Faço uma interrupção nos posts apenas para prestar contas sobre algo que a mim também incomoda.
O excesso de posts, de informações ou análises, de matérias de opinião sobre temas políticos, mais exatamente eleitorais.
Confesso não gostar disso, ou melhor, pelo menos não aqui, neste blog, que deveria estar voltado essencialmente, embora não exclusivamente, para temas de relações internacionais e de política externa do Brasil.
Os seguidores que se inscreveram para ler os posts, os leitores eventuais ou habituais podem estar incomodados com essa excessiva concentração de posts em temas meramente conjunturais, no mais das vezes sequer edificantes, e talvez mesmo vergonhosos.
Ao desculpar-me pelo fato, arrisco uma explicação.
Gosto de ocupar-me de assuntos de inteligência, como dá para perceber: livros, informações, análises, reflexões sobre meus temas preferidos, que são os de economia, desenvolvimento, cultura, politica internacional, história, diplomacia, enfim, aquilo que os franceses chamariam de haute culture.
Nisso não vai nenhum elitismo, e se houver, não me incomoda o mínimo: considero altamente desejável, e admirável, as pessoas buscarem a maior cultura possível, a maior compreensão alcançável sobre as coisas do mundo e da mente. Como se diz em latim, numa expressão que termina por um palavrão em português: nada do que é humano me é estranho.
Assim, me interesso por tudo, e leio um pouco de tudo, geralmente livros de estudo, um pouco menos de romances -- o que lamento, sinceramente -- por absoluta falta de tempo e concentração naquelas áreas mencionadas.
Este blog, obviamente, procura apresentar uma pequena seleção de meus temas preferidos -- e tenho outros para outras matérias, livros, eleições, etc -- com ênfase nas relações internacionais e na política externa do Brasil, por gosto e por deformação de ofício, digamos assim.
Mas também tenho os meus dislikes.
Por exemplo, tenho alergia à burrice.
Atenção: não confundir com ignorância. "Respeito", humildemente (se é o caso de dizer), a "incultura" dos menos afortunados, daqueles que não tiveram chance na vida de se educar corretamente e que permanecem ignorantes, por falta de condições objetivas, ainda que eu acredite que qualquer ser humano pode fazer um esforço próprio para se instruir, se tiver consciência, claro, do valor do conhecimento para sua elevação material (e até espiritual). Mas não é desses indivíduos que estou falando.
Eu me refiro àqueles que, tendo condições e possibilidade de se instruir, ou de pelo menos de se informar por meios próprios, de buscar dados sobre as coisas que o cercam, de pelos menos abrir um jornal ou de ver um programa noticioso na TV ou ouvir informações no rádio, enfim, pessoas que escolhem voluntariamente permanecer ignorantes, por preguiça, por desinteresse, por simples insistência na desinformação (que salta virtualmente na face de qualquer um hoje em dia), por recusa de melhorar sua capacidade cognitiva, ou por simples acomodação na incultura. Esses eu encontro por vezes, aqui e ali, e me surpreendo como certas pessoas até bem vestidas, dotadas (aparentemente) de uma educação formal que pode ter ido até o terceiro nível, podem ser tão desinformadas e voluntariamente alheias às realidades do Brasil e do mundo. Esse eu reputo burros, e reputo que se trata de uma estupidez voluntariamente assumida. Tenho alergia, portanto, desse tipo de burrice ou de incultura (porque escolhida).
Também tenho horror à mentira, à fraude deliberada, à desonestidade intelectual, que são todos reflexo e resultado de um mesmo traço fundamental em certos indivíduos: a falta de caráter.
Infelizmente, todos esses traços são facilmente encontráveis no Brasil atualmente, e até em esferas onde não esperávamos encontrar esse tipo de "defeito", digamos assim.
Creio que estou chocado por encontrar tudo isso em doses altamente concentradas nos últimos tempos.
Essa é a razão de por que tenho me desviado de meus assuntos habituais para me ocupar, tapando o nariz, desses aspectos menos felizes da conjuntura brasileira atual.
Isso passa...
Paulo Roberto de Almeida
(23.09.2010)
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Uma analise do carisma - Mario Guerreiro
Afinal de contas, o que é carisma?!
Mario Guerreiro
(22.09.2010)
Quando investigamos a origem da palavra “carisma” surpreendemos um processo de laicização cujas consequências últimas são assaz surpreendentes. Charisma é uma palavra grega que foi usada pelo cristianismo primitivo e cujo significado era o de “dom da graça divina”. Desse modo, dizia-se que um homem agraciado por esse dom era um homem carismático.
Em seus estudos sobre a formação da religião cristã, o teólogo Rudolph Sohm empregou essa palavra diversas vezes e, ao que tudo indica, o sociólogo Max Weber (1864-1920) teria sido o primeiro a estender seu sentido a um contexto laico. Carisma passou a ser, para ele, uma qualidade excepcional (real ou imaginária) possuída por um indivíduo capaz de exercer influência e liderança sobre determinado grupo de indivíduos.
É importante assinalar que Weber não fez uso do termo na sua acepção original (teológica), mas sim numa acepção laica inspirada na mesma. Assim sendo, ele despiu o vocábulo inteiramente de qualquer conotação valorativa, tanto quando o que estava em jogo a análise das lideranças do ponto de vista da sociologia da religião como a do ponto de vista do poder político.
Ou seja: para o cristianismo, possuir carisma era e ainda é um bem, uma qualidade excepcional ofertada por Deus a alguns espíritos especiais, porém para Weber é meramente uma qualidade possuída por um particular tipo de liderança: a liderança carismática.
Tal liderança, em si mesma, não é boa nem má. O líder carismático goza de uma grande capacidade de persuadir e inflamar um grupo maior ou menor de indivíduos, porém tanto pode conduzi-los a praticar o bem como o mal. Lembremos que, tanto Mahatma Gandhi como Adolf Hitler teriam que ser considerados líderes carismáticos, tal como caracterizado por Weber. E por que não Abelardo Barbosa, o Chacrinha, e Seymour Abravanel, o Sílvio Santos, bem como Michael Jackson, o bispo Macedo, Enéas Carneiro et caterva?!
Lembremos que no caso de Sílvio Santos, este chegou mesmo a se candidatar a Presidente da República, e creio que só não obteve uma votação maior, porque lançou sua candidatura demasiadamente tarde, não por carecer de dons carismáticos weberianos.
Só fico em dúvida se devo considerar que é também carismático o candidato a deputado Tiririca com seu slogan "Vote em Tiririca que pior do que tá não fica"?! Digo isto porque ele mostrou ser capaz de conquistar a adesão de milhares de eleitores e está correndo o risco de ser o candidato mais votado em São Paulo.
Apesar disso, percebo que no mundo contemporâneo há uma valoração positiva da expressão “líder carismático”, como se uma liderança carismática fosse sempre uma algo positivo, unicamente conduzindo um grupo maior ou menor de indivíduos à prática do bem.
Nada mais estranho ao pensamento de Weber que sempre desempenhou um grande esforço no sentido de preservar aquilo que ele chamou de Wertfreiheit (literalmente: isenção de valor, mas numa linguagem técnica: neutralidade axiológica), coisa esta considerada por ele imprescindível numa abordagem científica.
Essa tomada no sentido valorativo de um termo, antes usado num sentido puramente descritivo, é um fenômeno bastante disseminado socialmente. Determinadas qualidades de caráter dianoético (relativas à mente e ao intelecto) frequentemente são tomadas num sentido ético. Se uma qualidade tal como a astúcia fosse algo eticamente negativo, Cristo não a teria recomendado ao dizer: “Sede mansos como as pombas, mas astutos como as serpentes”.
