Infantilismo e controle
MERVAL PEREIRA
O GLOBO, 21/08/10
A infantilização do eleitorado brasileiro denunciada pela candidata do Partido Verde, Marina Silva, é um dos sustentáculos da alta popularidade do presidente Lula. E a campanha eleitoral vai se desenrolando de acordo com os planos desenhados por ele à imagem e semelhança do seu governo, praticando o que talvez seja o maior mal que esteja fazendo ao país: a esterilização da política.
O controle dos partidos através da distribuição de cargos e de métodos mais radicais como o mensalão neutraliza a ação congressual, permitindo a formação de uma aliança política tão heterogênea quanto amorfa, com partidos que em comum têm apenas o apetite pelos benefícios que possam obter apoiando o governo da ocasião.
A quase unanimidade a favor se deve também ao assistencialismo e à cooptação dos “movimentos sociais”, de um lado, e de outro a uma política econômica que aumenta os gastos com juros, Previdência e programas assistenciais.
Uma frente que tem, num extremo, o setor financeiro e, no outro, os mais pobres, numa estranha aliança dos rentistas do Bolsa Família com os rentistas financeiros.
O pragmatismo que rege essa maneira de fazer política fez com que o PT engolisse a candidata oficial, tirada da cartola do ilusionista Lula e literalmente maquiada pela equipe de marqueteiros, que vende ao eleitorado uma persona política tão falsa quanto a favela cenográfica do programa de estreia do candidato do PSDB.
A ex-guerrilheira, durona e de trato difícil, transformouse em tempo real numa senhora simpática que quer se tornar “a mãe” do Brasil.
O governo Lula vem acelerando sua transformação, neste segundo mandato, na direção de um Estado nacionalista, populista e patrimonialista, dependente cada vez mais da vontade do líder carismático, que não aceita os limites da lei, muito menos críticas. E se considera “o pai” do “seu” povo.
A autoestima exagerada provoca sentimento de onipotência que faz o seu possuidor acreditar estar acima das regras que o constrangem.
Na política, pode produzir ditadores ou, no nosso caso, uma versão pós-moderna do caudilhismo latino-americano, que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso definiu como um “subperonismo lulista”.
Essa geleia geral que hoje apoia a candidatura oficial pode ter o mesmo destino do peronismo argentino na era pós-Lula que se avizinha, com diversos grupos disputando o espólio político do lulismo.
E Lula, fora do governo, querendo controlar os cordéis de seu fantoche.
Ao mesmo tempo em que aprofunda suas críticas aos órgãos fiscalizadores do Estado, como o Ibama, o Tribunal de Contas da União (TCU) ou até mesmo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tentando constrangê-los, o presidente Lula insiste na tentativa de neutralizar os veículos da grande imprensa, no pressuposto de que, com sua imensa popularidade, pode controlar a opinião pública.
Não é suficiente uma nota oficial para garantir a liberdade de expressão, quando há tentativas concretas, desde o início do governo, de “democratizar” os meios de informação, uma ideia recorrente que vem sendo derrotada desde que primeiramente foi oferecida a debate, com a proposta de criação de um Conselho Nacional de Jornalismo, que fiscalizaria os jornalistas para evitar “desvios éticos”.
Ela ressuscitou com a aprovação, na Conferência Nacional da Comunicação (Confecon), de um Observatório Nacional de Mídia e Direitos Humanos para monitorar a “mídia” e é similar à proposta contida no Programa Nacional de Direitos Humanos de punir os órgãos de comunicação que transgredirem normas a serem ditadas por um conselho governamental.
A questão é que, quando o governo fala em democracia, não está se referindo aos regimes em vigor no mundo ocidental, mas aos regimes bolivarianos gerados a partir do autoritarismo chavista na Venezuela, onde Lula acha que há “democracia até demais”.
Não é simples coincidência que tanto lá quanto na Argentina dos Kirchner os meios de comunicação são perseguidos ou coagidos com base em legislações nascidas de poderes cada vez menos democráticos.
E também não é mera coincidência que esses regimes esquerdistas da América do Sul tenham sua gênese no Foro de São Paulo, uma reunião da esquerda da América Latina que Lula e Fidel Castro organizaram em 1990 para o estabelecimento de uma estratégia comum, na definição do próprio Lula em discurso.
O problema é que o Foro de São Paulo abrigava na sua fundação não apenas partidos políticos de vários matizes da esquerda, mas também organizações guerrilheiras como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs) ou a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca (UNRG), consideradas terroristas, acusadas de tráfico de drogas e outras atividades criminosas.
Negar a relação do PT com as Farcs é imaginar que não existam registros confirmando, como uma entrevista de Raul Reys, o número dois das Farcs que morreu recentemente em confronto com o exército da Colômbia, contando como conheceu Lula num desses encontros.
As Farcs classificaram certa vez em nota oficial o Foro de São Paulo como “uma trincheira onde podemos encontrar os revolucionários de diferentes tendências, e diferentes manifestações de luta e de partidos (...)”.
A continuidade dessa política de aparelhamento do Estado é o que está em jogo nestas eleições, e é por isso que o presidente Lula está tão empenhado em vencêlas, e não apenas elegendo sua candidata à Presidência da República.
