segunda-feira, 21 de abril de 2025

Duda Teixeira transcreve artigo de Mario Vargas Llosa, de 2007, sobre a relação Lula-Chávez (Revista Veja)

 

07/10/2010 15h02 - Atualizado em 07/10/2010 15h03

Em artigo de 2007, Vargas Llosa critica apoio de Lula a Chávez; leia a íntegra

'Sabres e utopias', do peruano Nobel de literatura, reúne textos políticos.
Artigo de junho de 2007 é inspirado em leitura de revista e jornais brasileiros.

Capa de 'Sabres e utopias', de Vargas LlosaCapa de 'Sabres e utopias', de Vargas Llosa (Foto:
Divulgação)

Em seu livro mais recente, "Sabres e utopias", (editora Objetiva) o peruano Mario Vargas Llosa, vencedor do Nobel,  escreve artigos sobre política, direitos humanos, história e literatura. Ele também aborda o Brasil, como no texto abaixo, de junho de 2007, em que critica a relação do governo Lula com Chávez. Confira o artigo na íntegra:

O SOCIALISMO DO SÉCULO XXI

Diferentemente do que ocorre em outros países, onde a imprensa escrita perde leitores e publicidade e, em consequência, empobrece, no Brasil ela parece gozar de ótima saúde. É a impressão que me fica de uma semana intensa passada nesse país, entre o Rio de Janeiro e São Paulo (com direito a uma rápida escapada até o pequeno paraíso de Búzios), durante a qual,
fiel à minha vocação de leitor inveterado de jornais, tomei café da manhã todos os dias mergulhado nas abundantes páginas de "O Globo", "O Estado de S.Paulo" e "Folha de S.Paulo", os três principais jornais do país. Excelentes, os três. Bem escritos e otimamente diagramados, com rica informação local e internacional, bons colunistas, pouco sensacionalismo e quase nenhuma fofocagem. A única coisa a lamentar é o pouco espaço dedicado à cultura, algo de que os três padecem — mas já sabemos que isso é, hoje, uma doença mundial.

A imprensa brasileira, escrita e televisiva, reagiu com muita força e condenou de maneira severa o fechamento da Radio Caracas Televisión pelo aprendiz de ditador venezuelano Hugo Chávez. Até o Senado brasileiro fez a mesma coisa, numa atitude que o enobrece, sobretudo considerando os escrúpulos e silêncios covardes de outros parlamentos latino-americanos
diante da violação cometida por Chávez com a intenção de acabar com o pluralismo da informação e com a liberdade de expressão na Venezuela. Lamentável, isso sim, é o apoio que Chávez recebeu do presidente Lula, que justificou o fechamento da RCTV, para não despertar a ira do caudilho venezuelano, numa atitude que felizmente recebeu muitas e justas críticas da imprensa brasileira. De resto, não existe o menor risco de que Lula imite Hugo Chávez: embora lhe mande beijinhos escancarados e simule, por vezes, apoiá-lo, sua política vai no sentido exatamente oposto ao da estatização e do coletivismo econômico que o destemperado comandante aplica em seu país, decidido, pelo visto, a produzir na Venezuela uma catástrofe econômica e institucional semelhante à gerada no Peru pelo general Juan Velasco Alvarado, mais um dos mentores e modelos de Hugo Chávez, além de Fidel Castro.

Lula optou por um socialismo moderno, à moda europeia, ou seja, por um socialismo que dele só mantém mesmo o nome, pois apoia o investimento estrangeiro e o mercado, a abertura econômica e a empresa privada. E é por isso que os empresários brasileiros estão satisfeitos com ele: sabem que suas declarações esporádicas de simpatia em relação a Chávez são meras concessões retóricas à esquerda radical com vistas a aplacá-la — sem nenhum sucesso nesse sentido, aliás, pois ela já o ataca por considerá-lo um traidor da revolução. São os paradoxos do tempo em que vivemos: Lula, campeão do capitalismo para uma direita econômica brasileira que vê no ex-sindicalista a melhor defesa contra o “socialismo do século XXI” proposto por Hugo Chávez.

O último número da revista "Veja" — com uma tiragem de um milhão e duzentos mil exemplares por semana — contém uma excelente reportagem investigativa sobre esse “socialismo do século XXI” inventado pelo comandante Hugo Chávez e que ele, a golpe de petrodólares, empenha-se em disseminar por toda a região. O texto, assinado pelo jornalista Duda Teixeira, que averiguou os dados in loco, é preciso. Alguns exemplos ali expostos demonstram a velocidade e a obscenidade com que os colaboradores políticos mais próximos do caudilho-paraquedista enriqueceram no poder. O psiquiatra Jorge Rodríguez, vice-presidente nomeado por Chávez, é dono de um luxuoso hotel na ilha Margarita, principal balneário do país. Adán Chávez, irmão do presidente e ministro da Educação, é dono de uma empresa proprietária de 1.600 caminhões e barcos de pesca, e o senhor Eudomario Carrujo, diretor financeiro da poderosa PDVSA, a companhia petrolífera estatal, possui uma frota particular de quinze automóveis de luxo, entre eles um Hummer H2, que vale cem mil dólares. Este último veículo é o preferido entre os altos funcionários chavistas, segundo admitiram à "Veja" as concessionárias de automóveis de Caracas. Luis Acosta Carlez, governador chavista de Carabobo e um dos principais arautos do “socialismo do século XXI”, perguntou sem o menor escrúpulo: “Por que
nós, revolucionários, não teríamos o direito de ter uma caminhonete Hummer H2?” Com efeito, por que não? Por acaso o presidente Brejnev, da URSS, não tinha como hobby colecionar Mercedes-Benz? Mas não são apenas os carros que estão entre as fraquezas da atual nomenclatura venezuelana. Outra delas é Miami, com seus shopping centers, boates e hotéis de luxo. Nesse quesito, registra o jornalista da "Veja", com humor, Hugo Chávez já conseguiu igualar seu herói epônimo Fidel Castro: como os cubanos, todos os venezuelanos, agora, sonham em fugir para os Estados Unidos. A diferença está em que os altos funcionários chavistas podem, sim, fazê-lo. Mas como não fica bem gastarem seus petrodólares no império contra o qual seu chefe e caudilho se destempera dia e noite, valem-se de pequenos golpes ou malandragens que o relato de "Veja" narra com inúmeros detalhes. Como o de terem dois passaportes — um
deles apenas para viagens aos Estados Unidos — ou então arrancar as páginas que contenham carimbos de entrada no inferno imperialista.

