sexta-feira, 15 de abril de 2011

Censura à Imprensa - Reinaldo Azevedo (junto-me a ele)

Sim, censura à imprensa, mas explico-me.
Não se trata de censurar matérias que seriam veiculadas pela imprensa.
E sim censurar a maneira como a imprensa vem tratando a informação, colocando a objetividade de lado e veiculando análises deformadas, opiniões que deturpam o sentido original de argumentos defendidos por determinadas personagens políticas, enfim, falhando, e terrivelmente, na sua função de esclarecer, estabelecer a verdade, ficar do lado da racionalidade.
Ao contrário, certa imprensa vem: desinformando, deformando, obscurecendo, emburrecendo os leitores, além de contribuir para o empobrecimento político e intelectual dos eleitores.
Tudo isso, claro, a propósito da famosa frase do ex-presidente FHC a respeito do PT, dos "movimentos sociais" (entre aspas, pois todos foram comprados, literalmente, pelo PT) e do que ele chamou de "povão" (também entre aspas, mas que se refere às camadas beneficiadas por programas assistencialistas do governo).
Permito-me recordar que, nesse mesmo número da revista Interesse Nacional que publicou o artigo do ex-presidente FHC, também tem um artigo meu sobre a mesma "oposição" (entre aspas pois ela não merece, ainda, esse qualificativo, e não tenho certeza se um dia virá a merecer).
Meu artigo é este aqui:
A Miséria da “Oposição” no Brasil Da Falta de um Projeto de Poder à Irrelevância Política?
Por: PAULO ROBERTO DE ALMEIDA
Em ensaio analítico-opinativo sobre a inexistência de uma verdadeira oposição no atual cenário político brasileiro e sobre as tarefas da oposição num moderno sistema político democrático, o autor faz um exame das condições pelas quais se poderá ter a eventual reconstrução de uma oposição digna desse nome no Brasil. “A oposição precisa estar pronta para oferecer outro futuro a todos os brasileiros que não acham que a esperteza política aliada ao oportunismo propagandístico representa o horizonte real de possibilidades para o País”.
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Paulo Roberto de Almeida

Cuidado! Imprensa trabalhando. Ou: Da burrice alastrante
Reinaldo Azevedo, 15/04/2011

Há três dias setores da imprensa vêm massacrando a verdade de forma vergonhosa, escandalosa, vexaminosa, noticiando não o fato, mas uma leitura dele, marcada pelo preconceito ideológico evidente, escancarado, debochado. Aquele que já foi um lugar do pensamento, do confronto de idéias, do novo, abriga hoje o servilismo ousado, a ignorância rombuda, a desinformação canhestra. Ai daquele que ousar apresentar alguma alternativa aos valores triunfantes! Tentarão calá-lo, esmagá-lo, ridicularizá-lo, sem nem mesmo ler o que escreveu.

Trata-se de uma canalhice jornalística, intelectual e moral afirmar que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pregou que o PSDB “desista do povão” ou se “afaste do povão”. Usar o que escreveu para acusá-lo de demofobia é coisa de vigaristas, de demagogos, de reacionários a serviço do poder. Será que critico a imprensa, também eu, como o PT costuma fazer? Já chego lá!

Nunca será demais voltar ao texto de FHC:
Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os “movimentos sociais” ou o “povão”, isto é, sobre as massas carentes e pouco informadas, falarão sozinhos. Isto porque o governo “aparelhou”, cooptou com benesses e recursos as principais centrais sindicais e os movimentos organizados da sociedade civil e dispõe de mecanismos de concessão de benesses às massas carentes mais eficazes do que a palavra dos oposicionistas, além da influência que exerce na mídia com as verbas publicitárias.

Qual é o centro da informação? Por que diz o ex-presidente que é inútil entrar na tal disputa? Porque os petistas aparelharam esses movimentos sociais e esses sindicatos, que representam não a sociedade no seu conjunto, mas setores dela. Isso, sim, deveria ser matéria de debate. O parágrafo prepara o que vem depois: há milhões de brasileiros que não participam da vida partidária; há uma gigantesca classe média, que emergiu com o Plano Real — sim!!! — que precisa ser despertada para a política. Os meus leitores habituais sabem que defendi essa tese num artigo de quatro páginas publicado na VEJA em dezembro do ano passado. O “povão”, que vai no texto de FHC entre aspas — como entre aspas está a expressão “movimentos sociais” — é um forma sutil de se referir ao objeto de análise segundo os olhos do adversário. Mas esperar sutileza ou alfabetização de quem???

Estamos lidando aqui com categorias que requerem um pouco mais do que o “juvenilismo” estúpido, desinformado, militante, que aprendeu — como se houvesse aprendizado aí — que a palavra “povão” é, em si, um valor. As múltiplas teses que há no longo artigo — e não concordo com todas, não, mas cada coisa a seu tempo — foram tragadas pela voragem da estupidez.

Se pretendem que um texto escrito pelo único ex-presidente que venceu duas eleições presidenciais no primeiro turno (ainda que tivesse sido apenas uma, seria o único do mesmo jeito), pelo presidente de honra de um partido de oposição, por um sociólogo mundialmente respeitado pela qualidade do seu trabalho acadêmico, se pretendem, em suma, que esse texto não mereça consideração, reflexão, debate político, muito bem! É uma decisão cretina, que evidencia um alinhamento óbvio com as forças do governismo, mas AINDA NÃO É MENTIRA. Atribuir-lhe o que não disse é depredação do pensamento. Já nos basta o fato de termos uma academia que, com honrosas exceções, funciona hoje como um braço de um partido político?

Críticas à imprensa
Sim, eu faço críticas ao que considero ruim da imprensa, mas as minhas são muito diferente daquelas que faz o PT, o partido do coração dessa turma que se finge de analfabeta funcional para que possa ser analfabeta moral com mais desenvoltura.

Eu não quero censurar ninguém. Eu não quero criar conselho de vagabundos para monitorar o que os outros dizem. Eu não quero criar uma polícia estatal do pensamento para dizer o que pode e o que não pode ser publicado. A minha crítica é aberta. Os petistas sonham noite e dia em censurar a imprensa. Eu torço para que a imprensa se livre da censura:
- da censura do politicamente correto;
- da censura praticada pelas pessoas boazinhas que “amam” o “povão”;
- da censura oblíqua aplicada por um partido político;
- da censura à inteligência;
- da censura à divergência;
- da censura à verdade.

E não acho que o estado, com este governo ou com outro,tenha competência para fazer esse trabalho. O que se fez e se vem fazendo com esse texto de FHC é um crime intelectual. Covardes, uma boa parcela dos oposicionistas resolveu, como direi?, “puxar o saco” do “povão”, contribuindo para que a distorção avançasse e ganhasse corpo. Se tudo der certo, ainda acaba se confundindo com a verdade. Assim como se tem hoje como inquestionável que foi Lula quem criou os programas sociais e quem estabilizou a economia.