A estratégia de tentar influenciar a eleição do Congresso, sobretudo a do Senado, tem por trás o desejo de abrir caminho para aprovar legislação que aumente o controle do governo sobre o Estado brasileiro e, eventualmente, sobre a sociedade, através da “democracia direta”, à base de plebiscitos.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
sábado, 21 de agosto de 2010
Telecomunicações: como o governo rouba a sociedade...
Quem diz não sou eu, mas um respeitado colunista e especialista em telecomunicações. Acho que não preciso acrescentar uma linha sequer ao que ele disse, apenas confirmar que o governo nos faz de idiotas, de idiotas, de ingênuos inúteis, pois sequer sabemos defender o nosso patrimônio, contra esse assalto declarado e aberto do Estado.
Paulo Roberto de Almeida
Um confisco de R$ 362 bilhões
Ethevaldo Siqueira
Estado de São Paulo, 08/08/2010)
Os adversários do modelo privatizado das telecomunicações inventaram a palavra privataria, uma mistura de privatização e pirataria, para desqualificar o processo de desestatização do setor, levantando suspeitas sobre sua lisura. Pura mentira e desespero, por falta de argumentos. Mesmo diante de uma expansão de quase 900% da infraestrutura setorial, em 12 anos, os defensores do velho monopólio estatal ainda falam em privataria.
Mostro neste artigo a incrível ganância estatal, em relação às telecomunicações do País. E começo com uma pergunta: “Você sabia, leitor, que nós, assinantes e usuários de telefonia fixa e móvel – cidadãos como eu e você – já recolhemos R$ 330 bilhões de impostos aos cofres do governo, ao longo dos últimos 10 anos (2001-2010)”?
Pois bem, mesmo depois de ter vendido suas ações nas empresas de telecomunicações, o maior sócio de todo o setor continuou a ser o Estado brasileiro, pois arrecada anualmente nesse setor o correspondente a 10 vezes o lucro líquido de todas as operadoras de telefonia fixa e celular juntas.
As distorções crescem e se agravam ano a ano, com a elevação das alíquotas de tributação sobre serviços de telefonia fixa e móvel, e que hoje são as maiores do mundo (43% sobre o valor dos serviços). Só a Turquia comete equívoco semelhante, ao tributar suas telecomunicações em 42%.
É claro que, com menos impostos, o preço dos serviços poderia ser bem menor e as tarifas telefônicas brasileiras não seriam consideradas as mais caras do mundo.
E pior do que isso: em lugar de investir nesse setor vital, o Estado brasileiro prefere usar as telecomunicações como uma vaca leiteira, uma mina de ouro, da qual retira e confisca o máximo. Nessas condições, não poderia haver melhor negócio no mundo para o governo do que a privatização do velho Sistema Telebrás.
Assalto
Além dos R$ 330 bilhões de impostos arrecadados nesta década, o Estado retira muitos outros bilhões da telefonia. Acompanhe, leitor, a demonstração, passo a passo, dos números referentes a tudo que tem sido retirado e arrecadado de nossos bolsos e do setor pelo Estado brasileiro, desde os leilões, vendas de licenças, impostos e fundos setoriais não aplicados.
Ao privatizar, o governo brasileiro vendeu o controle da antiga Telebrás por R$ 22,2 bilhões e ainda faturou mais R$ 20,1 bilhões com os leilões de licenças de celulares e faixas de frequências. Em seguida, reformulou os tributos (em especial o ICMS) para ampliar a arrecadação e chegar aos R$ 330,4 bilhões recolhidos nesta década. Esse enorme confisco tem ocorrido ao longo dos últimos 10 anos, sendo dois anos do governo FHC, de 2001 a 2002, e oito anos no governo Lula, de 2003 a 2010.
Mas a sangria do setor não termina aí. Além desse montante, o governo federal ainda embolsou no mesmo período mais R$ 32 bilhões que pertenciam a três fundos setoriais, assim distribuídos: a) R$ 22 bilhões do excesso de arrecadação do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), b) R$ 8 bilhões correspondentes à totalidade da arrecadação do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust,) e c) R$ 2 bilhões dos recursos excedentes do Fundo de Tecnologia de Telecomunicações (Funttel).
Ilegalidade total
Esse confisco de R$ 32 bilhões dos fundos setoriais é um exemplo de ilegalidade flagrante, pois esses recursos são carimbados, com destinação legal certa e obrigatória. Deveriam, portanto, ter sido aplicados integralmente em fiscalização, universalização dos serviços e pesquisa tecnológica. Mas não foram. Na linguagem vulgar, esses R$ 32 bilhões foram para o ralo. Ou seja, para a vala comum do superávit fiscal.
Imagine, agora, o que teríamos hoje de modernização setorial se, por hipótese, o governo tivesse investido os R$ 32 bilhões e a fatia de apenas 10% dos R$ 330 bilhões de impostos arrecadados (R$ 33 bilhões), num grande projeto de banda larga e inclusão digital.
