terça-feira, 5 de março de 2013

Programa de (Des)Aceleracao do (Nao)Crescimento? Parece...

Incrível a capacidade de certos governos de atrasar obras que pareciam planejadas para começar e acabar, já que o projeto básico estava pronto e o traçado feito, ou seja, bastaria um pouco, só um pouquinho, de capacidade gerencial.
Mas essa é uma mercadoria rara em certos quarteis...
Paulo Roberto de Almeida

Atraso na Transnordestina

04 de março de 2013
Editorial O Estado de S.Paulo
 
A conclusão de um dos grandes empreendimentos lançados pelos governos petistas, em seus dez anos no poder, vai ser adiada, como tem acontecido rotineiramente com muitos dos projetos incluídos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A Ferrovia Transnordestina, numa extensão de 1.728 km, só deve ficar pronta, se tudo correr bem, em 2015 (ligação com o Porto de Suape, em Pernambuco) e 2016 (ligação ao Porto de Pecém, no Ceará). Quando começaram com estardalhaço, em 2006, a previsão era de que as obras dessa ferrovia seriam concluídas no fim do governo Lula.
O prazo teve de ser prorrogado para 2014. Dada a impossibilidade de que isso venha a ocorrer, o governo acabou tendo de aceitar uma nova dilatação do prazo. E, lógico, o custo também aumentará: o valor orçado de R$ 5,4 bilhões, já revisto para R$ 6,72 bilhões, subirá para R$ 7,5 bilhões só para a construção. Preveem-se gastos adicionais de R$ 1,5 bilhão para aquisição de material rodante (vagões e locomotivas), sem contar investimentos em oficinas e nos portos. O projeto tem sido financiado, em boa parte, pelo Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), Banco do Nordeste e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
No ano passado, quando esteve em Pernambuco, onde percorreu canteiros de obras, a presidente Dilma Rousseff cobrou um andamento mais rápido do projeto, tendo recebido a promessa da Transnordestina Logística (TLSA) de que a ferrovia seria concluída ainda em seu mandato. Não adiantou.
Alegando a necessidade de mais recursos e a demora dos Estados de Pernambuco e do Ceará em fazer as desapropriações pelas quais ficaram responsáveis, a TLSA pediu e conseguiu mais uma prorrogação. Segundo o jornal Valor (22/2), o governo cogitou de fazer nova licitação, inserindo a Transnordestina no bloco das ferrovias que serão privatizadas. Essa hipótese foi descartada por ter o Planalto avaliado que isso poderia desgastar a imagem do governo.
O fato vem comprovar, ainda uma vez, as deficiências de planejamento e gestão de projetos pelo governo, mesmo aqueles, como a Transnordestina, que têm merecido destaque na retórica oficial. A ferrovia, que atravessa sete Estados, deveria contribuir para melhorar a situação de pobreza crônica e subdesenvolvimento no interior do Nordeste, ligando-o a portos modernos como Suape e Pecém. Assim, poderia ser escoada a produção de novas fronteiras agrícolas do Piauí e do Maranhão e haveria condições econômicas para novos investimentos no semiárido, inclusive para exploração das riquezas minerais da região, como ferro e gesso.
Para alcançar esses objetivos, seria indispensável definir prazos para a construção da linha e liberar recursos com base numa análise realista dos custos. Como tem ocorrido com outros projetos - não há melhor exemplo disso do que o projeto de transposição de águas do Rio São Francisco -, a construção da Transnordestina ficou praticamente sujeita ao acaso, sendo conduzida de acordo com o ritmo irregular da liberação de verbas.
No pico das obras, em 2011, o trecho entre Eliseu Martins, no Piauí, e o Porto de Suape, numa extensão de 1.200 km, tinha 9.600 homens trabalhando, número que caiu hoje para 3.754. O único trecho efetivamente construído tem 262 km de extensão e seus trilhos não levam a lugar nenhum. Os trabalhos prosseguem em lentidão exasperante, no dizer de um técnico, e há quem considere que a conclusão das obras dez anos depois de iniciadas é uma previsão até otimista.
Em face desse quadro, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) promete fazer alterações no contrato com a TLSA, adequando os prazos e prevendo penalidades no caso de seu não cumprimento. Se a concessionária voltar a apresentar repetidas falhas no cronograma, como tem ocorrido, o contrato será simplesmente cancelado. Isso presume, naturalmente, que as dotações serão liberadas também tempestivamente, o que não se ajusta aos padrões que a administração federal vem adotando.

Ciencia para tras? O CsF vai atrasar ainda mais o Brasil?

Perguntas pertinentes: se os estudantes saem do Brasil para universidades piores do que aqueles nas quais poderiam estudar no Brasil, então se trata apenas de turismo remunerado, e férias pouco acadêmicas. Ou seja, o Brasil vai gastar dinheiro para alunos que vão voltar pior do que estariam se permanecessem no Brasil.
Faz sentido?
Pouca coisa faz sentido em certas políticas do governo.
Se é para dar férias pouco estudiosas aos nossos estudantes, não seria melhor mandá-los para as praias do Nordeste?
Paulo Roberto de Almeida 

Bolsistas fazem curso pior em Portugal
Davi Lira
O Estado de São Paulo, 5/03/2013

Entre estudantes do Ciência sem Fronteiras, quase 70% estão em universidades mais fracas
Dos 2.587 bolsistas do Ciência Sem Fronteiras (CsF) em Portugal - o país é o segundo principal destino do programa -, quase 70% foram para universidades consideradas mais fracas que as principais instituições brasileiras ranqueadas pelo SCImago, reconhecido grupo de pesquisa internacional que classifica os melhores locais para se estudar na América Latina, Portugal e Espanha.

