia sindical, como a antiga, está subordinada ao Estado – com a diferença muito importante de que a sua corrente central também se conecta ao aparelho político do PT. Os partidos de oposição não reagiram à montagem da versão lulista da CLT, preferindo buscar pontos de apoio nas correntes periféricas do neopeleguismo. Nada indica que ousarão propor a adoção da Convenção 87 da OIT, retomando a palavra de ordem da liberdade sindical que um dia pertenceu ao PT e à CUT.

Num “país de todos”, a cidadania é um contrato apoiado no princípio da igualdade perante a lei. No Brasil do lulismo, os indivíduos ganharam rótulos raciais oficiais, que já começam a regular o exercício de direitos e ameaçam produzir fronteiras sociais intransponíveis. A única pesquisa científica de opinião pública sobre o tema das cotas raciais, realizada poucos anos atrás no Rio de Janeiro por uma ONG racialista, revelou que uma maioria de dois terços, formada por pessoas de todas as cores de pele, rejeita a introdução da raça na lei. Mesmo assim, a aprovação parlamentar das primeiras leis raciais da história do País não foi confrontada pelo PSDB ou pelo DEM, só encontrando resistência em algumas figuras da oposição, como notadamente o senador Demóstenes Torres (DEM – GO).

Num “país de todos”, a política externa subordina-se a valores consagrados na Constituição, como a promoção dos direitos humanos. Sob o lulismo, a palavra constitucional vergou-se diante de ideologias propensas à celebração de ditaduras enroladas nos trapos de um visceral antiamericanismo. Em Cuba, Lula comparou os prisioneiros políticos do castrismo aos presos comuns brasileiros. Na ONU, os representantes do País opuseram-se a investigações e denúncias sobre violações de direitos humanos. Na América Latina, o Brasil deu cobertura ao enrijecimento do autoritarismo chavista, flertou com a reivindicação de concessão às FARC do estatuto de “força combatente” e engajou-se na aventura burlesca promovida por Hugo Chávez em Honduras. Alhures, numa iniciativa desastrosa, o Brasil tricotou o fracassado acordo tripartite com o Irã, escarnecendo da política internacional de não proliferação nuclear.

Vozes da oposição exercitaram a crítica, mas apenas no episódio da aprovação parlamentar do ingresso da Venezuela no Mercosul os partidos oposicionistas marcaram claramente seu inconformismo com a política oficial. Na campanha eleitoral, sob o curioso argumento de que não se trata de assunto capaz de ganhar as atenções da maioria, Serra emudeceu quase por completo sobre os problemas estratégicos e de princípio da política externa lulista. Os partidos de oposição parecem desconhecer o impacto dos temas dos direitos humanos, das liberdades públicas e da democracia na sociedade brasileira. A persistente relutância em expor as relações entre a natureza autoritária do PT e as orientações de política internacional do lulismo constitui uma aula completa sobre o estado falimentar do PSDB e do DEM.

O governo Lula conservou os fundamentos da política macroeconômica herdada mas, aos poucos, começou a plantar as sementes de um modelo econômico baseado no protagonismo estatal. As agências reguladoras sofreram vertiginoso esvaziamento. À tríade constituída por Eletrobras, Telebras e Petrobras atribuíram-se novas funções, de reorganização anticompetitiva dos mercados nos quais operam. A alteração da Lei Geral de Telecomunicações para favorecer a Oi, os ensaios do Projeto Nacional de Banda Larga, a engenharia financeira da hidrelétrica de Belo Monte e o marco regulatório do pré-sal representam indícios clamorosos da reconstituição de um modelo de capitalismo de Estado abandonado nos anos 1990.

O BNDES, banco público de fomento, e os fundos de pensão, patrimônios privados controlados efetivamente pelo governo, desempenham papéis cruciais na estratégia econômica geral do lulopetismo. O poder financeiro discricionário desses atores propicia vultosas transferências de recursos para o grande empresariado que orbita ao redor do Estado. As sucessivas capitalizações do BNDES, com recursos do Tesouro, funcionam de fato como um vasto subsídio público a empresários privados, escolhidos a dedo pelo poder político de turno.

O novo modelo econômico, ainda esboçado, adquirirá amplitude com uma anunciada coleção de obras faraônicas, que se estende de Belo Monte ao Trem-Bala e alcança os projetos de infraestrutura e esportivos ligados à Copa do Mundo e às Olimpíadas. Entretanto, ao que parece, os partidos oposicionistas nada têm a dizer sobre o modelo em gestação, que subordina o interesse público aos interesses privados. Assim, depois de renunciarem à defesa programática das agências reguladoras e das privatizações, o PSDB e o DEM curvam-se a uma estratégia de desenvolvimento baseada na emissão de dívida pública e no desperdício em larga escala dos recursos nacionais.

O Plano Real e a política de estabilidade econômica configuraram um programa de governo com profundo apelo popular. FHC foi eleito e reeleito em primeiro turno, derrotando Lula por duas vezes, pois esse programa abriu a estrada para o crescimento com distribuição de renda. O chão estabelecido na “era FHC” solicitava um novo programa de apelo popular, voltado para a universalização efetiva dos direitos sociais. Contudo, o PSDB e o DEM jamais formularam tal programa – e, como resultado, perderam a audiência da maior parte da população de baixa renda. Nas eleições de 2010, mais que um corte regional, verificou-se um recorte social no eleitorado: Serra foi batido na população de baixa renda até mesmo em São Paulo.

O lulopetismo alicerça-se sobre uma doutrina conservadora, que veste fantasias de esquerda. Lula também não formulou um programa de universalização dos direitos sociais, preferindo concentrar-se numa audaciosa expansão dos programas de transferência direta de renda, que geram imediatos dividendos eleitorais. Na “era Lula”, pouco se fez nas esferas da educação, da saúde e da segurança pública. No “país de todos”, os pobres continuam sem escolas públicas e hospitais de qualidade e seguem à mercê do crime organizado. Serra desperdiçou a oportunidade de apresentar ao País um ambicioso plano de metas destinado a universalizar os direitos sociais num horizonte temporal previsível, ordenado por um cronograma verificável. Mas, afinal, por que ele daria esse passo, se os partidos oposicionistas desistiram há tempo de falar ao povo?

Um eleitorado sem representação
Lula abordou a sua sucessão como uma campanha de reeleição. No Brasil, como na América Latina em geral, o instituto da reeleição tende a converter o Estado numa máquina partidária. A presidência, os ministérios, as empresas estatais e as centrais sindicais neopelegas foram mobilizadas para assegurar o triunfo da candidata oficial. A economia, no ano eleitoral de 2010, avançou em desabalada carreira, num ritmo alucinante propiciado pelo crédito farto e pelos fluxos especulativos de investimentos estrangeiros. Eduardo Campos em Pernambuco, Jaques Wagner na Bahia, Sérgio Cabral no Rio de Janeiro, Antonio Anastasia em Minas Gerais, Geraldo Alckmin em São Paulo, todos candidatos da continuidade, obtiveram a vitória nos pleitos estaduais sem a necessidade de segundo turno. Por que, então, a “mulher de Lula”, o pseudônimo do mito vivo, disputando em condições excepcionalmente favoráveis, não triunfou no primeiro turno?