Seriam R$ 65 bilhões (o equivalente a US$ 37 bilhões), quantia suficiente para implantar uma das infraestruturas de banda larga mais avançadas do mundo, tão moderna quanto a do Japão ou da Coreia do Sul.
Por outras palavras, com esse investimento, poderíamos ter assegurado ao País uma penetração de banda larga da ordem de 80 ou 90% de seus domicílios, bem próxima da que têm os países mais desenvolvidos.
Balanço final.
Agora, caro leitor, some os R$ 330 bilhões de tributos escorchantes ao confisco de R$ 32 bilhões dos fundos e terá o total de R$ 362 bilhões. Eis aí o grande mal que o governo federal tem feito contra as telecomunicações, segundo dados oficiais da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Tesouro Nacional (Siafi), Confaz, revelados em estudo do Sindicato das Empresas Operadoras de Telecomunicações (Sinditelebrasil).
Faça um teste, leitor. Pergunte ao cidadão comum se ele sabe quanto paga de impostos em sua conta de energia elétrica, gasolina, alimentos essenciais, água, transportes ou na conta de telefone fixo ou celular.
“Impostos? Sei, não” – responderá o pobre cidadão alienado. Como tanta gente neste País, ele não sabe nada.
É dessa inconsciência que se aproveitam todos os governos perdulários e populistas, ao longo da história.
Paulo Roberto de Almeida
Um confisco de R$ 362 bilhões
Ethevaldo Siqueira
Estado de São Paulo, 08/08/2010)
Os adversários do modelo privatizado das telecomunicações inventaram a palavra privataria, uma mistura de privatização e pirataria, para desqualificar o processo de desestatização do setor, levantando suspeitas sobre sua lisura. Pura mentira e desespero, por falta de argumentos. Mesmo diante de uma expansão de quase 900% da infraestrutura setorial, em 12 anos, os defensores do velho monopólio estatal ainda falam em privataria.
Mostro neste artigo a incrível ganância estatal, em relação às telecomunicações do País. E começo com uma pergunta: “Você sabia, leitor, que nós, assinantes e usuários de telefonia fixa e móvel – cidadãos como eu e você – já recolhemos R$ 330 bilhões de impostos aos cofres do governo, ao longo dos últimos 10 anos (2001-2010)”?
Pois bem, mesmo depois de ter vendido suas ações nas empresas de telecomunicações, o maior sócio de todo o setor continuou a ser o Estado brasileiro, pois arrecada anualmente nesse setor o correspondente a 10 vezes o lucro líquido de todas as operadoras de telefonia fixa e celular juntas.
As distorções crescem e se agravam ano a ano, com a elevação das alíquotas de tributação sobre serviços de telefonia fixa e móvel, e que hoje são as maiores do mundo (43% sobre o valor dos serviços). Só a Turquia comete equívoco semelhante, ao tributar suas telecomunicações em 42%.
É claro que, com menos impostos, o preço dos serviços poderia ser bem menor e as tarifas telefônicas brasileiras não seriam consideradas as mais caras do mundo.
E pior do que isso: em lugar de investir nesse setor vital, o Estado brasileiro prefere usar as telecomunicações como uma vaca leiteira, uma mina de ouro, da qual retira e confisca o máximo. Nessas condições, não poderia haver melhor negócio no mundo para o governo do que a privatização do velho Sistema Telebrás.
Assalto
Além dos R$ 330 bilhões de impostos arrecadados nesta década, o Estado retira muitos outros bilhões da telefonia. Acompanhe, leitor, a demonstração, passo a passo, dos números referentes a tudo que tem sido retirado e arrecadado de nossos bolsos e do setor pelo Estado brasileiro, desde os leilões, vendas de licenças, impostos e fundos setoriais não aplicados.
Ao privatizar, o governo brasileiro vendeu o controle da antiga Telebrás por R$ 22,2 bilhões e ainda faturou mais R$ 20,1 bilhões com os leilões de licenças de celulares e faixas de frequências. Em seguida, reformulou os tributos (em especial o ICMS) para ampliar a arrecadação e chegar aos R$ 330,4 bilhões recolhidos nesta década. Esse enorme confisco tem ocorrido ao longo dos últimos 10 anos, sendo dois anos do governo FHC, de 2001 a 2002, e oito anos no governo Lula, de 2003 a 2010.
Mas a sangria do setor não termina aí. Além desse montante, o governo federal ainda embolsou no mesmo período mais R$ 32 bilhões que pertenciam a três fundos setoriais, assim distribuídos: a) R$ 22 bilhões do excesso de arrecadação do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), b) R$ 8 bilhões correspondentes à totalidade da arrecadação do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust,) e c) R$ 2 bilhões dos recursos excedentes do Fundo de Tecnologia de Telecomunicações (Funttel).
Ilegalidade total
Esse confisco de R$ 32 bilhões dos fundos setoriais é um exemplo de ilegalidade flagrante, pois esses recursos são carimbados, com destinação legal certa e obrigatória. Deveriam, portanto, ter sido aplicados integralmente em fiscalização, universalização dos serviços e pesquisa tecnológica. Mas não foram. Na linguagem vulgar, esses R$ 32 bilhões foram para o ralo. Ou seja, para a vala comum do superávit fiscal.