A situação - que preocupa os gestores do programa e custa aos cofres públicos R$ 48 milhões por ano - fez com que o governo federal agisse. Na sexta-feira, cerca de 9,7 mil candidatos ao intercâmbio em Portugal foram notificados pelo CsF sobre a possibilidade de trocar de país (mais informações nesta página).

Para chegar aos números, o Estado cruzou as informações sobre a quantidade de bolsas implementadas até janeiro de 2013 com o atual ranking ibero-americano da SCImago. Foram considerados índices de qualidade da produção científica e internacionalização dos pesquisadores.

No cruzamento, observou-se que, das bolsas implementadas nas cerca de 50 instituições portuguesas, apenas 818 universitários e pesquisadores brasileiros foram para instituições lusas como a Universidade do Porto e a Técnica de Lisboa. Elas são consideradas tão boas quantos as sete melhores universidades públicas do Brasil - USP, Unicamp, Unesp e as federais de São Paulo (Unifesp), Rio de Janeiro (UFRJ), Rio Grande do Sul (UFRGS) e Minas Gerais (UFMG) -, todas ranqueadas no top 20 da SCImago. Na lista das 250 melhores, o Brasil ocupa 82 postos e Portugal, 21.

Uma das principais plataformas políticas do governo, o CsF atingiu desde 2011 apenas 22% da meta de enviar 101 mil bolsistas "às melhores universidades do mundo" até 2015.

"O programa está mais preocupado em mostrar números. As universidades de Portugal não estão à altura das nossas, a não ser em algumas especialidades", afirma o economista Cláudio Moura e Castro, especialista em educação.

Cursos piores. Com base no prestigioso ranking QS World University, quando se compara o curso de Engenharia Civil da UFRJ com o da Universidade de Coimbra - que recebe a maior quantidade de brasileiros -, a instituição do Brasil se sai melhor.

No próprio site da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes), umas das administradoras do programa, nenhuma universidade portuguesa é sequer listada como referência na seleção de melhores instituições europeias, muito menos na relação das mais destacadas em Engenharia e Tecnologia, áreas consideradas prioritárias para o programa.

Um dos motivos da grande quantidade de universidades portuguesas disponíveis é a facilidade na assinatura dos convênios com o programa, afirma Luiz Felipe Lampreia, ex-ministro das Relações Exteriores e ex-embaixador em Portugal.

"Não significa que elas não tenham critério nem parâmetros de aceitação de alunos. Mas a demanda por uma universidade de ponta americana, como Stanford e Harvard, é certamente maior", diz Lampreia.

Além de não estarem sendo enviados para instituições de excelência internacional, os bolsistas em Portugal ainda deixam de aprender a segunda língua - outra missão central do CsF.

"Independentemente da instituição em que vai estudar, o aluno retornará ao País com um importante ganho cultural e acadêmico", pondera Erasto Fortes, professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília.

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), também gestor do programa, diz que busca parcerias com as melhores universidades "disponíveis".

O CNPq informa ainda que o Ministério da Educação está desenvolvendo o programa Inglês sem Fronteiras para aumentar o número de bolsistas enviados para Estados Unidos, Canadá, Austrália e Grã-Bretanha.

'O IMPORTANTE É O CONTATO COM A CULTURA EUROPEIA'

As justificativas que levaram o estudante de Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Rafael Girardi, de 21 anos, a tentar uma bolsa em Portugal pelo Ciência sem Fronteiras são quase as respostas-padrão dos demais candidatos que acabam optando pelo mesmo país.

"Eu queria ter uma experiência lá fora, muitos amigos e até minha namorada escolheram Portugal. Além disso, não tive tempo de fazer o exame de proficiência em outra língua para tentar outro país", conta Girardi, que havia concluído o 5.º período no Brasil antes de partir para o país luso no segundo semestre de 2012.

A intenção de estudar em Portugal veio antes da decisão de optar pela universidade de destino. "Escolhi a Universidade de Coimbra, mas não conhecia muito sobre ela. O que sabia mesmo é que ela era famosa em Direito."

Depois de quase um semestre de aulas, foi possível conhecer um pouco mais sobre o curso. "É difícil avaliá-lo. As realidades brasileira e portuguesa são diferentes. A Federal do Rio é boa, mas o sistema público do Brasil têm suas deficiências", fala.

No entanto, mesmo reconhecendo que os professores de Coimbra são mais "focados" e praticamente nunca faltaram às aulas, existem outros quesitos em que a UFRJ é melhor, afirma o jovem.