Os institutos de pesquisa registravam, na época da campanha eleitoral, uma taxa de aprovação do governo Lula em torno de 80%. Cerca de dois terços da aprovação recordista originavam-se de indivíduos que conferem ao presidente a avaliação “bom”, não “ótimo”. Nesse grupo, uma maioria não votou na “mulher de Lula” no primeiro turno. Dilma precisou de segundo turno, disputando contra um Serra carente de discurso político, assim como o próprio Lula precisou do turno final quando concorreu com um Alckmin que se negava a defender a herança de FHC.

Os resultados eleitorais de 2010, tanto quanto os de 2006, permanecem abertos a análises e polêmicas. Há, porém, uma evidência indiscutível: uma parte expressiva do eleitorado brasileiro, superior a 40%, rejeita nitidamente o lulopetismo. A sociedade brasileira – moderna, urbana, complexa – não se ajusta à sedimentação de seu sistema político sob o peso de um hegemon. A rejeição ao petismo expressa- -se na sociedade sob as mais diversas formas. Essa oposição, entretanto, não se traduz adequadamente nos atuais partidos oposicionistas – e, portanto, também não encontra expressão parlamentar. É um sinal preocupante sobre o estado de saúde de nossa democracia.

DEMÉTRIO MAGNOLI, sociólogo e doutor em Geografia Humana, integra o GACINT-USP e assina colunas de opinião nos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

Censura à Imprensa - Reinaldo Azevedo (junto-me a ele)

Sim, censura à imprensa, mas explico-me.
Não se trata de censurar matérias que seriam veiculadas pela imprensa.
E sim censurar a maneira como a imprensa vem tratando a informação, colocando a objetividade de lado e veiculando análises deformadas, opiniões que deturpam o sentido original de argumentos defendidos por determinadas personagens políticas, enfim, falhando, e terrivelmente, na sua função de esclarecer, estabelecer a verdade, ficar do lado da racionalidade.
Ao contrário, certa imprensa vem: desinformando, deformando, obscurecendo, emburrecendo os leitores, além de contribuir para o empobrecimento político e intelectual dos eleitores.
Tudo isso, claro, a propósito da famosa frase do ex-presidente FHC a respeito do PT, dos "movimentos sociais" (entre aspas, pois todos foram comprados, literalmente, pelo PT) e do que ele chamou de "povão" (também entre aspas, mas que se refere às camadas beneficiadas por programas assistencialistas do governo).
Permito-me recordar que, nesse mesmo número da revista Interesse Nacional que publicou o artigo do ex-presidente FHC, também tem um artigo meu sobre a mesma "oposição" (entre aspas pois ela não merece, ainda, esse qualificativo, e não tenho certeza se um dia virá a merecer).
Meu artigo é este aqui:
A Miséria da “Oposição” no Brasil Da Falta de um Projeto de Poder à Irrelevância Política?
Por: PAULO ROBERTO DE ALMEIDA
Em ensaio analítico-opinativo sobre a inexistência de uma verdadeira oposição no atual cenário político brasileiro e sobre as tarefas da oposição num moderno sistema político democrático, o autor faz um exame das condições pelas quais se poderá ter a eventual reconstrução de uma oposição digna desse nome no Brasil. “A oposição precisa estar pronta para oferecer outro futuro a todos os brasileiros que não acham que a esperteza política aliada ao oportunismo propagandístico representa o horizonte real de possibilidades para o País”.
» saiba mais
Paulo Roberto de Almeida

Cuidado! Imprensa trabalhando. Ou: Da burrice alastrante
Reinaldo Azevedo, 15/04/2011

Há três dias setores da imprensa vêm massacrando a verdade de forma vergonhosa, escandalosa, vexaminosa, noticiando não o fato, mas uma leitura dele, marcada pelo preconceito ideológico evidente, escancarado, debochado. Aquele que já foi um lugar do pensamento, do confronto de idéias, do novo, abriga hoje o servilismo ousado, a ignorância rombuda, a desinformação canhestra. Ai daquele que ousar apresentar alguma alternativa aos valores triunfantes! Tentarão calá-lo, esmagá-lo, ridicularizá-lo, sem nem mesmo ler o que escreveu.

Trata-se de uma canalhice jornalística, intelectual e moral afirmar que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pregou que o PSDB “desista do povão” ou se “afaste do povão”. Usar o que escreveu para acusá-lo de demofobia é coisa de vigaristas, de demagogos, de reacionários a serviço do poder. Será que critico a imprensa, também eu, como o PT costuma fazer? Já chego lá!

Nunca será demais voltar ao texto de FHC:
Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os “movimentos sociais” ou o “povão”, isto é, sobre as massas carentes e pouco informadas, falarão sozinhos. Isto porque o governo “aparelhou”, cooptou com benesses e recursos as principais centrais sindicais e os movimentos organizados da sociedade civil e dispõe de mecanismos de concessão de benesses às massas carentes mais eficazes do que a palavra dos oposicionistas, além da influência que exerce na mídia com as verbas publicitárias.

Qual é o centro da informação? Por que diz o ex-presidente que é inútil entrar na tal disputa? Porque os petistas aparelharam esses movimentos sociais e esses sindicatos, que representam não a sociedade no seu conjunto, mas setores dela. Isso, sim, deveria ser matéria de debate. O parágrafo prepara o que vem depois: há milhões de brasileiros que não participam da vida partidária; há uma gigantesca classe média, que emergiu com o Plano Real — sim!!! — que precisa ser despertada para a política. Os meus leitores habituais sabem que defendi essa tese num artigo de quatro páginas publicado na VEJA em dezembro do ano passado. O “povão”, que vai no texto de FHC entre aspas — como entre aspas está a expressão “movimentos sociais” — é um forma sutil de se referir ao objeto de análise segundo os olhos do adversário. Mas esperar sutileza ou alfabetização de quem???

Estamos lidando aqui com categorias que requerem um pouco mais do que o “juvenilismo” estúpido, desinformado, militante, que aprendeu — como se houvesse aprendizado aí — que a palavra “povão” é, em si, um valor. As múltiplas teses que há no longo artigo — e não concordo com todas, não, mas cada coisa a seu tempo — foram tragadas pela voragem da estupidez.

Se pretendem que um texto escrito pelo único ex-presidente que venceu duas eleições presidenciais no primeiro turno (ainda que tivesse sido apenas uma, seria o único do mesmo jeito), pelo presidente de honra de um partido de oposição, por um sociólogo mundialmente respeitado pela qualidade do seu trabalho acadêmico, se pretendem, em suma, que esse texto não mereça consideração, reflexão, debate político, muito bem! É uma decisão cretina, que evidencia um alinhamento óbvio com as forças do governismo, mas AINDA NÃO É MENTIRA. Atribuir-lhe o que não disse é depredação do pensamento. Já nos basta o fato de termos uma academia que, com honrosas exceções, funciona hoje como um braço de um partido político?