Imagine, agora, o que teríamos hoje de modernização setorial se, por hipótese, o governo tivesse investido os R$ 32 bilhões e a fatia de apenas 10% dos R$ 330 bilhões de impostos arrecadados (R$ 33 bilhões), num grande projeto de banda larga e inclusão digital.
Seriam R$ 65 bilhões (o equivalente a US$ 37 bilhões), quantia suficiente para implantar uma das infraestruturas de banda larga mais avançadas do mundo, tão moderna quanto a do Japão ou da Coreia do Sul.
Por outras palavras, com esse investimento, poderíamos ter assegurado ao País uma penetração de banda larga da ordem de 80 ou 90% de seus domicílios, bem próxima da que têm os países mais desenvolvidos.
Balanço final.
Agora, caro leitor, some os R$ 330 bilhões de tributos escorchantes ao confisco de R$ 32 bilhões dos fundos e terá o total de R$ 362 bilhões. Eis aí o grande mal que o governo federal tem feito contra as telecomunicações, segundo dados oficiais da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Tesouro Nacional (Siafi), Confaz, revelados em estudo do Sindicato das Empresas Operadoras de Telecomunicações (Sinditelebrasil).
Faça um teste, leitor. Pergunte ao cidadão comum se ele sabe quanto paga de impostos em sua conta de energia elétrica, gasolina, alimentos essenciais, água, transportes ou na conta de telefone fixo ou celular.
“Impostos? Sei, não” – responderá o pobre cidadão alienado. Como tanta gente neste País, ele não sabe nada.
É dessa inconsciência que se aproveitam todos os governos perdulários e populistas, ao longo da história.
The END is not the end... (com perdão pelo trocadilho...)
Sim, um trocadilho infame com a grandiosa Estratégia Nacional de Defesa, publicada no final de 2008, e que não é absolutamente uma estratégia, é muito pouco de defesa e que apenas é, prosaicamente, nacional (talvez exageradamente).
Enfim, apenas para chamar a atenção -- já que acabo de receber o aviso -- para a publicação deste meu trabalho:
A Arte de NÃO Fazer a Guerra: novos comentários à Estratégia Nacional de Defesa
Meridiano 47 (vol. 11, n. 119, junho 2010, p. 21-31; ISBN: 1518-1219)
link para o boletim: http://meridiano47.files.wordpress.com/2010/08/v11n119.pdf;
link para o artigo: http://seer.bce.unb.br/index.php/MED/article/view/638/407.
Originais n. 2066; Publicados n. 972
Enfim, apenas para chamar a atenção -- já que acabo de receber o aviso -- para a publicação deste meu trabalho:
A Arte de NÃO Fazer a Guerra: novos comentários à Estratégia Nacional de Defesa
Meridiano 47 (vol. 11, n. 119, junho 2010, p. 21-31; ISBN: 1518-1219)
link para o boletim: http://meridiano47.files.wordpress.com/2010/08/v11n119.pdf;
link para o artigo: http://seer.bce.unb.br/index.php/MED/article/view/638/407.
Originais n. 2066; Publicados n. 972
Uma sugestao: fechar a porta aos anônimos...
Leio num blog português, que talvez tenha inteiramente razão:
Anónimos ficam à porta
Este blog não aceita comentários anónimos, de qualquer tipo.
Vou pensar nisso; acho que vou ter menos material a processar (de qualquer tipo de qualidade, do bom, do mau e do feio...)
Refletindo...
Anónimos ficam à porta
Este blog não aceita comentários anónimos, de qualquer tipo.
Vou pensar nisso; acho que vou ter menos material a processar (de qualquer tipo de qualidade, do bom, do mau e do feio...)
Refletindo...
Debate sobre a Politica Externa - Revista Epoca
O papel da política externa
Da Redação
Revista Época, Sábado, 21 de agosto de 2010
O Brasil entrou na década de 2000 com uma indiscutível liderança dentro da América do Sul. Em 2002, veio a candidatura à Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, cujo programa de governo falava em reforçar os laços diplomáticos com nossos vizinhos, mas também se referia à política externa como “indispensável para garantir a presença soberana do Brasil no mundo”. Com Lula eleito, a diplomacia ganhou novos contornos.
O presidente passou a usar seu carisma para tentar ampliar a voz do Brasil em organismos multilaterais. Beneficiado pelo bom momento econômico do país, Lula conseguiu atrair a atenção de líderes mundiais. Em abril do ano passado, durante a reunião do G20 em Londres, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, se dirigiu a ele com a frase “Este é o cara!”, que acabou se tornando um símbolo do prestígio internacional obtido pelo Brasil nos últimos anos.