Não por acaso, lá de Londres, onde foi pegar uma grana da Telefonica —  que, por vontade (pretérita) do Apedeuta jamais estaria no Brasil —, Lula resolveu exercer a sua “demofilia”, em consonância com o discurso exercitado por setores da imprensa aqui no Brasil. É um caso de formação de quadrilha intelectual, moral e ética. Como não poderia deixar de ser, mais um vez, o Ignorante Soberbo exerceu o seu preconceito contra aqueles que estudam. E ninguém vai reclamar porque se considera inaceitável que um intelectual aponte a estupidez de um estúpido, mas se está diante de uma verdadeira obra de arte quando o estúpido estupidifica o que diz o intelectual.

Alguns leitores me perguntam o que fazer diante de casos assim. Não tenho a receita, não! Eu sei o que eu faço: aponto o que me desagrada e busco, como qualquer leitor, fontes de informação que me respeitam — há certos horrores que tenho de experimentar porque, afinal, tenho a profissão que tenho.

Nunca antes na história destepaiz
Leio regularmente jornais desde os 14 anos, que foi quando comecei a me interessar por questões públicas. Depois de algum tempo — e porque, afinal, eu pertencia a um grupo que fazia política —, já sabia identificar o que era uma distorção ditada, então, por um regime de exceção. Vivi com grande entusiasmo a abertura política e o começo dos anos 1980, que foram bons, acreditem!, no jornalismo. Havia ousadia, inteligência, inconformismo — até de militantes políticos e ex-militantes que estavam nas redações.

Esse grau de boçalidade de hoje? Nunca vi! E não que eu seja do tipo saudosista. Ocorre que há aí um problema geracional, entendem? Estou com 49 anos. Tive muitos professores de esquerda. Gostava bastante de alguns, e há gente de quem gosto ainda hoje. Mas eu não fiz parte da geração que foi educada pelo petismo, que é um tipo muito particular de esquerdismo. Tive professores marxistas — alguns muito sérios dentro do pensamento que escolheram. Ocorre que o petismo está para o marxismo como essas seitas neopentecostais — as sérias, por favor, não reclamem; falo das vigaristas; daquelas mais novas do que o uísque eu bebo — estão para o cristianismo. Se você pedir a um petista que explique o que é luta de classes, ele não conseguirá ir além de um arranca-rabo. Se você lhe pedir que explique o que é “materialismo histórico” — não que seja grande coisa —, ele vai dizer que é o mesmo que não acreditar em Deus. É o triunfo da boçalidade.

Essa gente que destrói gerações nas faculdades de humanas e de comunicação comete um crime intelectual até contra a própria esquerda: o “fetichização” do povo ou do “povão”. Esses vagabundos nunca leram Marx — e alguém poderá dizer que não perderam grande coisa. Vá lá. O problema é que leram, no máximo, os discursos de Lula. Então não há esperanças? Sempre há aqueles que conseguem escapar desse cerco.

O mal que essa gente fez à inteligência começa a render frutos. Nem tanto lhes lastimo o esquerdismo — que não há nada de novo nisso! O problema é sua alastrante burrice a serviço de uma causa.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Miragens chinesas (2) -- de volta a velha hipocrisia...

Prevaleceu a visão chinesa
Editorial - O Estado de S.Paulo
14 de abril de 2011

Saiu ao gosto chinês o comunicado conjunto dos presidentes Dilma Rousseff e Hu Jintao. Os termos foram ditados principalmente pelos interesses da China, assim como são ditados os termos do comércio e da cooperação econômica entre os dois países. Pequim aproveitou a visita para algumas gentilezas. Oficializou a abertura de mercado à carne de porco brasileiro, aceitou conversar sobre a diversificação das trocas e confirmou uma compra de aviões da Embraer. Tudo isso é positivo, mas presidentes não viajam para vender costeleta e lombinho e raramente se envolvem na exportação de aviões - a menos, como fizeram o francês Nicolas Sarkozy e o americano Barack Obama, que se trate de concorrência para reequipar as Forças Armadas de um país.

Como de costume, a viagem serviu para o governo brasileiro pedir apoio à sua ambição de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. As autoridades chinesas concordaram apenas com uma declaração vaga. China e Brasil "apoiam uma reforma abrangente da ONU, incluindo o aumento da representação dos países em desenvolvimento no Conselho de Segurança como uma prioridade". Além disso, "a China (...) compreende e apoia a aspiração brasileira de vir a desempenhar papel mais proeminente nas Nações Unidas". Essa frase é tão evasiva quanto a declaração de "apreço" à pretensão brasileira, incluída na declaração final da visita do presidente Obama a Brasília.

Mais que chocha, a referência aos direitos humanos teve um toque humorístico - e até de humor negro: "As duas partes fortalecerão consultas bilaterais em matéria de direitos humanos e promoverão o intercâmbio de experiências e boas práticas". Quais serão os temas dessas consultas e que experiências e "boas práticas" o governo brasileiro poderá aprender?

Os dois lados assumiram, como de costume, compromissos de cooperação técnica e científica. Tudo isso produzirá poucos efeitos a curto e a médio prazos. Alguns programas, como geralmente ocorre, talvez sejam esquecidos por um longo período, para serem lembrados, dentro de algum tempo, quando for marcada a primeira reunião de uma comissão bilateral.

Os entendimentos com maior significado prático correspondem aos interesses chineses de acesso a recursos naturais. "Os dois lados acolhem a crescente cooperação entre os dois países nas áreas de mineração e infraestrutura relacionada e no processamento de produtos de minérios", informa o comunicado. Os dois governos "manifestaram ainda o interesse em abrir novas áreas de cooperação em energia e mineração".

Pode haver pontos importantes de interesse comum nessas áreas. Mas a ênfase nesse tipo de cooperação atende sobretudo à estratégia chinesa de crescimento econômico e reforça o estilo de intercâmbio bilateral até agora observado. "A parte chinesa", segundo o comunicado, "manifestou disposição de incentivar suas empresas a ampliar a importação de produtos de maior valor agregado."

Essa "disposição" tem pouco ou nenhum significado prático - e o governo chinês talvez nem pudesse ir além desse ponto.

Se o governo brasileiro deseja de fato mais exportações de manufaturados para a China, o primeiro passo deve ser um exame das condições do comércio e dos obstáculos encontrados pelas empresas. Até agora, a iniciativa mais notável de Brasília, nesse campo, foi a pressão para a Vale exportar menos minérios e investir mais em siderurgia - uma ideia tão estapafúrdia em termos econômicos quanto perigosa politicamente.

Pequim cobrou, como se esperava, o cumprimento de uma promessa tola formulada há anos pelo governo brasileiro. "A parte brasileira reafirmou o compromisso de tratar de forma expedita a questão do reconhecimento da China como economia de mercado nos termos estabelecidos no Plano de Ação Conjunta 2010-2014." A palavra "expedita" vale um ponto para os negociadores chineses.