O “socialismo do século XXI” consiste, também, em um mercantilismo desavergonhado. Na Venezuela de hoje, ainda é possível ser um capitalista bem-sucedido, desde que se seja, também, um chavista servil. Como a transparência desapareceu completamente com a instalação do regime, as concessões, licitações e contratos estatais são outorgados a dedo, e, às vezes, mediante editais ou concursos manipulados. Prevalece, sempre, o critério político, conforme a velha lei de ferro das ditaduras terceiro-mundistas: “Para os amigos, todos os favores; para os inimigos, a lei.” Como, graças à política chavista, a produção industrial do país despencou, a importação de mercadorias de primeira necessidade constitui, hoje, excelente negócio. No entanto, para obter os dólares necessários, o importador precisa manter ótimas relações com o governo, já que, visando exatamente isso, estabeleceu-se o controle do câmbio, tradicional instrumento de coerção e de suborno adotado pelos governos “nacionalistas” latino-americanos.

Apesar da pavorosa realidade de corrupção, favorecimentos pessoais, demagogia e autoritarismo que relata, a reportagem da "Veja" não é totalmente pessimista. Por outro lado, confirma algo de que eu já suspeitava depois de ver a maneira corajosa com que a oposição venezuelana se mobilizou contra o fechamento da Radio Caracas Televisión: que, dessa vez, o
caudilho venezuelano deu um passo em falso e o povo venezuelano começou a abrir os olhos para o monstro que criou ao depositar sua confiança e seus votos em um demagogo que pode levar o país à ruína e a uma ditadura totalitária. As pesquisas feitas pelo Instituto Hinterlaces, de Caracas, e publicadas pela "Veja", falam por si: 78% dos venezuelanos desaprovam o antiamericanismo de Chávez; 85% condenam o financiamento político a outros países; 86% não querem um socialismo à cubana; e 86% são contra o confisco de propriedades privadas. Mais: 40% dos venezuelanos que votaram em Chávez nas eleições de dezembro passado declaram que hoje votariam contra ele.

Ainda há esperança, portanto, para a Venezuela. E podemos garantir, sem medo de errar, que o “socialismo do século XXI”, criatura típica do espadachim rasteiro, logo se esvaziará, como mais um engodo criado por essas ditaduras grotescas de que está repleta a história latino-americana.
O que levou milhões de venezuelanos a votarem a favor de Hugo Chávez em diferentes ocasiões nos últimos anos? A corrupção que corroía a democracia e a incapacidade desta última para diminuir a pobreza e as vergonhosas desigualdades sociais. Mas, em vez de optar por uma alternativa libertadora, enfiaram uma corda no pescoço apoiando uma política que, em cinco anos, triplicou a criminalidade no país, fez a inflação disparar, esbanja recursos públicos financiando o extremismo marxista em todo o continente e mantém vivo o semicadáver cubano. Mas, sobretudo, um regime que acrescentou novas e mais perniciosas formas de corrupção às
muitas que o país já trazia de antes. Neste momento, o presidente Chávez sabe que sua impopularidade cresce a cada dia. Por isso, apressa-se em fechar os poucos espaços que ainda restam, na Venezuela, para a denúncia de seus desmandos. O que aconteceu com a RCTV é apenas o começo de um processo que, como em Cuba, acabará por colocar todos os meios de comunicação venezuelanos sob o controle do Estado, à exceção, talvez, de duas ou três empresas supostamente independentes — parece ser esse, por exemplo, o caso da Venevisión, a julgar por seu abominável silêncio diante do fechamento da RCTV —, para manter a farsa do pluralismo na informação. Mas, a julgar pela valente reação que essa medida provocou no meio estudantil e popular que antes apoiava o regime, esse episódio poderia
ser, também, o início do fim da revolução chavista.