Pool Kirsty Wigglesworth
PRESTIGIADO
O presidente Lula sentado ao lado da rainha britânica, Elizabeth II, e à frente do presidente americano, Barack Obama, durante a reunião do G2), em 2009. O Brasil tenta se consolidar entre os grandes da diplomacia mundial
O “ativismo diplomático” do governo Lula também recebeu críticas da comunidade internacional. Os EUA discordaram do abrigo dado pela embaixada brasileira em Honduras ao presidente deposto Manuel Zelaya, o que teria alongado a crise institucional naquele país. Os americanos e outras potências ocidentais, como França e Reino Unido, também ficaram contrariados com a ideia de Lula de se apresentar como mediador do conflito árabe-israelense e, mais recentemente, com a resistência de nossa diplomacia em relação a sanções contra o programa nuclear do Irã. Diante disso, como o próximo presidente deve equilibrar o protagonismo crescente do Brasil e a convivência com antigas potências diplomáticas? Que parâmetros a política externa brasileira deve seguir nos próximos quatro anos? Essas perguntas estarão em pauta no quarto ÉPOCA Debate 2010, que aborda os temas mais importantes na agenda dos candidatos à Presidência da República. A discussão, aberta à participação de leitores, será no dia 31 de agosto, às 16h30, no auditório da Editora Globo, em São Paulo. Os convidados para este ÉPOCA Debate – Política Externa são Samuel Pinheiro Guimarães, ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência e ex-secretário-geral do Itamaraty; Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington; e Amaury de Souza, cientista político e autor do livro A agenda internacional do Brasil: a política externa brasileira de FHC a Lula.
Os três primeiros debates foram sobre Justiça e segurança pública, educação e saúde. O quinto e último será sobre o papel do Estado. Todos serão gravados e estarão disponíveis em epoca.com.br. As inscrições podem ser feitas pelo telefone (11) 3767-7325 begin_of_the_skype_highlighting (11) 3767-7325 end_of_the_skype_highlighting ou por meio de um formulário em epoca.com.br/inscricao.
ÉPOCA DEBATE
* Política Externa
* Participação
* - Samuel Pinheiro Guimarães
* Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência
* - Rubens Barbosa
* Ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington
* - Amaury de Souza
* Cientista político e autor do livro A agência internacional do Brasil
* Data: 31 de agosto (terça-feira)
* Horário: 16h30
* Local Editora Globo
* Endereço Av. Jaguaré, 1485, 7ºandar, São Paulo, SP
* Inscrições: tel. (11)3767-7325 begin_of_the_skype_highlighting (11)3767-7325 end_of_the_skype_highlighting ou pelo site epoca.com.br/inscricao
* (As inscrições serão feitas até o limite de vagas do auditório que tem capacidade para 92 pessoas.)
Da Redação
Revista Época, Sábado, 21 de agosto de 2010
O Brasil entrou na década de 2000 com uma indiscutível liderança dentro da América do Sul. Em 2002, veio a candidatura à Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, cujo programa de governo falava em reforçar os laços diplomáticos com nossos vizinhos, mas também se referia à política externa como “indispensável para garantir a presença soberana do Brasil no mundo”. Com Lula eleito, a diplomacia ganhou novos contornos.
O presidente passou a usar seu carisma para tentar ampliar a voz do Brasil em organismos multilaterais. Beneficiado pelo bom momento econômico do país, Lula conseguiu atrair a atenção de líderes mundiais. Em abril do ano passado, durante a reunião do G20 em Londres, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, se dirigiu a ele com a frase “Este é o cara!”, que acabou se tornando um símbolo do prestígio internacional obtido pelo Brasil nos últimos anos.
Pool Kirsty Wigglesworth
PRESTIGIADO
O presidente Lula sentado ao lado da rainha britânica, Elizabeth II, e à frente do presidente americano, Barack Obama, durante a reunião do G2), em 2009. O Brasil tenta se consolidar entre os grandes da diplomacia mundial
O “ativismo diplomático” do governo Lula também recebeu críticas da comunidade internacional. Os EUA discordaram do abrigo dado pela embaixada brasileira em Honduras ao presidente deposto Manuel Zelaya, o que teria alongado a crise institucional naquele país. Os americanos e outras potências ocidentais, como França e Reino Unido, também ficaram contrariados com a ideia de Lula de se apresentar como mediador do conflito árabe-israelense e, mais recentemente, com a resistência de nossa diplomacia em relação a sanções contra o programa nuclear do Irã. Diante disso, como o próximo presidente deve equilibrar o protagonismo crescente do Brasil e a convivência com antigas potências diplomáticas? Que parâmetros a política externa brasileira deve seguir nos próximos quatro anos? Essas perguntas estarão em pauta no quarto ÉPOCA Debate 2010, que aborda os temas mais importantes na agenda dos candidatos à Presidência da República. A discussão, aberta à participação de leitores, será no dia 31 de agosto, às 16h30, no auditório da Editora Globo, em São Paulo. Os convidados para este ÉPOCA Debate – Política Externa são Samuel Pinheiro Guimarães, ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência e ex-secretário-geral do Itamaraty; Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington; e Amaury de Souza, cientista político e autor do livro A agenda internacional do Brasil: a política externa brasileira de FHC a Lula.
Os três primeiros debates foram sobre Justiça e segurança pública, educação e saúde. O quinto e último será sobre o papel do Estado. Todos serão gravados e estarão disponíveis em epoca.com.br. As inscrições podem ser feitas pelo telefone (11) 3767-7325 begin_of_the_skype_highlighting (11) 3767-7325 end_of_the_skype_highlighting ou por meio de um formulário em epoca.com.br/inscricao.