Empresas da China provavelmente aumentarão seus investimentos no Brasil. Fala-se em grandes projetos para a área eletrônica. Mas nada disso depende de entendimentos de cúpula. A Zona Franca de Manaus e o Polo de Jaguariúna são provas disso. O governo brasileiro deveria designar algum técnico talentoso para estudar esse e outros fatos da vida.

Conselhos aos aspirantes a politica (no Brasil)

O texto abaixo, postado num outro site que mantenho apenas para "depositar" textos mais longos, foi confundido recentemente por um leitor anônimo -- provavelmente um jovem iniciante -- que o interpretou literalmente, deixando de constatar sua imensa ironia e seu caráter antinômico ao que procura combater, que é uma realidade que infelizmente infectou o Brasil a partir de certo personagem desonesto, helàs muito popular.
Resolvi transcrever novamente aqui, pois suas lições permanecem plenamente válidas, sobretudo quando se vêem tantos sabujos incensando o dito cujo, cujo nome não preciso lembrar aqui.
Paulo Roberto de Almeida

CONSELHOS AOS JOVENS POLÍTICOS (e aos jovens em geral)
por Augusto de Franco
Site Diego Casagrande, Sexta-feira, Setembro 14, 2007

Você que é um jovem político, que escolheu trilhar o caminho da política na falta de uma ocupação honesta (como Jorge Luis Borges escreveu certa vez), guarde este artigo que poderá ser de grande valia para o seu sucesso nessa carreira.

PRIMEIRO CONSELHO. Se você se chama Antonio, seja antonista. Ou seja, filie-se a um partido apenas como quem cumpre exigência legal para exercer uma profissão. Mas tenha em conta que o único partido que conta é aquele que é só seu, que atende inteiramente aos seus próprios interesses.

SEGUNDO CONSELHO. Tenha como objetivo chegar ao máximo posto de poder. Se você chegar à presidência da República, entretanto, não se detenha. Seja candidato à reeleição. Se você já for um presidente reeleito, não se detenha. Você ainda pode ter mais poder. Se for possível, dê um golpe e se transforme em ditador. Ou mude a lei que proíbe a sua permanência no cargo. Tente sempre subir, ter mais poder. Se não houver para onde subir, tente ficar o maior tempo possível no cargo máximo que alcançou. Abandonar o poder por vontade própria ou em respeito a algum princípio ou regra é sempre um suicídio, mesmo que essa regra seja uma lei. Não se esqueça: toda lei pode ser mudada por quem tem o poder de mudá-la. Portanto, o essencial não é a lei e sim o poder.

TERCEIRO CONSELHO. Lembre-se: a única coisa que conta realmente é o seu partido exclusivo, não aquele ao qual você se filiou em virtude de alguma exigência legal e sim aquele que atende integralmente aos seus interesses e no qual só você manda. Mas se você puder ter um partido legal e reconhecido que se sujeite assim a você e que fique totalmente submetido às suas vontades, melhor ainda. Você terá conquistado a glória suprema de fazer com que um partido sirva apenas aos seus interesses. O partido legal cumprirá então o importante papel de recrutar gente que trabalhe de graça para você, para o seu partido pessoal. Essa última hipótese é de materialização improvável, mas você não deve ficar desanimado com isso, pois tem gente que consegue. Portanto, você não deve abrir mão de tentar concretizá-la. Pois você sempre precisará de outras pessoas que lhe sirvam para poder atingir os seus objetivos máximos.

QUARTO CONSELHO. Se você não conseguir transformar um partido inteiro em uma assessoria pessoal, que trabalhe apenas para promovê-lo (isso é difícil mesmo), organize uma tendência dentro desse partido que possa cumprir o papel de gangue política a seu serviço. Isso é obrigatório, se você quiser ter pleno sucesso.

QUINTO CONSELHO. Não dê a mínima para coisas como ética, princípios políticos, democracia, respeito às leis ou ao Estado de direito. Tudo isso é conversa-mole, usada por alguns apenas para limpar o seu caminho em direção ao poder. A regra aqui é bem clara: faça tudo o que puder. Se for necessário trair velhos amigos, traia sem a menor culpa. Se for necessário fazer exatamente o oposto do que você sempre pregou, faça-o sem qualquer vergonha. Se for necessário roubar, roube. Se for necessário matar, mate. Entenda que em política não existe nenhuma autoridade à qual você deva se curvar, pois tudo é possível desde que você tenha o poder para tornar possível mesmo o que parece ser impossível.

SEXTO CONSELHO. Roubar merece um capítulo a parte. Você não pode chegar onde quer - o poder máximo, pelo maior tempo possível - sem roubar. Existem dois tipos de roubo e - muita atenção agora! - você deve se dedicar aos dois. Há o roubo cometido em seu próprio benefício, para melhorar a sua vida (e a vida da sua família) no curto prazo. E há o roubo cometido para fortalecer a sua gangue política em benefício da sua carreira no médio e no longo prazos. Os dois são muito importantes e estão quase sempre relacionados. Muitos políticos cometem um erro grave quanto a esse ponto: roubam para si mesmos mas esquecem de roubar para a sua gangue. Se você aspira o poder máximo, nunca deve cometer esse erro. Lembre-se: articular e manter uma gangue política é uma providência absolutamente necessária em qualquer circunstância.

SÉTIMO CONSELHO. O correto exercício do roubo exige alguns cuidados. O problema não é roubar. O problema não é, nem mesmo, não fazer bem feito o malfeito e se deixar apanhar. O problema é não ter a quem chantagear caso você seja apanhado cometendo um delito. Portanto, ao exercer as duas formas de roubo - a pessoal e a grupal - tome também as providências necessárias para não ser punido. A primeira providência é acionar a sua gangue (está vendo porque você precisa ter uma?) para que monitore os roubos dos outros atores políticos. Se você mantiver relatórios atualizados dos roubos alheios certamente conseguirá escapar quando quiserem pegá-lo. A segunda providência é se associar sempre aos roubos alheios, sobretudo aos roubos grupais dos que têm mais poder do que você. Tendo participado das suas iniciativas criminosas, você poderá assegurar que eles não vão traí-lo quando for conveniente (para eles). E você poderá exigir o seu apoio caso venha a ficar em uma situação difícil.