Críticas à imprensa
Sim, eu faço críticas ao que considero ruim da imprensa, mas as minhas são muito diferente daquelas que faz o PT, o partido do coração dessa turma que se finge de analfabeta funcional para que possa ser analfabeta moral com mais desenvoltura.

Eu não quero censurar ninguém. Eu não quero criar conselho de vagabundos para monitorar o que os outros dizem. Eu não quero criar uma polícia estatal do pensamento para dizer o que pode e o que não pode ser publicado. A minha crítica é aberta. Os petistas sonham noite e dia em censurar a imprensa. Eu torço para que a imprensa se livre da censura:
- da censura do politicamente correto;
- da censura praticada pelas pessoas boazinhas que “amam” o “povão”;
- da censura oblíqua aplicada por um partido político;
- da censura à inteligência;
- da censura à divergência;
- da censura à verdade.

E não acho que o estado, com este governo ou com outro,tenha competência para fazer esse trabalho. O que se fez e se vem fazendo com esse texto de FHC é um crime intelectual. Covardes, uma boa parcela dos oposicionistas resolveu, como direi?, “puxar o saco” do “povão”, contribuindo para que a distorção avançasse e ganhasse corpo. Se tudo der certo, ainda acaba se confundindo com a verdade. Assim como se tem hoje como inquestionável que foi Lula quem criou os programas sociais e quem estabilizou a economia.

Não por acaso, lá de Londres, onde foi pegar uma grana da Telefonica —  que, por vontade (pretérita) do Apedeuta jamais estaria no Brasil —, Lula resolveu exercer a sua “demofilia”, em consonância com o discurso exercitado por setores da imprensa aqui no Brasil. É um caso de formação de quadrilha intelectual, moral e ética. Como não poderia deixar de ser, mais um vez, o Ignorante Soberbo exerceu o seu preconceito contra aqueles que estudam. E ninguém vai reclamar porque se considera inaceitável que um intelectual aponte a estupidez de um estúpido, mas se está diante de uma verdadeira obra de arte quando o estúpido estupidifica o que diz o intelectual.

Alguns leitores me perguntam o que fazer diante de casos assim. Não tenho a receita, não! Eu sei o que eu faço: aponto o que me desagrada e busco, como qualquer leitor, fontes de informação que me respeitam — há certos horrores que tenho de experimentar porque, afinal, tenho a profissão que tenho.

Nunca antes na história destepaiz
Leio regularmente jornais desde os 14 anos, que foi quando comecei a me interessar por questões públicas. Depois de algum tempo — e porque, afinal, eu pertencia a um grupo que fazia política —, já sabia identificar o que era uma distorção ditada, então, por um regime de exceção. Vivi com grande entusiasmo a abertura política e o começo dos anos 1980, que foram bons, acreditem!, no jornalismo. Havia ousadia, inteligência, inconformismo — até de militantes políticos e ex-militantes que estavam nas redações.

Esse grau de boçalidade de hoje? Nunca vi! E não que eu seja do tipo saudosista. Ocorre que há aí um problema geracional, entendem? Estou com 49 anos. Tive muitos professores de esquerda. Gostava bastante de alguns, e há gente de quem gosto ainda hoje. Mas eu não fiz parte da geração que foi educada pelo petismo, que é um tipo muito particular de esquerdismo. Tive professores marxistas — alguns muito sérios dentro do pensamento que escolheram. Ocorre que o petismo está para o marxismo como essas seitas neopentecostais — as sérias, por favor, não reclamem; falo das vigaristas; daquelas mais novas do que o uísque eu bebo — estão para o cristianismo. Se você pedir a um petista que explique o que é luta de classes, ele não conseguirá ir além de um arranca-rabo. Se você lhe pedir que explique o que é “materialismo histórico” — não que seja grande coisa —, ele vai dizer que é o mesmo que não acreditar em Deus. É o triunfo da boçalidade.

Essa gente que destrói gerações nas faculdades de humanas e de comunicação comete um crime intelectual até contra a própria esquerda: o “fetichização” do povo ou do “povão”. Esses vagabundos nunca leram Marx — e alguém poderá dizer que não perderam grande coisa. Vá lá. O problema é que leram, no máximo, os discursos de Lula. Então não há esperanças? Sempre há aqueles que conseguem escapar desse cerco.

O mal que essa gente fez à inteligência começa a render frutos. Nem tanto lhes lastimo o esquerdismo — que não há nada de novo nisso! O problema é sua alastrante burrice a serviço de uma causa.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Miragens chinesas (2) -- de volta a velha hipocrisia...

Prevaleceu a visão chinesa
Editorial - O Estado de S.Paulo
14 de abril de 2011

Saiu ao gosto chinês o comunicado conjunto dos presidentes Dilma Rousseff e Hu Jintao. Os termos foram ditados principalmente pelos interesses da China, assim como são ditados os termos do comércio e da cooperação econômica entre os dois países. Pequim aproveitou a visita para algumas gentilezas. Oficializou a abertura de mercado à carne de porco brasileiro, aceitou conversar sobre a diversificação das trocas e confirmou uma compra de aviões da Embraer. Tudo isso é positivo, mas presidentes não viajam para vender costeleta e lombinho e raramente se envolvem na exportação de aviões - a menos, como fizeram o francês Nicolas Sarkozy e o americano Barack Obama, que se trate de concorrência para reequipar as Forças Armadas de um país.

Como de costume, a viagem serviu para o governo brasileiro pedir apoio à sua ambição de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. As autoridades chinesas concordaram apenas com uma declaração vaga. China e Brasil "apoiam uma reforma abrangente da ONU, incluindo o aumento da representação dos países em desenvolvimento no Conselho de Segurança como uma prioridade". Além disso, "a China (...) compreende e apoia a aspiração brasileira de vir a desempenhar papel mais proeminente nas Nações Unidas". Essa frase é tão evasiva quanto a declaração de "apreço" à pretensão brasileira, incluída na declaração final da visita do presidente Obama a Brasília.

Mais que chocha, a referência aos direitos humanos teve um toque humorístico - e até de humor negro: "As duas partes fortalecerão consultas bilaterais em matéria de direitos humanos e promoverão o intercâmbio de experiências e boas práticas". Quais serão os temas dessas consultas e que experiências e "boas práticas" o governo brasileiro poderá aprender?

Os dois lados assumiram, como de costume, compromissos de cooperação técnica e científica. Tudo isso produzirá poucos efeitos a curto e a médio prazos. Alguns programas, como geralmente ocorre, talvez sejam esquecidos por um longo período, para serem lembrados, dentro de algum tempo, quando for marcada a primeira reunião de uma comissão bilateral.

Os entendimentos com maior significado prático correspondem aos interesses chineses de acesso a recursos naturais. "Os dois lados acolhem a crescente cooperação entre os dois países nas áreas de mineração e infraestrutura relacionada e no processamento de produtos de minérios", informa o comunicado. Os dois governos "manifestaram ainda o interesse em abrir novas áreas de cooperação em energia e mineração".

Pode haver pontos importantes de interesse comum nessas áreas. Mas a ênfase nesse tipo de cooperação atende sobretudo à estratégia chinesa de crescimento econômico e reforça o estilo de intercâmbio bilateral até agora observado. "A parte chinesa", segundo o comunicado, "manifestou disposição de incentivar suas empresas a ampliar a importação de produtos de maior valor agregado."