Segundo ele, na UFRJ o estudante tem mais possibilidade de trabalhar com pesquisa, há mais laboratórios, é possível conciliar os estudos com estágio e, no Rio, as atividades extracurriculares eram realizadas de forma mais intensa. "Em Coimbra, não achei esses pontos muito positivos não", fala Girardi.

Mas, segundo ele, o princípio do intercâmbio tem mais relação com outras questões. "Em termos de currículo não muda muito. Acho que o mais importante é o contato com a cultura europeia", diz.

Ele fica em Coimbra até o final de junho de 2013. "Até lá, estou tentando conversar com professores, para participar de projetos envolvendo a área de urbanismo."
 
Capes oferece a alunos transferência de país

Preocupada com o número excessivo de universitários interessados numa bolsa do Ciência Sem Fronteiras (CsF) para estudar em uma das 50 instituições disponíveis em Portugal - onde há menos universidades de excelência internacional -, a Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes) enviou uma notificação para os futuros bolsistas desse país.

Conforme revelado pelo Estado no dia 2, foram encaminhados e-mails para 9,7 mil estudantes das áreas prioritárias, a maioria alunos de cursos de exatas. Todos eles queriam estudar em Portugal, mas agora podem transferir sua candidatura para Estados Unidos, Grã-Bretanha, Austrália, Canadá, Irlanda, Itália, França ou Alemanha.

Para esses estudantes, no entanto, não foi exigido nenhum conhecimento do idioma estrangeiro do país de destino. Seriam concedidos a eles cursos imersivos de seis meses de duração para a melhoria da proficiência.

A maneira como foi conduzido o episódio ainda está gerando uma série de dúvidas nos alunos que tiveram de optar até ontem pela transferência. O e-mail foi encaminhado na madrugada da última sexta-feira, segundo relatos de estudantes.

Mesmo já tendo optado pela Itália, Sergio Machado, de 23 anos, aluno do curso Engenharia Biomédica da Universidade Federal do ABC, ainda possui uma série de perguntas sem respostas. "Não sei bem qual será a nova data de viagem, nem se terei direito assegurado ao curso de italiano e se a minha vaga na Itália será de fato garantida", diz.

De acordo com a Capes, a distribuição desses candidatos para outros destinos visa alcançar "maior equilíbrio na formação dos estudantes de acordo com os objetivos estratégicos do CsF".

Venezuela: la se foi o comandante...

Muitas lágrimas, enxurradas delas, provavelmente mais sinceras do que as derramadas quando da morte de Stalin, ou de Mao Tsé-tung, dois tiranos que mataram muitos, milhões, de seus compatriotas.
Chávez nunca chegou a tanto, inclusive porque as condições eram bem diversas; foi apenas um autoritário caricato, quase de opereta, ou talvez totalmente de opereta.
Deixa a economia do país em frangalhos, e muito mais dependente do petróleo do que quando entrou, e justamente havia prometido fazer o contrário. Seria apenas a conhecida maldição do petróleo? Provavelmente não. Como Lênin, era um gênio político, mas um total incompetente econômico: o líder bolchevique também destruiu a economia russa, e Stalin passou a construir a economia soviética com basea no mais completo escravismo conhecido na era moderna. Mao foi muito pior, mas não inovou quase nada em relação a Stalin, apenas matou mais gente, mais por incompetência do que pod desejo de matar. Chávez não chegou a tanto, mas seria interessante saber quantos milhares de venezuelanos fugiram do seu socialismo do século 19, ou 18, sim, porque do século 21 não tinha absolutamente nada, só o calendário errado, torto, completamente deformado.
Herança pesada que deixa para os sucessores, de qualquer tendência e inclinação política e econômica. Herança muito pesada. Pobre Venezuela.
Ah, sim, vamos ter luto de três dias, querem apostar?
Não tenho nenhum sentimento adverso em relação à pessoa de Chávez, inclusive porque teria de ter também contra outros líderes populistas incompetentes da nossa região, o que não é o caso. Apenas tento compreender as circunstâncias pelas quais foi possível chegar a tamanha decadência política (mas que não é inédita na história da Venezuela; basta ver um perfeito antecessor de Chávez, cem anos atrás, na pessoa do coronel Cipriano Castro; depois houve outros ditadores). Muito pode ser atribuído a elites corruptas, certamente, mas tam∫ém se deve à falta de educação política, ou de educação simplesmente, da maior parte da população. Conhecemos isso, também, pois temos o mesmo fenômeno, apenas com menos desastres. O que faço, geralmente, é apenas analisar, e criticar, políticas públicas, meu terreno preferencial de debate intelectual. Registro que as da Venezuela, e da Argentina, foram muito mais incompetentes, dezenas de vezes mais do que as do nosso vidente.
Transcrevo abaixo pequena alegoria que fiz no começo deste ano, quando já era evidente que os dias do candidato a ditador estavam contados. Prolongaram seu sofrimento durante muito tempo, como aliás ocorre com os verdadeiros ditadores: Stalin, Mao, Tito, Franco, Salazar e outras figuras caricatas da América Latina. El colonel ya no tiene quien le escriba, mas muitos vão chorar nos próximos dias.
Paulo Roberto de Almeida

