A fervura da presidente
Editorial O Estado de São Paulo, 06/07/2013
A governante em fim de mandato, já diziam os velhos políticos, nem cafezinho é servido. A presidente Dilma Rousseff tem ainda um ano e meio de mandato pela frente, a copa do Planalto continua às suas ordens, mas a cada dia fica mais evidente o processo de fervura a que está sendo submetida. Não admira. Chacoalhando na ribanceira das pesquisas de opinião, conseguiu ser a um só tempo oportunista e estabanada ao tentar desviar as atenções gerais do descalabro dos serviços públicos, denunciado nas ruas a plenos pulmões, apresentando-se, para recuperar a popularidade perdida, como padroeira de uma redentora reforma política mediante plebiscito - como se essa fosse a demanda central das manifestações que espocaram por todo o País.
Agindo de novo como a dona da verdade que imagina ser, ignorou o vice-presidente e jurista Michel Temer, para não falar dos líderes da base aliada, e jogou na mesa o curinga de uma consulta popular para a convocação de uma Constituinte apartada do Congresso com a exclusiva incumbência de reescrever as regras do sistema político e eleitoral. O lance, que a seu juízo decerto parecia genial, sucumbiu em menos de 24 horas, ao ficar escancarada a sua ilegalidade. Dilma não se deu por achada: alegou, descaradamente, que o que propusera não era bem isso e voltou à carga com a feitiçaria de outro plebiscito para obrigar os políticos a fazer a reforma a tempo de entrar em vigor já nas eleições de 2014. E, para mostrar quem é que manda, enviou ao Congresso cinco "sugestões" de mudança, como se nunca antes elas tivessem sido cogitadas por deputados e senadores.
O açodamento, combinado com a soberba, a cegou para os obstáculos que fariam a mágica desandar. Antes de mais nada, não previu que a Justiça Eleitoral exigiria 70 dias de prazo, a contar da aprovação do teor do plebiscito no Legislativo, para providenciar a sua realização. Nem que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), respaldado pelos titulares dos 27 tribunais regionais, alertasse que não pode autorizar consultas sobre temas a que o eleitorado não pode responder ou acerca dos quais não esteja suficientemente esclarecido. Na primeira categoria está a Constituição, insuscetível de ser alterada nas urnas. O prazo estipulado pelo TSE caiu do céu para os presidentes peemedebistas da Câmara e do Senado e as respectivas lideranças nas duas Casas, que se opõem ao plebiscito, ainda que alguns o tenham endossado da boca para fora.
Reunidos com o vice (e presidente licenciado do PMDB) Michel Temer e uma trinca de ministros, líderes de oito partidos aliados reiteraram que não seria possível aprovar os termos do plebiscito, justificar na TV posições a favor ou contra cada um deles, efetuar a consulta e transformar em lei os seus resultados, tudo antes de 5 de outubro, quando devem estar definidas as normas da eleição cujo primeiro turno se realizará na mesma data de 2014. Temer, cuja lealdade primeira é com o PMDB e que não há de ter digerido a marginalização a que a presidente o submeteu no episódio da Constituinte, disse que "não havendo condições temporais (sic) para fazer a consulta", é preciso aceitar o "inexorável" - reforma política só para as eleições subsequentes. O que se seguiu foi uma patética demonstração de que Dilma só faz correr atrás dos prejuízos para a sua autoridade que ela mesma se encarrega de causar.
A presidente pediu a Temer que voltasse atrás, e ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que reforçasse o recuo. Eles divulgaram notas ladinas, repetindo que o "ideal" continua sendo um plebiscito para valer em 2014. O episódio apenas acentua a solidão política de Dilma, enquanto o seu mentor se vê obrigado a negar a toda hora que tenha parte com o "volta, Lula". O coro cresce na razão direta das "barbeiragens" da sua escolhida, como ele teria qualificado a ideia da Constituinte exclusiva. Ontem, a colunista Dora Kramer, do Estado, revelou que a presidente desabafou com um político: "Ninguém me defende". Informado, o titular do Senado, Renan Calheiros, retrucou: "Ela tentou jogar a crise no colo do Congresso". É de lembrar o clássico Ninguém me ama, de Antônio Maria: "… E quem me abraça não me quer bem".
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Inesgotável criatividade
Editorial(OESP)
Desde que, em desastrada tentativa de responder aos clamores dos brasileiros que saíram às ruas, a presidente Dilma Rousseff propôs um "pacto pela responsabilidade fiscal", entre outras tantas medidas desnecessárias ou inviáveis, sabia-se que tudo não passava de uma cortina de fumaça para tentar encobrir a irresponsabilidade da atual política fiscal. Mas se havia algo de que o governo não precisava diante da notória corrosão de sua credibilidade era ele próprio confirmar a falácia da proposta da presidente.
Mesmo pressionado para que pratique o que cobra de outros, o governo acaba de publicar um decreto que lhe permitirá distorcer ainda mais suas demonstrações contábeis, apropriando-se de mais dinheiro vivo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), na forma de dividendos, em troca de títulos da dívida pública. Manobra semelhante está sendo feita com a Caixa Econômica Federal (CEF), que recebeu aporte de R$ 8 bilhões em títulos públicos - justificado como cobertura de risco de inadimplência e de subsídios com os empréstimos concedidos pelo programa Minha Casa Melhor - e, assim, poderá repassar dinheiro vivo ao Tesouro, também como dividendos. Ainda que legais, esses atos demonstram continuado descaso com a responsabilidade fiscal.
De nada adianta o Ministério da Fazenda anunciar um corte adicional de R$ 15 bilhões no Orçamento, insuficiente para compensar o crescimento de outras despesas, se, ao mesmo tempo, aumenta artificialmente sua receita. Pois não passa de simples artifício contábil - mais um entre tantos de que o governo já lançou mão nos últimos meses - a pequena mudança no estatuto social do BNDES que permite o pagamento antecipado de dividendos ao Tesouro.
Publicado em edição extra do Diário Oficial da União, o decreto que permite esse pagamento torna ainda mais nebulosas as contas do governo e pode ter consequências duradouras sobre a higidez financeira da instituição. Ele inclui novas reservas de lucro para aumento de capital da instituição entre os recursos que geram dividendos complementares, antes que essas reservas tenham atingido os limites definidos em lei. Além disso, permite que, a qualquer tempo, os saldos dessas reservas "sejam distribuídos a título de dividendos", desde que sejam compensados por instrumento que possa ser utilizado como capital para o cumprimento das normas bancárias.
Ou seja, de um lado, o governo se apropria de mais dinheiro vivo, que engorda suas receitas e o ajuda no cumprimento da meta de superávit primário, e, de outro, dá à instituição papéis que, embora façam crescer a dívida bruta, não são contabilizados entre as despesas.
Por meio da "contabilidade criativa" que transformou no padrão de sua política fiscal, o governo vem usando cada vez mais as instituições financeiras como fonte de receita artificial, sem levar em conta o real desempenho dessas instituições. No ano passado, por exemplo, embora tenha contabilizado lucro de R$ 8,2 bilhões, o BNDES pagou R$ 10,6 bilhões em dividendos. A CEF, com lucro de R$ 6,1 bilhões, pagou R$ 7,7 bilhões em dividendos.
O pagamento de dividendos nesse montante pelos dois bancos foi um dos truques contábeis que o governo utilizou em 2012 para alcançar a meta de superávit primário (a economia feita para o pagamento dos juros). Portarias do Ministério da Fazenda editadas no último dia útil de 2012, mas só publicadas no início deste ano, permitiram, além da apropriação antecipada de dividendos do BNDES, a troca de ações da Petrobrás que compunham o Fundo Fiscal de Investimentos e Estabilização por títulos da dívida pública, no total de R$ 8,84 bilhões. Outras manobras envolveram o desconto, da coluna de despesas, de gastos com o PAC.