São Paulo, 14 de junho de 2007


Le Pouvoir de Dire Non - Dominique De Villepin (Le Grand Continent)

O ex-chanceler francês Dominique De Villepin elaborou um grande ensaio conjuntural e conceitual, sobre o “poder de dizer Não”, da Europa para o mundo. Louvo seu esforço, empenho e clarividência, mas, infelizmente, a França, a Europa e o mundo racional não possuem poder suficiente para dizer Não e barrar a atual prepotência dos gtandes e poderosos. Não vejo estadistas suficientes, como ele, para se juntar não só ao coro, mas aos esforços concretos para dizer não, a Putin, a Trump, a Netanyahu, a todos os déspotas que trazem morte, desgraça e sofrimento ao mundo.

https://legrandcontinent.eu/fr/2025/04/07/doctrine-villepin-le-pouvoir-de-dire-non/ 


Minha expressão de reconhecimento, por Francisco - Paulo Roberto de Almeida

Minha expressão de reconhecimento, por Francisco

Paulo Roberto de Almeida 

Não sou cristão, não sou católico, não sou sequer religioso (a despeito de ter tido formação nessas crenças). Mas sei reconhecer os homens bons, e os falsos cristãos.
Francisco era fundamentalmente bom, para com todos, todas as religiões, todos os povos, todas as pessoas, sobretudo os marginalizados, os rejeitados. Eu o reconheço como uma inspiração para todos, e para todos os dirigentes políticos.
Com base nesses critérios, franciscanos e de Francisco, indico que, claramente, Trump não é cristão, é um homem mau, perverso com imigrantes e estrangeiros em geral. Putin não é, nunca foi, cristão, ao ordenar o massacre de civis ucranianos, da mesma religião ortodoxa, das denominações cristãs, dos judeus, dos agnósticos, de todos os ucranianos, apenas por não se dobrarem à sua vontade opressiva. Bolsonaro nunca foi cristão, ao elogiar torturadores, ao lamentar que a ditadura militar não tivesse eliminado mais opositores da ditadura, entre os quais eu me incluía (e por isso saí do Brasil, para não ser mais uma vítima de assassinos não cristãos).
Francisco honrou o seu nome e sua fé, nisso reconheço uma pessoa profundamente humana, acima de qualquer crença religiosa. Acima e contra as guerras, contra a opressão, contra a pobreza, a desigualdade, a indiferença, a violência, a intolerância.
Um cristão, mas acima de tudo um humanista universal.
Minha homenagem a ele.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 21 de abril de 2025.

Stefan Zweig e o país que não chegou ao futuro - Paulo Roberto de Almeida (blog São João del-Rei)

 Divulgando o que acabo de receber, aproveitando também para convidar todos os cariocas, fluminenses, assemelhados, passantes ao acaso, navegantes, turistas, curiosos, zweiguianos fanáticos, a prestigiarem o simpósio que se realizará na Biblioteca Nacional, em cooperação com a Embaixada da Áustria no Brasil, a ABL e a própria Casa Stefan Zweig de Petrópolis, na próxima sexta-feira 25/04, sobre o maior escritor austríaco (e um dos maiores do mundo), a propósito do livro que lhe é dedicado e com o qual colaborei.

A colaboração abaixo foi divulgada pelo blog São João del-Rei, por iniciativa do colega blogueiro, o intelectual Francisco Braga:


Stefan Zweig e o país que não chegou ao futuro


Prezad@,

Tenho o prazer de apresentar ao leitor (à leitora) do Blog de São João del-Rei seu novo colaborador, Dr. PAULO ROBERTO DE ALMEIDA, diplomata e professor, entre outras especializações, que estreia com o artigo sobre o último livro de STEFAN ZWEIG, Brasil, um país do futuro.

O autor é um dos colaboradores de um livro lançado neste ano, intitulado Stefan Zweig no caleidoscópio do tempo. Aproveito a oportunidade para convidá-lo(la) para participar de um simpósio na Biblioteca Nacional na sexta-feira, dia 25/04/2025, em que será debatido o conteúdo do livro.


Link: https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2025/04/stefan-zweig-e-o-pais-que-nao-chegou-ao.html


Cordial abraço,

Francisco Braga

Gerente do Blog de São João del-Rei”

domingo, 20 de abril de 2025

Book, The New Economic Nationalism, by Monica De Bolle

Ondas Nacionalistas

Sobre meu novo livro, The New Economic Nationalism. A pintura que ilustra esse artigo é de minha autoria.

Ontem, 16 de abril de 2025, foi o lançamento do meu mais novo livro “The New Economic Nationalism”, editado pelo Peterson Institute for International Economics e distribuído pela Columbia University Press. O livro está disponível no site do PIIE e na Amazon, também em formato digital para quem gosta desse tipo de leitura. Não há tradução.

Apesar do “timing” fortuito, o livro não é uma resposta aos acontecimentos recentes, às novas modalidades de nacionalismo, ou aos rompantes protecionistas que dominam o noticiário. Foram oito anos de extensa pesquisa histórica para escrever esse livro, cuja análise é construída a partir da apresentação de diferentes estudos de caso ao longo de mais um século. Da industrialização dos EUA, da Alemanha, e do Japão no Século 19, passando pela Alemanha Nazista, pela Itália de Mussolini, pela reconstrução do pós-guerra, chegando ao Século 21, a obra identifica as principais características das políticas nacionalistas adotadas por vários países. A partir de uma metodologia desenvolvida para avaliar a intensidade do nacionalismo econômico nos casos apresentados, o livro apresenta regularidades e padrões que se repetem apesar das diferentes épocas e contextos.

Eis algumas das conclusões:

  1. O nacionalismo econômico, sempre marcado pelo uso intenso de políticas industriais e protecionismo, é algo que se manifesta em ondas. Ainda que existam casos isolados, na prática o uso de políticas nacionalistas está invariavelmente associado a uma espécie de zeitgeist, de “sabor dos tempos". Não é diferente agora.

  2. Há muitas motivações para o uso de políticas nacionalistas, mas é possível reduzi-las a dois impulsos fundamentais: a busca pelo desenvolvimento a partir da industrialização/reindustrialização, de um lado; o desejo de se sobrepôr a outros países norteado por uma visão de mundo que reduz a nuance de inevitáveis conflitos entre países ao antagonismo combativo, de outro.