Essa "disposição" tem pouco ou nenhum significado prático - e o governo chinês talvez nem pudesse ir além desse ponto.

Se o governo brasileiro deseja de fato mais exportações de manufaturados para a China, o primeiro passo deve ser um exame das condições do comércio e dos obstáculos encontrados pelas empresas. Até agora, a iniciativa mais notável de Brasília, nesse campo, foi a pressão para a Vale exportar menos minérios e investir mais em siderurgia - uma ideia tão estapafúrdia em termos econômicos quanto perigosa politicamente.

Pequim cobrou, como se esperava, o cumprimento de uma promessa tola formulada há anos pelo governo brasileiro. "A parte brasileira reafirmou o compromisso de tratar de forma expedita a questão do reconhecimento da China como economia de mercado nos termos estabelecidos no Plano de Ação Conjunta 2010-2014." A palavra "expedita" vale um ponto para os negociadores chineses.

Empresas da China provavelmente aumentarão seus investimentos no Brasil. Fala-se em grandes projetos para a área eletrônica. Mas nada disso depende de entendimentos de cúpula. A Zona Franca de Manaus e o Polo de Jaguariúna são provas disso. O governo brasileiro deveria designar algum técnico talentoso para estudar esse e outros fatos da vida.

Conselhos aos aspirantes a politica (no Brasil)

O texto abaixo, postado num outro site que mantenho apenas para "depositar" textos mais longos, foi confundido recentemente por um leitor anônimo -- provavelmente um jovem iniciante -- que o interpretou literalmente, deixando de constatar sua imensa ironia e seu caráter antinômico ao que procura combater, que é uma realidade que infelizmente infectou o Brasil a partir de certo personagem desonesto, helàs muito popular.
Resolvi transcrever novamente aqui, pois suas lições permanecem plenamente válidas, sobretudo quando se vêem tantos sabujos incensando o dito cujo, cujo nome não preciso lembrar aqui.
Paulo Roberto de Almeida

CONSELHOS AOS JOVENS POLÍTICOS (e aos jovens em geral)
por Augusto de Franco
Site Diego Casagrande, Sexta-feira, Setembro 14, 2007

Você que é um jovem político, que escolheu trilhar o caminho da política na falta de uma ocupação honesta (como Jorge Luis Borges escreveu certa vez), guarde este artigo que poderá ser de grande valia para o seu sucesso nessa carreira.

PRIMEIRO CONSELHO. Se você se chama Antonio, seja antonista. Ou seja, filie-se a um partido apenas como quem cumpre exigência legal para exercer uma profissão. Mas tenha em conta que o único partido que conta é aquele que é só seu, que atende inteiramente aos seus próprios interesses.

SEGUNDO CONSELHO. Tenha como objetivo chegar ao máximo posto de poder. Se você chegar à presidência da República, entretanto, não se detenha. Seja candidato à reeleição. Se você já for um presidente reeleito, não se detenha. Você ainda pode ter mais poder. Se for possível, dê um golpe e se transforme em ditador. Ou mude a lei que proíbe a sua permanência no cargo. Tente sempre subir, ter mais poder. Se não houver para onde subir, tente ficar o maior tempo possível no cargo máximo que alcançou. Abandonar o poder por vontade própria ou em respeito a algum princípio ou regra é sempre um suicídio, mesmo que essa regra seja uma lei. Não se esqueça: toda lei pode ser mudada por quem tem o poder de mudá-la. Portanto, o essencial não é a lei e sim o poder.

TERCEIRO CONSELHO. Lembre-se: a única coisa que conta realmente é o seu partido exclusivo, não aquele ao qual você se filiou em virtude de alguma exigência legal e sim aquele que atende integralmente aos seus interesses e no qual só você manda. Mas se você puder ter um partido legal e reconhecido que se sujeite assim a você e que fique totalmente submetido às suas vontades, melhor ainda. Você terá conquistado a glória suprema de fazer com que um partido sirva apenas aos seus interesses. O partido legal cumprirá então o importante papel de recrutar gente que trabalhe de graça para você, para o seu partido pessoal. Essa última hipótese é de materialização improvável, mas você não deve ficar desanimado com isso, pois tem gente que consegue. Portanto, você não deve abrir mão de tentar concretizá-la. Pois você sempre precisará de outras pessoas que lhe sirvam para poder atingir os seus objetivos máximos.

QUARTO CONSELHO. Se você não conseguir transformar um partido inteiro em uma assessoria pessoal, que trabalhe apenas para promovê-lo (isso é difícil mesmo), organize uma tendência dentro desse partido que possa cumprir o papel de gangue política a seu serviço. Isso é obrigatório, se você quiser ter pleno sucesso.

QUINTO CONSELHO. Não dê a mínima para coisas como ética, princípios políticos, democracia, respeito às leis ou ao Estado de direito. Tudo isso é conversa-mole, usada por alguns apenas para limpar o seu caminho em direção ao poder. A regra aqui é bem clara: faça tudo o que puder. Se for necessário trair velhos amigos, traia sem a menor culpa. Se for necessário fazer exatamente o oposto do que você sempre pregou, faça-o sem qualquer vergonha. Se for necessário roubar, roube. Se for necessário matar, mate. Entenda que em política não existe nenhuma autoridade à qual você deva se curvar, pois tudo é possível desde que você tenha o poder para tornar possível mesmo o que parece ser impossível.

SEXTO CONSELHO. Roubar merece um capítulo a parte. Você não pode chegar onde quer - o poder máximo, pelo maior tempo possível - sem roubar. Existem dois tipos de roubo e - muita atenção agora! - você deve se dedicar aos dois. Há o roubo cometido em seu próprio benefício, para melhorar a sua vida (e a vida da sua família) no curto prazo. E há o roubo cometido para fortalecer a sua gangue política em benefício da sua carreira no médio e no longo prazos. Os dois são muito importantes e estão quase sempre relacionados. Muitos políticos cometem um erro grave quanto a esse ponto: roubam para si mesmos mas esquecem de roubar para a sua gangue. Se você aspira o poder máximo, nunca deve cometer esse erro. Lembre-se: articular e manter uma gangue política é uma providência absolutamente necessária em qualquer circunstância.

SÉTIMO CONSELHO. O correto exercício do roubo exige alguns cuidados. O problema não é roubar. O problema não é, nem mesmo, não fazer bem feito o malfeito e se deixar apanhar. O problema é não ter a quem chantagear caso você seja apanhado cometendo um delito. Portanto, ao exercer as duas formas de roubo - a pessoal e a grupal - tome também as providências necessárias para não ser punido. A primeira providência é acionar a sua gangue (está vendo porque você precisa ter uma?) para que monitore os roubos dos outros atores políticos. Se você mantiver relatórios atualizados dos roubos alheios certamente conseguirá escapar quando quiserem pegá-lo. A segunda providência é se associar sempre aos roubos alheios, sobretudo aos roubos grupais dos que têm mais poder do que você. Tendo participado das suas iniciativas criminosas, você poderá assegurar que eles não vão traí-lo quando for conveniente (para eles). E você poderá exigir o seu apoio caso venha a ficar em uma situação difícil.