No exame crítico das contas de 2012 do governo Dilma, o Tribunal de Contas da União chegou a lembrar o que ocorre na Argentina, onde os dados econômicos do governo perderam totalmente a credibilidade.
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A presidente se afunda enganando a si mesma
ROLF KUNTZ - O Estado de S.Paulo
Mentir para os outros pode ser pecado. Pode também ser crime, em algumas circunstâncias. Mentir para si mesmo é insânia. Os brasileiros, têm, portanto, mais um sério motivo para se inquietar. O governo, tudo parece indicar, mente para si mesmo e continuará mentindo para se isolar da realidade. É muito difícil explicar de outra forma a reação da presidente Dilma Rousseff e de sua equipe às manifestações de rua e ao tsunami de más notícias. O governo tentou, mas como deslocar os problemas para o Congresso, quando até fontes oficiais continuam despejando informações assustadoras sobre a economia? Até os aliados, a começar pelo vice-presidente Michel Temer, têm resistido à manobra, Mesmo sem essa resistência, a situação desastrosa do País continuaria atraindo as atenções.
O Banco Central (BC), uma das fontes oficiais, diminuiu de 3,1% para 2,7% o crescimento econômico projetado para o ano, além de reduzir de US$ 15 bilhões para US$ 7 bilhões o saldo comercial estimado. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) reestimou de 3,2% para 2% a expansão do produto interno bruto (PIB). Na semana passada estava em 2,4% a mediana das projeções do mercado financeiro. Não só as bolas de cristal mostram cenários tenebrosos. Os dados já conhecidos alimentam no dia a dia as previsões negativas.
Um bom exemplo: a produção industrial caiu 2% de abril para maio, depois de modesta recuperação nos meses anteriores, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O saldo comercial do trimestre foi um déficit de US$ 3 bilhões, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento. Mas o número seria bem pior sem as exportações fictícias de plataformas de petróleo no valor de US$ 2,4 bilhões.
A inflação continua elevada e especialistas apontam um resultado próximo de 6% até o fim do ano. A desinflação dos alimentos acabou e o custo das matérias-primas poderá em breve pressionar de novo os preços ao consumidor.
Em junho, o índice oficial de inflação, o IPCA, calculado pelo IBGE, perdeu impulso e subiu 0,26%, principalmente por causa da menor pressão dos preços dos alimentos. Mas no atacado os preços agrícolas aumentaram 1,46%, depois de recuarem 0,75% em maio, de acordo com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Também no atacado a alta dos preços industriais chegou a 0,62%. Ainda em junho, o índice de commodities do BC, o IC-Br, subiu 5,34%, com variação de 5,72% para agropecuária, 4,3% para metais e 4,39% para energia.
O repasse desses aumentos ao varejo dependerá de fatores como o nível de emprego, a renda e a disposição dos consumidores, a possibilidade de substituição de bens, as condições do crédito e, naturalmente, a situação das contas públicas. Os consumidores andam mais ressabiados e cautelosos. Mas o emprego permanece elevado, os salários ainda acumulam ganhos reais, embora menores que os dos últimos anos, o crédito ainda aumenta e a política fiscal permanece, como afirma o pessoal do BC, "expansionista".
Nas ruas, manifestantes protestaram contra as tarifas e a qualidade do transporte urbano e cobraram melhores padrões de serviços essenciais, como educação e assistência à saúde. Diante dessas pressões a presidente propôs um plebiscito fora de hora, sobre temas políticos, e convocou os ministros para exigir maior empenho na execução de seus programas - os mesmos programas condenados nas ruas pela baixíssima qualidade de seus resultados.
Os ministros da área econômica estavam prontos, como sempre, para esse tipo de jogo. Afinal, continuam prometendo mais do mesmo - uma péssima gestão das finanças públicas, mal disfarçada com novos lances de contabilidade criativa, já famosa até na imprensa estrangeira. A quem pensam enganar? Só podem enganar a si mesmos, é claro, porque até os muito trouxas acabam percebendo, embora com algum atraso, os sinais do desarranjo.
A presidente, dizem fontes de Brasília, está isolada. De certa forma, sempre esteve. Desde o começo de seu mandato cercou-se de assessores incapazes - por incompetência ou por falta de coragem - de ajudá-la a examinar os fatos e a planejar as ações de governo com base em diagnósticos realistas.
A maior parte de sua política administrativa e econômica é mero desdobramento da herança deixada por Luiz Inácio Lula da Silva. Nenhuma alteração essencial ocorreu na diplomacia econômica. Na prática, as prioridades têm sido as mesmas. O País continua amarrado ao mundo estreito e medíocre do Mercosul. Enquanto isso, negociam-se novas alianças e novas perspectivas de comércio e integração econômica são abertas em quase todas as regiões, incluída a América Latina. A Aliança do Pacífico é um bom exemplo.
A administração continua tão ineficiente quanto na fase do antecessor, quando o Brasil foi arrastado pela prosperidade mundial e o País pareceu tornar-se uma potência de peso. A grande novidade, naquele período, foi a rápida incorporação de massas ao mercado consumidor. Como nada se fez para modernizar o País e fortalecer sua capacidade produtiva, a mágica da expansão do mercado se esgotou. A dramática perda de produtividade geral da economia deixou o País desarmado para enfrentar a concorrência estrangeira.
Os resultados são evidentes nas contas externas, mesmo com algum disfarce. Aparentemente sem perceber esses fatos, a presidente insistiu numa política baseada principalmente no estímulo ao consumo. O resultado foi uma combinação de piora das contas fiscais, erosão do balanço de pagamentos, inflação sempre alta e indústria estagnada. Na administração federal, direta e indireta. aparelhamento e loteamento continuam predominando. Vai-se consertar tudo isso com um plebiscito improvisado?
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
domingo, 7 de julho de 2013
sábado, 6 de julho de 2013
Eixo China/Russia contra os EUA - Leslie Gelb (NYT)
OPINION
A New Anti-American Axis?
By LESLIE H. GELB and DIMITRI K. SIMES
The New York Times, July 6, 2013
On his first foreign trip as president of China, Xi Jinping was welcomed to Russia by President Vladimir V. Putin in March.
THE flight of the leaker Edward J. Snowden from Hong Kong to Moscow last month would not have been possible without the cooperation of Russia and China. The two countries’ behavior in the Snowden affair demonstrates their growing assertiveness and their willingness to take action at America’s expense.
Beyond their protection of Mr. Snowden, Chinese-Russian policies toward Syria have paralyzed the United Nations Security Council for two years, preventing joint international action. Chinese hacking of American companies and Russia’s cyberattacks against its neighbors have also caused concern in Washington. While Moscow and Beijing have generally supported international efforts to end Iran’s nuclear weapons program, they clearly were not prepared to go as far as Washington was, and any coordinated shift in their approach could instantly gut America’s policy on the issue and endanger its security and energy interests. To punctuate the new potential for cooperation, China is now carrying out its largest ever joint naval exercises — with Russia.
Russia and China appear to have decided that, to better advance their own interests, they need to knock Washington down a peg or two. Neither probably wants to kick off a new cold war, let alone hot conflicts, and their actions in the case of Mr. Snowden show it. China allowed him into Hong Kong, but gently nudged his departure, while Russia, after some provocative rhetoric, seems to have now softened its tone.
