quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Pensamento Diplomatico Brasileiro: artigo-apresentacao de Paulo Roberto de Almeida

Um dos artigos mais recentes publicados, reproduzido abaixo: 


1113. “A política externa brasileira, pelos seus principais atores e pensadores”, [Apresentação do livro “Pensamento Diplomático Brasileiro, formuladores e agentes da política externa, 1750-1964” (Brasília: Funag, 2013, 3 vols., p. 1138; ISBN: 978-85-7631-462-2)], Boletim ADB (Ano 20, n. 83, outubro-novembro-dezembro 2013, p. 33-34; ISSN: 0104–8503). Relação de Originais n. 2526.


Prata da Casa - Boletim ADB: 4to. trimestre 2013
Seção Especial sobre obra coletiva da FUNAG

Paulo Roberto de Almeida
Boletim da Associação dos Diplomatas Brasileiros
 (Ano 20, n. 83, outubro-novembro-dezembro 2013, p. 33-34; ISSN: 0104–8503).

A política externa brasileira, pelos seus principais atores e pensadores

José Vicente Pimentel (organizador):
Pensamento Diplomático Brasileiro: Formuladores e Agentes da Política Externa (1750-1964)
(Brasília: FUNAG, 2013, 1138 p. em 3 volumes; ISBN 978-85-7631-462-2)

A Fundação Alexandre de Gusmão, a instituição vinculada ao Itamaraty que mais se aproxima do conceito anglo-saxão de think tank, montou um projeto à altura de suas responsabilidades intelectuais, consistindo numa coletânea de estudos analíticos sobre as ideias e as ações de 26 personagens relevantes das relações internacionais do Brasil, entre diplomatas de carreira, políticos e intelectuais, que moldaram o pensamento e a ação da diplomacia brasileira ao longo de mais de dois séculos. Assinam as colaborações, sob a coordenação do presidente da Funag, quinze diplomatas e treze acadêmicos, todos especialistas nos personagens ou nos períodos enfocados nas três partes da obra.
O ponto de partida da obra antecede a constituição formal do Estado brasileiro, em 1822, já que não se poderia excluir de uma obra de referência a contribuição do chamado “avô da diplomacia brasileira”, o personagem que, aliás, dá o nome à Fundação que se responsabilizou pelo projeto: Alexandre de Gusmão. Ele foi, justamente, o foco do primeiro capítulo substantivo do livro, na parte que tratou das concepções fundadoras da diplomacia brasileira. Essa parte ainda abriga alguns dos “pais fundadores” da nação e do Estado brasileiro, assim como da própria diplomacia: José Bonifácio, seguido de Paulino Soares de Souza, Duarte da Ponte Ribeiro, Francisco Varnhagen, Honório Hermeto Carneiro Leão, o Visconde do Rio Branco e o “mais longevo” secretário geral do ministério, Cabo Frio.
A segunda parte, voltada para a política internacional da Primeira República, tratou de alguns grandes nomes que vieram do Império, mas que engrandeceram a diplomacia republicana, começando por Joaquim Nabuco. O Barão do Rio Branco ocupa papel de destaque nessa fase, mas também seus amigos, e eventuais auxiliares, Ruy Barbosa e Euclides da Cunha, que também cumpriram missões diplomáticas sem serem profissionais do serviço exterior. Dois outros diplomatas, Manoel de Oliveira Lima, também historiador e articulista, e Domício da Gama, completam esse primeiro ciclo republicano. Aqui entrou também o jurista Afrânio de Melo Franco, que iniciou uma carreira diplomática, foi para a política, exerceu diversas missões diplomáticas durante a República Velha – entre elas a frustrada missão de colocar o Brasil no conselho da Liga das Nações – mas que também foi o primeiro chanceler do novo regime, em 1930, e que continuou no início do governo provisório de Getúlio Vargas.