Todavia, a astúcia em si mesma não é uma qualidade dianoética positiva nem negativa, tudo dependerá de quem a empregar: se a empregar com uma boa ou má finalidade, se a empregar para se defender de quem preparou uma armadilha ou para passar a perna nos outros. O mesmo pode ser dito da prudência: por acaso um vil criminoso não pode ser prudente em determinada ação? E se for, só por isso ele deixará de ser um meliante e passará a ser um homem probo?
No entanto, por maior que seja minha admiração pelas brilhantes análises da liderança carismática realizadas por Max Weber, gostaria de ir mais adiante e colocar a seguinte indagação:
O portador de carisma é reconhecido pelas características de sua personalidade qua tale – tais como poder de comunicação, persuasão, liderança, etc – ou tudo depende muito de como seus liderados o vêem, de sua identificação com ele, de ele se comportar de acordo com os anseios e expectativas deles, etc?
Coloquei essas indagações logo após a leitura da análise de uma particular personagem da história reconhecidamente carismática. Em sua descrição de Che Guevara, diz Olavo de Carvalho:
“Como revolucionário, Che Guevara foi um vulgar tiranete, um assassino que se comprazia em executar pessoalmente as sentenças de morte que assinava.”
“Como ministro da Economia foi um fiasco do qual o próprio regime cubano se livrou o mais rápido que pôde; como guerrilheiro, foi um recordista de inépcia, capaz de perder para o exército mais pífio da América Latina”.
“Que encanto possui essa porcaria de personagem para que tantos brasileiros se babem de gozo devoto ante sua imagem e concedam mais vasta homenagem aos trinta anos de sua morte do que aos trezentos anos de Vieira e aos quatrocentos de Anchieta?”
Associar a barba rala de adolescentes a algum odor de santidade, me desculpem, mas é pura perversão sexual: não explica nada. Quanto ao “no perder la ternura [jamás]” é apenas uma frase e nada de novo nos informa”.
“O culto de Che Guevara é um enigma que a própria figura do Che não elucida. Suas razões não estão na natureza do objeto cultuado, mas sim na psicologia de seus sacerdotes. Para encontrá-las, é preciso dar à pergunta uma formulação mais geral: Por que o socialismo, um fracasso na realidade, continua persuasivo como ‘ideal’?” [Olavo de Carvalho: O Imbecil Coletivo II. Rio de Janeiro. Topbooks.1998. pp.47-8. O grifo é meu].
Fica bastante claro na supracitada passagem - especialmente no último parágrafo - que os motivos do grande carisma de Che Guevara não devem ser procurados em sua figura, porém na “psicologia de seus sacerdotes”, ou seja: nos anseios, nas expectativas, na identificação daqueles que interagiram e ainda interagem com sua figura, mesmo - ou principalmente - após sua morte seguida de sua “beatificação”.
Reconhecer isso representa analisar a liderança carismática por um prisma diferente daquele descortinado por Weber, pois o que passa a estar em jogo é a idéia de que um líder carismático é muito mais o que ele representa para os outros, os anseios que ele vem a preencher, expectativas dos outros que ele satisfaz ou se limita a nutrir substanciosamente, etc.
Com isto, não estou pretendendo insinuar que o líder carismático tenha grande capacidade de intuir os anseios e as expectativas de seus acólitos e, com verdadeiro talento dramático, seja capaz de desempenhar um papel que venha ao encontro dos mesmos. Longe dele esse distanciamento frio mediante o qual um bom ator confere vida à personagem representada por ele.
O líder carismático não finge ser uma personalidade que ele não é, não representa num palco para uma platéia. Malgrado sua fala e seus gestos mostrarem-se frequentemente eivados de teatralidade, são realmente espontâneos: ele sente de fato as emoções que transmite aos outros, ele se mostra tal qual é.
E nisto consiste justamente uma das suas principais virtudes, uma vez que a persuasão não se faz apenas pelas idéias transmitidas por ele, mas, principalmente pelo tônus afetivo mediante o qual elas envolvem afetivamente a platéia. Na comunicação de um líder carismático com seu público, está muito mais em jogo o pólo expressivo do que o pólo semântico da linguagem, para usar a oportuna distinção de Karl Bühler.
No excelente filme O Grande Ditador, o magistral ator e diretor Charles Chaplin expressou isso de maneira admirável. Ele faz uma paródia do Führer esvaziando seus eletrizantes discursos de todo conteúdo significativo, só emitindo fonemas típicos da língua alemã, porém com toda aquela verve acompanhada de frenética gesticulação. Algo semelhante a “Aftas ardem e doem”!!!
E é por isso que carismáticos são Fidel Castro, Chávez e Lula e não-carismáticos são Dilma, Marina e Serra. Estes, não importando o conteúdo de suas falas, são incapazes de transmitir emoção e envolver afetivamente a platéia. Seus sorrisos são forçados e inexpressivos. O de Serra mal consegue esconder uma pessoa amarga, dona da verdade e intransigente, o de Dilma uma pessoa rancorosa, intratável e mandona: a folclórica sogra de maus bofes sorrindo para as visitas, mas só por questão de etiqueta.
Mas não nos esqueçamos de que ser carismático não é nenhuma virtude ética, limita-se às capacidades de persuasão e liderança. Tais capacidades, como já vimos, dependem muito do reconhecimento e do acolhimento dos liderados que se identificam com o líder. Vamos até mais longe dizendo que não só os anseios e as expectativas, mas também a especial mentalidade da platéia é que fazem de alguém um verdadeiro líder carismático.
Antonio Conselheiro não conquistaria multidões de fanáticos seguidores, se estes não estivessem nos sertões nordestinos, mas sim na Finlândia (onde provavelmente ele seria remetido a uma clínica psiquiátrica). Se sua carreira fosse feita no Brasil, Hitler não teria sido levado a sério e eleito (ainda que indiretamente) pelo povo, e provavelmente arranjaria um emprego num circo como bom imitador de Carlitos (personagem de Charles Chaplin).
Mas a esta altura há uma pergunta que não quer se calar: Considerando que um líder político como Luís Inácio Lula da Silva é de fato um grande líder carismático, sem que haja nessa asserção nenhum juízo de valor – tal como recomendaria Max Weber – o que fez com que ele se tornasse o que de fato se tornou? E ser ainda capaz de alavancar sua insossa e despreparada candidata à sucessão em virtude única de seu carisma de grande transferidor de votos – capaz de eleger até um poste!
Para resumir tudo numa só sentença: Ele é a “cara do povo”, como se costuma dizer. Mas o que é ser a cara do povo, quando o povo em questão só pode ser o brasileiro?
Ora, é ser semiletrado, bravateiro, orgulhoso de seu despreparo e ignorância, matreiro, fiel seguidor da “Lei de Gérson”, manipulador, inconseqüente, emissor de chavões esquerdistas e abobrinhas de apedeuta, cara-de-pau, amante de mordomias y otras cositas mucho más malas...
Trata-se, portanto, de um legítimo representante do povo, e isto ninguém pode negar! Nem mesmo os 4% de eleitores que o detestam tanto quanto seus dois (des)governos e em que me incluo prazerosamente como minoria irrelevante em termos estatísticos.
Que devemos concluir? Que “a democracia é uma aristocracia de pilantras?” (Lorde Byron). Que “a democracia não passa de uma ficção estatística?” (Jorge Luis Borges). Que a democracia corre sempre o risco de se transformar numa ditadura da maioria? (Tocqueville).
Não! Devemos concluir que cada povo tem o governo que merece.
E se um povo quiser ser merecedor de futuros governos melhores, que exija uma educação da melhor qualidade para todos indistintamente, capaz de gerar um número maior de eleitores bem formados e bem informados.
É quase certo eles que jamais elegeriam um indivíduo como Lula nem para síndico de seu edifício ou Presidente de seu clube de futebol.
Mario Guerreiro
(22.09.2010)
Quando investigamos a origem da palavra “carisma” surpreendemos um processo de laicização cujas consequências últimas são assaz surpreendentes. Charisma é uma palavra grega que foi usada pelo cristianismo primitivo e cujo significado era o de “dom da graça divina”. Desse modo, dizia-se que um homem agraciado por esse dom era um homem carismático.