Still, both countries are seeking greater diplomatic clout that they apparently reckon they can acquire only by constraining the United States. And in world affairs, there’s no better way to flex one’s muscles than to visibly diminish the strongest power.
This new approach appears based in part on a sense of their growing strength relative to America and their increasing emphasis on differences over issues like Syria. Both Moscow and Beijing oppose the principle of international action to interfere in a country’s sovereign affairs, much less overthrow a government, as happened in Libya in 2011. After all, that principle could always backfire on them.
They also don’t like watching the West take action against leaders friendly to them, like President Bashar al-Assad of Syria. As this sense of common interests becomes entrenched, increasing Russian-Chinese cooperation could pose grave risks for America and the world.
Their conduct suggests that they see less cost in challenging the United States and fewer rewards for acting as a partner. These calculations stem from two dangerous perceptions.
First, they see American decline and decadence. In their view, the United States is on the wrong side of history, holding on to ties with Europe and parts of Asia, while losing economic leverage and moral authority in the rest of the world. American disengagement from Iraq and Afghanistan without victory contributes to a related impression that America’s unquestioned military superiority isn’t worth much in terms of achieving policy objectives on the ground.
Second, many Russian and Chinese elites consider American foreign policy objectives fundamentally hostile to their vital interests. Neither group views American democracy promotion as reflecting any genuine commitment to freedom; instead, both perceive it as a selective crusade to undermine governments that are hostile to the United States or too powerful for its comfort.
Meanwhile, Russian and Chinese leaders make clear that Washington’s support for their neighbors in practically every dispute involving Beijing or Moscow is less a matter of respect for international law than a form of dual containment that seeks to curtail the regional and global influence of these two major powers.
American backing for Georgia and the former Soviet republics of Central Asia bothers Russia. Likewise, China views American support for Vietnam and the Philippines in their maritime disputes with Beijing as a menace.
No wonder Xi Jinping of China made his first international trip as China’s president to Moscow, where he told his counterpart, Vladimir V. Putin, that Beijing and Moscow should “resolutely support each other in efforts to protect national sovereignty, security and development interests” and promised to “closely coordinate” on regional and international issues. Mr. Putin reciprocated by saying that “the strategic partnership between us is of great importance on both a bilateral and global scale.” While the two leaders’ words may have generated more of an impression of collusion than was necessary, it’s safe to assume they knew exactly the message they were sending.
POLICY makers in Washington must carefully assess the growing chumminess between China and Russia and what it means for America. To ignore it would be foolish.
Yes, China and Russia continue to be divided by a history of mutual distrust as well as by conflicting economic interests and Chinese territorial ambitions. China’s concerns about North Korea exceed Russia’s, and Moscow’s stake in Syria is greater than Beijing’s. And in Central Asia, the two nations are outright competitors. Moreover, China is a rising superpower and Russia is fighting to stay in the big leagues, which gives them different perspectives on world affairs.
That said, both countries share a strong interest in maintaining partnerships with the United States and the European Union, their main trading partners and the custodians of the international financial system, in which each has a major stake. These are powerful reasons for staying on good working terms with Washington, but the United States should not assume that they will halt the new anti-American tack in Beijing and Moscow. That would be a dangerous misreading of history.
Before World War I, many assumed that mutual economic entanglement and the huge costs of war would prevent conflict among key European powers. On the eve of World War II, Communist Russia and Nazi Germany seemed the unlikeliest of allies, until the two-year-long nonaggression treaty known as the Molotov-Ribbentrop pact left Europe in ruins and many millions dead.
President Obama should see China and Russia as neither enemies nor friends, but as significant powers with their own interests, as the Snowden affair showed. Initially, Mr. Obama railed publicly and ineffectually at both, urging them to extradite Mr. Snowden. Only when he softened his public stance and hardened his private line did Beijing and Moscow begin to see the advantages of avoiding further confrontation.
Washington needs to understand that most security threats around the world — from Syria to Iran to North Korea — can’t be managed safely and successfully without Russia’s and China’s cooperation. With respect to Syria, this approach would mean appreciating Moscow’s historical connection to the country’s Alawite leaders as well as Russia’s concern over the fate of Syria’s Christians, especially Orthodox Christians. In dealing with Beijing, it would mean strongly protecting American trade interests while understanding that Chinese leaders face real obstacles in tackling their own domestic economic problems.
To gain the respect of Russia and China, the White House must first demonstrate that American leadership is essential to solving key world problems, including those vital to China and Russia. America can’t be seen as passive.
Relations with Russia and China deserve to be given priority, but the United States mustn’t be afraid to stand firm in some cases or, in others, to partner with these two authoritarian but ultimately pragmatic powers. To do otherwise would be a folly of historic proportions.
Leslie H. Gelb, a former columnist, editor and correspondent for The New York Times, is president emeritus of the Council on Foreign Relations. Dimitri K. Simes is president of the Center for the National Interest and publisher of its magazine, The National Interest.
A New Anti-American Axis?
By LESLIE H. GELB and DIMITRI K. SIMES
The New York Times, July 6, 2013
On his first foreign trip as president of China, Xi Jinping was welcomed to Russia by President Vladimir V. Putin in March.
THE flight of the leaker Edward J. Snowden from Hong Kong to Moscow last month would not have been possible without the cooperation of Russia and China. The two countries’ behavior in the Snowden affair demonstrates their growing assertiveness and their willingness to take action at America’s expense.
Beyond their protection of Mr. Snowden, Chinese-Russian policies toward Syria have paralyzed the United Nations Security Council for two years, preventing joint international action. Chinese hacking of American companies and Russia’s cyberattacks against its neighbors have also caused concern in Washington. While Moscow and Beijing have generally supported international efforts to end Iran’s nuclear weapons program, they clearly were not prepared to go as far as Washington was, and any coordinated shift in their approach could instantly gut America’s policy on the issue and endanger its security and energy interests. To punctuate the new potential for cooperation, China is now carrying out its largest ever joint naval exercises — with Russia.
Russia and China appear to have decided that, to better advance their own interests, they need to knock Washington down a peg or two. Neither probably wants to kick off a new cold war, let alone hot conflicts, and their actions in the case of Mr. Snowden show it. China allowed him into Hong Kong, but gently nudged his departure, while Russia, after some provocative rhetoric, seems to have now softened its tone.
Still, both countries are seeking greater diplomatic clout that they apparently reckon they can acquire only by constraining the United States. And in world affairs, there’s no better way to flex one’s muscles than to visibly diminish the strongest power.
This new approach appears based in part on a sense of their growing strength relative to America and their increasing emphasis on differences over issues like Syria. Both Moscow and Beijing oppose the principle of international action to interfere in a country’s sovereign affairs, much less overthrow a government, as happened in Libya in 2011. After all, that principle could always backfire on them.
They also don’t like watching the West take action against leaders friendly to them, like President Bashar al-Assad of Syria. As this sense of common interests becomes entrenched, increasing Russian-Chinese cooperation could pose grave risks for America and the world.
Their conduct suggests that they see less cost in challenging the United States and fewer rewards for acting as a partner. These calculations stem from two dangerous perceptions.
First, they see American decline and decadence. In their view, the United States is on the wrong side of history, holding on to ties with Europe and parts of Asia, while losing economic leverage and moral authority in the rest of the world. American disengagement from Iraq and Afghanistan without victory contributes to a related impression that America’s unquestioned military superiority isn’t worth much in terms of achieving policy objectives on the ground.