OITAVO CONSELHO. Dedique-se diuturnamente, lançando mão de todos os meios e por todas as formas, a aumentar a sua popularidade. Ou seja, invista 24 horas por dia em ações de marketing pessoal. Use sempre os outros, sobretudo os membros da sua gangue política, para atingir seus objetivos, mas não confie em ninguém quando o assunto for esse. Assim, tome especial cuidado com seus auxiliares mais graduados ou mais salientes. Mantenha-os sempre na sua sombra e não permita que eles cresçam e apareçam mais do que o necessário para promovê-lo (e não para se autopromoverem). De tempos em tempos você deve "fritar" a camada superior dos seus colaboradores e ceifar algumas cabeças que começarem a emergir. O segredo aqui é manter seu pessoal numa espécie de pântano. Quanto mais invisível for esse pântano, melhor para você. Você é a única flor de lótus que deve ser notada e admirada. Se você tiver popularidade, terá legitimidade para fazer qualquer coisa: poderá mudar de posição, trair, roubar e até mesmo matar e colocar toda a culpa em seus auxiliares (o pântano também serve para isso). Às vezes será necessário, para manter o pântano, proteger os seus auxiliares com o manto da impunidade (do contrário as pessoas não se arriscarão a assumir a culpa para livrá-lo de alguma sanção). Mas só você deve ter a condição de inimputabilidade para fazer isso, de sorte que as outras pessoas dependam inteiramente da sua boa vontade e, assim, fiquem totalmente nas suas mãos.

NONO CONSELHO. Adquira a capacidade de mentir sem corar. Minta, minta descaradamente sem qualquer pudor. Se, por exemplo, alguma investigação apontou a sua culpa em um determinado crime, declare sempre que todas as investigações provaram que você não tinha qualquer culpa. Não se preocupe com a coerência pois em política isso não vale para nada. Nem tenha problemas de consciência: quando o assunto é poder, o superego só atrapalha. Mas, sobretudo, adquira a capacidade de dizer exatamente o oposto do que você está pretendendo. Por exemplo, se você está trabalhando para desmoralizar uma instituição, declare publicamente que tal instituição é soberana e deve ser respeitada por todos. Se você está querendo ficar no poder contra as leis do seu país, diga que jamais aceitará ficar no poder, mesmo que o povo inteiro lhe peça isso em nome felicidade geral da nação. Mais ainda: aprenda a se antecipar às conseqüências das suas ações declarando sua intenção oculta para que ela pareça ser de outrem e não sua. Assim, você inoculará na opinião pública uma vacina contra a identificação do verdadeiro culpado. Então, por exemplo, se você está querendo desmoralizar um adversário, diga antes que fica muito chateado com os que cometem a baixeza de tentar atingir a honra de seus adversários. Essa é uma sabedoria sutil e suprema: aprenda a mentir com a verdade.

Você, caro jovem normal, que não tem vocação e pretensões políticas e que está assistindo diariamente, sem entender direito, o que se passa nas instituições políticas brasileiras, aqui vai o meu conselho. Tente adaptar, para a sua vida social e profissional, os nove conselhos que acabei de dar aos jovens atores políticos. Se, para eles - a quem caberá a tarefa de nos governar e legislar - não valem quaisquer princípios e regras de bom comportamento, por que deveriam valer para você?

Postado por Paulo R. de Almeida no blog Textos PRA, Sexta-feira, Setembro 14, 2007

Minitratado dos reencontros - Paulo Roberto de Almeida

Minitratado dos reencontros
Paulo Roberto de Almeida

(ver toda a série neste link)

Depois de ter tratado, num dos minitratados (sem jogo de palavras) desta série, dos desencontros, cabe falar também dos reencontros, que podem eventualmente ocorrer, embora eles possam demorar algum tempo para se materializar, por vezes até alguns anos. O reencontro pode ser considerado a inflexão da curva de dispersão, ou da linha de divergência, que tinha sido formada, ou que existia, por ocasião do desencontro. Com efeito, o reencontro só se justifica, na maior parte dos casos, após um desencontro ter acontecido, salvo se a separação anterior foi uma obra do acaso, uma contingência inesperada, um acidente de percurso ou seja lá qual fator acidental. Em qualquer hipótese, um reencontro depende da vontade de pelo menos uma das partes, imponderável como pode ser a realização de uma expectativa, sempre dependente das trapaças da sorte o da astúcia da razão. Se as duas partes o desejam, então a conjunção se faz mais facilmente ainda, embora essa hipótese seja mais rara.
A razão, a motivação e o esforço para realizar o reencontro estão todos situados numa mesma dimensão fundamental: a carência, real ou percebida, em relação a uma situação de melhor conforto espiritual com uma dada relação. Tem de ser isso, ou então não haveriam motivos para tantas angústias, tantas reflexões ao léu, tantas suposições otimistas, tantos cenários idealizados. Carências podem se manifestar de duas maneiras: uma negativa, que seria uma espécie de estado depressivo, outra mais positiva, que seria a esperança levada ao estado de euforia, caso o reencontro se materialize por acaso ou por intenção. Seria simples assim? Provavelmente não, pois raramente existem soluções extremas para a maior parte dos casos e sim o continuum de situações indefinidas, que angustiam o “paciente”.
Existe uma estratégia para o reencontro, ou estratégias? Eventualmente, a parte interessada no reencontro pode elaborar uma (e segui-la, o que parece mais importante), embora tudo possa ser muito difuso e até isento de planejamento quanto aos lances táticos que levariam, supostamente, ao almejado reencontro, que é, por certo, a convergência de vontades. Na paz como na guerra, na vida civil como na vida militar (se é que se pode falar em vida, neste caso), na autonomia como na dependência, sempre se pode desenhar estratégias para enfrentar os acasos da vida (embora isso não queira dizer que todas elas funcionem adequadamente). Jogos de guerra, ou jogos de amor, nem tudo termina com final feliz para todos, o tempo todo.
Já que este é um minitratado – ou seja, um documento formal de procedimentos, métodos e disposições práticas, quase um manual de serviço – caberia descrever os detalhes da estratégia e discutir seus elementos táticos. Quem sabe a partir daqui não resulte um desses How to do?, desses que vendem nas estantes de autoajuda – ou até um Idiot’s Guide to Making Up Again – que podem ser úteis a almas gêmeas temporariamente separadas ou a corações desesperados? Não tenho certeza de oferecer o manual perfeito para tranquilizar corações desesperados, mas vou tentar acalmar os confusos (sem garantia de sucesso e sem dinheiro devolvido).
A primeira tarefa nesse tipo de empreendimento é definir as chances de que o objetivo se concretize; existem várias possibilidades classificatórias: o reencontro pode ser utópico, realizável, impossível, razoável no médio prazo, imprevisível, mesmo no longo prazo, etc. Pode até conceber um quadro analítico – quem sabe uma tabela Excel? – com cronogramas definidos, cujas células poderiam ser ocupadas por “missões” graduais para a consecução do reencontro, até a etapa final de atingimento do objetivo fixado. Uma estratégia consequente prevê várias táticas alternativas, todas conjugadas ou atuando de forma sucessiva, conforme os efeitos e resultados da aplicação de cada um.
Existem métodos diretos ou indiretos de aproximação, o que for mais conveniente. Hoje em dia, o Google resolve quase todos os pedidos de busca, mesmo os mais inusitados (suponho que até a polícia, em suas missões para os mais “wanted men”, mas podem ser “women” também, use o Google para buscas rápidas). As redes sociais também “atingem” – literalmente – milhões de pessoas, embora nesses casos de busca afetiva um dos lados sempre peca por timidez.
Definida a estratégia e desenvolvidas algumas técnicas, cabe esperar uma implantação decisiva da missão “reencontro”, de preferência com ações bem pensadas para não frustrar o objetivo final. Geralmente a abordagem é gradual, indireta e silenciosa, embora existam os apressadinhos (em parte incautos) que passam a uma tática de assédio pouco recomendável para a maior parte dos casos. Um “levantamento de terreno” preliminar – como no caso do planejamento militar – parece indispensável ao desenvolvimento de uma estratégia bem montada, o que implica em conhecimentos mínimos de cartografia afetiva e de mapeamento sentimental.
A logística também apresenta papel importante, pois é preciso planejar as operações sobre o terreno, com margem suficiente de manobras e recursos disponíveis para manter presença no terreno. Aqui não precisa de soldados, no sentido estrito do termo, mas certamente precisará de talão de cheques, no sentido estrito e no lato, sobretudo neste último. Quanto mais lato melhor, pois essas táticas de sedução costumam ser altamente custosas para o bolso do contribuinte...
Enfim, quaisquer que sejam as táticas e estratégias a serem mobilizadas no esforço de reencontro, é preciso ter algo para “vender”; do contrário fica difícil concretizar a meta da “conquista” (como nos objetivos militares). O objeto, parece claro, é o próprio iniciador do esforço de reencontro, o personagem que se coloca na posição de articulador de novas situações, o proponente de uma nova etapa de vida. Nesse ponto entramos naquilo que os americanos chamam de core of the matter, ou na substância da matéria. Não tenho sugestões a fazer neste particular. Apenas desejar que o pretendente seja o personagem dos sonhos da pessoa visada. Também acontece...