OITAVO CONSELHO. Dedique-se diuturnamente, lançando mão de todos os meios e por todas as formas, a aumentar a sua popularidade. Ou seja, invista 24 horas por dia em ações de marketing pessoal. Use sempre os outros, sobretudo os membros da sua gangue política, para atingir seus objetivos, mas não confie em ninguém quando o assunto for esse. Assim, tome especial cuidado com seus auxiliares mais graduados ou mais salientes. Mantenha-os sempre na sua sombra e não permita que eles cresçam e apareçam mais do que o necessário para promovê-lo (e não para se autopromoverem). De tempos em tempos você deve "fritar" a camada superior dos seus colaboradores e ceifar algumas cabeças que começarem a emergir. O segredo aqui é manter seu pessoal numa espécie de pântano. Quanto mais invisível for esse pântano, melhor para você. Você é a única flor de lótus que deve ser notada e admirada. Se você tiver popularidade, terá legitimidade para fazer qualquer coisa: poderá mudar de posição, trair, roubar e até mesmo matar e colocar toda a culpa em seus auxiliares (o pântano também serve para isso). Às vezes será necessário, para manter o pântano, proteger os seus auxiliares com o manto da impunidade (do contrário as pessoas não se arriscarão a assumir a culpa para livrá-lo de alguma sanção). Mas só você deve ter a condição de inimputabilidade para fazer isso, de sorte que as outras pessoas dependam inteiramente da sua boa vontade e, assim, fiquem totalmente nas suas mãos.

NONO CONSELHO. Adquira a capacidade de mentir sem corar. Minta, minta descaradamente sem qualquer pudor. Se, por exemplo, alguma investigação apontou a sua culpa em um determinado crime, declare sempre que todas as investigações provaram que você não tinha qualquer culpa. Não se preocupe com a coerência pois em política isso não vale para nada. Nem tenha problemas de consciência: quando o assunto é poder, o superego só atrapalha. Mas, sobretudo, adquira a capacidade de dizer exatamente o oposto do que você está pretendendo. Por exemplo, se você está trabalhando para desmoralizar uma instituição, declare publicamente que tal instituição é soberana e deve ser respeitada por todos. Se você está querendo ficar no poder contra as leis do seu país, diga que jamais aceitará ficar no poder, mesmo que o povo inteiro lhe peça isso em nome felicidade geral da nação. Mais ainda: aprenda a se antecipar às conseqüências das suas ações declarando sua intenção oculta para que ela pareça ser de outrem e não sua. Assim, você inoculará na opinião pública uma vacina contra a identificação do verdadeiro culpado. Então, por exemplo, se você está querendo desmoralizar um adversário, diga antes que fica muito chateado com os que cometem a baixeza de tentar atingir a honra de seus adversários. Essa é uma sabedoria sutil e suprema: aprenda a mentir com a verdade.

Você, caro jovem normal, que não tem vocação e pretensões políticas e que está assistindo diariamente, sem entender direito, o que se passa nas instituições políticas brasileiras, aqui vai o meu conselho. Tente adaptar, para a sua vida social e profissional, os nove conselhos que acabei de dar aos jovens atores políticos. Se, para eles - a quem caberá a tarefa de nos governar e legislar - não valem quaisquer princípios e regras de bom comportamento, por que deveriam valer para você?

Postado por Paulo R. de Almeida no blog Textos PRA, Sexta-feira, Setembro 14, 2007

Minitratado dos reencontros - Paulo Roberto de Almeida

Minitratado dos reencontros
Paulo Roberto de Almeida

(ver toda a série neste link)

Depois de ter tratado, num dos minitratados (sem jogo de palavras) desta série, dos desencontros, cabe falar também dos reencontros, que podem eventualmente ocorrer, embora eles possam demorar algum tempo para se materializar, por vezes até alguns anos. O reencontro pode ser considerado a inflexão da curva de dispersão, ou da linha de divergência, que tinha sido formada, ou que existia, por ocasião do desencontro. Com efeito, o reencontro só se justifica, na maior parte dos casos, após um desencontro ter acontecido, salvo se a separação anterior foi uma obra do acaso, uma contingência inesperada, um acidente de percurso ou seja lá qual fator acidental. Em qualquer hipótese, um reencontro depende da vontade de pelo menos uma das partes, imponderável como pode ser a realização de uma expectativa, sempre dependente das trapaças da sorte o da astúcia da razão. Se as duas partes o desejam, então a conjunção se faz mais facilmente ainda, embora essa hipótese seja mais rara.
A razão, a motivação e o esforço para realizar o reencontro estão todos situados numa mesma dimensão fundamental: a carência, real ou percebida, em relação a uma situação de melhor conforto espiritual com uma dada relação. Tem de ser isso, ou então não haveriam motivos para tantas angústias, tantas reflexões ao léu, tantas suposições otimistas, tantos cenários idealizados. Carências podem se manifestar de duas maneiras: uma negativa, que seria uma espécie de estado depressivo, outra mais positiva, que seria a esperança levada ao estado de euforia, caso o reencontro se materialize por acaso ou por intenção. Seria simples assim? Provavelmente não, pois raramente existem soluções extremas para a maior parte dos casos e sim o continuum de situações indefinidas, que angustiam o “paciente”.
Existe uma estratégia para o reencontro, ou estratégias? Eventualmente, a parte interessada no reencontro pode elaborar uma (e segui-la, o que parece mais importante), embora tudo possa ser muito difuso e até isento de planejamento quanto aos lances táticos que levariam, supostamente, ao almejado reencontro, que é, por certo, a convergência de vontades. Na paz como na guerra, na vida civil como na vida militar (se é que se pode falar em vida, neste caso), na autonomia como na dependência, sempre se pode desenhar estratégias para enfrentar os acasos da vida (embora isso não queira dizer que todas elas funcionem adequadamente). Jogos de guerra, ou jogos de amor, nem tudo termina com final feliz para todos, o tempo todo.
Já que este é um minitratado – ou seja, um documento formal de procedimentos, métodos e disposições práticas, quase um manual de serviço – caberia descrever os detalhes da estratégia e discutir seus elementos táticos. Quem sabe a partir daqui não resulte um desses How to do?, desses que vendem nas estantes de autoajuda – ou até um Idiot’s Guide to Making Up Again – que podem ser úteis a almas gêmeas temporariamente separadas ou a corações desesperados? Não tenho certeza de oferecer o manual perfeito para tranquilizar corações desesperados, mas vou tentar acalmar os confusos (sem garantia de sucesso e sem dinheiro devolvido).
A primeira tarefa nesse tipo de empreendimento é definir as chances de que o objetivo se concretize; existem várias possibilidades classificatórias: o reencontro pode ser utópico, realizável, impossível, razoável no médio prazo, imprevisível, mesmo no longo prazo, etc. Pode até conceber um quadro analítico – quem sabe uma tabela Excel? – com cronogramas definidos, cujas células poderiam ser ocupadas por “missões” graduais para a consecução do reencontro, até a etapa final de atingimento do objetivo fixado. Uma estratégia consequente prevê várias táticas alternativas, todas conjugadas ou atuando de forma sucessiva, conforme os efeitos e resultados da aplicação de cada um.
Existem métodos diretos ou indiretos de aproximação, o que for mais conveniente. Hoje em dia, o Google resolve quase todos os pedidos de busca, mesmo os mais inusitados (suponho que até a polícia, em suas missões para os mais “wanted men”, mas podem ser “women” também, use o Google para buscas rápidas). As redes sociais também “atingem” – literalmente – milhões de pessoas, embora nesses casos de busca afetiva um dos lados sempre peca por timidez.
Definida a estratégia e desenvolvidas algumas técnicas, cabe esperar uma implantação decisiva da missão “reencontro”, de preferência com ações bem pensadas para não frustrar o objetivo final. Geralmente a abordagem é gradual, indireta e silenciosa, embora existam os apressadinhos (em parte incautos) que passam a uma tática de assédio pouco recomendável para a maior parte dos casos. Um “levantamento de terreno” preliminar – como no caso do planejamento militar – parece indispensável ao desenvolvimento de uma estratégia bem montada, o que implica em conhecimentos mínimos de cartografia afetiva e de mapeamento sentimental.
A logística também apresenta papel importante, pois é preciso planejar as operações sobre o terreno, com margem suficiente de manobras e recursos disponíveis para manter presença no terreno. Aqui não precisa de soldados, no sentido estrito do termo, mas certamente precisará de talão de cheques, no sentido estrito e no lato, sobretudo neste último. Quanto mais lato melhor, pois essas táticas de sedução costumam ser altamente custosas para o bolso do contribuinte...
Enfim, quaisquer que sejam as táticas e estratégias a serem mobilizadas no esforço de reencontro, é preciso ter algo para “vender”; do contrário fica difícil concretizar a meta da “conquista” (como nos objetivos militares). O objeto, parece claro, é o próprio iniciador do esforço de reencontro, o personagem que se coloca na posição de articulador de novas situações, o proponente de uma nova etapa de vida. Nesse ponto entramos naquilo que os americanos chamam de core of the matter, ou na substância da matéria. Não tenho sugestões a fazer neste particular. Apenas desejar que o pretendente seja o personagem dos sonhos da pessoa visada. Também acontece...