Em seus estudos sobre a formação da religião cristã, o teólogo Rudolph Sohm empregou essa palavra diversas vezes e, ao que tudo indica, o sociólogo Max Weber (1864-1920) teria sido o primeiro a estender seu sentido a um contexto laico. Carisma passou a ser, para ele, uma qualidade excepcional (real ou imaginária) possuída por um indivíduo capaz de exercer influência e liderança sobre determinado grupo de indivíduos.
É importante assinalar que Weber não fez uso do termo na sua acepção original (teológica), mas sim numa acepção laica inspirada na mesma. Assim sendo, ele despiu o vocábulo inteiramente de qualquer conotação valorativa, tanto quando o que estava em jogo a análise das lideranças do ponto de vista da sociologia da religião como a do ponto de vista do poder político.
Ou seja: para o cristianismo, possuir carisma era e ainda é um bem, uma qualidade excepcional ofertada por Deus a alguns espíritos especiais, porém para Weber é meramente uma qualidade possuída por um particular tipo de liderança: a liderança carismática.
Tal liderança, em si mesma, não é boa nem má. O líder carismático goza de uma grande capacidade de persuadir e inflamar um grupo maior ou menor de indivíduos, porém tanto pode conduzi-los a praticar o bem como o mal. Lembremos que, tanto Mahatma Gandhi como Adolf Hitler teriam que ser considerados líderes carismáticos, tal como caracterizado por Weber. E por que não Abelardo Barbosa, o Chacrinha, e Seymour Abravanel, o Sílvio Santos, bem como Michael Jackson, o bispo Macedo, Enéas Carneiro et caterva?!
Lembremos que no caso de Sílvio Santos, este chegou mesmo a se candidatar a Presidente da República, e creio que só não obteve uma votação maior, porque lançou sua candidatura demasiadamente tarde, não por carecer de dons carismáticos weberianos.
Só fico em dúvida se devo considerar que é também carismático o candidato a deputado Tiririca com seu slogan "Vote em Tiririca que pior do que tá não fica"?! Digo isto porque ele mostrou ser capaz de conquistar a adesão de milhares de eleitores e está correndo o risco de ser o candidato mais votado em São Paulo.
Apesar disso, percebo que no mundo contemporâneo há uma valoração positiva da expressão “líder carismático”, como se uma liderança carismática fosse sempre uma algo positivo, unicamente conduzindo um grupo maior ou menor de indivíduos à prática do bem.
Nada mais estranho ao pensamento de Weber que sempre desempenhou um grande esforço no sentido de preservar aquilo que ele chamou de Wertfreiheit (literalmente: isenção de valor, mas numa linguagem técnica: neutralidade axiológica), coisa esta considerada por ele imprescindível numa abordagem científica.
Essa tomada no sentido valorativo de um termo, antes usado num sentido puramente descritivo, é um fenômeno bastante disseminado socialmente. Determinadas qualidades de caráter dianoético (relativas à mente e ao intelecto) frequentemente são tomadas num sentido ético. Se uma qualidade tal como a astúcia fosse algo eticamente negativo, Cristo não a teria recomendado ao dizer: “Sede mansos como as pombas, mas astutos como as serpentes”.
Todavia, a astúcia em si mesma não é uma qualidade dianoética positiva nem negativa, tudo dependerá de quem a empregar: se a empregar com uma boa ou má finalidade, se a empregar para se defender de quem preparou uma armadilha ou para passar a perna nos outros. O mesmo pode ser dito da prudência: por acaso um vil criminoso não pode ser prudente em determinada ação? E se for, só por isso ele deixará de ser um meliante e passará a ser um homem probo?
No entanto, por maior que seja minha admiração pelas brilhantes análises da liderança carismática realizadas por Max Weber, gostaria de ir mais adiante e colocar a seguinte indagação:
O portador de carisma é reconhecido pelas características de sua personalidade qua tale – tais como poder de comunicação, persuasão, liderança, etc – ou tudo depende muito de como seus liderados o vêem, de sua identificação com ele, de ele se comportar de acordo com os anseios e expectativas deles, etc?
Coloquei essas indagações logo após a leitura da análise de uma particular personagem da história reconhecidamente carismática. Em sua descrição de Che Guevara, diz Olavo de Carvalho:
“Como revolucionário, Che Guevara foi um vulgar tiranete, um assassino que se comprazia em executar pessoalmente as sentenças de morte que assinava.”
“Como ministro da Economia foi um fiasco do qual o próprio regime cubano se livrou o mais rápido que pôde; como guerrilheiro, foi um recordista de inépcia, capaz de perder para o exército mais pífio da América Latina”.
“Que encanto possui essa porcaria de personagem para que tantos brasileiros se babem de gozo devoto ante sua imagem e concedam mais vasta homenagem aos trinta anos de sua morte do que aos trezentos anos de Vieira e aos quatrocentos de Anchieta?”
Associar a barba rala de adolescentes a algum odor de santidade, me desculpem, mas é pura perversão sexual: não explica nada. Quanto ao “no perder la ternura [jamás]” é apenas uma frase e nada de novo nos informa”.
“O culto de Che Guevara é um enigma que a própria figura do Che não elucida. Suas razões não estão na natureza do objeto cultuado, mas sim na psicologia de seus sacerdotes. Para encontrá-las, é preciso dar à pergunta uma formulação mais geral: Por que o socialismo, um fracasso na realidade, continua persuasivo como ‘ideal’?” [Olavo de Carvalho: O Imbecil Coletivo II. Rio de Janeiro. Topbooks.1998. pp.47-8. O grifo é meu].
Fica bastante claro na supracitada passagem - especialmente no último parágrafo - que os motivos do grande carisma de Che Guevara não devem ser procurados em sua figura, porém na “psicologia de seus sacerdotes”, ou seja: nos anseios, nas expectativas, na identificação daqueles que interagiram e ainda interagem com sua figura, mesmo - ou principalmente - após sua morte seguida de sua “beatificação”.
Reconhecer isso representa analisar a liderança carismática por um prisma diferente daquele descortinado por Weber, pois o que passa a estar em jogo é a idéia de que um líder carismático é muito mais o que ele representa para os outros, os anseios que ele vem a preencher, expectativas dos outros que ele satisfaz ou se limita a nutrir substanciosamente, etc.
Com isto, não estou pretendendo insinuar que o líder carismático tenha grande capacidade de intuir os anseios e as expectativas de seus acólitos e, com verdadeiro talento dramático, seja capaz de desempenhar um papel que venha ao encontro dos mesmos. Longe dele esse distanciamento frio mediante o qual um bom ator confere vida à personagem representada por ele.
O líder carismático não finge ser uma personalidade que ele não é, não representa num palco para uma platéia. Malgrado sua fala e seus gestos mostrarem-se frequentemente eivados de teatralidade, são realmente espontâneos: ele sente de fato as emoções que transmite aos outros, ele se mostra tal qual é.
E nisto consiste justamente uma das suas principais virtudes, uma vez que a persuasão não se faz apenas pelas idéias transmitidas por ele, mas, principalmente pelo tônus afetivo mediante o qual elas envolvem afetivamente a platéia. Na comunicação de um líder carismático com seu público, está muito mais em jogo o pólo expressivo do que o pólo semântico da linguagem, para usar a oportuna distinção de Karl Bühler.
No excelente filme O Grande Ditador, o magistral ator e diretor Charles Chaplin expressou isso de maneira admirável. Ele faz uma paródia do Führer esvaziando seus eletrizantes discursos de todo conteúdo significativo, só emitindo fonemas típicos da língua alemã, porém com toda aquela verve acompanhada de frenética gesticulação. Algo semelhante a “Aftas ardem e doem”!!!