Second, many Russian and Chinese elites consider American foreign policy objectives fundamentally hostile to their vital interests. Neither group views American democracy promotion as reflecting any genuine commitment to freedom; instead, both perceive it as a selective crusade to undermine governments that are hostile to the United States or too powerful for its comfort.
Meanwhile, Russian and Chinese leaders make clear that Washington’s support for their neighbors in practically every dispute involving Beijing or Moscow is less a matter of respect for international law than a form of dual containment that seeks to curtail the regional and global influence of these two major powers.
American backing for Georgia and the former Soviet republics of Central Asia bothers Russia. Likewise, China views American support for Vietnam and the Philippines in their maritime disputes with Beijing as a menace.
No wonder Xi Jinping of China made his first international trip as China’s president to Moscow, where he told his counterpart, Vladimir V. Putin, that Beijing and Moscow should “resolutely support each other in efforts to protect national sovereignty, security and development interests” and promised to “closely coordinate” on regional and international issues. Mr. Putin reciprocated by saying that “the strategic partnership between us is of great importance on both a bilateral and global scale.” While the two leaders’ words may have generated more of an impression of collusion than was necessary, it’s safe to assume they knew exactly the message they were sending.
POLICY makers in Washington must carefully assess the growing chumminess between China and Russia and what it means for America. To ignore it would be foolish.
Yes, China and Russia continue to be divided by a history of mutual distrust as well as by conflicting economic interests and Chinese territorial ambitions. China’s concerns about North Korea exceed Russia’s, and Moscow’s stake in Syria is greater than Beijing’s. And in Central Asia, the two nations are outright competitors. Moreover, China is a rising superpower and Russia is fighting to stay in the big leagues, which gives them different perspectives on world affairs.
That said, both countries share a strong interest in maintaining partnerships with the United States and the European Union, their main trading partners and the custodians of the international financial system, in which each has a major stake. These are powerful reasons for staying on good working terms with Washington, but the United States should not assume that they will halt the new anti-American tack in Beijing and Moscow. That would be a dangerous misreading of history.
Before World War I, many assumed that mutual economic entanglement and the huge costs of war would prevent conflict among key European powers. On the eve of World War II, Communist Russia and Nazi Germany seemed the unlikeliest of allies, until the two-year-long nonaggression treaty known as the Molotov-Ribbentrop pact left Europe in ruins and many millions dead.
President Obama should see China and Russia as neither enemies nor friends, but as significant powers with their own interests, as the Snowden affair showed. Initially, Mr. Obama railed publicly and ineffectually at both, urging them to extradite Mr. Snowden. Only when he softened his public stance and hardened his private line did Beijing and Moscow begin to see the advantages of avoiding further confrontation.
Washington needs to understand that most security threats around the world — from Syria to Iran to North Korea — can’t be managed safely and successfully without Russia’s and China’s cooperation. With respect to Syria, this approach would mean appreciating Moscow’s historical connection to the country’s Alawite leaders as well as Russia’s concern over the fate of Syria’s Christians, especially Orthodox Christians. In dealing with Beijing, it would mean strongly protecting American trade interests while understanding that Chinese leaders face real obstacles in tackling their own domestic economic problems.
To gain the respect of Russia and China, the White House must first demonstrate that American leadership is essential to solving key world problems, including those vital to China and Russia. America can’t be seen as passive.
Relations with Russia and China deserve to be given priority, but the United States mustn’t be afraid to stand firm in some cases or, in others, to partner with these two authoritarian but ultimately pragmatic powers. To do otherwise would be a folly of historic proportions.
Leslie H. Gelb, a former columnist, editor and correspondent for The New York Times, is president emeritus of the Council on Foreign Relations. Dimitri K. Simes is president of the Center for the National Interest and publisher of its magazine, The National Interest.
O Aspone do Aspone companheiro: enfim descoberto
Governo petista de Dilma encontrou até o cargo de chefe de gabinete do chefe de gabinete na estrutura organizacional da Presidência
A má gestão dos governos do PT não se refletem apenas no alto grau de empreguismo da companheirada e tampouco na falta de conhecimento, talento, aptidão e disposição para o trabalho dos nomeados, porque ainda pior é a falta de pudor e o histrionismo dos novos protagonistas da era lulo-petista.
Aí ao lado, você pode examinar um exemplo da falta de senso do ridículo da atual administração federal, que chega ao paroxismo de encontrar o inédito cargo de chefe de gabinete do chefe de gabinete.
Clique ao lado para ver melhor.
(da coluna diária do jornalista Políbio Braga, 5/07/2013)
A má gestão dos governos do PT não se refletem apenas no alto grau de empreguismo da companheirada e tampouco na falta de conhecimento, talento, aptidão e disposição para o trabalho dos nomeados, porque ainda pior é a falta de pudor e o histrionismo dos novos protagonistas da era lulo-petista.
Aí ao lado, você pode examinar um exemplo da falta de senso do ridículo da atual administração federal, que chega ao paroxismo de encontrar o inédito cargo de chefe de gabinete do chefe de gabinete.
Clique ao lado para ver melhor.
(da coluna diária do jornalista Políbio Braga, 5/07/2013)
Pausa para... The Piaui Herald... o blog mais elegante do Brasil
Dilma contrata 30 mil jornalistas cubanos
03/07/2013 15:45 | Categoria: BrasilJornais noticiaram o amplo apoio popular a Aloizio MercandanteGRANMA - Preocupada com a queda de popularidade, a presidenta Dilma Rousseff reuniu a imprensa para anunciar a contratação imediata de 30 mil jornalistas cubanos. "Proporei um plebiscito à Nação, no qual movimentos sociais cooptados poderão se manifestar sobre a propriedade de uma reforma ampla e profunda no Partido da Imprensa Golpista", exaltou-se a mandatária, mordendo um exemplar da revista Veja. E logo emendou: "O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo".
Já à tarde, os articulistas cubanos Reynaldo Azedón, Merbalo Pereyo, Juan Miguel Pondé e Denito Rosenfielde receberam cargos comissionados nos principais meios de comunicação do país.
Numa primeira leitura, Arnaldo Jabor criticou duramente a medida. Depois, voltou atrás, para logo adiante, numa última pirueta, classificar o ato como "um tapa na cara dos babacas pseudo-anarquistas que, cheirosinhos, chafurdam no lamaçal ignoto da sociedade paternal alienada". No início da noite, foi substituído por um cineasta cubano aposentado.
Os jornais amanheceram destacando a liderança carismática de Dilma, a coragem de José Dirceu e o bigode de Mercadante.
Animada com o resultado, Dilma cogitou importar 30 mil vereadores suecos.Leia também
China: the debate over economic policy, from export led to consumer led growth
Blog The Humble Student of the Markets, July 4th, 2013
Stephen Roach recently penned an article entitled "Get Ready for the Next China" outlining the transformation that China is undergoing from an economy led by investment led growth to consumer growth:
The message from this new approach to Chinese macroeconomic stabilization policy is clear: Gone are the days of open-ended hyper growth. Significantly, this message has been reinforced by an important political overlay. Xi’s rather cryptic emphasis on a “mass line” education campaign aimed at addressing problems arising from the “four winds” of formalism, bureaucracy, hedonism and extravagance underscores a new sense of political discipline directed at the Chinese Communist Party. The CCP is being urged to realign itself with the core interests of citizens and their need for fair and stable economic underpinnings.