  3. As modalidades mais recentes do nacionalismo econômico exibem ambas características, sobretudo quando avaliadas à luz do passado. No nacionalismo atual, o antagonismo combativo é inegável, o que intensifica a agressividade das políticas adotadas, sobretudo no âmbito do comércio internacional.

  4. No Século 21, o nacionalismo econômico é marcado por uma acentuada repulsa à qualquer iniciativa de cooperação global — da rejeição aos acordos de livre comércio ao intenso desconforto e desconfiança em relação a tratados e instituições multilaterais, vistos como um obstáculo à perseguição de interesses nacionais. Desse modo, o nacionalismo econômico hoje transcende a esfera puramente econômica, resvalando para a saúde pública, para as políticas de transição e adaptação climáticas, e quaisquer outras iniciativas que requeiram coordenação entre países.

  5. Modalidades nacionalistas que somam ao desejo de desenvolvimento o antagonismo em relação a outros países e a visões de mundo distintas estão invariavelmente associadas a países com viés autoritário.

  6. Quanto mais agressivas e longevas as políticas nacionalistas, maior o custo econômico futuro. O custo econômico se apresenta na forma de baixa produtividade, baixo crescimento, aumento do desemprego, aumento da desigualdade e da pobreza, entre outros males.

O livro, portanto, ajuda a compreender o presente a partir de experiências passadas, ainda que não tenha sido esse o seu objetivo final. Das conclusões elencadas, a mais importante é a terceira, isto é, a de que o nacionalismo econômico contemporâneo não está circunscrito à economia. É essa a grande “novidade” do “novo” nacionalismo econômico: a brutal rejeição àquela que foi a maior conquista do pós-guerra, os mecanismos de coordenação e cooperação entre países. Essa característica torna a atual onda nacionalista especialmente ominosa e desconcertante. Seus defensores atacam não somente as ideias e estruturas que sustentaram o sistema econômico mundial até aqui, mas toda a rede institucional global responsável pelo enfrentamento dos maiores problemas existenciais da Humanidade: a crise climática, as ameaças à saúde pública, a insegurança alimentar.

Visto desse modo, o nacionalismo econômico — contemporâneo e pregresso — não é redutível a uma agenda de “esquerda” ou de “direita”. Tal simplificação ignora a força psicológica que o retrocesso exerce sobre nós quando somos confrontados com a realidade de que temos controle sobre muito pouco, ou quase nada. Ou seja, o nacionalismo econômico é estrutural. As ondas, inevitáveis.


A fotobiografia de JK - Celso Lafer (O Estado de S. Paulo)

A fotobiografia de JK

Celso Lafer

O Estado de S. Paulo, domingo, 20 de abril de 2025


JK teve a capacidade de compreender a complexidade da realidade do País, suas urgências e seus desafios

 

Juscelino Kubitschek – uma fotobiografia, organizada com dedicação e competência por Fábio Chateaubriand, foi recém-publicada (2024) sob os auspícios da Fundação Padre Anchieta (FPA). José Roberto Maluf, presidente da FPA, destacou o significado para o conhecimento da vida brasileira das imagens que o livro apresenta. Ele pontua que o norte e a âncora da trajetória de JK foram permeados pelos valores e pelas práticas da democracia. É o que configurou exemplarmente o parâmetro em cujo âmbito deu rumo às transformações do Brasil, que liderou como notável homem público.

A fotobiografia é um gênero pouco explorado entre nós. Tece a tradicional narrativa da palavra de uma biografia com o poder visual das fotos. As fotos compõem uma antologia que capta a experiência de uma vida. Esclarecem de onde veio, como veio e a que veio JK, e também o que padeceu no final, por conta do arbítrio do regime autoritário de 1964. Na edição comercial dessa fotobiografia, de próxima publicação, essa maior investigação iconográfica sobre JK estará distribuída em 13 capítulos, que dão o fio estruturador de um admirável trabalho de pesquisa.

JK foi presidente de 1956 a 1961. Faleceu em 1976. O tempo consolidou sua presença no imaginário político e a lembrança de seu período como anos dourados de criatividade, confiança, democracia e desenvolvimento. São anos que contrastam com a rudeza de uma apagada e vil tristeza camoniana que se seguiu e resultou da implantação do regime de 1964.

São vários os fatores que explicam a persistência histórico-política de JK. Um dos mais significativos é a lição da sua governança. JK teve a capacidade de compreender a complexidade da realidade do País, suas urgências e seus desafios. Soube descortinar o futuro do Brasil. Exerceu a tarefa primordial da liderança de estadista, que é a aptidão para imprimir construtivo rumo e sentido de direção para a vida nacional. Assim, levou adiante o impacto transformador dos 50 anos em 5 de seu Programa de Metas e da construção de Brasília.

JK criou o novo a partir do existente, como analisei na minha tese de PhD de 1970 em Cornell sobre o processo decisório do sistema político brasileiro no seu período – publicada em português em 2002.

JK soube enfrentar o imenso desafio a que se propôs de transformar interna e externamente a escala do País, coma competência de quem sabia formular e decidir, reunir talentos, entender-se com o Congresso, mobilizar confiança nos projetos a que deu andamento, conjugando maestria executiva, vocação democrática e imaginação política e administrativa. Nesta empreitada foi O Artista do Impossível, como o qualificou Claudio Bojunga na sua admirável biografia.