E é por isso que carismáticos são Fidel Castro, Chávez e Lula e não-carismáticos são Dilma, Marina e Serra. Estes, não importando o conteúdo de suas falas, são incapazes de transmitir emoção e envolver afetivamente a platéia. Seus sorrisos são forçados e inexpressivos. O de Serra mal consegue esconder uma pessoa amarga, dona da verdade e intransigente, o de Dilma uma pessoa rancorosa, intratável e mandona: a folclórica sogra de maus bofes sorrindo para as visitas, mas só por questão de etiqueta.
Mas não nos esqueçamos de que ser carismático não é nenhuma virtude ética, limita-se às capacidades de persuasão e liderança. Tais capacidades, como já vimos, dependem muito do reconhecimento e do acolhimento dos liderados que se identificam com o líder. Vamos até mais longe dizendo que não só os anseios e as expectativas, mas também a especial mentalidade da platéia é que fazem de alguém um verdadeiro líder carismático.
Antonio Conselheiro não conquistaria multidões de fanáticos seguidores, se estes não estivessem nos sertões nordestinos, mas sim na Finlândia (onde provavelmente ele seria remetido a uma clínica psiquiátrica). Se sua carreira fosse feita no Brasil, Hitler não teria sido levado a sério e eleito (ainda que indiretamente) pelo povo, e provavelmente arranjaria um emprego num circo como bom imitador de Carlitos (personagem de Charles Chaplin).
Mas a esta altura há uma pergunta que não quer se calar: Considerando que um líder político como Luís Inácio Lula da Silva é de fato um grande líder carismático, sem que haja nessa asserção nenhum juízo de valor – tal como recomendaria Max Weber – o que fez com que ele se tornasse o que de fato se tornou? E ser ainda capaz de alavancar sua insossa e despreparada candidata à sucessão em virtude única de seu carisma de grande transferidor de votos – capaz de eleger até um poste!
Para resumir tudo numa só sentença: Ele é a “cara do povo”, como se costuma dizer. Mas o que é ser a cara do povo, quando o povo em questão só pode ser o brasileiro?
Ora, é ser semiletrado, bravateiro, orgulhoso de seu despreparo e ignorância, matreiro, fiel seguidor da “Lei de Gérson”, manipulador, inconseqüente, emissor de chavões esquerdistas e abobrinhas de apedeuta, cara-de-pau, amante de mordomias y otras cositas mucho más malas...
Trata-se, portanto, de um legítimo representante do povo, e isto ninguém pode negar! Nem mesmo os 4% de eleitores que o detestam tanto quanto seus dois (des)governos e em que me incluo prazerosamente como minoria irrelevante em termos estatísticos.
Que devemos concluir? Que “a democracia é uma aristocracia de pilantras?” (Lorde Byron). Que “a democracia não passa de uma ficção estatística?” (Jorge Luis Borges). Que a democracia corre sempre o risco de se transformar numa ditadura da maioria? (Tocqueville).
Não! Devemos concluir que cada povo tem o governo que merece.
E se um povo quiser ser merecedor de futuros governos melhores, que exija uma educação da melhor qualidade para todos indistintamente, capaz de gerar um número maior de eleitores bem formados e bem informados.
É quase certo eles que jamais elegeriam um indivíduo como Lula nem para síndico de seu edifício ou Presidente de seu clube de futebol.
Populismo cambial: governo comete, e custa caro...
Os "economistas" do governo atual, aliás o próprio ministro da Fazenda, e o candidato ao governo paulista pelo partido que "combatia o populismo cambial" do governo "neoliberal" anterior, parece terem se esquecido de suas acusações sem pé nem cabeça. E, no entanto, é o que eles mais estão praticando, desde que chegaram ao poder, acumulando ainda reservas em excesso, a um custo anual superior a 20 bilhões de dólares.
Parece que eles não têm a solução para o problema, a não ser comprar mais dólares, o que estimula os "especuladores" e trazer mais dólares ainda ao Brasil.
Quanto isso vai durar? Enquanto o governo tiver condições de comprar dólares e jogar a conta nas nossas costas pelo futuro imprevisível...
Paulo Roberto de Almeida
Enxurrada de dólares
Editorial Folha de S.Paulo, 22.09.2010
Apesar das incertezas que ainda pairam sobre a economia mundial, cresce com rapidez o fluxo de capitais para os países em desenvolvimento. O Brasil é um destinatário privilegiado: nos últimos 12 meses, os investimentos estrangeiros em renda fixa e Bolsa superam US$ 65 bilhões, um recorde em anos recentes. Por causa dessa enxurrada de dólares, o país experimenta um processo de forte valorização do real -uma ameaça ao equilíbrio das contas externas.
As causas são globais. A mais importante é a consolidação de uma disparidade de crescimento econômico entre países ricos e o mundo em desenvolvimento. São hoje os emergentes, Brasil entre eles, os responsáveis pelo dinamismo e pelas oportunidades de investimento mais atrativas.
EUA e Europa -onde se concentra grande parte da riqueza financeira do mundo- amargam uma recuperação complicada, lenta, insuficiente para reduzir o desemprego. Não há dúvida de que a taxa real de juro dessas economias permanecerá próxima de zero por muito tempo, o que incentiva os investidores a buscar opções fora de seus países.
É natural, portanto, que se observe uma persistente realocação de capitais em favor dos países em crescimento. Estima-se, por exemplo, que menos de 5% da carteira dos grandes investidores institucionais europeus e americanos se encontre alocada em títulos de nações emergentes, parcela que poderá subir para cerca de 20% nos próximos anos.
É um movimento que agravará as dificuldades de gestão para os países receptores.
Como está em curso um processo de desvalorização do dólar e do euro, em razão da crise, a pressão pela valorização cambial afetará quase todas as outras economias -como tem ocorrido. Nesse quadro, ações isoladas em plano nacional podem amenizar, mas não eliminarão o problema.
A maior parte dos países em desenvolvimento tenta administrar a valorização de suas moedas por meio de compras de dólares nos mercados de câmbio. Valem-se para isso das vultosas reservas internacionais que acumularam nos últimos anos.
Mas há diferenças que precisam ser ressaltadas. Algumas economias -em especial as asiáticas- estão mais aparelhadas para acumular dólares, pois contam com ampla poupança interna e juros baixos. Não é o caso do Brasil, onde o custo de aumentar o volume de reservas pode se tornar proibitivo. Sustentar US$ 250 bilhões com uma diferença de juros nominais de 8% em relação aos ricos (10,75% contra 2,5% nos EUA) já onera o Tesouro em US$ 20 bilhões ao ano. Logo, os recursos para adquirir dólares não são "ilimitados", e a autorização para o Fundo Soberano comprá-los, como já se anunciou, não deverá alterar muito essa realidade.
Por outro lado, a opção de lavar as mãos e não intervir é insustentável, pois tornaria ainda maior o dano para a competitividade do setor produtivo. Cabe ao governo agir para minimizar as disparidades e o custo das intervenções -por exemplo, desonerando as exportações e o investimento.
É preciso que se criem logo condições fiscais para aproximar a taxa de juros interna dos padrões internacionais, levando-a para cerca de 2% ao ano, em termos reais, ou seja, descontada a inflação.
Parece que eles não têm a solução para o problema, a não ser comprar mais dólares, o que estimula os "especuladores" e trazer mais dólares ainda ao Brasil.
Quanto isso vai durar? Enquanto o governo tiver condições de comprar dólares e jogar a conta nas nossas costas pelo futuro imprevisível...
Paulo Roberto de Almeida
Enxurrada de dólares
Editorial Folha de S.Paulo, 22.09.2010
Apesar das incertezas que ainda pairam sobre a economia mundial, cresce com rapidez o fluxo de capitais para os países em desenvolvimento. O Brasil é um destinatário privilegiado: nos últimos 12 meses, os investimentos estrangeiros em renda fixa e Bolsa superam US$ 65 bilhões, um recorde em anos recentes. Por causa dessa enxurrada de dólares, o país experimenta um processo de forte valorização do real -uma ameaça ao equilíbrio das contas externas.