Uma lágrima para Chávez; nenhuma para o socialismo do século 21
Paulo Roberto de Almeida
Alegoria política estilo século 20
Juca Chávez se foi. Uma pena. Era um bom cantor e compositor. Encantava o público, que podia passar horas escutando-o deblaterar contra os poderosos, os políticos tradicionais, os mercados, o capitalismo, a ganancia, a cupidez dos homens, enquanto versejava sobre um futuro melhor, feito de abundância, de solidariedade, de muito amor e compreensão. Embaladas nos acordes de um velho violão, as canções soavam simpáticas, sempre prometendo justiça e bem-estar para todos, mesmo sem esclarecer como tudo isso seria alcançado, já que trovas políticas precisam ter recados curtos para serem eficazes. Ele chamava tudo isso de “socialismo do século 21”, um título curioso, pois suas ideias recendiam mais ao século 19. Enfim, a vida é feita de contradições.
Era um mestre das palavras e das rimas. Sabia tocar os corações e mentes das pessoas, sobretudo os mais humildes, aqueles afastados dos círculos de poder, que só têm uma vaga ideia sobre como são complexos os mecanismos da dominação política e ainda mais as engrenagens dos circuitos produtivos. Chávez era um carismático, com sua retórica poderosa, certamente convencido de seu próprio poder sobre as pessoas. Mas ele não descuidava de fazer sua autopromoção, ressaltando suas qualidades e escondendo habilmente seus defeitos. Acompanhado de seu violão, era capaz de reter as pessoas durante horas, frente às telas da televisão, ou ao som do rádio.
A isso chamamos liderança natural: Juca Chávez a tinha de sobra. Pena que usou muito mal de todas as suas habilidades, prometendo muito e, afinal, entregando muito pouco. Suas ideias econômicas eram bizarras, feitas de uma mistura de estatismo e socialismo rústico: acabou desmantelando as bases da economia de mercado, e deixando o país pior do que se encontrava quando assumiu sua posição de líder, o que lhe converteu numa espécie de caudilho da música popular. Primeiro, passou a achar que só as suas músicas eram as boas: daí praticamente monopolizou as rádios e TVs para seu estilo de música, banindo todos os demais. Depois decretou que todos (ou quase todos) passariam a usar a mesma cor de camisa, que ele dizia ser a cor do amor. Tanto carinho e dedicação a suas causas nobres encantavam os já conquistados ao seu charme e pregações, mas deixavam poucas opções de escolha aos demais, aqueles que simplesmente gostariam de usufruir de suas boas promessas, sem necessariamente ter de aderir a todas as suas maneiras e trejeitos.
Juca Chávez, como trovador, era mesmo contraditório: queria fazer o bem, mas achava que todos deviam concordar com a sua maneira especial de fazer o bem. Na verdade, ele não estimulava a criatividade nas ou das pessoas; pretendia simplesmente à agregação de todos e cada à sua visão peculiar do que fosse o bem, ao seu projeto pessoal de engenharia social. E a sua engenharia padecia de sérios erros estruturais.
Juca Chávez se foi. O mundo da canção latino-americana já não será mais o mesmo, pois Chávez o transformou irremediavelmente. Deixou seguidores, mas nenhum à sua altura, ou dispondo de seus recursos pessoais e materiais. Vai fazer falta para muitos, sobretudo porque era generoso com os humildes, embora impiedoso com quem não partilhava de seu “socialismo do século 21”. Este nunca chegou a ser formulado explicitamente e, de fato, era muito confuso para funcionar de verdade. Imagina-se que nunca funcionaria na prática, já que poetas e trovadores jamais conseguem articular soluções a problemas concretos: ele só alimentam sonhos.
Uma lágrima para Juca Chávez; nenhuma para o seu socialismo.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2 de Janeiro de 2013.

ENEM: tropecando na redacao (e no MECssauro)...

Esse triste resultado é obviamente a consequência da má educação que os alunos recebem, por um lado, mesmo nas escolas privadas, e, por outro lado, da incompetência do MEC, que não consegue reunir gente habilitada para fazer exames sensatos. Os companheiros sempre têm uma proposta gramsciana para fazer.
Destaco apenas duas passagens que evidenciam meu argumento:
1) O estudante paulista André Luis dos Santos Valente, de 17 anos, fez o último Enem. Só não tirou nota 1.000 por causa da avaliação dessa exigência. "Em todas as competências tive 100% de aproveitamento, mas na última, fiquei com 80%", diz ele, que critica o modelo. "Não sei bem como eles avaliam, mas é difícil exigir que nós estudantes tenhamos uma intervenção que nem os governos conseguiram."
2)  Para a consultora em educação Ilona Becskeházy, a diferença entre as médias de cada competência é sinal de que há problemas no modelo. "Os critérios são subjetivos o suficiente para confundir tanto quem faz a prova como quem corrige", diz ela. "Como mensurar a qualidade de uma proposta de intervenção?
Pois é, juntou a ruindade, em geral, do ensino no Brasil, sobretudo o domínio da norma culta da língua -- já que o MEC ensina que "nós pega o peixe" é aceitável -- com a ruindade intrínseca das saúvas freireanas, que acham que conscientizar o cidadão no besteirol gramsciano é melhor do que simplesmente ensinar as três matérias fundamentais de modo correto e intensivo.
Paulo Roberto de Almeida