This new mindset works only if China changes its growth model. A services-led growth dynamic, one of the pillars for a consumer-led Chinese economy, is consistent with a marked downshift in trend GDP growth. That’s because services generate about 30 percent more jobs per unit of Chinese output than do manufacturing and construction – allowing China to hit its all-important labor absorption and social stability goals with economic growth in the 7 to 8 percent range rather than 10 percent as before. Similarly, a more disciplined and market-based allocation of credit tempers the excesses of uneconomic investments, necessary if China is to begin absorbing its surplus saving to spur consumer demand.
He went on to say that this transformation presents a great opportunity for American business:
China’s consumer-led growth presents the United States with an important opportunity. With the American consumer on ice for more than five years – underscored by average annualized growth of just 0.9 percent in inflation-adjusted consumption expenditures since the first quarter of 2008 – the US is in desperate need of a new source of economic growth. China is America’s third largest and most rapidly growing export market. Washington negotiators should push hard on market access, ensuring that US companies and their workers have the opportunity to capitalize on China’s transformation.
Second, and related to the first point, is a potential bonanza in Chinese services. At 43 percent of its GDP, China has the smallest services sector of any major economy in the world. Under reasonable assumptions, the scale of Chinese services could increase by around $12 trillion by 2025. Increasingly tradable in a connected world, the coming explosion in Chinese services could translate into a windfall, up to $6 trillion, for foreign services companies from retail trade and transportation to hotels and finance. For the United States, with the world’s largest and most dynamic services sector, this could be an extraordinary opportunity. US negotiators should push especially hard for access to Chinese services markets.
How do you get from A to B?
In recent years, Stephen Roach has changed from the global bear to the cheerleader for China. In his article, he glosses over the little detail of how China can effect this transformation without a significant slowdown.
Michael Pettis has a different take. He wrote a Foreign Policy article about the credit crunch related convulsions within the context of the transformation from an investment-led to a consumer-led economy and also urged caution by the West in their approach to China:
Last week is a reminder that Beijing is playing a difficult game. The rest of the world should try to understand the stakes, and accommodate China's transition to a more sustainable growth model. As policymakers in China continue to try to restructure the economy away from reliance on massive, debt-fueling investment projects that create little value for the economy, the United States, Europe, and Japan must implement policies that reduce trade pressures. Any additional adverse trade conditions will further jeopardize the stability of China's economy, especially as lower trade surpluses and decreased foreign investment slow money creation by China's central bank. A trade war would clearly be devastating for Beijing's attempt to rebalance its economy and have potentially critical implications for global markets.
Here is his key conclusion [emphasis added]:
Regardless of what happens next, the consensus expectations that China's economy will grow at roughly 7 percent over the next few years can be safely ignored. Growth driven by consumption, instead of trade and investment, is alone sufficient to grow China's GDP by 3 to 4 percent annually. But it is not clear that consumption can be sustained if investment growth levels are sharply reduced. If Beijing can successfully manage the employment consequences of decreased investment growth, perhaps it can keep consumption growing at current levels. But that's a tricky proposition.
In other words, Pettis estimates that the consumer-led Chinese economy can only grow at 3-4%. If the Chinese economy changes the tone of its growth from investment and infrastructure to consumer led growth, the consensus of growth in the 7% range is unrealistic.
In addition, what happens to all the leverage in the system? Who eats the non-performing loan (NPL) losses from all of the infrastructure spending by the SOEs and local governments? In past eras, the Chinese government had taken the brunt of the NPL losses through classic financial repression - through artificially low interest rates that repressed the household sector and blew an property asset bubble.
Now that the Plan is to grow the consumer sector, the old trick of household sector financial repression won't work. In a separate interview with Ron Rimkus of the CFA Institute, Pettis stated:
You can only resolve a bad debt problem by assigning the cost to some sector of the economy. In the past it was the household sector that implicitly paid to clean up the debt, but if we expect rapid growth in household consumption to lead the economy going forward, and this is what rebalancing means in the Chinese context, we cannot also expect the household sector to clean up the bad debt in the same way it has done so over the past decade.
So who pays? In the worst case, it could lead to a disorderly unwinding of the excess leverage in China which, given how the global financial system is inter-connected, spark a global financial crisis.
In addition, Kyle Bass sounded a warning on China (via Zero Hedge) [emphasis added]:
The speed and depth of the Chinese policy response will help determine the severity and duration of this crisis. If the Chinese address the issue quickly and move decisively to rein in credit expansion and accept a period of much lower growth, they may be able to use the government and People’s Bank of China’s balance sheet to cushion the adjustment in the economy. If, however, they continue on the current path and allow this deterioration to reach its natural and logical limit, we will likely see a full scale recession as well as a collapse in asset and real estate prices sometime next year.
Even Stephen Roach sounded an implicit warning of potentially higher interest rates as China transforms itself:
But there is another twist. As China shifts to consumer-led growth, it will start to draw down its surplus saving and current-account surplus. That could lead to a reduction in its vast $3.4 trillion foreign exchange reserves, thereby dampening China’s demand for dollar-based assets. Who will fund a seemingly chronic US saving shortfall – and on what terms – if America’s largest foreign creditor ceases doing so?
China's transformation from investment led growth to consumer led growth is a story of short-term pain for long-term gain. The only questions are:
- When? And
- How much pain?
Cam Hui is a portfolio manager at Qwest Investment Fund Management Ltd. ("Qwest"). This article is prepared by Mr. Hui as an outside business activity. As such, Qwest does not review or approve materials presented herein. The opinions and any recommendations expressed in this blog are those of the author and do not reflect the opinions or recommendations of Qwest.
None of the information or opinions expressed in this blog constitutes a solicitation for the purchase or sale of any security or other instrument. Nothing in this article constitutes investment advice and any recommendations that may be contained herein have not been based upon a consideration of the investment objectives, financial situation or particular needs of any specific recipient. Any purchase or sale activity in any securities or other instrument should be based upon your own analysis and conclusions. Past performance is not indicative of future results. Either Qwest or Mr. Hui may hold or control long or short positions in the securities or instruments mentioned.
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sexta-feira, 5 de julho de 2013
"O projeto do PT e' retrogrado" - Andre Lara Resende
O mal-estar contemporâneo
Por André Lara Resende
Valor Econômico, 5/07/2013
O projeto do PT no governo revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional-desenvolvimentismo.
Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças
O projeto do PT no governo revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional-desenvolvimentismo.
Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças
Na tentativa de interpretar o protesto das ruas nas grandes cidades brasileiras, há uma natural tentação de fazer um paralelo com os movimentos similares nos países avançados, sobretudo da Europa, mas também nos EUA - Occupy Wall Street - assim como com os da chamada Primavera Árabe. As condições objetivas são, contudo, muito distintas. A Primavera Árabe é um fenômeno de países totalitários, onde não há representação democrática. Não é o caso do Brasil. Na Europa, sobretudo nos países mediterrâneos periféricos mais atingidos pelos efeitos da crise financeira de 2008, houve uma drástica piora das condições de vida. O desemprego, especialmente entre os jovens, subiu para níveis dramáticos. Mais uma vez, não é o caso do Brasil.
Nem os críticos mais radicais ousariam argumentar que o Brasil de hoje não se enquadra nos moldes das democracias representativas do século XX. Podem-se culpar os desacertos da política econômica nos últimos seis anos. Embora devam ficar mais evidentes daqui para a frente, os efeitos negativos da incompetência da política econômica só muito recentemente se fizeram sentir. Fato é que, desde a estabilização do processo inflacionário crônico, houve grandes avanços nas condições econômicas de vida dos brasileiros. Nos últimos 20 anos, houve ganho substancial de renda entre os mais pobres. Ao contrário do que ocorreu em outras partes do mundo, até mesmo nos países avançados, a distribuição de renda melhorou. O desemprego está em seu mínimo histórico.