Brasília, 14 de abril de 2011

O "povão" volta a cena: FHC se explica

Eu já tinha postado aqui minha opinião de que esse afastamento do "povão" não era a boa tática, embora conceda que o ex-presidente foi mal interpretado. Ele queria dizer na verdade movimentos sociais, que são todos manipulados -- e alimentados e financiados -- pelo partido no Brasil, quase numa conjução mafiosa.
Parece que o debate vai amainar, mas o desgaste, e o desastre, já foi consumado.
O PSDB vai virar o partido da classe média, quase uma nova UDN. Não tem problema: a UDN também chegou ao poder pela eleições, embora com candidato bizarro...
Vamos tentar outra vez.
Paulo Roberto de Almeida

"Não sou idiota para propor que o PSDB ignore o povão", diz FHC
Cristiane Agostine | De São Paulo
Valor Econômico, 14/04/2011, pág. A6

FHC: "Ficar no discurso de quem rachou ou de quem é candidato não interessa a ninguém; é preciso sensibilizar a população"

"Qual é o bobo que vai deixar de lado o povão nas eleições? Eu não sou um idiota". Indignado, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de 79 anos, diz que foi mal interpretado no artigo de sua autoria, divulgado pelo PSDB e amplamente criticado por correligionários. No texto, o presidente de honra do partido diz que se os tucanos persistirem em disputar com o PT a influência sobre os movimentos sociais ou o "povão", o partido falará sozinho.

Em entrevista ao Valor, concedida na tarde de ontem por telefone, FHC afirma que na entressafra eleitoral o PSDB precisa construir um discurso e direcioná-lo para aqueles que ascenderam socialmente durante os anos do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para Fernando Henrique, o partido precisa manter uma expectativa de poder para continuar vivo. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: O senhor defendia a aproximação do PSDB com as bases sociais, mas agora diz para o partido desistir do 'povão' e buscar a nova classe média. O que mudou?

Fernando Henrique Cardoso: Sempre tive a mesma posição. Agora tem de ver o que é novo, o que está emergindo. Acho que o PSDB tem de ser o porta-voz do novo. Tem que ter uma mensagem com estratégia de futuro do Brasil. O novo é que as pessoas estão mais voltadas a sua vida cotidiana. Então tem de ver como é que liga a preocupação da vida cotidiana com essa estratégia de futuro e com valores como a democracia, a luta contra a corrupção e contra o clientelismo. Tem que mostrar que há problemas de infraestrutura nas obras da Copa e dos aeroportos. Isso a população sente, percebe o que está faltando. Tem que mostrar que a questão do imposto não interessa só ao rico, mas a todos. Além disso a mensagem tem que vir de meios de comunicação novos, sem dispensar os tradicionais. É preciso usar internet, redes sociais. E não basta a oposição ficar no parlamento. Tem que ir para as ruas, se aproximar do povo. Agora boa parte do que o PT chama de povão, está mais cooptada pelo clientelismo. Mas isso não quer dizer que vou desprezar uma camada. Sou louco por acaso? Não ganhei duas vezes a eleição do Lula, no primeiro turno? Vou desprezar alguma parte? Não! Estou dizendo qual é a estratégia, como é que faz para sua mensagem se consolidar. Não falei de eleição, nem de voto. Na entressafra eleitoral devemos utilizar este momento para refazer nossa linguagem, para ver quais são as camadas mais sensíveis. Não estou tratando de eleição.

Valor: O senhor quer dizer que na eleição tem de se aproximar de todos, mas na entressafra...

FHC: Não. Não só na eleição. Quais são as camadas que estão desconectadas e como o PSDB pode se conectar com elas? Não é questão de se aproximar. Claro que um partido tem que se aproximar com todo mundo do país. O que eu fiz no governo? As bolsas quem criou, não fomos nós? Na reforma agrária, quem deu o impulso não fomos nós? Não é essa a ideia, de ter um setor que se ocupa do povo e outro da elite. O que não pode é pensar que não houve uma mobilidade grande e que setores enormes das camadas populares, trabalhadores, é pensar que não estejam conectados pela internet também e que não estejam suscetíveis a uma mensagem que não a tradicional. E também que não sejam tão suscetíveis de ser cooptação por esse assistencialismo. Não se trata de se aproximar do povo só na eleição. Tem que ter uma concepção mais complexa do que é a sociedade. Fiquei muito assustado com a rapidez com que as pessoas interpretam e criticam [o artigo] antes de ler. Foi uma interpretação equivocada do que eu penso.

Valor: Desistir dos movimentos sociais, do 'povão', não é uma orientação divergente à estratégia de o PSDB se aproximar do Nordeste?

FHC: Imagina se eu seria louco de achar isso. Não, não. Agora tem que ter marca. O Nordeste também está avançando e queremos que avance mais. Não temos que ser o partido da manutenção e da transição do atraso, através dos meios sociais que sejam. Temos que dar os meios sociais, a ajuda necessária, mas não pode se contentar com isso. Tem que se medir... "Qual é o progresso? Como é que eu avanço?"

"Estou dizendo qual é a estratégia, como se faz para sua mensagem se consolidar. Não falei de eleição, nem de voto"

Valor: O senhor falou da nova classe média, como a classifica?