Brasília, 14 de abril de 2011

O "povão" volta a cena: FHC se explica

Eu já tinha postado aqui minha opinião de que esse afastamento do "povão" não era a boa tática, embora conceda que o ex-presidente foi mal interpretado. Ele queria dizer na verdade movimentos sociais, que são todos manipulados -- e alimentados e financiados -- pelo partido no Brasil, quase numa conjução mafiosa.
Parece que o debate vai amainar, mas o desgaste, e o desastre, já foi consumado.
O PSDB vai virar o partido da classe média, quase uma nova UDN. Não tem problema: a UDN também chegou ao poder pela eleições, embora com candidato bizarro...
Vamos tentar outra vez.
Paulo Roberto de Almeida

"Não sou idiota para propor que o PSDB ignore o povão", diz FHC
Cristiane Agostine | De São Paulo
Valor Econômico, 14/04/2011, pág. A6

FHC: "Ficar no discurso de quem rachou ou de quem é candidato não interessa a ninguém; é preciso sensibilizar a população"

"Qual é o bobo que vai deixar de lado o povão nas eleições? Eu não sou um idiota". Indignado, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de 79 anos, diz que foi mal interpretado no artigo de sua autoria, divulgado pelo PSDB e amplamente criticado por correligionários. No texto, o presidente de honra do partido diz que se os tucanos persistirem em disputar com o PT a influência sobre os movimentos sociais ou o "povão", o partido falará sozinho.

Em entrevista ao Valor, concedida na tarde de ontem por telefone, FHC afirma que na entressafra eleitoral o PSDB precisa construir um discurso e direcioná-lo para aqueles que ascenderam socialmente durante os anos do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para Fernando Henrique, o partido precisa manter uma expectativa de poder para continuar vivo. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: O senhor defendia a aproximação do PSDB com as bases sociais, mas agora diz para o partido desistir do 'povão' e buscar a nova classe média. O que mudou?

Fernando Henrique Cardoso: Sempre tive a mesma posição. Agora tem de ver o que é novo, o que está emergindo. Acho que o PSDB tem de ser o porta-voz do novo. Tem que ter uma mensagem com estratégia de futuro do Brasil. O novo é que as pessoas estão mais voltadas a sua vida cotidiana. Então tem de ver como é que liga a preocupação da vida cotidiana com essa estratégia de futuro e com valores como a democracia, a luta contra a corrupção e contra o clientelismo. Tem que mostrar que há problemas de infraestrutura nas obras da Copa e dos aeroportos. Isso a população sente, percebe o que está faltando. Tem que mostrar que a questão do imposto não interessa só ao rico, mas a todos. Além disso a mensagem tem que vir de meios de comunicação novos, sem dispensar os tradicionais. É preciso usar internet, redes sociais. E não basta a oposição ficar no parlamento. Tem que ir para as ruas, se aproximar do povo. Agora boa parte do que o PT chama de povão, está mais cooptada pelo clientelismo. Mas isso não quer dizer que vou desprezar uma camada. Sou louco por acaso? Não ganhei duas vezes a eleição do Lula, no primeiro turno? Vou desprezar alguma parte? Não! Estou dizendo qual é a estratégia, como é que faz para sua mensagem se consolidar. Não falei de eleição, nem de voto. Na entressafra eleitoral devemos utilizar este momento para refazer nossa linguagem, para ver quais são as camadas mais sensíveis. Não estou tratando de eleição.

Valor: O senhor quer dizer que na eleição tem de se aproximar de todos, mas na entressafra...

FHC: Não. Não só na eleição. Quais são as camadas que estão desconectadas e como o PSDB pode se conectar com elas? Não é questão de se aproximar. Claro que um partido tem que se aproximar com todo mundo do país. O que eu fiz no governo? As bolsas quem criou, não fomos nós? Na reforma agrária, quem deu o impulso não fomos nós? Não é essa a ideia, de ter um setor que se ocupa do povo e outro da elite. O que não pode é pensar que não houve uma mobilidade grande e que setores enormes das camadas populares, trabalhadores, é pensar que não estejam conectados pela internet também e que não estejam suscetíveis a uma mensagem que não a tradicional. E também que não sejam tão suscetíveis de ser cooptação por esse assistencialismo. Não se trata de se aproximar do povo só na eleição. Tem que ter uma concepção mais complexa do que é a sociedade. Fiquei muito assustado com a rapidez com que as pessoas interpretam e criticam [o artigo] antes de ler. Foi uma interpretação equivocada do que eu penso.

Valor: Desistir dos movimentos sociais, do 'povão', não é uma orientação divergente à estratégia de o PSDB se aproximar do Nordeste?