ÉPOCA DEBATE
* Política Externa
* Participação
* - Samuel Pinheiro Guimarães
* Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência
* - Rubens Barbosa
* Ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington
* - Amaury de Souza
* Cientista político e autor do livro A agência internacional do Brasil
* Data: 31 de agosto (terça-feira)
* Horário: 16h30
* Local Editora Globo
* Endereço Av. Jaguaré, 1485, 7ºandar, São Paulo, SP
* Inscrições: tel. (11)3767-7325 begin_of_the_skype_highlighting (11)3767-7325 end_of_the_skype_highlighting ou pelo site epoca.com.br/inscricao
* (As inscrições serão feitas até o limite de vagas do auditório que tem capacidade para 92 pessoas.)
Poetas e diplomatas... (tudo a ver?)
Não, não vou falar da "promoção" de Vinicius de Moraes a "embaixador", embora ele seja citado nesta bela poesia que transcrevo abaixo.
Alertado por meu colega blogueiro e diplomata -- acho que na ordem inversa -- Francisco Seixas da Costa, que sempre traz coisas muito boas no seu "Duas ou Três Coisas...", descobri, em um seu post sobre Diplomacia e Poesia, essa junção de duas coisas que sempre caminharam juntas: a diplomacia e a poesia, tanto porque os diplomatas são algo como os poetas da Realpolitik, ou os realistas da Idealpolitik, quanto porque eles não se cansam de encontrar palavras bonitas para feias realidades...
Enfim, sou de opinião que, independentemente de suas qualidades enquanto grande poeta, grande letrista, incomparável bebum, Vinicius nunca poderia ter sido promovido a embaixador, razão pela qual coloquei essas expressões entre aspas, no começo deste post. Tratou-se de uma promoção política, administrativa e técnicamente irregular, que poderia ser desmantelada por qualquer órgão de controle da legalidade dos atos (mas que, no Brasil atual, se preocupa com a legalidade dos atos do governo?), feita mais para dar uma gorda pensão -- e provavelmente uma grande "indenização" retroativa -- a suas duas filhas, do que para reparar uma grande injustiça.
Mas deixemos essa questão de lado para apreciar esta crítica dos costumes poético-diplomáticos em forma de poesia, justamente, embora vagamente depreciativa, talvez comme il faut...
Paulo Roberto de Almeida
Divertimento
Blog Tim Tim no Tibete
Thursday, August 19, 2010
Um diplomata só já é risível;
poeta e diplomata, isso é demais!
Fica bem nas fronteiras do incrível:
Vinícius e Cabral não quero mais!
Foi você que pediu Octavio Paz?
Não sei o que ele fez nem o que faz.
Poetas são patetas com plumas
e diplomatas são coisas nenhumas.
Claudel que vá rezar avé marias
e o Perse consertar as avarias
que fez à Resistência no exílio.
Não pensem que esquecemos o Abílio
Guerra Junqueiro, toda uma ameaça:
o Rei a cair morto numa praça!
Poetas diplomatas, vão pastar!
Poetas presidentes?! Nem pensar...
E não julguem que sou qualquer reaça!
Eu sou da nobre estirpe de um talassa...
Posted by Alcipe at 9:06 AM
Alertado por meu colega blogueiro e diplomata -- acho que na ordem inversa -- Francisco Seixas da Costa, que sempre traz coisas muito boas no seu "Duas ou Três Coisas...", descobri, em um seu post sobre Diplomacia e Poesia, essa junção de duas coisas que sempre caminharam juntas: a diplomacia e a poesia, tanto porque os diplomatas são algo como os poetas da Realpolitik, ou os realistas da Idealpolitik, quanto porque eles não se cansam de encontrar palavras bonitas para feias realidades...
Enfim, sou de opinião que, independentemente de suas qualidades enquanto grande poeta, grande letrista, incomparável bebum, Vinicius nunca poderia ter sido promovido a embaixador, razão pela qual coloquei essas expressões entre aspas, no começo deste post. Tratou-se de uma promoção política, administrativa e técnicamente irregular, que poderia ser desmantelada por qualquer órgão de controle da legalidade dos atos (mas que, no Brasil atual, se preocupa com a legalidade dos atos do governo?), feita mais para dar uma gorda pensão -- e provavelmente uma grande "indenização" retroativa -- a suas duas filhas, do que para reparar uma grande injustiça.
Mas deixemos essa questão de lado para apreciar esta crítica dos costumes poético-diplomáticos em forma de poesia, justamente, embora vagamente depreciativa, talvez comme il faut...
Paulo Roberto de Almeida
Divertimento
Blog Tim Tim no Tibete
Thursday, August 19, 2010
Um diplomata só já é risível;
poeta e diplomata, isso é demais!
Fica bem nas fronteiras do incrível:
Vinícius e Cabral não quero mais!
Foi você que pediu Octavio Paz?
Não sei o que ele fez nem o que faz.
Poetas são patetas com plumas
e diplomatas são coisas nenhumas.