FHC: Sociologicamente não é classe média. Classe social não é classe de renda. Teve um aumento da renda de vários setores, mas isso não classifica automaticamente como uma mudança de classe, no sentido sociológico. Classe implica em um estilo de vida, de educação, redes sociais, conjunto de privilégios. Estamos usando, sociologicamente, de forma abusiva a ideia de uma nova classe média. Não é uma nova classe média. São novas categorias sociais. O mundo de hoje não é tão estabilizado como o do passado, que tinha o trabalhador, a classe média e os empresários, a burguesia. É um mundo muito mais fragmentado. Houve mobilidade, sim, melhorou a renda. Com o tempo, aí sim, vai estabelecer novas teias de relações sociais, participar de certos grupos de escola... Com o tempo vai ser, eventualmente, o que se chama de classe média.

Valor: As demandas da nova classe média se assemelham às das classe D?

FHC: As demandas são diferentes. [A nova classe média] Vai querer mais informação, mais atendimento e mais qualidade dos serviços sociais. Nós conseguimos dar acesso geral à educação, mas todo mundo se queixa da educação no Brasil. Vai ser um momento difícil, da passagem da quantidade para a qualidade. No fundo é o momento de o Brasil passar de país em desenvolvimento para desenvolvido. O PSDB e as oposições têm que entender isso e ir para a vanguarda, como nós fizemos no passado, quando o PT era contra a estabilização da economia. O PT era contra o capital estrangeiro. O PT era contra que as leis do mercado tivessem vigência, era contra a globalização. Hoje acabou tudo isso. Ninguém mais é contra. Mas o PSDB foi a favor. De novo agora temos que dizer: isso está feito e o que mais? Vamos olhar o horizonte, avançar mais. Alguém vai fazer isso. Se não fizermos outros farão.

Valor: E por que essa nova classe estaria mais suscetível ao discurso do PSDB do que a classe D?

FHC: O PSDB tem de ser capaz de ter um discurso que mexa com ela. É o que eu estou dizendo. Não tem um discurso definido. Vamos procurar um discurso, vamos ouvi-la.

Valor: O que poderia motivar a aproximação? No artigo o senhor cita a questão moral...

FHC: Pode ser a questão moral. Mas pode ser a questão do atendimento, dos serviços com mais qualidade, mais segurança. Não tenho uma receita. É uma estratégia. É mudar o foco, para ver se chega lá. Se as pessoas discutissem isso seria mais útil do que discutir se vai deixar de lado o povão. Qual é o bobo que vai deixar de lado o povão nas eleições? Eu não sou um idiota. Todo o governo tem que olhar para a população, para os mais pobres também. Precisamos disputar o controle político dessa população. Não temos instrumentos para o assistencialismo, para transformar as bolsas em o instrumento de voto, cooptar os sindicatos...

Valor: Em relação aos movimentos sociais, Alckmin e Aécio tentam se aproximar das centrais sindicais. O senhor discorda da estratégia?

FHC: Tem mesmo que se aproximar. Acho que deve 'descooptar'. Mas os sindicatos do Brasil e no mundo todo não pegam mais a maioria dos trabalhadores. O índice de filiação é pequeno. Não sei se as demandas dos sindicatos são as dos trabalhadores ou são da burocracia sindical. Essa subiu na vida também e tem poder político. Mas será que arrastou consigo a massa operária? Duvido. O que não quer dizer que não devemos trabalhar com os sindicatos.

Valor: E qual pode ser o ponto de intersecção entre os discursos do PSDB e o sindicalismo?

Fernando Henrique: O PSDB deve lutar contra o corporativismo. E a garantia de sobrevivência sem a adesão dos trabalhadores não tem sentido. O imposto [sindical] é sobre todos os trabalhadores sem que eles digam se querem ou não. Não faz sentido.

Valor: E os 100 dias da presidente Dilma, como o senhor analisa?

FHC: Esse negócio de 100 dias é outra dessas ficções. É muito cedo para avaliar o governo. Ela mudou um pouco o estilo: menos falante, muito mais cortês comigo. Não sei qual vai ser a política. Na Vale já houve uma interferência bastante forte. Na política externa houve modificações. Falar de direitos humanos é positivo, se distanciar daquela visão de que basta ser ditadura dita de esquerda para nós termos uma ligação é bom. Mas é como uma partida de xadrez, quem dá os lances iniciais é quem tem as pedras brancas. Na política, quando alguém ganha a eleição leva as pedras brancas. Não adianta nos precipitarmos antes de saber qual é o jogo deles. Não é o momento de eu sair criticando. Todos torcem para que o Brasil vá pra frente.

Valor: Com o esvaziamento do DEM, como será o papel da oposição em relação ao governo?

FHC: Não sei como a oposição vai se desdobrar, porque depende do que o governo faça. Agora não dá pra tapar o sol com a peneira. Essa perda de substância do DEM não é boa, a menos que o novo partido se declare de oposição. Temos que ter uma mensagem que vá além do jogo dos partidos e do Congresso, que fale com o país. Para isso vai precisar de líderes que encarnem a nova mensagem. Tendo essa liderança, você se mantém na oposição e mantém o partido vivo. Mantém uma expectativa de poder. Enquanto o PSDB representar no imaginário das pessoas uma alternativa pro futuro, ele se mantém apesar das dificuldades do dia-a-dia da oposição.

Valor: O PSDB então poderia já lançar uma pré-candidatura à Presidência?

FHC: É cedo para isso, mas tem que se preocupar com o pé no chão. O partido tem que se estruturar nas bases, oferecer bons candidatos a prefeito, olhar no mapa eleitoral e dizer 'onde estamos fracos?' Tem que recrutar bons candidatos, que tenham compromisso programático, compostura política. Candidatos que tenham capacidade de expressar o que a população está sentindo nos municípios. É um longo trabalho a ser feito, de formiguinha, não de quem vai ser candidato a presidente. O que o PSDB precisa agora é de coesão. O DEM está com um problema muito grave. Não temos fratura, temos que solidificar a coesão. Quem quiser trabalhar pela oposição no futuro tem que trabalhar já pela coesão no PSDB. E não ficar pensando em nome de uma eventual candidatura.

Valor: Geraldo Alckmin lançou informalmente Serra à Prefeitura de São Paulo. O que o senhor acha?

FHC: Não sei se é a melhor opção pra ele. Se não combinar com o principal interessado, não tem jogo. Não sei qual é a opinião do Serra. Duvido que ele esteja, nesse momento, pensando nisso. Claro que, se for candidato, todo mundo vai ficar ao lado dele. Mas nesse momento nós todos devíamos estar pensando qual é o nosso papel, como é que você fala com a sociedade. Dizer que 'é candidato, não é', 'rachou, não rachou', isso cansou o povo. Isso não diz nada a ninguém. É preciso falar coisas que sejam sensíveis à população. Ontem, fiz uma palestra em Maringá (PR). Tinha 2,8 mil pessoas. Fiquei espantado. Jovens, mulheres, empresários, tudo misturado. O que eles querem saber? O futuro. Você junta aqui 100 pessoas para discutir, nesse momento, quem vai ser candidato? Não junta. Vamos partir do que a população está sentindo, não do que nós mesmos publicamos nos jornais. Um põe uma notinha aqui, outro lá, já sabe quem pôs, um fica envenenado contra o outro, não leva a nada.