É verdade que a inflação, especialmente a de alimentos, que se faz sentir mais intensamente pelos assalariados, está em alta. Por mais consciente que se seja em relação aos riscos, políticos e econômicos, da inflação, é difícil atribuir à inflação o papel de catalisadora do movimento das ruas nas últimas semanas. Só agora a taxa de inflação superou o teto da banda - excessivamente generosa, é verdade - da meta do Banco Central.
Os dois elementos tradicionais da insatisfação popular - dificuldades econômicas e falta de representação democrática - definitivamente não estão presentes no Brasil de hoje. Inflação, desemprego, autoritarismo e falta de liberdade de expressão não podem ser invocados para explicar a explosão popular. O fenômeno é, portanto, novo. Procurar interpretá-lo de acordo com os cânones do passado parece-me o caminho certo para não o compreender.
O movimento de maio de 1968 na França tem sido lembrado diante das manifestações das últimas semanas. O paralelo se justifica, pois maio de 68 é o paradigma do movimento sem causas claras nem objetivos bem definidos, uma combustão espontânea surpreendente, que ocorre em condições políticas e econômicas relativamente favoráveis. Movimento que, uma vez detonado, canaliza um sentimento de frustração difusa - um "malaise"- com o estado das coisas, com tudo e todos, com a vida em geral.
A novidade mais evidente em relação a maio de 68 na França é a internet e as redes sociais. Embora não tivesse expressão clara na vida pública francesa, a insatisfação difusa poderia ter sido diagnosticada, ao menos entre os universitários parisienses. No Brasil de hoje, a irritação difusa podia ser claramente percebida na internet e nas redes sociais. O movimento pelo passe livre fez com que este mal-estar transbordasse do virtual para a realidade das ruas. Tanto os universitários franceses de 68, quanto os internautas do Brasil de hoje, não representam exatamente o que se poderia chamar de as massas ou o povão, mas funcionam igualmente como sensores e catalisadores de frustrações comuns.
Quais as causas do mal-estar difuso no Brasil de hoje, que transbordou da internet para a realidade e levou a população às ruas?
Parecem ter dois eixos principais. O primeiro, e mais evidente, é uma crise de representação. A sociedade não se reconhece nos poderes constituídos - Executivo, Legislativo e Judiciário - em todas suas esferas. O segundo é que o projeto do Estado brasileiro não corresponde mais aos anseios da população. O projeto do Estado, e não do governo, é importante que se note, pois a questão transcende governos e oposições. Este hiato entre o projeto do Estado e a sociedade explica em grande parte a crise de representação.
O Estado brasileiro mantém-se preso a um projeto cuja formulação é do início da segunda metade do século passado. Um projeto que combina uma rede de proteção social com a industrialização forçada. A rede de proteção social inspirou-se nas reformas das economias capitalistas da Europa, entre as duas Grandes Guerras, reforçadas após a crise dos anos 1930. Foi introduzida no Brasil por Getúlio Vargas, para a organização do mercado de trabalho, baseado no modelo da Itália de Mussolini. A industrialização forçada através da substituição de importações, introduzida por Juscelino Kubitschek nos anos 1950, e reforçada pelo regime militar nos anos 1970, tem raízes mais autóctones. Suas origens intelectuais são o desenvolvimentismo latino-americano dos anos 1950, que defendia a ação direta do Estado, como empresário e planejador, para acelerar a industrialização.
Não nos interessa aqui fazer a análise crítica do projeto desenvolvimentista que, com altos e baixos, aos trancos e barrancos, cumpriu seu papel e levou o país às portas da modernidade neste início de século. Basta ressaltar que o desenvolvimentismo, em seus dois pilares - a industrialização forçada e a rede de proteção social - dependem da capacidade do Estado de extrair recursos da sociedade. Recursos que devem ser utilizados para financiar o investimento público e os benefícios da proteção social.
Diante da baixa taxa de poupança do setor privado e da precariedade da estrutura tributária do Estado, a inflação transferiu os recursos da sociedade para o Estado, até que nos anos 1980 viesse a se tornar completamente disfuncional. Com a inflação estabilizada, a partir do início dos anos 1990, o Estado se reorganizou para arrecadar por via fiscal também os recursos que extraía através do imposto inflacionário. A carga fiscal passou de menos de 15% da renda nacional, no início dos anos 1950, para em torno de 25%, nas décadas de 1970 a 90, até saltar para os atuais 36%, depois da estabilização da inflação. O Brasil tem hoje uma carga tributária comparável, ou mesmo superior, à das economias mais avançadas.
Apesar de extrair da sociedade mais de um terço da renda nacional, o Estado perdeu a capacidade de realizar seu projeto. Não o consegue entregar porque, apesar de arrecadar 36% da renda nacional, investe menos de 7% do que arrecada, ou seja, menos de 3% da renda nacional. Para onde vão os outros 93% dos quase 40% da renda que extrai da sociedade? Parte, para a rede de proteção e assistência social, que se expandiu muito além do mercado de trabalho organizado, mas, sobretudo, para sua própria operação. O Estado brasileiro tornou-se um sorvedouro de recursos, cujo principal objetivo é financiar a si mesmo. Os sinais dessa situação estão tão evidentes, que não é preciso conhecer e analisar os números. O Executivo, com 39 ministérios ausentes e inoperantes; o Legislativo, do qual só se tem más notícias e frustrações; o Judiciário pomposo e exasperadoramente lento.
O Estado foi também incapaz de perceber que seu projeto não corresponde mais ao que deseja a sociedade. O modelo desenvolvimentista do século passado tinha dois pilares. Primeiro, a convicção de que a industrialização era o único caminho para escapar do subdesenvolvimento. Países de economia primário-exportadora nunca poderiam almejar alcançar o estágio de desenvolvimento das economias industrializadas. Segundo, a convicção de que o capitalismo moderno exige a intervenção do Estado em três dimensões: para estabilizar as crises cíclicas das economias de mercado; para prover uma rede de proteção social; e, no caso dos países subdesenvolvidos, para liderar o processo de industrialização acelerada. As duas primeiras dimensões da ação do Estado são parte do consenso formado depois da crise dos anos 1930. A terceira decorre do sucesso do planejamento central soviético em transformar uma economia agrária, semifeudal, numa potência industrial em poucas décadas. A proteção tarifária do mercado interno, com o objetivo de proteger a indústria nascente e promover a substituição de importações, completava o cardápio com um toque de nacionalismo.
O nacional- desenvolvimentismo, fermentado nos anos 1950, teve sua primeira formulação como plano de ação do governo na proposta de Roberto Simonsen. Embora sempre combatido pelos defensores mais radicais do liberalismo econômico, como Eugênio Gudin, autor de famosa polêmica com Roberto Simonsen, e posteriormente por Roberto Campos, foi adotado tanto pela esquerda, como pela direita. Seu período de maior sucesso foi justamente o do "milagre econômico" do regime militar.
Na década de 1980, a inflação se acelera e se torna definitivamente disfuncional. As sucessivas e fracassadas tentativas de estabilização passam a dominar o cenário econômico. Com a estabilização do real, a partir da segunda metade da década de 1990, ainda com algum constrangimento em reconhecer que o nacional-desenvolvimentismo já não fazia sentido num mundo integrado pela globalização, o país parecia estar em busca de novos rumos. A vitória do PT foi, sem dúvida, parte da expressão desse anseio de mudança.