As causas são globais. A mais importante é a consolidação de uma disparidade de crescimento econômico entre países ricos e o mundo em desenvolvimento. São hoje os emergentes, Brasil entre eles, os responsáveis pelo dinamismo e pelas oportunidades de investimento mais atrativas.
EUA e Europa -onde se concentra grande parte da riqueza financeira do mundo- amargam uma recuperação complicada, lenta, insuficiente para reduzir o desemprego. Não há dúvida de que a taxa real de juro dessas economias permanecerá próxima de zero por muito tempo, o que incentiva os investidores a buscar opções fora de seus países.
É natural, portanto, que se observe uma persistente realocação de capitais em favor dos países em crescimento. Estima-se, por exemplo, que menos de 5% da carteira dos grandes investidores institucionais europeus e americanos se encontre alocada em títulos de nações emergentes, parcela que poderá subir para cerca de 20% nos próximos anos.
É um movimento que agravará as dificuldades de gestão para os países receptores.
Como está em curso um processo de desvalorização do dólar e do euro, em razão da crise, a pressão pela valorização cambial afetará quase todas as outras economias -como tem ocorrido. Nesse quadro, ações isoladas em plano nacional podem amenizar, mas não eliminarão o problema.
A maior parte dos países em desenvolvimento tenta administrar a valorização de suas moedas por meio de compras de dólares nos mercados de câmbio. Valem-se para isso das vultosas reservas internacionais que acumularam nos últimos anos.
Mas há diferenças que precisam ser ressaltadas. Algumas economias -em especial as asiáticas- estão mais aparelhadas para acumular dólares, pois contam com ampla poupança interna e juros baixos. Não é o caso do Brasil, onde o custo de aumentar o volume de reservas pode se tornar proibitivo. Sustentar US$ 250 bilhões com uma diferença de juros nominais de 8% em relação aos ricos (10,75% contra 2,5% nos EUA) já onera o Tesouro em US$ 20 bilhões ao ano. Logo, os recursos para adquirir dólares não são "ilimitados", e a autorização para o Fundo Soberano comprá-los, como já se anunciou, não deverá alterar muito essa realidade.
Por outro lado, a opção de lavar as mãos e não intervir é insustentável, pois tornaria ainda maior o dano para a competitividade do setor produtivo. Cabe ao governo agir para minimizar as disparidades e o custo das intervenções -por exemplo, desonerando as exportações e o investimento.
É preciso que se criem logo condições fiscais para aproximar a taxa de juros interna dos padrões internacionais, levando-a para cerca de 2% ao ano, em termos reais, ou seja, descontada a inflação.
Ironias da historia: militares defendem a democracia, jornalistas sao pela censura...
Participo nesta 5ª de um debate sobre a liberdade de expressão no Brasil
Reinaldo Azevedo, 23.09.2010
Há algo de deliciosamente irônico no que vou escrever agora. E certas ironias da história são muito úteis porque não servem para iluminar só o presente. Iluminam também o passado. Amanhã, este blog passará uma boa parte do tempo sem atualização. Encerro o trabalho nesta madrugada e volto a postar só à noite. Por quê?
Vou ao Rio para participar de um debate sobre “liberdade de expressão”. Os demais debatedores são o jornalista Merval Pereira, colunista do jornal O Globo e da GloboNews, e Rodolfo Machado Moura, diretor de Assuntos Legais da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão. A mediação é de Paulo Uebel, do Instituto Millenium.
Muito bem. Também nesta quinta, o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo abriga uma manifestação que tem como tema a imprensa. No caso, o PT e alguns outros partidos de esquerda, com apoio da CUT, UNE e outros auto-intitulados “movimentos sociais,” lançarão um grito de guerra contra o que chamam “velha mídia”. Por quê?
Estão descontentes com a cobertura que a imprensa, cumprindo a sua obrigação, vem fazendo dos escândalos promovidos pelo governo Lula ou, mais genericamente, pelos petistas. Nunca antes na história destepaiz — e, creio, na história mundial —, um sindicato de jornalistas se mobilizou para defender a censura! O “protesto” conta com o apoio e o incentivo entusiasmado de “profissionais” que são direta ou indiretamente financiados pelo governo federal ou por estatais.
E a ironia? O debate de que vou participar, aberto ao público, ocorre no Clube Militar, no Rio, entre 15h e 17h, no Salão Nobre da sede principal, na avenida Rio Branco, 251, no Centro. O encontro é promovido pelo clube e conta com o apoio do Instituto Millenium e do Centro de Estudos Políticos, Estratégicos e de Relações Internacionais (Themas).
Alguns bobinhos acreditam que o mundo pode ser dividido assim: militares são autoritários, detestam a democracia e são contra a liberdade de expressão. Já com os civis se dá o contrário. Errado! Aqueles podem ser democratas primorosos; estes podem ser tiranos contumazes. Não há regra para isso. No Brasil, o preconceito se deve, em boa parte, a uma história contada no joelho, que cria vilões e heróis de manual.
Dada, no entanto, a “história oficial”, a ironia está justamente nisto: debate-se liberdade de expressão no Clube Militar e se pede censura num sindicato de jornalistas. E isso serve, sim, para instruir o nosso olhar sobre o passado. Ao longo de mais de duas décadas, deu-se por verdade uma mentira: todos aqueles que combateram o regime militar estariam querendo democracia. Falso! Muitos queriam uma ditadura, outra ditadura…
Em parte, o espírito daqueles falsos combatentes da liberdade remanesce nos dias de hoje. Os que agora maculam um sindicato de jornalistas pedindo censura são herdeiros dos que queriam, há mais de 40 anos, uma ditadura comunista no Brasil. Aos ideólogos de sempre, ressalte-se, juntaram-se agora alguns vagabundos que só querem assaltar os cofres públicos.
Já os militares, vejam só!, têm clareza de que não há solução aceitável fora da democracia e do estado de direito. Isso nos diz muito do presente. Isso nos diz muito do passado.
Reinaldo Azevedo, 23.09.2010
Há algo de deliciosamente irônico no que vou escrever agora. E certas ironias da história são muito úteis porque não servem para iluminar só o presente. Iluminam também o passado. Amanhã, este blog passará uma boa parte do tempo sem atualização. Encerro o trabalho nesta madrugada e volto a postar só à noite. Por quê?
Vou ao Rio para participar de um debate sobre “liberdade de expressão”. Os demais debatedores são o jornalista Merval Pereira, colunista do jornal O Globo e da GloboNews, e Rodolfo Machado Moura, diretor de Assuntos Legais da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão. A mediação é de Paulo Uebel, do Instituto Millenium.
Muito bem. Também nesta quinta, o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo abriga uma manifestação que tem como tema a imprensa. No caso, o PT e alguns outros partidos de esquerda, com apoio da CUT, UNE e outros auto-intitulados “movimentos sociais,” lançarão um grito de guerra contra o que chamam “velha mídia”. Por quê?
Estão descontentes com a cobertura que a imprensa, cumprindo a sua obrigação, vem fazendo dos escândalos promovidos pelo governo Lula ou, mais genericamente, pelos petistas. Nunca antes na história destepaiz — e, creio, na história mundial —, um sindicato de jornalistas se mobilizou para defender a censura! O “protesto” conta com o apoio e o incentivo entusiasmado de “profissionais” que são direta ou indiretamente financiados pelo governo federal ou por estatais.
E a ironia? O debate de que vou participar, aberto ao público, ocorre no Clube Militar, no Rio, entre 15h e 17h, no Salão Nobre da sede principal, na avenida Rio Branco, 251, no Centro. O encontro é promovido pelo clube e conta com o apoio do Instituto Millenium e do Centro de Estudos Políticos, Estratégicos e de Relações Internacionais (Themas).