Exigência em redação do Enem derruba nota
Paulo Saldaña
O Estado de São Paulo, 4/03/2013

Na prova de 2011, 37,4% conseguiram elaborar de forma precária proposta de intervenção ao tema, uma das competências avaliadas
Dados do Enem de 2011 mostram que 37,4% dos candidatos conseguiram elaborar "apenas de forma precária" uma proposta de intervenção ao tema da redação. Além de demonstrar domínio da norma padrão da língua, entender a proposta e argumentar, o candidato precisa apresentar uma proposta de resolução ou conscientização do problema - que ainda respeite os direitos humanos.

Essa competência, que vale um quinto da nota da redação, tem jogado para baixo a média geral dos alunos.

As redações do Enem têm cinco competências avaliadas. Cada uma vale 200 pontos e a nota final vem da soma dessas cinco avaliações (mais informações nesta página). Na média do País, a competência que avalia a proposta de intervenção é de 82,30 pontos. O número é no mínimo 25% mais baixo do que a média de qualquer competência. A diferença pode chegar a 35%.

"É possível ver que as notas baixas nessa competência correspondem a redações nas quais os alunos elaboram respostas com intervenções precárias ou tangenciais ao tema, ou até redações nas quais os alunos não elaboram intervenção alguma", explica o economista Felipe Cocco, do portal dadosdoenem.org, responsável pelo levantamento. Cocco utilizou os microdados do exame de 2011, quando o tema da redação foi "Viver em rede no século XXI: os limites entre o público e o privado".

A pontuação que o candidato consegue em cada competência avaliada representa sua capacidade em atender aos critérios que o exercício pede. Assim, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) estipula uma escala de faixas de pontuação para cada quesito.

Diferença. Nessa divisão, é possível perceber que 35% dos participantes até conseguem elaborar a proposta, "mas pouco articulada à discussão desenvolvida no texto". Apenas 5,5% conseguiram elaborar uma ideia "clara e inovadora", tirando nota máxima nessa parte. Como comparação, na competência 3, que tem a segunda menor média, mais de 11% conseguiram nota máxima.  

O estudante paulista André Luis dos Santos Valente, de 17 anos, fez o último Enem. Só não tirou nota 1.000 por causa da avaliação dessa exigência.
"Em todas as competências tive 100% de aproveitamento, mas na última, fiquei com 80%", diz ele, que critica o modelo. "Não sei bem como eles avaliam, mas é difícil exigir que nós estudantes tenhamos uma intervenção que nem os governos conseguiram." No Enem 2012, a proposta foi "O movimento imigratório para o Brasil no século XXI" - considerado difícil e complexo. Os dados do último exame ainda não estão disponíveis.

A diferença em cada parte da correção do texto foi ainda maior na prova de José Albérico da Silva Dantas Filho, de 18 anos, de Maceió. Nas outras quatro competências a nota variou entre 100 e 160. Mas na avaliação da proposta, ficou com 20. "Perdi qualquer chance de concorrer a uma vaga", diz.

O Enem é o único vestibular do País a exigir que o candidato faça uma proposta de intervenção à problemática do tema. Nas últimas edições do exame, a redação centralizou as reclamações de alunos, que se queixavam das correções.

Na opinião da professora de redação Angela Maria de Souza, do colégio Albert Sabin, de São Paulo, os professores ainda não estão acostumados a trabalhar com os alunos essa habilidade. "Não é fácil para o aluno. Se ele não treinar exaustivamente, não consegue ir bem", diz. Pela dificuldade, Angela conta que trabalha a competência desde o primeiro dia de aula. "Acho que é a parte mais importante, que diferencia um dos outros."

Para a consultora em educação Ilona Becskeházy, a diferença entre as médias de cada competência é sinal de que há problemas no modelo. "Os critérios são subjetivos o suficiente para confundir tanto quem faz a prova como quem corrige", diz ela. "Como mensurar a qualidade de uma proposta de intervenção?

Uma modesta homenagem ao guia genial dos povos - Guilherme Fiuza

Ele merece: nunca umzinho só, tão somente sua pessoinha pessoal, se ouso dizer, foi capaz de, continuamente, enganar a tantos (praticamente todos, com dois ou três de fora, como eu e esse jornalista), durante tanto tempo, sem que alguns o denunciassem como o maior fraudador de todos os tempos, para trás, mas também atualmente e para a frente, que nunca é demais...
Ele merece: desmentiu a frase do Lincoln, com quem aliás ele se comparou. Modesto elle.
Como demonstra este jornalista, ele é muito melhor do que o Lincoln: engana a todos, durante todo o tempo em todos os lugares, por todos os meios ao seu alcance, o que lhe é provisto por alguns bajuladores oficiais, trabalhando em tempo integral e o tempo todo... (vale a redundância com o personagem)
Paulo Roberto de Almeida

E o Oscar de efeitos especiais vai para.... O PT 

GUILHERME FIUZA

REVISTA ÉPOCA, 2/03/2013


Abraham Lincoln e Luiz Inácio da Silva não são a mesma pessoa, mas quase. Na festa de 30 anos da CUT, o filho do Brasil e pai da maior máquina de perpetuação no poder já vista neste país voltou a se queixar em grande estilo, como é próprio das vítimas profissionais. Declarou que ele e o companheiro Lincoln são uns injustiçados: “Fiquei impressionado como a imprensa batia no Lincoln em 1860. Igualzinho bate em mim”.