FHC: Imagina se eu seria louco de achar isso. Não, não. Agora tem que ter marca. O Nordeste também está avançando e queremos que avance mais. Não temos que ser o partido da manutenção e da transição do atraso, através dos meios sociais que sejam. Temos que dar os meios sociais, a ajuda necessária, mas não pode se contentar com isso. Tem que se medir... "Qual é o progresso? Como é que eu avanço?"

"Estou dizendo qual é a estratégia, como se faz para sua mensagem se consolidar. Não falei de eleição, nem de voto"

Valor: O senhor falou da nova classe média, como a classifica?

FHC: Sociologicamente não é classe média. Classe social não é classe de renda. Teve um aumento da renda de vários setores, mas isso não classifica automaticamente como uma mudança de classe, no sentido sociológico. Classe implica em um estilo de vida, de educação, redes sociais, conjunto de privilégios. Estamos usando, sociologicamente, de forma abusiva a ideia de uma nova classe média. Não é uma nova classe média. São novas categorias sociais. O mundo de hoje não é tão estabilizado como o do passado, que tinha o trabalhador, a classe média e os empresários, a burguesia. É um mundo muito mais fragmentado. Houve mobilidade, sim, melhorou a renda. Com o tempo, aí sim, vai estabelecer novas teias de relações sociais, participar de certos grupos de escola... Com o tempo vai ser, eventualmente, o que se chama de classe média.

Valor: As demandas da nova classe média se assemelham às das classe D?

FHC: As demandas são diferentes. [A nova classe média] Vai querer mais informação, mais atendimento e mais qualidade dos serviços sociais. Nós conseguimos dar acesso geral à educação, mas todo mundo se queixa da educação no Brasil. Vai ser um momento difícil, da passagem da quantidade para a qualidade. No fundo é o momento de o Brasil passar de país em desenvolvimento para desenvolvido. O PSDB e as oposições têm que entender isso e ir para a vanguarda, como nós fizemos no passado, quando o PT era contra a estabilização da economia. O PT era contra o capital estrangeiro. O PT era contra que as leis do mercado tivessem vigência, era contra a globalização. Hoje acabou tudo isso. Ninguém mais é contra. Mas o PSDB foi a favor. De novo agora temos que dizer: isso está feito e o que mais? Vamos olhar o horizonte, avançar mais. Alguém vai fazer isso. Se não fizermos outros farão.

Valor: E por que essa nova classe estaria mais suscetível ao discurso do PSDB do que a classe D?

FHC: O PSDB tem de ser capaz de ter um discurso que mexa com ela. É o que eu estou dizendo. Não tem um discurso definido. Vamos procurar um discurso, vamos ouvi-la.

Valor: O que poderia motivar a aproximação? No artigo o senhor cita a questão moral...

FHC: Pode ser a questão moral. Mas pode ser a questão do atendimento, dos serviços com mais qualidade, mais segurança. Não tenho uma receita. É uma estratégia. É mudar o foco, para ver se chega lá. Se as pessoas discutissem isso seria mais útil do que discutir se vai deixar de lado o povão. Qual é o bobo que vai deixar de lado o povão nas eleições? Eu não sou um idiota. Todo o governo tem que olhar para a população, para os mais pobres também. Precisamos disputar o controle político dessa população. Não temos instrumentos para o assistencialismo, para transformar as bolsas em o instrumento de voto, cooptar os sindicatos...

Valor: Em relação aos movimentos sociais, Alckmin e Aécio tentam se aproximar das centrais sindicais. O senhor discorda da estratégia?

FHC: Tem mesmo que se aproximar. Acho que deve 'descooptar'. Mas os sindicatos do Brasil e no mundo todo não pegam mais a maioria dos trabalhadores. O índice de filiação é pequeno. Não sei se as demandas dos sindicatos são as dos trabalhadores ou são da burocracia sindical. Essa subiu na vida também e tem poder político. Mas será que arrastou consigo a massa operária? Duvido. O que não quer dizer que não devemos trabalhar com os sindicatos.

Valor: E qual pode ser o ponto de intersecção entre os discursos do PSDB e o sindicalismo?

Fernando Henrique: O PSDB deve lutar contra o corporativismo. E a garantia de sobrevivência sem a adesão dos trabalhadores não tem sentido. O imposto [sindical] é sobre todos os trabalhadores sem que eles digam se querem ou não. Não faz sentido.

Valor: E os 100 dias da presidente Dilma, como o senhor analisa?

FHC: Esse negócio de 100 dias é outra dessas ficções. É muito cedo para avaliar o governo. Ela mudou um pouco o estilo: menos falante, muito mais cortês comigo. Não sei qual vai ser a política. Na Vale já houve uma interferência bastante forte. Na política externa houve modificações. Falar de direitos humanos é positivo, se distanciar daquela visão de que basta ser ditadura dita de esquerda para nós termos uma ligação é bom. Mas é como uma partida de xadrez, quem dá os lances iniciais é quem tem as pedras brancas. Na política, quando alguém ganha a eleição leva as pedras brancas. Não adianta nos precipitarmos antes de saber qual é o jogo deles. Não é o momento de eu sair criticando. Todos torcem para que o Brasil vá pra frente.

Valor: Com o esvaziamento do DEM, como será o papel da oposição em relação ao governo?

FHC: Não sei como a oposição vai se desdobrar, porque depende do que o governo faça. Agora não dá pra tapar o sol com a peneira. Essa perda de substância do DEM não é boa, a menos que o novo partido se declare de oposição. Temos que ter uma mensagem que vá além do jogo dos partidos e do Congresso, que fale com o país. Para isso vai precisar de líderes que encarnem a nova mensagem. Tendo essa liderança, você se mantém na oposição e mantém o partido vivo. Mantém uma expectativa de poder. Enquanto o PSDB representar no imaginário das pessoas uma alternativa pro futuro, ele se mantém apesar das dificuldades do dia-a-dia da oposição.

Valor: O PSDB então poderia já lançar uma pré-candidatura à Presidência?

FHC: É cedo para isso, mas tem que se preocupar com o pé no chão. O partido tem que se estruturar nas bases, oferecer bons candidatos a prefeito, olhar no mapa eleitoral e dizer 'onde estamos fracos?' Tem que recrutar bons candidatos, que tenham compromisso programático, compostura política. Candidatos que tenham capacidade de expressar o que a população está sentindo nos municípios. É um longo trabalho a ser feito, de formiguinha, não de quem vai ser candidato a presidente. O que o PSDB precisa agora é de coesão. O DEM está com um problema muito grave. Não temos fratura, temos que solidificar a coesão. Quem quiser trabalhar pela oposição no futuro tem que trabalhar já pela coesão no PSDB. E não ficar pensando em nome de uma eventual candidatura.

Valor: Geraldo Alckmin lançou informalmente Serra à Prefeitura de São Paulo. O que o senhor acha?