A terceira e última parte cobre toda a era Vargas e a República de 1946, começando pela própria reforma do Estado e a modernização da diplomacia, iniciada sob Afrânio de Melo Franco e continuada por Oswaldo Aranha, o homem que terminou de unificar as carreiras do ministério, e que não só liderou a revolução de 1930, como também manteve firmemente o Brasil no campo democrático durante os tempos sombrios da ascensão do nazi-fascismo e do Estado Novo no Brasil. O nome que primeiro representou a diplomacia multilateral do Brasil foi o de Cyro de Freitas Valle, que teve em sua vertente econômica a importante contribuição de Edmundo Penna Barbosa da Silva, ambos relativamente desconhecidos, hoje, dos mais jovens. Outros nomes que ilustraram tanto a era Vargas quanto o período democrático ulterior foram os do empresário e político José Carlos de Macedo Soares (chanceler nos dois regimes) e o de um militar, o Almirante Álvaro Alberto, bastante identificado tanto com o CNPq quanto com o programa nuclear brasileiro.
O final do período, cobrindo a fase otimista da presidência JK e os anos turbulentos dos governos Jânio Quadros e João Goulart, está representado pelas figuras do sociólogo Hélio Jaguaribe, do historiador José Honório Rodrigues, pelo poeta Augusto Frederico Schmidt, e pelos juristas e políticos Afonso Arinos e San Tiago Dantas. Finalmente, encerra o exame das grandes personalidades, o nome do embaixador Araújo Castro, o último ministro de Goulart e uma das cabeças que continuou a moldar a política externa brasileira nos anos à frente, influente até nossos dias.
Esta obra afirma-se como um dos mais sérios projetos de natureza intelectual implementados pelo Itamaraty. Não apenas uma coleção de biografias sintéticas, com muitas considerações analíticas sobre as ideias e ações dos personagens selecionados, este empreendimento pode ser visto como um exemplo de história intelectual, embora vários personagens tenham atuado mais pela prática do que sob a forma de escritos. Todos eles produziram narrativas sobre como viam e sobre como deveria ser a política externa, nos expedientes de serviço ou nas obras e memórias produzidas. Foram estadistas, na concepção lata da palavra, no sentido em que uma certa ideia do Brasil, geralmente grandiosa, estava sempre presente nesses escritos, a guiar-lhes os passos nas decisões mais relevantes.
Foi essa tradição que o projeto pretendeu resgatar e expor. Com as eventuais limitações que ela possa conter, este livro constitui um esforço pioneiro de identificação e de apresentação das ideias e dos conceitos que balizaram, orientaram ou guiaram a formulação e a execução prática das relações exteriores do Brasil, desde seu alvorecer, enquanto Estado autônomo, até quase o final do segundo terço do século 20; espera-se que ela possa servir de inspiração para outros empreendimentos do gênero ou para a continuidade do mesmo projeto. Referência doravante indispensável para o estudo do pensamento diplomático brasileiro, o projeto de fato merece continuar.