Alguns bobinhos acreditam que o mundo pode ser dividido assim: militares são autoritários, detestam a democracia e são contra a liberdade de expressão. Já com os civis se dá o contrário. Errado! Aqueles podem ser democratas primorosos; estes podem ser tiranos contumazes. Não há regra para isso. No Brasil, o preconceito se deve, em boa parte, a uma história contada no joelho, que cria vilões e heróis de manual.
Dada, no entanto, a “história oficial”, a ironia está justamente nisto: debate-se liberdade de expressão no Clube Militar e se pede censura num sindicato de jornalistas. E isso serve, sim, para instruir o nosso olhar sobre o passado. Ao longo de mais de duas décadas, deu-se por verdade uma mentira: todos aqueles que combateram o regime militar estariam querendo democracia. Falso! Muitos queriam uma ditadura, outra ditadura…
Em parte, o espírito daqueles falsos combatentes da liberdade remanesce nos dias de hoje. Os que agora maculam um sindicato de jornalistas pedindo censura são herdeiros dos que queriam, há mais de 40 anos, uma ditadura comunista no Brasil. Aos ideólogos de sempre, ressalte-se, juntaram-se agora alguns vagabundos que só querem assaltar os cofres públicos.
Já os militares, vejam só!, têm clareza de que não há solução aceitável fora da democracia e do estado de direito. Isso nos diz muito do presente. Isso nos diz muito do passado.
Democracia em perigo - editorial O Estado de S.Paulo
O desmanche da democracia
Editorial - O Estado de S.Paulo
23 de setembro de 2010
A escalada de ataques furiosos do presidente Lula contra a imprensa - três em cinco dias - é mais do que uma tentativa de desqualificar a sequência de revelações das maracutaias da família e respectivas corriolas da ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. É claro que o que move o inventor da sua candidata à sucessão, Dilma Rousseff, é o medo de que a sequência de denúncias - todas elas com foros de verdade, tanto que já provocaram quatro demissões na Pasta, entre elas a da própria Erenice - impeça, na 25.ª hora, a eleição de Dilma no primeiro turno. Isso contará como uma derrota para o seu mentor e poderá redefinir os termos da disputa entre a petista e o tucano José Serra.
Mas as investidas de Lula não são um raio em céu azul. Desde o escândalo do mensalão, em 2005, ele invariavelmente acusa a imprensa de difundir calúnias e infâmias contra ele e a patota toda vez que estampa evidências contundentes de corrupção e baixarias eleitorais no seu governo. A diferença é que, agora, o destampatório representa mais uma etapa da marcha para a desfiguração da instituição sob a sua guarda, com a consequente erosão das bases da ordem democrática. A apropriação deslavada dos recursos de poder do Executivo federal para fins eleitorais, a imersão total de Lula na campanha de sua afilhada e a demonização feroz dos críticos e adversários chegaram a níveis alarmantes.
A candidatura oposicionista relutou em arrostar o presidente em pessoa por seus desmandos, na crença de que isso representaria um suicídio eleitoral - como se, ao poupá-lo, o confronto com Dilma se tornaria menos íngreme. Isso, adensando a atmosfera de impunidade política ao seu redor, apenas animou Lula a fazer mais do mesmo, dando o exemplo para os seguidores. As invectivas contra a imprensa, por exemplo, foram a senha para o PT e os seus confederados, como a CUT, a UNE e o MST, promoverem hoje em São Paulo um "ato contra o golpismo midiático". É como classificam, cinicamente, a divulgação dos casos de negociatas, cobrança e recebimento de propinas no núcleo central do governo.
Sobre isso, nenhuma palavra - a não ser o termo "inventar", usado por Lula no seu mais recente bote contra a liberdade de imprensa que, com o habitual cinismo, ele diz considerar "sagrada". O lulismo promove a execração da mídia porque ela se recusa a tornar-se afônica e, nessa medida, talvez faça diferença nas urnas de 3 de outubro, dada a gravidade dos escândalos expostos. Sintoma da hegemonia do peleguismo nas relações entre o poder e as entidades de representação classista, o lugar escolhido para o esperado pogrom verbal da imprensa foi o Sindicato dos Jornalistas. O seu presidente, José Camargo, se faz de inocente ao dizer que apenas cedeu espaço "para um debate sobre a cobertura dos grandes veículos".
Mas a tal ponto avançou o rolo compressor do liberticídio que diversos setores da sociedade resolveram se unir para dizer "alto lá". Intelectuais, juristas, profissionais liberais, artistas, empresários e líderes comunitários - todos eles figuras de projeção - lançaram ontem em São Paulo um "manifesto em defesa da democracia", que poderá ser o embrião de um movimento da cidadania contra o desmanche da democracia brasileira comandado por um presidente da República que acha que é tudo - até a opinião pública - e que tudo pode.
Um movimento dessa natureza não será correia de transmissão de um partido nem estará atado ao ciclo eleitoral. Trata-se de reconstruir os limites do poder presidencial, escandalosamente transgredidos nos últimos anos, e os controles sobre as ações dos agentes públicos. "É intolerável", afirma o manifesto, "assistir ao uso de órgãos do Estado como extensão de um partido político, máquina de violação de sigilos e de agressão a direitos individuais." "É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita, que, na certeza da impunidade, já não se preocupa mais nem mesmo em fingir honestidade." O texto evoca valores políticos que, do alto de sua popularidade, Lula lança ao lixo, como se, dispensado de responder por seus atos, governasse num vácuo ético.
Editorial - O Estado de S.Paulo
23 de setembro de 2010
A escalada de ataques furiosos do presidente Lula contra a imprensa - três em cinco dias - é mais do que uma tentativa de desqualificar a sequência de revelações das maracutaias da família e respectivas corriolas da ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. É claro que o que move o inventor da sua candidata à sucessão, Dilma Rousseff, é o medo de que a sequência de denúncias - todas elas com foros de verdade, tanto que já provocaram quatro demissões na Pasta, entre elas a da própria Erenice - impeça, na 25.ª hora, a eleição de Dilma no primeiro turno. Isso contará como uma derrota para o seu mentor e poderá redefinir os termos da disputa entre a petista e o tucano José Serra.
Mas as investidas de Lula não são um raio em céu azul. Desde o escândalo do mensalão, em 2005, ele invariavelmente acusa a imprensa de difundir calúnias e infâmias contra ele e a patota toda vez que estampa evidências contundentes de corrupção e baixarias eleitorais no seu governo. A diferença é que, agora, o destampatório representa mais uma etapa da marcha para a desfiguração da instituição sob a sua guarda, com a consequente erosão das bases da ordem democrática. A apropriação deslavada dos recursos de poder do Executivo federal para fins eleitorais, a imersão total de Lula na campanha de sua afilhada e a demonização feroz dos críticos e adversários chegaram a níveis alarmantes.
A candidatura oposicionista relutou em arrostar o presidente em pessoa por seus desmandos, na crença de que isso representaria um suicídio eleitoral - como se, ao poupá-lo, o confronto com Dilma se tornaria menos íngreme. Isso, adensando a atmosfera de impunidade política ao seu redor, apenas animou Lula a fazer mais do mesmo, dando o exemplo para os seguidores. As invectivas contra a imprensa, por exemplo, foram a senha para o PT e os seus confederados, como a CUT, a UNE e o MST, promoverem hoje em São Paulo um "ato contra o golpismo midiático". É como classificam, cinicamente, a divulgação dos casos de negociatas, cobrança e recebimento de propinas no núcleo central do governo.