Claudel que vá rezar avé marias
e o Perse consertar as avarias
que fez à Resistência no exílio.
Não pensem que esquecemos o Abílio
Guerra Junqueiro, toda uma ameaça:
o Rei a cair morto numa praça!
Poetas diplomatas, vão pastar!
Poetas presidentes?! Nem pensar...
E não julguem que sou qualquer reaça!
Eu sou da nobre estirpe de um talassa...
Posted by Alcipe at 9:06 AM
Nunca antes naquele pais, a censura foi tao escabrosa...
...ou talvez sim: na época do ditador Perez Jimenez, como lembra o Estadão nesta matéria que também já foi objeto de um post neste blog, poucos dias atrás. O foco: a censura exercida por um juiz a serviço do caudilho sobre os jornais, que estão apenas estampando a realidade.
Em todas as ditaduras, é proibido refletir a realidade.
Todos tem de viver a ilusão pautada pela propaganda oficial.
Mais um pouco essa tendência vai se espalhar pelo continente. Na Bolívia, no Equador, na Argentina já se constata a disseminação desse virus.
Tem gente que gosta...
Paulo Roberto de Almeida
O arrocho de Chávez
Editorial - O Estado de S.Paulo
21 de agosto de 2010
A publicação, pelo jornal El Nacional de Caracas, de uma foto de 12 cadáveres empilhados no necrotério da capital - para denunciar a omissão do governo de Hugo Chávez diante da escalada da violência criminal na Venezuela - resultou esta semana na imposição explícita da censura a toda a imprensa do país, depois limitada a dois jornais de Caracas. É o mais grave ato repressivo do gênero desde os tempos do ditador Marcos Pérez Jiménez, nos anos 1950. Com uma peculiaridade: a mordaça valerá de início por um mês. Isso porque haverá eleições parlamentares na Venezuela em 26 de setembro, e a questão da segurança aflige como nenhuma outra o eleitorado da nação vizinha.
Não é para menos. Sob Chávez, a criminalidade alcançou níveis atualmente sem paralelo na América do Sul. Embora o governo tenha cessado de divulgar estatísticas sobre o assunto - na fútil tentativa de ocultar da população o que ela sabe por experiência própria na sua vida cotidiana -, cálculos extraoficiais revelam que em 2009 o número de homicídios no país superou 16 mil, com 50 mil feridos. Em julho último, 465 pessoas (ou 15 a cada dia) foram assassinadas, apenas em Caracas. Estima-se que o arsenal em poder da bandidagem soma 6 milhões de armas. Na Venezuela, o crime compensa: 91% dos atos de violência armada permanecem impunes.
Na República Bolivariana, o regime controla de tal modo o Judiciário que pode contar com a instituição para dar um verniz de legitimidade aos seus movimentos liberticidas. Assim foi no caso do oposicionista El Nacional. (Ou no caso do Tal Cual, outro jornal que se opõe ao caudilho, que reproduziu a foto do necrotério repleto.) Tão logo Chávez investiu contra o matutino, acusando-o de ter divulgado uma imagem "pornográfica", numa "manipulação politiqueira do tema da violência", o Tribunal para a Proteção da Criança e do Adolescente vedou a publicação de textos e fotos relativos, entre outras coisas, a "incidentes sangrentos e grotescos, armas, mensagens de terror, atos de agressão física e batalhas".
A reação do El Nacional foi vigorosa. Sob a manchete Proíbem publicar imagens e notícias sobre a violência, o diário carimbou a palavra "censurado" nos espaços em branco reservados para duas fotos. Uma legenda resumia a tragédia venezuelana: Se aqui houvesse uma foto, vocês veriam um pai chorando por um filho que morreu. O proprietário e editor-chefe do jornal considerou a censura uma arbitrariedade que viola a Constituição. "Foi uma decisão política", disse ainda, aludindo à campanha eleitoral em curso no país e ao problema que mais afeta a popularidade de Chávez. "A decisão judicial peca por amplitude e imprecisão", comentou a organização de defesa da imprensa Repórteres sem Fronteiras.
As incursões do autocrata contra a liberdade de informar nada têm de novo. Em 2007, o governo se recusou a renovar a concessão da rede RCTV, que acabou fechada. Tiveram o mesmo destino 40 emissoras de rádio. O caso talvez mais escabroso é a perseguição movida à TV Globovisión, cujo dono, Guillermo Zuloaga, fugiu do país depois de ter sido preso em março. Chávez anunciou que pretende adquirir o controle acionário da emissora. "Mas nunca vimos uma atitude como esta", ressalta o professor Marcelino Bisbal, da Universidade Católica Andrés Bello, de Caracas. Provavelmente porque parece haver um elo entre a indiferença do governo à violência urbana e os subterrâneos do poder chavista.