Paulo Roberto de Almeida

 [Hartford, 7/11/2013]

Os três volumes podem ser acessados nestes links respectivos:



A frase da semana, do mes, do ano...

“É assim que essa gente age… como a Máfia, primeiro tentam desqualificar o denunciante, depois, partem para cooptá-lo, por fim, no desespero, partem para coisa pior…” 
Romeu Tuma Jr.
10/12/2013

Books, books, and snow, at last... - fotos de Carmen Licia Palazzo

O inverno chegou, finalmente, com alguma precipitação de neve que deixou várias partes da cidade brancas, como vocês podem constatar por estas fotos de Carmen Lícia.

Nada que nos impedisse de praticar nosso esporte habitual, não exatamente caminhar na neve, mas continuar a enfrentar ventos e marés, tsunamis e tempestades, nevascas e granizo, apenas para frequentar nossos lugares habituais de distração, informação, lazer, divertimento, prazer intelectual, como uma livraria, por exemplo.

Comprei dois livros, um para ouvir no carro, pois já tenho o livro impresso em minha biblioteca: Jared Diamond, Guns, Germs and Steel, que recomendo; o outro para ler por inteiro, depois de já ter lido resenhas sobre ele:
Mark Mazower: Governing the World: The History of an Idea, 1815 to the Present (Penguin, 2012).
Vou mergulhar neste, agora mesmo.
Bye...
Paulo Roberto de Almeida

OMC: acordo de Bali, sucessos e frustracoes - artigos variados

'O principal foi ter acordo, mas ele é modestíssimo', diz ex-embaixador
Renan Carreira
O Estado de S.Paulo, 10/12/2013

'Não resolve nenhum problema importante de acesso aos mercados', afirmou o diretor da Faculdade de Economia da Faap, Rubens Ricupero         

O primeiro acordo comercial global em quase duas décadas está sendo "superestimado", disse, ao Broadcast, o ex-embaixador e diretor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), Rubens Ricupero. "É um acordo modestíssimo, é o mínimo. Não resolve nenhum problema importante de acesso aos mercados", afirmou.
A seguir, os principais trechos da entrevista.

Existe a estimativa de que o acordo de Bali abra o caminho para a injeção de US$ 1 trilhão na economia mundial. Quanto desse valor pode vir ao Brasil?
Existe uma tendência, há muito tempo, de superestimar esses acordos. Esta cifra é, em grande parte, papo furado. O principal foi ter um acordo, qualquer acordo. É algo mais institucional, de salvar a OMC. O acordo é modestíssimo, é o mínimo. Não resolve nenhum problema importante de acesso aos mercados.

Qual é o principal ponto do entendimento para o Brasil?
Pode ser que a administração de cotas agrícolas, que ainda vai depender de muita negociação, ajude. Para o Brasil, o mais concreto é isso. O País é beneficiário em várias cotas. Dizer que vai ganhar muito com acordo de facilitação de comércio é exagero. O Brasil não é exemplo nesse caso. É um dos países mais encrencados em matéria de aduana.

Mas as cotas já não existem?
Existem, mas o que está se tentando com esse acordo é obter uma regulamentação para fazer valer essas cotas. No momento atual, elas são meio facultativas, dependem de conjuntura. O que se quer são regras mais claras para fazer com que funcionem.

O entendimento deve beneficiar mais exportadores ou importadores?
No caso da facilitação do comércio, os beneficiados são os grandes exportadores, como China, Alemanha, EUA, pois torna mais ágil a liberação de produtos. O Brasil também pode ser beneficiado, na medida em que exporta produtos agrícolas. No momento, é mais para exportadores. Para os importadores, é bom para os privados, pois assegura que receberão logo os produtos.

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'É importante. Vai ajudar a recuperar o comércio'
Renan Carreira
O Estado de S.Paulo, 10/12/2013

Ex-embaixador e diretor do Centro de Investigação Laboratório do Século XXI da Faap, o setor manufatureiro brasileiro pode ser um dos grandes beneficiados desse entendimento

Ex-embaixador e diretor do Centro de Investigação Laboratório do Século XXI (LAB XXI) da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), Clodoaldo Hugueney disse ao Broadcast que o primeiro acordo comercial global em quase duas décadas foi importante porque terá impacto na recuperação do comércio mundial e mostra que a OMC está ativa. Segundo ele, o setor manufatureiro brasileiro pode ser um dos grandes beneficiados desse entendimento.
A seguir, os principais trechos da entrevista.

O sr. considera que o acordo de Bali está sendo superestimado?
Essa ideia de que o entendimento é uma propaganda enganosa é errada. O acordo é equilibrado e importante por duas razões: vai ter impacto na recuperação do comércio mundial, já que as economias estão custando a sair da crise, e mostra que a OMC está na jogada, não está sendo descartada.

De que forma o Brasil se beneficia do acordo?
Com o sistema de facilitação do comércio. Onde existem grandes dificuldades na área de facilitação do comércio, em termos de procedimentos aduaneiros, demora na liberação de importação, atrasos, práticas não transparentes? Nos países em desenvolvimento, que são importantes para o Brasil. Na realidade, muito do que está previsto no acordo já é feito no Brasil. Então, a contribuição adicional do País não vai ser muito grande.

Quais setores no Brasil teriam vantagem com o acordo?
Na área de manufaturados, na qual o Brasil tem mercados importantes em outros países em desenvolvimento, o acordo deve ter impacto positivo e isso é relevante porque a exportação de produtos manufaturados vem enfrentando dificuldades crescentes, com a indústria com cada vez menos participação no PIB.