Sobre isso, nenhuma palavra - a não ser o termo "inventar", usado por Lula no seu mais recente bote contra a liberdade de imprensa que, com o habitual cinismo, ele diz considerar "sagrada". O lulismo promove a execração da mídia porque ela se recusa a tornar-se afônica e, nessa medida, talvez faça diferença nas urnas de 3 de outubro, dada a gravidade dos escândalos expostos. Sintoma da hegemonia do peleguismo nas relações entre o poder e as entidades de representação classista, o lugar escolhido para o esperado pogrom verbal da imprensa foi o Sindicato dos Jornalistas. O seu presidente, José Camargo, se faz de inocente ao dizer que apenas cedeu espaço "para um debate sobre a cobertura dos grandes veículos".
Mas a tal ponto avançou o rolo compressor do liberticídio que diversos setores da sociedade resolveram se unir para dizer "alto lá". Intelectuais, juristas, profissionais liberais, artistas, empresários e líderes comunitários - todos eles figuras de projeção - lançaram ontem em São Paulo um "manifesto em defesa da democracia", que poderá ser o embrião de um movimento da cidadania contra o desmanche da democracia brasileira comandado por um presidente da República que acha que é tudo - até a opinião pública - e que tudo pode.
Um movimento dessa natureza não será correia de transmissão de um partido nem estará atado ao ciclo eleitoral. Trata-se de reconstruir os limites do poder presidencial, escandalosamente transgredidos nos últimos anos, e os controles sobre as ações dos agentes públicos. "É intolerável", afirma o manifesto, "assistir ao uso de órgãos do Estado como extensão de um partido político, máquina de violação de sigilos e de agressão a direitos individuais." "É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita, que, na certeza da impunidade, já não se preocupa mais nem mesmo em fingir honestidade." O texto evoca valores políticos que, do alto de sua popularidade, Lula lança ao lixo, como se, dispensado de responder por seus atos, governasse num vácuo ético.
Manifesto pela Liberdade e pela Democracia
Normalmente não assino manifestos, de qualquer teor, de qualquer origem. Não é meu estilo.
Ocorre porém que recebi, numa dessas mensagens "informativas", uma amostra das ofensas feitas por partidários da candidatura oficial contra o oponente político, que eles consideram um inimigo a ser abatido. O asco das injúrias, as palavras de baixo calão, o estilo escatológico, a podridão dos argumentos me surpreenderam, pois não imaginava que pessoas normais, ainda que animadas pela batalha eleitoral, fossem capazes de descer tão baixo no fosso de seus valores inexistentes.
Tudo isso me leva a não apenas assinar o manifesto que já está disponível na internet, como também a sugerir que outros o assinem.
Não se trata de uma questão partidária, mas da defesa elementar da democracia e das liberdades.
Paulo Roberto de Almeida
Manifesto em Defesa da Democracia
Publicado em 22/09/2010 por manifestoemdefesadademocracia
Numa democracia, nenhum dos Poderes é soberano. Soberana é a Constituição, pois é ela quem dá corpo e alma à soberania do povo.
Acima dos políticos estão as instituições, pilares do regime democrático. Hoje, no Brasil, inconformados com a democracia representativa se organizam no governo para solapar o regime democrático.
É intolerável assistir ao uso de órgãos do Estado como extensão de um partido político, máquina de violação de sigilos e de agressão a direitos individuais.
É inaceitável que militantes partidários tenham convertido órgãos da administração direta, empresas estatais e fundos de pensão em centros de produção de dossiês contra adversários políticos.
É lamentável que o Presidente esconda no governo que vemos o governo que não vemos, no qual as relações de compadrio e da fisiologia, quando não escandalosamente familiares, arbitram os altos interesses do país, negando-se a qualquer controle.
É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita, que, na certeza da impunidade, já não se preocupa mais em valorizar a honestidade.
É constrangedor que o Presidente não entenda que o seu cargo deve ser exercido em sua plenitude nas vinte e quatro horas do dia. Não há “depois do expediente” para um Chefe de Estado. É constrangedor também que ele não tenha a compostura de separar o homem de Estado do homem de partido, pondo-se a aviltar os seus adversários políticos com linguagem inaceitável, incompatível com o decoro do cargo, numa manifestação escancarada de abuso de poder político e de uso da máquina oficial em favor de uma candidatura. Ele não vê no “outro” um adversário que deve ser vencido segundo regras, mas um inimigo que tem de ser eliminado.
É aviltante que o governo estimule e financie a ação de grupos que pedem abertamente restrições à liberdade de imprensa, propondo mecanismos autoritários de submissão de jornalistas e de empresas de comunicação às determinações de um partido político e de seus interesses.
É repugnante que essa mesma máquina oficial de publicidade tenha sido mobilizada para reescrever a História, procurando desmerecer o trabalho de brasileiros e brasileiras que construíram as bases da estabilidade econômica e política, que tantos benefícios trouxeram ao nosso povo.
É um insulto à República que o Poder Legislativo seja tratado como mera extensão do Executivo, explicitando o intento de encabrestar o Senado. É deplorável que o mesmo Presidente lamente publicamente o fato de ter de se submeter às decisões do Poder Judiciário.
Cumpre-nos, pois, combater essa visão regressiva do processo político, que supõe que o poder conquistado nas urnas ou a popularidade de um líder lhe conferem licença para ignorar a Constituição e as leis. Propomos uma firme mobilização em favor de sua preservação, repudiando a ação daqueles que hoje usam de subterfúgios para solapá-las. É preciso brecar essa marcha para o autoritarismo.
Brasileiros erguem sua voz em defesa da Constituição, das instituições e da legalidade.
Não precisamos de soberanos com pretensões paternas, mas de democratas convictos.
ASSINE A PETIÇÃO
Ocorre porém que recebi, numa dessas mensagens "informativas", uma amostra das ofensas feitas por partidários da candidatura oficial contra o oponente político, que eles consideram um inimigo a ser abatido. O asco das injúrias, as palavras de baixo calão, o estilo escatológico, a podridão dos argumentos me surpreenderam, pois não imaginava que pessoas normais, ainda que animadas pela batalha eleitoral, fossem capazes de descer tão baixo no fosso de seus valores inexistentes.
Tudo isso me leva a não apenas assinar o manifesto que já está disponível na internet, como também a sugerir que outros o assinem.
Não se trata de uma questão partidária, mas da defesa elementar da democracia e das liberdades.
Paulo Roberto de Almeida
Manifesto em Defesa da Democracia
Publicado em 22/09/2010 por manifestoemdefesadademocracia
Numa democracia, nenhum dos Poderes é soberano. Soberana é a Constituição, pois é ela quem dá corpo e alma à soberania do povo.
Acima dos políticos estão as instituições, pilares do regime democrático. Hoje, no Brasil, inconformados com a democracia representativa se organizam no governo para solapar o regime democrático.
É intolerável assistir ao uso de órgãos do Estado como extensão de um partido político, máquina de violação de sigilos e de agressão a direitos individuais.
É inaceitável que militantes partidários tenham convertido órgãos da administração direta, empresas estatais e fundos de pensão em centros de produção de dossiês contra adversários políticos.
É lamentável que o Presidente esconda no governo que vemos o governo que não vemos, no qual as relações de compadrio e da fisiologia, quando não escandalosamente familiares, arbitram os altos interesses do país, negando-se a qualquer controle.
É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita, que, na certeza da impunidade, já não se preocupa mais em valorizar a honestidade.
É constrangedor que o Presidente não entenda que o seu cargo deve ser exercido em sua plenitude nas vinte e quatro horas do dia. Não há “depois do expediente” para um Chefe de Estado. É constrangedor também que ele não tenha a compostura de separar o homem de Estado do homem de partido, pondo-se a aviltar os seus adversários políticos com linguagem inaceitável, incompatível com o decoro do cargo, numa manifestação escancarada de abuso de poder político e de uso da máquina oficial em favor de uma candidatura. Ele não vê no “outro” um adversário que deve ser vencido segundo regras, mas um inimigo que tem de ser eliminado.
É aviltante que o governo estimule e financie a ação de grupos que pedem abertamente restrições à liberdade de imprensa, propondo mecanismos autoritários de submissão de jornalistas e de empresas de comunicação às determinações de um partido político e de seus interesses.