FHC: Não sei se é a melhor opção pra ele. Se não combinar com o principal interessado, não tem jogo. Não sei qual é a opinião do Serra. Duvido que ele esteja, nesse momento, pensando nisso. Claro que, se for candidato, todo mundo vai ficar ao lado dele. Mas nesse momento nós todos devíamos estar pensando qual é o nosso papel, como é que você fala com a sociedade. Dizer que 'é candidato, não é', 'rachou, não rachou', isso cansou o povo. Isso não diz nada a ninguém. É preciso falar coisas que sejam sensíveis à população. Ontem, fiz uma palestra em Maringá (PR). Tinha 2,8 mil pessoas. Fiquei espantado. Jovens, mulheres, empresários, tudo misturado. O que eles querem saber? O futuro. Você junta aqui 100 pessoas para discutir, nesse momento, quem vai ser candidato? Não junta. Vamos partir do que a população está sentindo, não do que nós mesmos publicamos nos jornais. Um põe uma notinha aqui, outro lá, já sabe quem pôs, um fica envenenado contra o outro, não leva a nada.

Miragens chinesas - The Economist

Brazil/China economy: Rebalancing the relationship
The Economist, April 13th 2011

FROM THE ECONOMIST INTELLIGENCE UNIT

Sino-Brazilian commercial ties have expanded rapidly in the last decade, and China is now Brazil’s top trading partner—and was its biggest foreign direct investor in 2010 (with FDI worth around US$15bn). However, the relationship is seen as unbalanced, with Brazil exporting mostly commodities and importing manufactured goods from the Asian giant. President Dilma Rousseff took a step towards correcting this imbalance during a five-day visit to China that began on April 11th. She signed 22 co-operation agreements, some designed to open China’s market to higher-value-added goods.

The Rousseff administration wants to diversify Brazil’s exports and convince China to lower its substantial formal and informal barriers to the import of manufactured and processed goods. For example, China buys huge quantities of soybeans from Brazil, but does not import much processed soy products. Of Brazil’s US$56bn in sales to China last year, around 75% was commodities, with iron ore being the top export item. Similarly, some 90% of Chinese FDI in Brazil is in natural-resources sectors.

Accompanied by a large contingent of Brazilian businessmen and officials, Ms Rousseff was clear in her message to her Chinese hosts: she wants a “qualitative jump” in what Brazil sells to the Asian powerhouse, with a major increase in value-added and processed goods. The government also wants Chinese investment in Brazil to be more diversified, to include not just extractive industries but also high-tech manufacturing.

Range of deals
The president got some of what she wanted. The accords cover areas ranging from defence co-operation to joint development of agricultural technology and biofuels, as well as sports and education initiatives. The two sides also agreed to do research and development in the areas of nanotechnology, electricity and oil. Brazil’s state-controlled oil company Petrobras, for instance, will work with China’s Sinochem and Sinopec to develop new technologies for geological and deep-water prospecting.

China also said it would lift barriers to the import of pork products and agreed to purchase 25 additional regional jets for its state companies (Beijing had already agreed to buy 10) from Embraer, the Brazilian aircraft manufacturer. These orders are worth US$1.2bn. As a follow-up, the Chinese will send a commercial mission to Brazil in May to identify other potential suppliers of manufactured goods.

In the high-tech area, a major announcement came from the chief of Taiwan-based Foxconn, who said the company was considering an investment of US$12bn over five years in Brazil to manufacture Apple products, including the popular iPad tablet computer.

Looking for reciprocity
At the core of the discussions was the concept of “reciprocity”. This underscores growing concerns that, although Brazil has reaped rewards from its closer ties to China in terms of trade and investment—Chinese demand has been a driver of Brazilian exports and economic growth for years—the long-term benefits seem to favour the Chinese. Critics warn that Brazil and other Latin American commodity exporters are returning to a commodity-driven export path resembling that of the 17th and 18th centuries.

This carries the risk of an over reliance on commodity exports at the expense of sectors such as manufacturing and services exports. This not only makes Latin American countries vulnerable to a crash in commodity prices (or a sharp drop in Chinese demand), but also to “Dutch disease”, whereby local currency values rise in line with commodity prices, making it even more difficult for their manufactured and non-commodity exports to compete. This could contribute to potential “deindustrialisation” of Latin American economies—whereby manufacturing sectors shrink as natural-resource sectors continue to grow. This could eventually lead to rising imports and decreasing exports, balance-of-payments difficulties and negative impacts on overall economic growth.

The risk of deindustrialisation is compounded by the fact that China captures the bulk of value-added production from the commodities it buys, while discriminating against imports of value-added goods. Further, thanks to China’s low labour costs and a government policy designed to keep the Chinese currency undervalued, China outcompetes many Latin American manufactured goods in global markets and increasingly within Latin America’s home markets as well.

China is a competitor
According to one analysis, 94% of manufactured exports from Latin America and the Caribbean face a partial or direct threat from China. The direct threat is most acute for Mexico and the countries in Central America and the Caribbean, which are not net commodity exporters but export many light manufactured goods that directly compete with exports from China. Such countries have been losing market share to more competitive Chinese goods for some years.

Yet even in Brazil there is worry about potential deindustrialisation. Manufacturing competitiveness is being hurt by the strong local currency, the Real (which has been appreciating for two years owing to strong capital inflows), as well as by China’s own currency policy. Given Brazil’s diversified productive sector, the short-term risk of deindustrialisation is limited. However, industrial growth has been slower than that of commodity exports, and many sectors—notably clothing and footwear—have already suffered loss of market share at home and in neighbouring markets.

Active industrial policy
The Rousseff administration’s desire to reset commercial relations with China forms part of the left-leaning government’s broader industrial policy designed to promote industrial leaders (“national champions”), boost competitiveness and use industry as a tool of economic development.

Besides assisting local businesses with state financing and other incentives, the government is trying to steer certain strategic companies towards more production of value-added goods. One example is Vale, Brazil’s second-largest company and one of the world’s biggest mining companies. Vale extracts iron ore and other base metals, and exports them mostly to China. The previous government of President Luiz Inácio Lula da Silva tried to strong-arm the management of Vale for years to invest in steel production and other value-added projects at home. Ms Rousseff earlier in April finally succeeded in pressuring Vale’s shareholders to oust its president, who had resisted such government interference.

Challenges ahead
With regards to China, the recent bilateral agreements, while notable, are not likely to fundamentally change the nature of the relationship. Not only will China continue to import primarily raw materials, it is also becoming a bigger player in the direct production of such resources, particularly oil. Energy security and access to primary metals and foodstuffs will remain China’s overriding strategic interest in Brazil.

As China also continues to penetrate the Brazilian market with its lower-cost electronics, clothing and other goods, domestic producers may display more resistance to Chinese competition, and may pressure the government for more direct assistance (even protectionist measures) or to initiate anti-dumping complaints. Yet even commercial tensions of this nature are unlikely to turn back China’s expansion in Brazil, whether via trade or direct investment.

The challenge for Brazil and other commodity exports will be to figure out how best to profit from the Chinese connection to ensure that it contributes to more equitably distributed, diversified and sustainable growth. Besides agreements of the type signed in Beijing, more will have to be done on the domestic side to channel income from the commodities windfall to improvements in education, infrastructure and innovation, which will help to improve competitiveness over the longer term. Progress in implementing structural reforms in areas such as labour laws, fiscal policy and taxation, which keep business costs high, will also be needed.

The Economist Intelligence Unit
Source: ViewsWire