Também há avanços na administração de cotas?
Com certeza. Com o acordo, essas cotas ficam regulamentadas, muito mais transparentes e submetem esse sistema ao Regime de Solução de Controvérsias da OMC. O acordo obtido não é uma coisa trivial nem tem pouca importância. Isto tem pelo menos uns 20 anos de negociação.

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A OMC depois de Bali
RUBENS BARBOSA
O Estado de S.Paulo, 10/12/2013

As grandes e rápidas transformações no cenário internacional, no campo político e econômico, deixaram, de certa maneira, a sua marca nas instituições multilaterais. A Organização Mundial do Comércio (OMC) não foi exceção na crise geral do multilateralismo.
A complexidade das negociações internacionais, a diversidade de interesses entre os 159 países-membros, as dificuldades causadas pelo processo decisório impossibilitaram o avanço real e a conclusão da Rodada Doha. Se a isso for acrescentado o desinteresse dos EUA e da União Europeia em discutir fórmulas multilaterais para perseguir a abertura de mercados e a liberalização comercial, fica explicado o final menos melancólico do que se antevia das negociações dos ministros de Comércio Exterior em Bali, na semana passada.
Apesar das avaliações iniciais positivas, os acordos alcançados - facilitação de comércio, medidas na área agrícola para garantir a segurança alimentar e incentivos a países mais pobres - não são suficientes para salvar a Agenda para o Desenvolvimento, lançada em Doha em 2002, nem para ressuscitar a credibilidade da OMC como fórum de negociações globais.
O limitado resultado de Bali - quase destruído pela ação dos países bolivarianos para acabar com o embargo a Cuba - prolonga a agonia da OMC, que dificilmente conseguirá incorporar uma nova agenda para a liberalização do comércio e a redução do protecionismo, negociada à margem da instituição.
O acordo de facilitação de comércio, que visa a simplificar os procedimentos aduaneiros e a burocracia nas fronteiras, para as importações e exportações - que deve beneficiar mais os países desenvolvidos - será positivo para o setor privado brasileiro, visto que, por ser obrigatório, forçará o governo a tomar medidas concretas de desburocratização, como mencionado em nota do Itamaraty.
A OMC ganhou mandato para tentar em um ano retomar as negociações da Rodada Doha. A Organização terá de passar por um profundo processo de reforma institucional se quiser contar com o apoio efetivo dos países desenvolvidos. O processo decisório consensual, como agora evidenciado, não mais se ajusta ao grande número de países-membros; os princípios do tratamento especial e diferenciado e a impossibilidade de acordos isolados (single undertaking) estão sendo questionados. Acordos parciais plurilaterais, não envolvendo todos os países-membros, como hoje, terão de ser aceitos, inclusive no tocante às regras OMC plus. Esse é o preço que os países em desenvolvimento terão de pagar.
As novas formas de comércio internacional, baseadas na integração das cadeias produtivas globais e de maior valor agregado - agenda da maioria dos acordos bilaterais e dos mega-acordos regionais de comércio -, estão sendo discutidas e negociadas fora da OMC. As regras que regulam esses acordos - investimento, competição, propriedade intelectual, serviços, de origem, compras governamentais - estão sendo discutidas por grupos de países na Ásia, por meio da Parceria Trans-Pacífico, e entre os EUA e a União Europeia. No caso do Acordo Transatlântico, estão sendo examinadas também regras relacionadas com a padronização de bens e serviços. Se e quando esses entendimentos forem concluídos, os produtos agrícolas do Brasil e do Mercosul, que têm na Europa seu maior mercado, passarão a competir com os produtos dos EUA, a maior potência agrícola global, e certamente nossos produtos terão suas exportações reduzidas.
O fim das negociações multilaterais de comércio no âmbito da OMC terá profundas consequências para países como o Brasil. Para se inserir nas novas formas de comércio global, no contexto das cadeias produtivas, o Brasil deverá ter de se ajustar, no futuro, a regras que foram definidas sem a sua participação e que refletem os interesses dos países desenvolvidos.
O Brasil manteve equivocadamente, nos últimos 12 anos, a estratégia de privilegiar as negociações multilaterais no âmbito da OMC, sem se voltar para a necessidade de também negociar acordos de livre-comércio, a exemplo de muitos outros países. O resultado todos conhecemos, em especial os empresários: enquanto estão em discussão mais de 500 acordos, dos quais 354 se encontram em vigor, o Brasil e o Mercosul, à margem desse processo, firmaram apenas três acordos de menor importância comercial, com Israel, Egito e Autoridade Palestina. As reformas que a OMC terá de sofrer para poder retomar a iniciativa nas negociações multilaterais colocarão enormes desafios para o Brasil, que até aqui sempre defendeu a Organização, sem aceitar mudanças em suas regras e seus princípios. O Brasil atuou construtivamente em Bali para salvar a OMC e evitar sua irrelevância, mesmo tendo de abandonar a defesa das concessões em subsídios agrícolas no contexto da Rodada Doha. Como o Brasil reagirá a essas mudanças?
O que acontece no mundo afeta diretamente os interesses do setor produtivo brasileiro. Governo e setor privado deveriam coordenar-se para mudar a atual estratégia de negociação comercial externa, influenciada por considerações políticas e partidárias.
Com a União Europeia, cujas negociações duram mais de 12 anos, o setor privado pressionou o governo a avançar nos entendimentos no âmbito do Mercosul, sem ficar amarrado a considerações ideológicas da Venezuela nem ao atraso da Argentina. O governo finalmente parece ter escutado os empresários e fará proposta para que se iniciem os entendimentos entre Bruxelas e os países-membros do Mercosul que assim o desejarem. Quem não quiser acompanhar o Brasil ficará para trás. Com isso a Argentina deve mudar de posição e acompanhar o Brasil. A Venezuela ficará isolada.
Afinal, ao menos nesse caso, estamos assistindo a mais pragmatismo e menos considerações ideológicas.