A atração que JK ainda desperta sobre os caminhos pelos quais infundia confiança e esperança no futuro do Brasil foi instigada pelos ares da redemocratização e pelo centenário de seu nascimento em 2002. Impulsionou biografias como adeBoju ng a e as docontí nu owork in progress da admirável devoção ao seu percurso de Ronaldo Costa Couto.

Na passagem da palavra para a imagem, instigou a minissérie JK da TV Globo, de 2006, que em roteiro de Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira, combinou história e criação como o engenho da linguagem televisiva. As imagens em movimento norteiam os documentários sobre JK e muito especialmente o mais recente, o qualificado relato de 2023 preparado pela TV Cultura: JK - O Reinventor do Brasil. Os documentários são narrativas de um fluxo em andamento. Não possuem, no entanto, as características próprias das fotos, que são lascas do tempo que configuram, como diria Susan Sontag, um grande livro de citações, de relevante informação sobre um percurso.

Sontag aponta a diferença entre o pintor e o fotógrafo. O pintor, mesmo nos retratos, constrói. A fotografia, mesmo nas pousadas, revela. É o que se pode verificar nesta fotobiografia comparando os qualificados portraits de JK pintados por Portinari e Di Cavalcanti com as suas fotografias, inclusive as oficiais.

A capa é a chave da interpretação do livro. É JK em 1960 empunhando uma Rolleiflex num evento com jornalistas, assumindo o papel dos fotógrafos que cobriam a entrevista. É como se JK indicasse com a Rolleiflex que cabia aos fotógrafos e suas fotos darem testemunho das lascas do tempo do percurso de sua vida, numa antologia de citações. Estas partem da Diamantina de seu nascimento; das etapas de sua formação que, superando as dificuldades de menino pobre, o levaram à cursar Medicina; do prefeito-furacão de Belo Horizonte; do inovador governador do binômio energia e transportes de Minas Gerais; da afirmativa campanha e eleição à Presidência; da epopeia dos 50 anos em 5 e da construção de Brasília; dos registros de família; do afeto pela sua querência Diamantina; do senador cassado e exilado; de sua volta ao Brasil e suas penúrias; arrematado com a consagração do reconhecimento popular que foi o seu enterro em Brasília.

 

"Ascensão dos Nazistas" (BBC)

 "Ascensão dos Nazistas" (BBC)

documentário da BBC em três episódios

(grato a Airton Dirceu Lemmertz)


A minissérie histórica [da BBC] "Ascensão dos Nazistas" (em inglês, "Rise of the Nazis") conta, em três episódios, como Adolf Hitler e seu Partido Nazista chegaram ao poder na Alemanha no começo da década de 1930. As consequências disso seriam trágicas para a humanidade. Este primeiro episódio nos leva aos corredores do poder, onde um mestre da política alemã vê uma oportunidade de usar a repentina popularidade dos nazistas para benefício próprio. Isso leva a uma rede de erros de cálculo, acordos duvidosos e tomadas de poder que irão tirar Hitler das franjas do ativismo político e alçá-lo ao coração do governo. Hitler quer se tornar o líder absoluto de um Estado de um partido só na Alemanha – mas, em seu caminho, estão a democracia e as leis. Depois de um golpe malsucedido em 1923, Hitler adota outra estratégia: em vez de agirem como revolucionários, os nazistas se tornarão um partido político legítimo, operando sob a aparência de legalidade. O objetivo dele é conquistar o poder democraticamente e então destruir a democracia por dentro. Para atingir essa meta, Hitler precisa superar a elite política da Alemanha, incluindo o presidente Paul von Hindenburg, que o menospreza, e, internamente, Kurt von Schleicher, que quer usá-lo. Enquanto suas intrigas políticas se desenrolam no nível mais alto do governo, Hitler enfrenta outro obstáculo: o advogado judeu Hans Litten, que tenta provar que os nazistas estão longe de ser o partido legal e legítimo que eles clamam ser. Confira: https://www.youtube.com/watch?v=MMk7six-DLc (parte 1: "a estratégia que levou Hitler ao poder"; duração: 52 minutos)

No segundo episódio da minissérie histórica "Ascensão dos Nazistas" (em inglês, "Rise of the Nazis"), você vai acompanhar a campanha violenta dos Sturmabteilung, a tropa de choque nazista. Eles atacaram, espancaram e mataram sistematicamente os adversários de Adolf Hitler, principalmente os comunistas, os principais adversários políticos dos nazistas. Milhões de prisões também foram realizadas – mas para torná-las legais, os nazistas conseguem passar um decreto dando a eles poderes emergenciais para banir a liberdade de expressão e o direito de protesto, além da liberdade de prender sem acusação. Hitler usou esse grupo violento para aumentar gradualmente seu poder político na Alemanha. Confira: https://www.youtube.com/watch?v=7vcDxWPOUVU (parte 2: "a violenta tropa de choque de Hitler"; duração: 52 minutos)

No terceiro [e último] episódio da minissérie "Ascensão dos Nazistas", você vai ver como o regime de Adolf Hitler usou a disseminação de informações falsas como arma para conseguir aniquilar seus opositores e alcançar o poder político total. Isso incluiu disputas internas, no coração do Partido Nazista. Também vemos como a Alemanha passou de uma democracia plena para uma completa ditadura em pouco mais de três anos, com supressão de liberdades individuais e o início do extermínio de minorias e de adversários. Confira: https://www.youtube.com/watch?v=5pac0EWyXhw (parte 3: "o golpe final que deu a Hitler poder absoluto"; duração: 52 minutos)

A alta corrupção das altas esferas e a ingovernabilidade do Brasil - Bolivar Lamounier, Paulo Roberto de Almeida

Bolivar Lamounier oferece um análise sóbria dos fatores de ingovernabilidade no Brasil e é bastante cauteloso com os altos salários do Judiciário, sobretudo seus muitos penduricalhos.