As semelhanças não param por aí: Lincoln não ganhou o Oscar, Lula também não. Mais uma armadilha do sistema capitalista contra os heróis do povo. Como um sujeito que sai limpinho do mensalão, convencendo mais de 100 milhões de pessoas de que não sabia de nada, pode não ser premiado com o Oscar? É muita injustiça social mesmo. Só pode ser preconceito das elites contra o ex-operário.

Lincoln e Lula, os irmãos siameses da resistência contra a imprensa burguesa, passarão juntos à história da CUT apesar do boicote de Hollywood. Mas que os americanos não se animem muito com essa dobradinha.

Mesmo com as incríveis semelhanças entre os dois estadistas, Lula é melhor.

Lincoln jamais seria capaz de eleger uma Dilma e, depois de um governo inoperante, preguiçoso, fisiológico, perdulário, destruidor das instituições com tarifas mentirosas e contabilidade idem, se encaminhasse para reelegê-la. Com todo o respeito à mitologia ianque e ao talento de Steven Spielberg, uma façanha dessas não cabe na biografia de Lincoln. Como transformar uma militante inexpressiva em símbolo feminino nacional, sem que ela manifeste um único pensamento original em anos de vida pública? Lincoln teria de nascer de novo duas vezes para aprender essa com Lula.

Enquanto o líder máximo de todos os tempos das Américas demonizava a imprensa, ensinando a classe operária a suspeitar da informação livre, odiar o contraditório e só confiar no que seu guru diz, notava-se ao lado os sorrisos divertidos de Gilberto Carvalho, o chefe de gabinete vitalício do Brasil. Carvalho é uma espécie de entroncamento entre Lula e Dilma, um avalista da continuação do final feliz petista no berço esplêndido do Estado brasileiro. Como se sabe, para que esse final feliz dure bastante, é necessário que o conto de fadas do oprimido prevaleça sobre a vida real - daí a implicância sistemática com a imprensa.

Ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho está sempre nos fóruns partidários prometendo à militância que o governo criará uma imprensa nova, confiável. Parece piada chavista, mas é verdade. Por acaso, foi um subalterno de Carvalho que voltou de Cuba com um dossiê contra a blogueira Yoani Sánchez, caprichosamente gravado num CD. É o velho estilo petista de conspirar com o rabo de fora.

Na chegada da blogueira cubana ao Brasil, surgiram subitamente patrulhas organizadas de apoio ao regime de Fidel Castro, um movimento que ninguém imaginava que existia, que nunca mostrara sua cara em lugar nenhum. De repente, num Brasil supostamente democrático e tolerante às diferenças ideológicas, esses grupos surgidos do nada simplesmente impediram os debates públicos com Yoani - no grito, na marra. Quem será que instrumentalizou essa turminha braba?

A inacreditável operação abafa contra uma blogueira, nesse espetáculo deprimente de censura que o Brasil engoliu, veio mostrar que o chavismo só não prosperou no Brasil porque o oxigênio da liberdade por aqui ainda é maior do que na Venezuela. Mas o estado-maior petista não desistiu de sua doutrina da democracia dirigida e baba de inveja dos índices fabricados pela companheira Cristina Kirchner, em sua cruzada bolivariana pela informação de laboratório. Assim como Lincoln e Lula, Cristina também é uma vítima da imprensa reacionária, que tem essa mania mórbida de querer divulgar indicadores públicos verdadeiros.

O lucro do BNDES acaba de ser maquiado, graças a mais uma manobra genial dos companheiros que produzem superavit de proveta e passam blush na inflação. Quando se trata de picaretagem para se agarrar ao poder, é impressionante como a mediocridade do governo popular se transmuta em brilhantismo. Como disse Lula na CUT: “Nós sabemos o time que temos”.

É mesmo um timaço. Merece no mínimo o Oscar de efeitos especiais.

Os equivocos da politica economia brasileira - Claudio Adilson Goncalez

Os equívocos da política econômica

Claudio Adilson Goncalez
O Estado de S.Paulo, 4/03/2013
Em meu último artigo neste espaço, procurei mostrar que há uma restrição estrutural à expansão da oferta de bens e serviços na economia brasileira, dada pela escassez de mão de obra. A ideia de que a situação apertada do mercado de trabalho é um obstáculo ao crescimento - pelo menos no curto e no médio prazos-é compartilhada por boa parte dos analistas, embora não seja consensual. No entanto, há menos concordância no que se refere à taxa de utilização do Estoque de Capital Fixo (ECF), ou seja,das máquinas, equipamentos e construções - nestas incluídos não só os imóveis residenciais, comerciais e industriais, como também toda a infraestrutura produtiva (transporte, comunicações, energia, etc.)