Miragens chinesas - The Economist

Brazil/China economy: Rebalancing the relationship
The Economist, April 13th 2011

FROM THE ECONOMIST INTELLIGENCE UNIT

Sino-Brazilian commercial ties have expanded rapidly in the last decade, and China is now Brazil’s top trading partner—and was its biggest foreign direct investor in 2010 (with FDI worth around US$15bn). However, the relationship is seen as unbalanced, with Brazil exporting mostly commodities and importing manufactured goods from the Asian giant. President Dilma Rousseff took a step towards correcting this imbalance during a five-day visit to China that began on April 11th. She signed 22 co-operation agreements, some designed to open China’s market to higher-value-added goods.

The Rousseff administration wants to diversify Brazil’s exports and convince China to lower its substantial formal and informal barriers to the import of manufactured and processed goods. For example, China buys huge quantities of soybeans from Brazil, but does not import much processed soy products. Of Brazil’s US$56bn in sales to China last year, around 75% was commodities, with iron ore being the top export item. Similarly, some 90% of Chinese FDI in Brazil is in natural-resources sectors.

Accompanied by a large contingent of Brazilian businessmen and officials, Ms Rousseff was clear in her message to her Chinese hosts: she wants a “qualitative jump” in what Brazil sells to the Asian powerhouse, with a major increase in value-added and processed goods. The government also wants Chinese investment in Brazil to be more diversified, to include not just extractive industries but also high-tech manufacturing.

Range of deals
The president got some of what she wanted. The accords cover areas ranging from defence co-operation to joint development of agricultural technology and biofuels, as well as sports and education initiatives. The two sides also agreed to do research and development in the areas of nanotechnology, electricity and oil. Brazil’s state-controlled oil company Petrobras, for instance, will work with China’s Sinochem and Sinopec to develop new technologies for geological and deep-water prospecting.

China also said it would lift barriers to the import of pork products and agreed to purchase 25 additional regional jets for its state companies (Beijing had already agreed to buy 10) from Embraer, the Brazilian aircraft manufacturer. These orders are worth US$1.2bn. As a follow-up, the Chinese will send a commercial mission to Brazil in May to identify other potential suppliers of manufactured goods.

In the high-tech area, a major announcement came from the chief of Taiwan-based Foxconn, who said the company was considering an investment of US$12bn over five years in Brazil to manufacture Apple products, including the popular iPad tablet computer.

Looking for reciprocity
At the core of the discussions was the concept of “reciprocity”. This underscores growing concerns that, although Brazil has reaped rewards from its closer ties to China in terms of trade and investment—Chinese demand has been a driver of Brazilian exports and economic growth for years—the long-term benefits seem to favour the Chinese. Critics warn that Brazil and other Latin American commodity exporters are returning to a commodity-driven export path resembling that of the 17th and 18th centuries.

This carries the risk of an over reliance on commodity exports at the expense of sectors such as manufacturing and services exports. This not only makes Latin American countries vulnerable to a crash in commodity prices (or a sharp drop in Chinese demand), but also to “Dutch disease”, whereby local currency values rise in line with commodity prices, making it even more difficult for their manufactured and non-commodity exports to compete. This could contribute to potential “deindustrialisation” of Latin American economies—whereby manufacturing sectors shrink as natural-resource sectors continue to grow. This could eventually lead to rising imports and decreasing exports, balance-of-payments difficulties and negative impacts on overall economic growth.

The risk of deindustrialisation is compounded by the fact that China captures the bulk of value-added production from the commodities it buys, while discriminating against imports of value-added goods. Further, thanks to China’s low labour costs and a government policy designed to keep the Chinese currency undervalued, China outcompetes many Latin American manufactured goods in global markets and increasingly within Latin America’s home markets as well.

China is a competitor
According to one analysis, 94% of manufactured exports from Latin America and the Caribbean face a partial or direct threat from China. The direct threat is most acute for Mexico and the countries in Central America and the Caribbean, which are not net commodity exporters but export many light manufactured goods that directly compete with exports from China. Such countries have been losing market share to more competitive Chinese goods for some years.

Yet even in Brazil there is worry about potential deindustrialisation. Manufacturing competitiveness is being hurt by the strong local currency, the Real (which has been appreciating for two years owing to strong capital inflows), as well as by China’s own currency policy. Given Brazil’s diversified productive sector, the short-term risk of deindustrialisation is limited. However, industrial growth has been slower than that of commodity exports, and many sectors—notably clothing and footwear—have already suffered loss of market share at home and in neighbouring markets.

Active industrial policy
The Rousseff administration’s desire to reset commercial relations with China forms part of the left-leaning government’s broader industrial policy designed to promote industrial leaders (“national champions”), boost competitiveness and use industry as a tool of economic development.

Besides assisting local businesses with state financing and other incentives, the government is trying to steer certain strategic companies towards more production of value-added goods. One example is Vale, Brazil’s second-largest company and one of the world’s biggest mining companies. Vale extracts iron ore and other base metals, and exports them mostly to China. The previous government of President Luiz Inácio Lula da Silva tried to strong-arm the management of Vale for years to invest in steel production and other value-added projects at home. Ms Rousseff earlier in April finally succeeded in pressuring Vale’s shareholders to oust its president, who had resisted such government interference.

Challenges ahead
With regards to China, the recent bilateral agreements, while notable, are not likely to fundamentally change the nature of the relationship. Not only will China continue to import primarily raw materials, it is also becoming a bigger player in the direct production of such resources, particularly oil. Energy security and access to primary metals and foodstuffs will remain China’s overriding strategic interest in Brazil.

As China also continues to penetrate the Brazilian market with its lower-cost electronics, clothing and other goods, domestic producers may display more resistance to Chinese competition, and may pressure the government for more direct assistance (even protectionist measures) or to initiate anti-dumping complaints. Yet even commercial tensions of this nature are unlikely to turn back China’s expansion in Brazil, whether via trade or direct investment.

The challenge for Brazil and other commodity exports will be to figure out how best to profit from the Chinese connection to ensure that it contributes to more equitably distributed, diversified and sustainable growth. Besides agreements of the type signed in Beijing, more will have to be done on the domestic side to channel income from the commodities windfall to improvements in education, infrastructure and innovation, which will help to improve competitiveness over the longer term. Progress in implementing structural reforms in areas such as labour laws, fiscal policy and taxation, which keep business costs high, will also be needed.

The Economist Intelligence Unit
Source: ViewsWire

O mito do valor agregado (as nossas custas, claro)...