Nos dois primeiros anos do governo Lula, a política econômica foi essencialmente pautada pela necessidade de acalmar os mercados financeiros, sempre conservadores, assustados com a perspectiva de uma virada radical à esquerda. A partir daí, o PT passou a pôr em prática o seu projeto. Um projeto muito diferente do que defendia enquanto oposição. O projeto do PT no governo, frustrando as expectativas dos que esperavam mudanças, muito mais do que o aparente continuísmo dos primeiros anos do governo Lula, revelou-se flagrantemente retrógrado. É essencialmente a volta do nacional-desenvolvimentismo, inspirado no período em este que foi mais bem-sucedido: durante regime militar. A crise internacional de 2008 serviu para que o governo abandonasse o temor de desagradar aos mercados financeiros e, sob pretexto de fazer política macroeconômica anticíclica, promovesse definitivamente a volta do nacional-desenvolvimentismo estatal.
O PT acrescentou dois elementos novos em relação ao projeto nacional-desenvolvimentista do regime militar: a ampliação da rede de proteção social, com o Bolsa Família, e o loteamento do Estado. A ampliação da rede de proteção social se justifica, tanto como uma inciativa capaz de romper o impasse da pobreza absoluta, em que, apesar dos avanços da economia, grande parte da população brasileira se via aprisionada, quanto como forma de manter um mínimo de coerência com seu discurso histórico. Já a lógica por trás do loteamento do Estado é puramente pragmática. Ao contrário do regime militar, que não precisava de alianças difusas, o PT utilizou o loteamento do Estado, em todas suas instâncias, como moeda de troca para compor uma ampla base de sustentação. Sem nenhum pudor ideológico, juntou o sindicalismo de suas raízes com o fisiologismo do que já foi chamado de Centrão, atualmente representado principalmente pelo PMDB, no qual se encontra toda sorte de homens públicos, que, independentemente de suas origens, perderam suas convicções ao longo da estrada e hoje são essencialmente cínicos.
Há ainda um terceiro elemento do projeto de poder do PT. Trata-se da eleição de uma parte do empresariado como aliada estratégica. Tais aliados têm acesso privilegiado ao crédito favorecido dos bancos públicos e, sobretudo, à boa vontade do governo, para crescerem, absorverem empresas em dificuldades, consolidarem suas posições oligopolísticas no mercado interno e se aventurarem internacionalmente como "campeões nacionais".
A combinação de um projeto anacrônico com o loteamento do Estado entre o sindicalismo e o fisiologismo político, ao contrário do pretendido, levou à sobrevalorização cambial e à desindustrialização. Só foi possível sustentar um crescimento econômico medíocre enquanto durou a alta dos preços dos produtos primários, puxados pela demanda da China. A ineficiência do Estado nas suas funções básicas - segurança, infraestrutura, saúde e educação - agravou-se significativamente. Ineficiência realçada pela redução da pobreza absoluta na população, que aumentou a demanda por serviços de qualidade.
A insatisfação difusa dos protestos pode vir a ser catalizadora de uma mudança profunda de rumo, que abra o caminho para um novo desenvolvimento
Loteado e inadimplente em suas funções essenciais, enquanto absorvia parcela cada vez maior da renda nacional para sua própria operação, o Estado passou a ser visto como um ilegítimo expropriador de recursos. Não apenas incapaz de devolver à sociedade o mínimo que dele se espera, mas também um criador de dificuldades. A combinação de uma excessiva regulamentação de todas as esferas da vida, com a truculência e a arrogância de seus agentes, consolidou o estranhamento da sociedade. Em todas as suas esferas, o Estado deixou de ser percebido como um aliado, representativo e prestador de serviço. Passou a ser visto como um insaciável expropriador, cujo único objetivo é criar vantagens para os que dele fazem parte, enquanto impõe dificuldades e cria obrigações para o resto da população. O contraste da realidade com o ufanismo da propaganda oficial só agravou o estranhamento e consolidou o divórcio entre a população e os que deveriam ser seus representantes e servidores.
A insatisfação com a democracia representativa não é um fenômeno exclusivamente brasileiro. As razões dessa insatisfação ainda não estão claras, mas é possível que o modelo de representação democrática, constituído há dois séculos para sociedades menores e mais homogêneas, tenha deixado de cumprir seu papel num mundo interligado de 7 bilhões de pessoas, e precise ser revisto. O debate público deslocou-se das esferas tradicionais da política para a internet e as redes sociais. Ameaçada pelo crescimento da internet e habituada ao seu papel de agente da política tradicional, a mídia não percebeu que o debate havia se deslocado.
No caso brasileiro, perplexa com sua aparente falta de repercussão e pressionada financeiramente pela competição da internet, uma parte da mídia desistiu do jornalismo de interesse público e passou a fazer um jornalismo de puro entretenimento. Mesmo os que resistiram, cederam, em maior ou menor escala, à lógica dos escândalos. Foram incapazes de compreender a razão da sua falta de repercussão, pois não se deram conta de que o público e o debate haviam se deslocado para a internet. Surpreendida pelo movimento de protestos, num primeiro momento, a mídia não foi capaz de avaliar a extensão da insatisfação. Transformou-se ela própria em alvo da irritação popular. Em seguida, aderiu sem convencer, sempre a reboque do debate e da mobilização através da internet. A favor da mídia, diga-se que ninguém foi capaz de captar a insatisfação latente antes da eclosão do movimento das ruas. As pesquisas apontavam, até muito recentemente, grande apoio à presidente da República, considerada praticamente imbatível, até mesmo por seus eventuais adversários nas próximas eleições. Nenhuma liderança soube captar e expressar o mal-estar contemporâneo. Este é provavelmente o seu elemento novo: a internet viabiliza a mobilização antes que surjam as lideranças. Tanto as possibilidades como os riscos são novos.
O projeto nacional-desenvolvimentista combina o consumismo das economias capitalistas avançadas com o produtivismo soviético. Ambos pressupõem que o crescimento material é o objetivo final da atividade humana. Aí está a essência de seu caráter anacrônico. Os avanços da informática permitiram a coleta de um volume extraordinário de evidências sobre a psicologia e os componentes do bem-estar. A relação entre renda e bem-estar só é claramente positiva até um nível relativamente baixo de renda, capaz de atender às necessidades básicas da vida. A partir daí, o aumento do bem-estar está associado ao que se pode chamar de qualidade de vida, cujos elementos fundamentais são o tempo com a família e os amigos, o sentido de comunidade e confiança nos concidadãos, a saúde e a ausência de estresse emocional.
Os estudos da moderna psicologia comprovam aquilo que de uma forma ou de outra, mais ou menos conscientemente, intuímos todos: nossa insaciabilidade de bens materiais advém do fato de que o bem-estar que nos trazem é efêmero. Para manter a sensação de bem-estar, precisamos de mais e novas aquisições. O consumismo material tem elementos parecidos com o do uso de substâncias entorpecentes que causam dependência física e psicológica.
No mundo todo, a população parece já ter intuído a exaustão do modelo consumista do século XX, mas ainda não encontrou nas esferas da política tradicional a capacidade de participar da formulação das alternativas. Apegada a fórmulas feitas, a política continua pautada pelos temas e objetivos de um mundo que não corresponde mais à realidade de hoje. As grandes propostas totalizantes já não fazem sentido. O nacionalismo, a obsessão com o crescimento material, a ênfase no consumo supérfluo, os grandes embates ideológicos, temas que dominaram a política nos últimos dois séculos, perderam importância. Hoje, o que importa são questões concretas, relativas ao cotidiano, questões de eficiência administrativa para garantir a qualidade de vida.