Aceitar que a taxa de utilização do ECF também está elevada, ao mesmo tempo que a produtividade total dos fatores de produção (PTF) está praticamente estagnada, leva necessariamente à conclusão de que o atual nível do PIB está acima do potencial. Tal constatação é contra intuitiva, dadas as pífias taxas de crescimento observadas nos últimos dois anos e as perspectivas não muito animadoras para 2013.

Os economistas Regis Bonelli e Edmar Bacha publicaram recentemente o excelente artigo Crescimento Brasileiro Revisitado (capítulo 8 do livro Crescimento Econômico - Uma Perspectiva Brasileira, organizadores Fernando Veloso e outros). Nele, é examinada a evolução de longo prazo da economia a partir de modelos com ênfase nos determinantes da oferta agregada. Desse trabalho, dois pontos são relevantes para o tema que trato neste artigo.

O primeiro é que, segundo estimativas dos autores, a taxa de utilização do ECF da economia (de todos os setores, não só da indústria)era,no final de 2011, de 95,7%, superior à média dos últimos 10 anos (94%) e bem acima da média dos últimos 20 anos (92,4%). Dado que o investimento bruto registrou variação negativa em 2012, é fácil concluir que essa taxa de utilização tenha crescido ainda mais.

O segundo ponto refere-se à evolução da produtividade, tema que também tratei em meu artigo anterior. As estimativas dos mencionados autores são muito semelhantes às minhas, mas cobrem um período mais longo. Segundo elas, a PTF evoluiu historicamente a taxas muito baixas no Brasil (0,9% ao ano, se considerado o período 1948-2011). Além disso - e este é o ponto mais interessante-, ao decompor o crescimento da PTF nas contribuições para a produtividade do capital e do trabalho, os autores mostram que a primeira evoluiu negativamente (-0,36% ao ano), registrando taxas positivas em raros períodos.

Ou seja, todo o crescimento da PTF foi decorrente do aumento da produtividade do trabalho (1,24% ao ano).

As implicações desses resultados para a política econômica são imediatas. A mais evidente é que, além de investir pouco, o País não tem conseguido incorporar plenamente os avanços tecnológicos ao seu ECF. Ou seja, a qualidade de nossas máquinas, equipamentos, infraestrutura, etc., é precária.

Dado que a sobras de infraestrutura (transporte,energia,comunicações, etc.) fazem parte do ECF, a necessidade premente de suprir as carências nesses setores fica mais uma vez evidenciada.

Os baixos crescimentos da PTF e dos investimentos estão intimamente relacionados. Até a década de1980, alguns analistas acreditavam que a PTF nada mais era do que uma consequência da acumulação de capital, como no modelo de Paul Romer (1986). No entanto, acumulou-se sólida evidência empírica no sentido de que o crescimento da produtividade é que induz o investimento.Como diz o economista Paul Krugman, "a produtividade não é tudo,mas no longo prazo é quase tudo".

Com esse arcabouço teórico e empírico em mente, vejamos os maiores erros da atual política econômica brasileira.

Um deles é a tentativa de estimular o crescimento mediante ações agressivas voltadas à depreciação do real, prática que felizmente parece estar sendo abandonada pelo governo. Políticas protecionistas à indústria doméstica de bens de capital e ativismo cambial dificultam ainda mais a modernização do parque produtor nacional, na medida em que restringem e tornam mais caras as importações desses bens.

Outro é a tibieza das ações do governo para elevar a produtividade da economia, sem o que não haverá uma retomada sustentada dos investimentos.

A agenda voltada à modernização da infraestrutura tem vários pontos positivos, como abrir à iniciativa privada a exploração de rodovias, ferrovias, aeroportos e portos.Porém tem sido conduzida de forma titubeante,lenta e ineficaz.

Somente agora as autoridades sinalizaram com a possibilidade de permitir taxas de retorno capazes de atrair o interesse do setor privado nas concessões de rodovias.

Na contramão dessas iniciativas, o governo comete erros crassos. Por exemplo, continua utilizando a Petrobrás como meio para controlar a inflação, proteger a indústria nacional de equipamentos e,pior, para acomodar demandas de sua base de apoio político.

Isso tem reduzido drasticamente a eficiência da empresa, consumindo sua rentabilidade e atrasando o programa de prospecção e produção de petróleo, especialmente no tão sonhado pré-sal.

Nessa linha, cabe citar também a forma, algo truculenta, como se impôs a redução das tarifas de energia elétrica, bem como tantas outras intervenções na economia.

Além de desestimular o investimento no setor, a medida aumenta as incertezas (inibindo o investimento) em outros segmentos,dado o temor dos investidores de, eventualmente, receberem tratamento semelhante.

Finalmente, há deslizes na condução das políticas fiscal e monetária.Como vimos, existem restrições ao crescimento determinadas pela elevada taxa de utilização dos recursos produtivos, tanto trabalho como capital.Nessas condições, aumentos dos gastos públicos, como se observam atualmente no Brasil, bem como a manutenção do juro real em patamar excessivamente baixo, podem estar armando uma bomba-relógio para o cenário prospectivo de inflação.