Eu, de minha parte, não hesito em classificar esses ajutórios como corrupção pura e simples, da mais escandalosa e vergonhosa para a nação. Também é o caso das emendas parlamentares usadas em causa própria, o estupro orçamentário praticado pelos próprios ordenadores e beneficiários, o que também ocorre no caso da aristocracia do Judiciário com seus acréscimos pornográficos.

O fato de ambas as práticas estarem cobertas em "leis" – que eles mesmos fizeram em causa própria – impede absolutamente que possam ser classificadas como corrupção pura e simples.

Paulo Roberto de Almeida


Três problemas em busca de soluções

Bolívar Lamounier

O Estado de S. Paulo, sábado, 19 de abril de 2025


Mais grave, no entanto, é que sequer compreendemos as raízes de nossa ingovernabilidade, ou seja, essa difusa maçaroca que mal conseguimos identificar

Francamente, nunca me ocorrera que cedo ou tarde iria simpatizar com um país governado de forma totalitária – a China –, e me posicionar contra outro que sempre vira como uma “democracia exemplar”, os Estados Unidos.

Três fatores contribuíram para alterar minha perspectiva. Primeiro, eu me haver convencido de que o atual governo dos Estados Unidos representa um risco muito maior para o mundo do que o destrambelhado sr. Donald Trump. Custa-me acreditar que a maioria dos cidadãos americanos tenha prostituído suas instituições a ponto de eleger e empossar na Presidência um indivíduo duas vezes condenado por tentativa de golpe de Estado (??? – MD) e se abalançado a praticar políticas comerciais capazes de desmantelar toda a ordem mundial edificada desde a Segunda Guerra Mundial. Isso sem contar as incontáveis ameaças e violências contra indivíduos, instituições culturais e de governo em seu próprio país. A esperança de superar esse estado de coisas, se houver, será o Congresso americano acionar contra ele, o quanto antes, o instituto constitucional do impeachment.

No Brasil, temos a sorte de não possuirmos tamanho potencial destrutivo; este, porém, não deve ser subestimado. No curto prazo, o estrago que há anos vem sendo feito pode ser mitigado, dependendo principalmente da eleição presidencial de 2026.

Apresso-me a externar meus votos para que o sr. Jair Bolsonaro se recupere prontamente de seus problemas de saúde. No momento, todavia, é à política que devo me dedicar e, nesse contexto, sinceramente, não vejo chance de nosso país se recuperar. Bolsonaro e Lula reeditarem a malfadada polarização dos últimos anos não seria apenas burrice; seria empurrar o Brasil ladeira abaixo por muitos anos. O retorno da taxa de juros de longo prazo ao patamar da sra. Dilma Rousseff é uma indicação mais do que suficiente deste prognóstico. Aos 80 anos, praticamente nada tendo aprendido em sua longa trajetória política, movido, ao que tudo faz crer, apenas por sua notória vaidade, salta aos olhos que Lula já deu o que tinha a dar. Este segundo problema a que me refiro só pode ser um: candidaturas de centro, competentes e politicamente amadurecidas.

O terceiro problema é bem mais complexo, e queira Deus que já não tenhamos passado do ponto em nossa busca por soluções. Não precisamos nos deter nas mazelas que temos acumulado já há vários anos. Se não discernimos sequer um estreito sendeiro que possa nos levar a algo útil, de nada vale martelar mais uma vez a obscena desigualdade de renda e riqueza que nos divide como povo. O mesmo vale para a insegurança que dia e noite nos bate à porta. Sem esquecer que as últimas pesquisas de opinião mostram, creio que pela primeira vez, que os preços dos alimentos passaram ao primeiro lugar nas preocupações dos entrevistados, acima até da criminalidade.

Mais grave, no entanto, é que sequer compreendemos as raízes de nossa ingovernabilidade, ou seja, essa difusa maçaroca que mal conseguimos identificar. Só para não deixar a bola cair, peço vênia para aqui mencionar três pontos. Entre estes, o primeiro só pode ser a corrupção. Mas em que, exatamente, consiste ela? Onde começa, onde termina? Seu ponto de partida são os folclóricos punguistas ou haverá algo mais abaixo deles? Ouço dizer que a Polícia Federal indiciou um brilhante futebolista, jogador de seleção brasileira, por ter “forçado” o terceiro cartão amarelo, facilitando, assim, a vitória do clube adversário. Reparem que me referi a um ato de indiciamento; não estou prejulgando o jovem atleta. Mas, vejam bem: a ser verdadeira, faz sentido tal situação? O suposto corruptor teria desembolsado, num mero jogo de campeonato, uma fortuna superior à qual o rapaz com certeza teria ou terá a ganhar nos próximos anos?

Outro aspecto que é imperativo mencionar são os chamados supersalários, cujo epicentro parece ser o Judiciário. Mas aqui devo tomar cuidado, pois o que pode ser corrupção para mim pode não o ser para os interessados diretos. Que um número considerável de magistrados aufere quantia astronômicas, tanto na esfera federal como na estadual, não há dúvida. Mas há quem afirme que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Corrupção é uma coisa, o restante, segundo essa exegese, seriam penduricalhos, quer dizer, figuras jurídicas um tanto incompreensíveis, mas com força de lei, porque assim as entendeu o Judiciário.