É repugnante que essa mesma máquina oficial de publicidade tenha sido mobilizada para reescrever a História, procurando desmerecer o trabalho de brasileiros e brasileiras que construíram as bases da estabilidade econômica e política, que tantos benefícios trouxeram ao nosso povo.
É um insulto à República que o Poder Legislativo seja tratado como mera extensão do Executivo, explicitando o intento de encabrestar o Senado. É deplorável que o mesmo Presidente lamente publicamente o fato de ter de se submeter às decisões do Poder Judiciário.
Cumpre-nos, pois, combater essa visão regressiva do processo político, que supõe que o poder conquistado nas urnas ou a popularidade de um líder lhe conferem licença para ignorar a Constituição e as leis. Propomos uma firme mobilização em favor de sua preservação, repudiando a ação daqueles que hoje usam de subterfúgios para solapá-las. É preciso brecar essa marcha para o autoritarismo.
Brasileiros erguem sua voz em defesa da Constituição, das instituições e da legalidade.
Não precisamos de soberanos com pretensões paternas, mas de democratas convictos.
ASSINE A PETIÇÃO
Jornalistas pedem censura a jornais: assim mesmo
Dia de luto no Brasil: jornalistas, obviamente alinhados com partidos celerados e inimigos da liberdade, fazem manifestação contra o que eles chamam de "imprensa golpista", ou seja, aquela que ousa denunciar -- no que não faz mais do que o seu dever -- as falcatruas, roubalheiras e crimes políticos cometidos nas mais altas esferas de nossa república mafiosa.
Permito-me apenas transcrever editorial publicado na página 2, de Opinião, do Jornal da Tarde desta quinta-feira, 23 de setembro de 2010.
Ato pró-censura no auditório do Sindicato “dos Jornalistas”
Manifestação contra imprensa livre se dará em lugar que leva nome de mártir da liberdade na ditadura
É um preocupante sinal dos tempos as centrais sindicais, alguns sindicatos, partidos governistas, movimentos sociais e certos “blogueiros” terem marcado para hoje seu “Ato contra o golpismo midiático”, ou seja, um protesto contra a liberdade de imprensa, no auditório do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo. O convite para a manifestação acusa a imprensa de “castrar o voto popular”, “deslegitimizar as instituições” e destruir a democracia por noticiar pagamento de propina em envelopes entregues em gabinetes contíguos ao da ex-chefe da Casa Civil e atual candidata petista à Presidência, Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto, onde o presidente da República dá expediente. Mas, como de hábito agem Luiz Inácio da Silva e sua candidata em palanques ou em pronunciamentos públicos de quaisquer naturezas, não se referem explicitamente ao escândalo propriamente dito. Ou seja, o “golpismo midiático” contra que sindicalistas, militantes de movimentos sem existência jurídica e indefinidos “blogueiros” investem é a prerrogativa que no Estado Democrático de Direito todo cidadão tem de ser informado sobre o que acontece, principalmente quando isso implica dispêndio de dinheiro público arrecadado de impostos.
O presidente Lula já demitiu quatro servidores de alto coturno, entre os quais a ex-chefe da Casa Civil Erenice Guerra, que era braço direito de Dilma e por esta foi indicada para o posto. Mas os participantes do movimento, como o presidente, a candidata e as cúpulas do governo e do PT, preferem protestar contra a divulgação do escândalo. Este gerou as demissões e, nesta reta final da campanha pela sucessão presidencial, forçou o presidente e seus áulicos a abandonarem às pressas seu devotado apego ao conceito do Direito Romano da dúvida a favor do réu (in dubio pro reo) , ao qual sempre fizeram questão de recorrer para justificar a impunidade gozada por companheiros pilhados em flagrante delito.
Numa demonstração de que é cada vez menos “dos jornalistas”, o sindicato anfitrião do ato o faz ao arrepio da própria história. Assim como a corte de Lula manipula suas massas de manobra de sempre sem levarem em conta o fato de que o ex-dirigente sindical e seu partido só chegaram aonde chegaram por obra e graça do permanente desafio dos meios de comunicação à censura na ditadura militar. Por ironia do destino, o auditório onde a manifestação a favor da censura será realizado leva o nome do mais notório mártir da liberdade de imprensa no Brasil (o que tem sido omitido no noticiário), o jornalista Vladimir Herzog, morto sob tortura.
Nem tudo está perdido, contudo, pois o Largo de São Francisco continua cumprindo seu papel histórico de dar voz aos que discordam: nele foi lançado ontem o “Manifesto em Defesa da Democracia”, assinado por intelectuais, artistas e homens públicos que não têm medo da verdade. Ao contrário: eles sabem que sem ela a democracia torna-se farsa para, depois, fenecer.
Permito-me apenas transcrever editorial publicado na página 2, de Opinião, do Jornal da Tarde desta quinta-feira, 23 de setembro de 2010.
Ato pró-censura no auditório do Sindicato “dos Jornalistas”
Manifestação contra imprensa livre se dará em lugar que leva nome de mártir da liberdade na ditadura
É um preocupante sinal dos tempos as centrais sindicais, alguns sindicatos, partidos governistas, movimentos sociais e certos “blogueiros” terem marcado para hoje seu “Ato contra o golpismo midiático”, ou seja, um protesto contra a liberdade de imprensa, no auditório do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo. O convite para a manifestação acusa a imprensa de “castrar o voto popular”, “deslegitimizar as instituições” e destruir a democracia por noticiar pagamento de propina em envelopes entregues em gabinetes contíguos ao da ex-chefe da Casa Civil e atual candidata petista à Presidência, Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto, onde o presidente da República dá expediente. Mas, como de hábito agem Luiz Inácio da Silva e sua candidata em palanques ou em pronunciamentos públicos de quaisquer naturezas, não se referem explicitamente ao escândalo propriamente dito. Ou seja, o “golpismo midiático” contra que sindicalistas, militantes de movimentos sem existência jurídica e indefinidos “blogueiros” investem é a prerrogativa que no Estado Democrático de Direito todo cidadão tem de ser informado sobre o que acontece, principalmente quando isso implica dispêndio de dinheiro público arrecadado de impostos.
O presidente Lula já demitiu quatro servidores de alto coturno, entre os quais a ex-chefe da Casa Civil Erenice Guerra, que era braço direito de Dilma e por esta foi indicada para o posto. Mas os participantes do movimento, como o presidente, a candidata e as cúpulas do governo e do PT, preferem protestar contra a divulgação do escândalo. Este gerou as demissões e, nesta reta final da campanha pela sucessão presidencial, forçou o presidente e seus áulicos a abandonarem às pressas seu devotado apego ao conceito do Direito Romano da dúvida a favor do réu (in dubio pro reo) , ao qual sempre fizeram questão de recorrer para justificar a impunidade gozada por companheiros pilhados em flagrante delito.
Numa demonstração de que é cada vez menos “dos jornalistas”, o sindicato anfitrião do ato o faz ao arrepio da própria história. Assim como a corte de Lula manipula suas massas de manobra de sempre sem levarem em conta o fato de que o ex-dirigente sindical e seu partido só chegaram aonde chegaram por obra e graça do permanente desafio dos meios de comunicação à censura na ditadura militar. Por ironia do destino, o auditório onde a manifestação a favor da censura será realizado leva o nome do mais notório mártir da liberdade de imprensa no Brasil (o que tem sido omitido no noticiário), o jornalista Vladimir Herzog, morto sob tortura.
Nem tudo está perdido, contudo, pois o Largo de São Francisco continua cumprindo seu papel histórico de dar voz aos que discordam: nele foi lançado ontem o “Manifesto em Defesa da Democracia”, assinado por intelectuais, artistas e homens públicos que não têm medo da verdade. Ao contrário: eles sabem que sem ela a democracia torna-se farsa para, depois, fenecer.
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