Esquizofrenia tributaria brasileira - Everardo Maciel

A marcha da insensatez (2a. parte)
Everardo Maciel
O Globo, 4/03/2013

Em artigo publicado aqui em 04.02.2013 (“A Marcha da Insensatez”, primeira parte), tomei por empréstimo o primoroso título da obra da escritora e historiadora norte-americana Barbara Tuchman, para destacar uma evidência de insensatez na política tributária brasileira, que consiste no omisso e confuso tratamento dispensado ao planejamento tributário.

Retorno ao tema, em virtude da profusão de exemplos de insensatez tributária.

Na França, o presidente François Hollande, reproduzindo a demagógica criação do imposto sobre grandes fortunas, nos anos 1980, pelo também socialista presidente François Mitterrand, acaba de elevar a alíquota máxima do imposto de renda das pessoas físicas para 75%.

A iniciativa, além de confiscatória, estimulará abertamente o planejamento tributário e a mudança de domicílio fiscal (Gérard Depardieu, mais importante ator francês, já assumiu a cidadania russa, sob as bênçãos de Vladimir Putin). Tal como foi concebida, a medida será contraproducente e não vai, por isso mesmo, reequilibrar as desastradas contas públicas francesas. Quem viver, verá.

A tributação pode ser um instrumento para redução das desigualdades, desde que exercida nos limites da razoabilidade. Não sem razão se diz que os paraísos fiscais, de tão notória nocividade, só existem porque foram precedidos por infernos fiscais.

A insensatez tributária não se revela apenas por meio da extração desproporcional, como no exemplo francês. Pode manifestar-se, também, na falta de clareza do texto legal ou na indisposição do fisco de atender, em tempo hábil, às demandas do contribuinte.

Se clareza remete à moralidade, presteza é atributo da eficiência e se inscrevem ambas no âmbito dos princípios constitucionais da administração pública, que também alcançam a legalidade, a impessoalidade e a publicidade.

A guerra fiscal do ICMS atingiu contornos inimagináveis. Nesse contexto, a Resolução nº 13, de 2012, do Senado Federal constitui um exemplo de falta de clareza, potencializada por uma solução de baixíssima qualidade técnica, sem falar de sua presumida inconstitucionalidade.

Na chamada guerra dos portos, a obsessão dos Estados pela atração, a qualquer custo, de investimentos passou inacreditavelmente a privilegiar o produto importado vis-à-vis o nacional, constituindo um raro caso de discriminação territorial inversa.

Na ânsia de enfrentar essa questão, promulgou-se uma Resolução do Senado, em lugar de uma lei complementar, de tramitação legislativa mais exigente, conforme preconiza o art. 155, § 2º, inciso XII, alínea g da Constituição.

Não bastasse a inconstitucionalidade da norma, construiu-se um cipoal de requisitos burocráticos atentatórios ao bom senso, com destaque para a obrigação de identificar as margens dos negócios visando apurar um caricato “conteúdo nacional”, ofendendo uma elementar regra comercial.

A Justiça, felizmente, está afastando as absurdas exigências, não sendo desarrazoado que o STF venha considerar inconstitucional a norma aprovada.

De resto, por que só a guerra dos portos é indesejada? Seriam legais, ao contrário do que tem reiteradamente decidido o STF, as demais formas de guerra fiscal?

Não é bem assim. O que falta, em verdade, é disposição, por parte do Poder Público, para buscar-se uma solução constitucional, abrangente e eficaz para a ilegal guerra fiscal. A preferência é pela insensatez apressada.

A demora na solução de consultas tributárias, formuladas pelos contribuintes, converteu-se em algo patológico. Seria a legislação tão complexa que nem mesmo o fisco sabe adequadamente interpretá-la? Haveria razões para isso, pois ninguém desconhece a complexidade. A melhor explicação, entretanto, é a incúria, em ofensa ostensiva ao princípio constitucional da eficiência.

Outra pérola de insensatez é a tardia cobrança, pelos Estados, do imposto sobre doações em espécie. Até então, apenas o Estado de São Paulo fazia essa cobrança.

Essas operações são isentas de imposto de renda. Desse modo, os contribuintes informavam as doações efetivadas na declaração anual, na convicção de que não haveria ônus tributário.

De repente, à sorrelfa, a Receita Federal decidiu transferir essas informações para os fiscos estaduais, que passaram a fazer lançamentos retroativos aos últimos cinco anos, acompanhados de juros e multas. Antes disso, ressalvado o Estado de São Paulo, esse imposto jamais fora cobrado. Trata-se de mais um episódio de deslealdade tributária.

Em decorrência dessa insensatez, o contribuinte será induzido a buscar formas lícitas de evitar o pagamento do imposto, a exemplo da conversão da doação em empréstimo.

Sendo irrisória a participação do imposto sobre doações em espécie nas receitas estaduais, o que se pretende, afinal, com esse lançamento?

Espero que, na resposta, não esteja incluída a ideia de um curioso programa de deseducação tributária patrocinado pelo fisco, estimulando o planejamento tributário. Essa hipótese de incidência deveria, tão somente, ser extinta.

Everardo Maciel é ex-secretário da Receita Federal

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