Há pouco, a CNN levou ao ar o documentário espanhol Los Guardianes de Chávez sobre os grupos paramilitares como Los Colectivos, La Piedrita e Los Carapaicas, que formam uma espécie de força pretoriana do caudilho que intimida, quando não aterroriza, a oposição ao chefe. Um número indeterminado, porém não desprezível, de seus integrantes mantém relações com organizações criminosas ou fazem parte eles mesmos das quadrilhas. Outra tropa de choque são as milícias camponesas apoiadas e armadas pelo autocrata. Como era de prever, ele atribuiu as denúncias a uma tentativa golpista. "Este tema da violência, do crime", investiu, "converteu-se num fator antirrevolucionário de peso." Na realidade, é um pretexto para o arrocho. Mais um.
Em todas as ditaduras, é proibido refletir a realidade.
Todos tem de viver a ilusão pautada pela propaganda oficial.
Mais um pouco essa tendência vai se espalhar pelo continente. Na Bolívia, no Equador, na Argentina já se constata a disseminação desse virus.
Tem gente que gosta...
Paulo Roberto de Almeida
O arrocho de Chávez
Editorial - O Estado de S.Paulo
21 de agosto de 2010
A publicação, pelo jornal El Nacional de Caracas, de uma foto de 12 cadáveres empilhados no necrotério da capital - para denunciar a omissão do governo de Hugo Chávez diante da escalada da violência criminal na Venezuela - resultou esta semana na imposição explícita da censura a toda a imprensa do país, depois limitada a dois jornais de Caracas. É o mais grave ato repressivo do gênero desde os tempos do ditador Marcos Pérez Jiménez, nos anos 1950. Com uma peculiaridade: a mordaça valerá de início por um mês. Isso porque haverá eleições parlamentares na Venezuela em 26 de setembro, e a questão da segurança aflige como nenhuma outra o eleitorado da nação vizinha.
Não é para menos. Sob Chávez, a criminalidade alcançou níveis atualmente sem paralelo na América do Sul. Embora o governo tenha cessado de divulgar estatísticas sobre o assunto - na fútil tentativa de ocultar da população o que ela sabe por experiência própria na sua vida cotidiana -, cálculos extraoficiais revelam que em 2009 o número de homicídios no país superou 16 mil, com 50 mil feridos. Em julho último, 465 pessoas (ou 15 a cada dia) foram assassinadas, apenas em Caracas. Estima-se que o arsenal em poder da bandidagem soma 6 milhões de armas. Na Venezuela, o crime compensa: 91% dos atos de violência armada permanecem impunes.
Na República Bolivariana, o regime controla de tal modo o Judiciário que pode contar com a instituição para dar um verniz de legitimidade aos seus movimentos liberticidas. Assim foi no caso do oposicionista El Nacional. (Ou no caso do Tal Cual, outro jornal que se opõe ao caudilho, que reproduziu a foto do necrotério repleto.) Tão logo Chávez investiu contra o matutino, acusando-o de ter divulgado uma imagem "pornográfica", numa "manipulação politiqueira do tema da violência", o Tribunal para a Proteção da Criança e do Adolescente vedou a publicação de textos e fotos relativos, entre outras coisas, a "incidentes sangrentos e grotescos, armas, mensagens de terror, atos de agressão física e batalhas".
A reação do El Nacional foi vigorosa. Sob a manchete Proíbem publicar imagens e notícias sobre a violência, o diário carimbou a palavra "censurado" nos espaços em branco reservados para duas fotos. Uma legenda resumia a tragédia venezuelana: Se aqui houvesse uma foto, vocês veriam um pai chorando por um filho que morreu. O proprietário e editor-chefe do jornal considerou a censura uma arbitrariedade que viola a Constituição. "Foi uma decisão política", disse ainda, aludindo à campanha eleitoral em curso no país e ao problema que mais afeta a popularidade de Chávez. "A decisão judicial peca por amplitude e imprecisão", comentou a organização de defesa da imprensa Repórteres sem Fronteiras.
As incursões do autocrata contra a liberdade de informar nada têm de novo. Em 2007, o governo se recusou a renovar a concessão da rede RCTV, que acabou fechada. Tiveram o mesmo destino 40 emissoras de rádio. O caso talvez mais escabroso é a perseguição movida à TV Globovisión, cujo dono, Guillermo Zuloaga, fugiu do país depois de ter sido preso em março. Chávez anunciou que pretende adquirir o controle acionário da emissora. "Mas nunca vimos uma atitude como esta", ressalta o professor Marcelino Bisbal, da Universidade Católica Andrés Bello, de Caracas. Provavelmente porque parece haver um elo entre a indiferença do governo à violência urbana e os subterrâneos do poder chavista.
Há pouco, a CNN levou ao ar o documentário espanhol Los Guardianes de Chávez sobre os grupos paramilitares como Los Colectivos, La Piedrita e Los Carapaicas, que formam uma espécie de força pretoriana do caudilho que intimida, quando não aterroriza, a oposição ao chefe. Um número indeterminado, porém não desprezível, de seus integrantes mantém relações com organizações criminosas ou fazem parte eles mesmos das quadrilhas. Outra tropa de choque são as milícias camponesas apoiadas e armadas pelo autocrata. Como era de prever, ele atribuiu as denúncias a uma tentativa golpista. "Este tema da violência, do crime", investiu, "converteu-se num fator antirrevolucionário de peso." Na realidade, é um pretexto para o arrocho. Mais um.
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