A noção de governabilidade sempre nos leva à questão dos partidos políticos, também assaz complexa. Tomada esta numa acepção rigorosa, penso que o Brasil nunca teve, não tem e não é certo que venha a ter uma estrutura de partidos séria e confiável.

Inclino-me, porém, a crer que agora, com essa curiosa figura do Centrão, chegamos a um ponto sem volta. Hoje, o que chamamos de partidos são apenas entidades cartoriais, indispensáveis ao registro das candidaturas e à repartição de certos penduricalhos que o Estado põe à disposição dos eleitos. Esta, contudo, é uma questão de alta filosofia, a ser explorada noutra oportunidade.

 

A corrupção institucionalizada e normalizada dos cartões corporativos - Ricardo Bergamini

 Apenas transcrevo, a partir de Ricardo Bergamini. Não há necessidade de qualquer comentário: 

Desde sua criação em 2001, os catões corporativos sempre foram fontes primárias de corrupção e uso político, haja vista manchete ora em pauta - “As descobertas do TCU sobre gastos com cartão corporativo no governo Bolsonaro” - entretanto não houve nenhuma descoberta do TCU, tendo em vista que as informações sempre estiveram disponíveis no Portal da Transparência. O brasileiro é que não tem interesse em números, gráficos e tabelas.

 

Não há necessidade de auditoria, já que o desvio é obvio e ululante: de 2019/2021 o governo Bolsonaro gastou R$ 610,7 milhões (média/ano de R$ 203,6 milhões). Em 2022, com as eleições, o gasto foi de R$ 422,9 milhões, ou seja, o dobro da média/ano de 2019/2021. 

 

O populista Lula, dando continuidade a sua campanha para reeleição, manteve a despesa no mesmo patamar deixado por Bolsonaro de R$ 430,6 milhões em 2023, e de R$ 595,6 milhões em 2024.

 

Motociatas de Bolsonaro tiveram custo médio de R$ 100 mil cada... 

 

- Veja mais em https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/23/motociatas-de-bolsonaro-tiveram-custo-medio-de-r-100-mil-cada.htm?cmpid=copiaecola

 

Quando era deputado federal, o ex- presidente Jair Bolsonaro (PSL) era um dos maiores críticos da falta de transparência dos petistas. Gastos nababescos bancados com dinheiro público eram denunciados com a ferocidade que se espera de um real representante da sociedade. Um exemplo claro: em 2008, durante discurso na bancada, Jair Bolsonaro, na época do PP, desafiou o PT a abrir as despesas com cartão corporativo do governo federal. Na época, havia eclodido o escândalo dos gastos com essa modalidade de pagamento, desencadeada após a imprensa, tão criticada hoje por Bolsonaro, descobrir que o cartão corporativo foi utilizado para custear mesas de sinuca, festas com bailarinas e até uma mera tapioca na praia.

 

Prezados Senhores

 

Resumo da posição dos malditos cartões corporativos em 2024.

 

1 – Portadores dos malditos cartões corporativo: 6.424 iluminados indicados pelo governante de plantão.

 

2 - Gastos totais com esses malditos cartões corporativos: R$ 595,6 milhões.

 

3 - Gastos apenas com a presidência da república foram de R$ 26,0 milhões, sendo 10.823 movimentações, com valor médio de R$ 2.405,85 por movimentação, tendo sido apenas 13 iluminados portadores desses cartões. Cabe lembrar que essas despesas da presidência da república, em sua grande maioria são sigilosas, contrariando decisão do STF.

 

4 - Em 2018, o governo Temer gastou R$ 244,8 milhões (média de R$ 20,4 milhões ao mês) em cartões corporativos. Em 2022, o governo Bolsonaro gastou R$ 422,9 milhões (média de R$ 35,2 milhões ao mês). Crescimento de 72,55%, em relação ao ano de 2018. 

 

5 – Em 2024, o governo Lula gastou R$ 595,6 milhões (média de R$ 49,6 milhões ao mês). Crescimento de 40,91% em relação ao ano de 3022.

 

Aos que desejarem conhecer a orgia ampla, geral e irrestrita, clique abaixo:

 

Estudo completo clique aqui http://www.portaltransparencia.gov.br/cartoesorgia

 

sábado, 19 de abril de 2025

Uma permanente obsessão com o desenvolvimento (do país e próprio) - Paulo Roberto de Almeida

Uma permanente obsessão com o desenvolvimento (do país e próprio)

Paulo Roberto de Almeida

        Até onde me lembro de minha infância, a imagem mais fugaz, já andando e aprendendo a me comunicar, é a de minha mãe me dando banho numa bacia, com água morna na caneca, numa casinha ainda sem reboco em algumas peças, sem chuveiro elétrico, telefone ou televisão (que só “chegaram” bem mais tarde) e até sem geladeira: havia um “armário” onde se colocava uma barra de gelo trazida por alguém de carrocinha. O chuveiro no começo era de água natural, daí a bacia providencial.

        Ou seja, nada de muito diferente de milhares, de milhões de outras famílias, no Brasil e no mundo, ainda hoje, mais de meio século depois da passagem da infância.

        Não havia livros ou revistas em casa, pois meus pais tinham apenas o primário incompleto, sendo os avós perfeitamente analfabetos. Minha “sorte” foi ter uma biblioteca infantil nas cercanias, uma quadra e meia, que passei a frequentar ainda antes de aprender a ler, na “tardia” idade de sete anos (eu calculo que “perdi” dois ou três anos de leituras, pois poderia ter começado mais cedo, se outras fossem as condições familiares).