É significativo que os protestos no Brasil tenham começado com a reivindicação do passe livre nos transportes públicos urbanos. A questão da mobilidade nas grandes metrópoles é paradigmática da exaustão do modelo produtivista-consumista. A indústria automobilística foi o pilar da industrialização desenvolvimentista e o automóvel o símbolo supremo da aspiração consumista. O inferno do trânsito nas grandes cidades, que se agrava quanto mais bem-sucedido é o projeto desenvolvimentista, é a expressão máxima da completa inviabilidade de prosseguir sem uma revisão profunda de objetivos. Ao que parece, a sociedade intuiu a falência do projeto do século passado antes que o Estado e aqueles que deveriam representá-la - governo e oposição, Executivo, Legislativo e imprensa - tenham se dado conta de que hoje trabalham com objetivos anacrônicos.
A insatisfação difusa dos protestos pode vir a ser catalizadora de uma mudança profunda de rumo, que abra o caminho para um novo desenvolvimento, não mais baseado exclusivamente no crescimento do consumo material, mas na qualidade de vida. Para isso, é preciso que surjam lideranças capazes de exprimir, formular e executar o novo desenvolvimento.
André Lara Resende é economista. Este texto será apresentado na Festa Literária de Paraty (Flip), em debate com o filósofo Marcos Nobre, que ocorre neste sábado.
A irresponsabilidade fiscal do Tesouro - Mansueto Almeida
Tesouro explica a (ir)responsabilidade fiscal
05/07/2013 por mansueto
Meu repórter favorito em temas fiscais, Ribamar Oliveira, fez uma excelente entrevista hoje no VALOR com o Secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. A conclusão que tiro da entrevista é que o secretario acha normal as sucessivas emissões de divida pública para emprestar ao bancos públicos (BNDES e CEF), como também acha normal que, simultaneamente, o bancos recolham mais dividendos ao Tesouro, pois os bancos não estão sendo capitalizados por meio divida. A expansão da divida é apenas uma simples operação de empréstimo de longo-prazo.
O tom da entrevista deixa muito claro que o secretario acho tudo isso normal e, assim, a tendência desse tipo de operação é continuar. Acontece que o custo desse tipo de operação, mesmo que o governo tente esconder (assunto de outro post) começa a aparecer na rigidez da queda da taxa de juros implícita da Dívida Líquida do Setor Público. Vamos explicar cuidadosamente porque emissões de divida bruta que não afetam a divida liquida do setor púbico é um problema. Vamos assumir que a dívida bruta do setor público seja de R$ 1.000.
Primeiro exemplo: divida bruta igual à divida liquida: Vamos supor que o governo faça uma emissão de R$ 100 para gastar e pague juros de 8% ao ano para levantar o dinheiro no mercado. Apenas com essas operação, a divida bruta e liquida cresceram em R$ 100. Como a divida bruta do governo é igual a líquida e vamos supor por simplicidade que todos os títulos sejam negociados por Selic, os juros total da divida bruta será de: 8% * (R$ 1000+ R$ 100) = R$ 88. Como Divida bruta e liquida são iguais as taxa de juros da divida bruta (Selic) e a taxa de juros implícita da dívida líquida serão iguais.
Segundo exemplo: divida bruta diferente da divida liquida: Vamos supor agora que um certo Secretário do Tesouro tem a seguinte ideia. Por que não aumentamos a divida bruta e emprestamos para nosso banco público estatal para ele subsidiar várias coisas? Assim, não precisaremos colocar a conta dos nossos subsídios no item “equalização de taxa de juros” que é uma despesa primária e, assim reduziria o nosso esforço fiscal (superávit primário). O secretario rapidamente convence todo mundo afinal, ele “quer o bem para o país” e as pessoas não estão preparadas para entender as discussões técnicas.
Assim, o governo faz algo diferente. Faz a mesma emissão de títulos para levantar R$ 100 a um custo Selic de 8% ao ano e, em seguida, empresta para o banco público o valor total a um juros de 4% ao ano. Aqui começa o problema. A dívida bruta neste caso aumenta como no caso anterior em R$ 100. Assim, os juros que incidem sobre a divida bruta com a nova emissão será o mesmo do caso anterior = 8% * (R$ 1000+ R$ 100) = R$ 88.
Mas agora a Divida Liquida não se alterou por que a nova emissão de R$ 100 foi emprestada ao Banco de Desenvolvimento. No entanto, como o governo recebe uma taxa de juros pelo empréstimo ao seu banco de desenvolvimento menor (4% ao ano) do que aquela que paga para levantar recursos no mercado (8%) essa operação tem um custo financeiro que afeta a taxa de juros implícita da Dívida Liquida do Setor Público (DLSP). Neste caso:
Juros sobre a Divida Bruta = 8% * (R$ 1000+ R$ 100) = R$ 88. (a)
Juros que o Tesouro recebe do Banco de Desenvolv. = 4% * (R$ 100) = R$ 4 (b)
Juros Líquidos = (a) – (b) = R$ 84
Aqui começa a complicação. Como a DLSP é a mesma que antes R$ 1.000 (a nova emissão de títulos foi, integralmente, emprestada ao banco de desenvolvimento), antes da emissão os juros sobre a divida bruta e liquida era de 8%*R$ 1.000 = R$ 80. Agora para a mesma DLSP de R$ 1.000, o juros implícitos são de R$ 84 que, dividido pelo estoque da Divida Liquida de R$ 1.000, equivale a uma taxa de 8,4% ao ano que é maior que a taxa de 8% (Selic) que corrige a divida Bruta. Imaginem agora várias operações sucessivas desse tipo como o governo vem fazendo desde 2008.
Terceiro Exemplo: Expansão do modelo e o caso do Brasil. Assim, qualquer operação que não afeta a Dívida Liquida do Setor Público (DLSP) mas que cria um passivo – novas emissões de títulos- que paga uma taxa de juros maior do que aquela que o governo recebe pelo seu ativo-empréstimos p/ seu Banco de Desenvolvimento ou aplicação em reservas- faz com que o custo da Div. Liquida do Setor Público fique elevado e seja pouco sensível à queda da Selic.
No caso do Brasil, como mostro a seguir, essa diferença é gritante porque hoje temos uma DLSP de 35% do PIB e uma divida bruta de 60% do PIB (ou de 68% do PIB pelo critério FMI). O Brasil aumentou muito a diferença entre divida bruta e liquida porque aumentou fortemente o saldo de reservas internacionais e fez várias operações de empréstimo para BNDES e CEF; claro que a grande maioria para BNDES. O resultado dessas operações no custo da dívida que o nosso Secretário do Tesouro Nacional acha normal são os dois gráficos abaixo.
Taxa de Juros SELIC – % ao ano – 2002-2012
Taxa de Juros Implicita da Dívida Líquida do Setor Público – % aa – 2002-2012
Fonte: Banco Central
Apesar de mais de uma década de esforço fiscal com elevado superávit primário, a taxa de juros implícita da DLSP hoje é a mesma de 2002, 15% ao ano, enquanto a Selic no período foi reduzida de 25% para 7% aa. Na minha modesta opinião, uma economia na qual o secretário do Tesouro Nacional acha isso normal é motivo para preocupação. O Brasil vai continuar pagando uma conta monstruosa de juros porque o governo acha normal aumentar a divida para financiar o crescimento – algo que não tem paralelo para países com o nosso nível de desenvolvimento.
Assim, fica difícil acreditar em responsabilidade fiscal de um governo no qual o secretário acredita que o maior endividamento é o “missing link of economic development”. Boa sorte, secretário!
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