Governos ativistas, burocratas intervencionistas, espíritos dirigistas sempre querem, pretendem, e geralmente o fazem, melhorar as nossas vidas contra a nossa própria vontade.
Determinados líderes políticos, eu até diria a maioria, acham que sabem melhor do que os empresários, do que os agentes econômicos em geral, o que é melhor para o país e para a sociedade como um todo.
Claro, esses preclaros líderes da nacionalidade -- que certamente não merecem o nome de estadistas -- jamais fazem cálculos de custo-benefício, ou de custo-oportunidade, de cada uma das medidas que "tiram" -- literalmente -- de suas "cacholas", pela simples razão de que eles costumam ser rústicos, economicamente falando.
Como eu digo sempre: todo economista sensato é a favor do livre comércio; todo político sensato diz que é favor do livre comércio, mas não faz nada para efetivá-lo, pois costuma dizer que na prática a teoria é outra, que é muito bonito no papel, mas não funciona na vida real, que como os "outros" (agora são os chineses) praticam "comércio desleal", estaríamos colocando em risco o emprego dos nossos trabalhadores, etc. e tal...
Esses políticos, esses burocratas conseguem fazer isso por uma razão muito simples: eles são pagos para gastar o dinheiro dos outros -- isto é, o seu, o meu, o nosso dinheiro -- pois se tivessem de arriscar seus próprios tostões (enfim, milhões), eles provavelmente contratariam uma consultoria antes, para saber se o retorno é realmente garantido, se eles vão ficar mais ricos, etc. Podem até perder dinheiro em algum empreendimento, mas aposto como cuidam direitinho do que é seu.
Então, por que essa vontade de dirigir a vida alheia, por que essa ânsia de dizer aos empresários, que arriscam o seu próprio dinheiro e o de seus associados na empreitada, construindo um negócio que visa, única e simplesmente, ao melhor e maior lucro possível. Essa coisa de achar que as pessoas estão patrioticamente trabalhando pelo bem do país é uma bobagem imensa: cada um pensa, primordial e essencialmente, em sua própria situação. E com isso se constrói, segundo a ideia da mão invisível de Adam Smith, o melhor resultado possível para todos e cada um.
Como sempre, a alegoria smithniana da mão invisível, assim como a teoria ricardiana do livre comércio não costumam ser aceitas nesses meios dirigistas, que continuam a pressionar os empresários em geral para fazer aquilo que eles acham que deve ser bom para a sociedade, não o que os próprios empresários pensam ser o ideal do seu próprio ponto de vista. Como nenhum empresário -- salvo algum maluco -- está no negócio para perder dinheiro, eles querem mesmo é realizar o máximo de lucro possível (descontando o do "leão" do fisco), com o que acabam fazendo o melhor benefício possível para a sociedade, via pagamento de salários, juros, aluguéis, distribuição de lucros e dividendos, recolhimento de impostos, enfim, criando empregos, renda e riqueza para a sociedade como um todo.
Quem não acredita nisso? Os dirigistas de sempre...
Fiquem com um artigo ilustrativo a este respeito...
Paulo Roberto de Almeida

Smith, Ricardo e o lobo
ALEXANDRE SCHWARTSMAN
*FOLHA DE SÃO PAULO, 13/04/11

A "FALÁCIA do valor adicionado" é uma das manifestações mais comuns do analfabetismo econômico. Geralmente se expressa como indignação pelo fato de o país exportar alguma matéria-prima (minério, petróleo, algodão) em vez de seu correspondente manufaturado (aço, gasolina, têxteis), clamando a seguir pela atuação do governo para: a) desvalorizar o câmbio; ou b) taxar as importações de manufaturas; ou c) taxar as exportações de matérias-primas; ou e) dar crédito subsidiado à produção local; ou f) subsidiar diretamente a produção local; ou g) todas as alternativas anteriores.
Embora as políticas acima tenham como efeito inequívoco o benefício de poucos em detrimento de muitos, são comumente apresentadas como de "interesse nacional", mas não é esse o caso. Para entender isso, vamos usar um exemplo obviamente irreal, que, todavia, ajuda revelar a estrutura básica do problema. Imagine que haja cem trabalhadores disponíveis e cada um possa produzir duas toneladas de minério de ferro, ou meia tonelada de aço. Por outro lado, cada tonelada de aço, produto de maior valor agregado, vale duas toneladas de minério. Como deveriam então ser distribuídos os trabalhadores entre a produção de aço e minério, considerando que o país precisa de 25 toneladas de aço?
À primeira vista, bastaria empregar metade dos recursos para a produção de minério e metade para a produção de aço, obtendo, assim, cem toneladas de minério e as requeridas 25 toneladas de aço.
Há, contudo, uma alternativa melhor: todos os trabalhadores poderiam ser empregados na produção de minério, gerando 200 toneladas, das quais 50 poderiam ser trocadas por 25 toneladas de aço. Mesmo concentrando a produção no bem de menor valor adicionado, obtém-se o aço necessário, mas com um saldo maior de minério de ferro (150 toneladas ante 100) do que na primeira
opção.
O exemplo é confessadamente imaginário e os números foram escolhidos para mostrar um caso em que o foco na produção do bem de menor valor adicionado gera resultados superiores. Ainda assim, ele revela verdades importantes. Vale mais produzir minério do que aço em nosso exemplo porque a
produtividade relativa (duas toneladas/trabalhador no primeiro setor versus 0,5 tonelada/trabalhador no segundo) supera o preço do aço em termos de minério (duas toneladas de minério por uma de aço). Não é difícil concluir que seria mais vantajoso empregar todos os recursos na produção siderúrgica apenas se o preço do aço ultrapassar quatro toneladas de minério por uma de aço.
Como, porém, podemos saber se a produtividade relativa entre os setores supera, ou não, o preço relativo desses dois bens? Basta observar o comportamento das empresas: ante a alternativa de produzir minério ou aço, qual é a atividade escolhida? Dado que empresas privadas, em geral, não
estão no negócio de rasgar dinheiro, a escolha mais lucrativa revela a relação entre preços e produtividade.
No entanto, seria esse comportamento míope, dado que a empresa estaria preocupada apenas consigo mesma, e não com "os interesses do país"? Não. No primeiro caso, temos a produção de 100 toneladas de minério e 25 de aço, que, ao preço de 2:1, equivale a um PIB de 150 toneladas de minério (ou 75 de aço).
No segundo caso, o PIB equivale a 200 toneladas de minério (ou 100 de aço), mostrando que a otimização individual também implica otimização para a sociedade como um todo.
Assim, a menos que se consiga mostrar que há custos (ou benefícios) envolvidos na produção dos diferentes bens não plenamente refletidos nos preços (por exemplo, se uma atividade é mais poluidora que a outra), a solução de mercado revela a forma mais eficiente de produção. Os "interesses do país" serão mais bem servidos se aprendermos a respeitar os resultados da
busca pelo interesse individual, coordenados pelo sistema de preços, não pelo intervencionismo governamental.

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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...