        Mas depois que aprendi a ler, nunca mais parei, e devo a oportunidade à existência da Biblioteca Infantil Anne Frank, perto de minha casa, onde podia me refugiar todas as tardes enquanto não comecei a “trabalhar” (muito cedo mesmo). Mas mesmo trabalhando, conseguia retirar livros que eu lia na cama até que minha mãe apagasse a luz (não muito tarde).

        Acesso a livros e vontade própria foram as portas de meu ingresso no mundo das reflexões de porque alguns eram tão ricos e outros permaneciam pobres por largo tempo. Essa é a mais simples definição de toda uma vida voltada para o estudo das razões e requerimentos do progresso humano e social, uma obsessão que ainda não se extinguiu muitas décadas depois que comecei a pensar nas diferenças entre pessoas, comunidades e países.

        Minha trajetória não é muito diferente da de milhares, milhões de outras crianças e jovens saídos de uma pobreza ancestral — que nunca foi a de uma miséria estrutural, como em certos países ou mesmo em regiões do próprio Brasil — para uma lenta ascensão pelo estudo e pelo trabalho. 

        A diferença, talvez, seja a de que eu continuo me angustiando com a falta de progressos de concidadãos ou de outros povos e nações. No meu caso, e no de muitos outros, estudo e trabalho foram as molas propulsoras: elas não podem ser apenas externas, resultado da assistência pública, e sim inerentes a cada indivíduo e situação, mas algumas externalidades positivas precisam existir. Tive essa sorte, ou esforço, familiar e pessoal.

        Outros também precisam ter. Continuo focado nessa via. 

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 19/04/2025


Da diversidade do mundo - Paulo Roberto de Almeida

Da diversidade do mundo

Paulo Roberto de Almeida

Que coisa! A Justiça de um país vizinho tem a ousadia de processar, condenar e prender, não um ou dois, mas cinco presidentes por atos de corrupção, incluindo familiares. 

A Odebrecht ingressou na nomenclatura internacional como “empresa modelo” na “arte” do suborno, não em um ou dois países, mas em uma extensa variedade geográfica de países, na AL, na África, até na Suíça imaginem!

Em alguns países, deu confusão política e judicial, em outros tudo passa em branco, inclusive coisas que nada têm a ver com ela, como, por exemplo, rachadinhas e rachadonas de políticos mequetrefes e familiares, que se constituíram um verdadeiro império imobiliário.

Em alguns países a coisa anda; em outros não, inclusive no país mais poderoso (ainda) do planeta, cujo presidente (duas vezes) é um trambiqueiro vulgar e um “serious sexual offender” (além de serviçal de um “evil empire”).

O mundo é mesmo é tão diverso política e judicialmente quanto sua fauna e sua flora. Algumas espécies sobrevivem e se expandem, inclusive predatoriamente, outras fenecem e acabam desaparecendo, como a honra, a honestidade e a Justiça.

Em algum momento, ou em vários, de nossa história, como em 1909-1910 e em 1919-1920, falhamos ao não conceder a suprema magistratura a um homem como Rui Barbosa, aliás um exilado forçado, na última década do século XIX, por ousar defender opositores de uma ditadura castrense (ah, os salvadores da pátria, sempre eles, várias vezes).

Certos países vivem entre a espada e a lei, e vão avançando vagarosamente, entre grandes e pequenas corrupções (com Justiça muito maleável).

O mundo é mesmo muito diverso na sua composição e nos valores.

Democracia, por exemplo, não depende apenas de instituições, e sim de algo mais fundamental, que se chama “mores”, ou a organização primária de um povo ou comunidade: algumas são governadas desde abaixo, outras são construídas a partir de acima. Isso explica em parte os percalços do desenvolvimento. 

Mesmo em certas situações autoritárias, os avanços de um determinado país dependem muito da energia e da resolução do seu povo, pois mais importantes do que abundância ou disposição de recursos  naturais ou capital financeiro, o mais importante mesmo é a qualidade do seu capital humano.

Paulo Roberto Almeida

Brasília, 19/04/2025


sexta-feira, 18 de abril de 2025

Tributo a Mario Vargas Llosa - Cato Institute

 Tributo a Mario Vargas Llosa 

Cato Institute

https://www.elcato.org/coleccion/tributo-mario-vargas-llosa?mc_cid=b18095b05d&mc_eid=19e757ffce

El connotado autor, ex candidato a la presidencia del Perú y un amigo del Cato Institute, Mario Vargas Llosa (1936-2025) fue nombrado ganador del Premio Nobel de Literatura. Al anunciar el premio, la Academia dijo haber elegido a Vargas Llosa por "su cartografía de las estructuras de poder y por sus incisivas imágenes de la resistencia, la rebelión y la derrota del individuo".

Aquí presentamos una colección de ensayos de Mario Vargas Llosa y de artículos y comentarios de académicos y pensadores liberales acerca del autor.

Ensayos, estudios y entrevistas

El liberalismo a fin de siglo: Desafíos y oportunidades

Mario Vargas Llosa
6 de Junio de 1998

Artículos y ensayos de otros

Mario Vargas Llosa, el gigante del liberalismo

Alberto Benegas Lynch (h)
10 de Julio de 2023

Mario Vargas Llosa: Una travesía intelectual

Julio H. Cole
21 de Octubre de 2010





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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...