PRESIDENTE DO CONSELHO DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP

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O Brasil e o sucesso da OMC
Editorial O Estado de S.Paulo, 10/12/2013

O governo brasileiro tem motivos especiais para festejar o sucesso da conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Bali, na Indonésia. O acordo entre os 159 participantes deu novo fôlego à maior negociação comercial da história, a Rodada Doha, reforçou o prestígio da OMC e foi a primeira vitória do novo diretor-geral da entidade, o brasileiro Roberto Azevêdo. Ruim para todos, o fracasso teria sido um desastre para o Brasil, porque seria mais uma derrota do sistema multilateral. Há dez anos a diplomacia petista pôs de lado os acordos com os países mais desenvolvidos, adotou uma política terceiro-mundista e subordinou a estratégia brasileira a um Mercosul cada vez mais emperrado pelo protecionismo argentino. Ao mesmo tempo, manteve a bandeira do multilateralismo, enquanto no resto do mundo se multiplicavam acordos bilaterais e inter-regionais.
Embora modesto em termos materiais, o pacote de Bali renova as possibilidades do multilateralismo. Mas novos avanços serão trabalhosos e acordos parciais continuarão sendo construídos. Em alguns casos, esses acordos poderão criar referências para a negociação mais ampla. Isso poderá ocorrer, por exemplo, na área de serviços, a partir de entendimentos entre várias grandes economias, incluídas a americana e a chinesa.
O governo brasileiro insistirá num erro perigoso, se continuar fora dos grandes arranjos parciais de comércio. O primeiro passo de uma ação mais eficiente será concluir um acordo com a União Europeia, com ou sem apoio argentino. Os europeus já mostraram disposição de avançar nesse entendimento, mesmo com a participação de apenas alguns países do Mercosul. Caberá à diplomacia brasileira, se for capaz de realismo no âmbito regional, criar uma solução para o impasse no bloco.
Será prudente seguir o mesmo critério nas próximas etapas da Rodada Doha, buscando objetivos ambiciosos e estimulando os parceiros regionais a tomar o mesmo caminho. O pacote de Bali só foi fechado quando o prazo inicial já estourava. Algo parecido havia ocorrido no lançamento da rodada, em 2001, no Catar, quando a negociação se estendeu muito além do tempo previsto. Mas a agenda era imensamente mais complicada e inovadora.
Em Bali, o compromisso mais importante foi sobre a facilitação de comércio - medidas para desburocratizar e simplificar entradas e saídas de mercadorias e dar mais transparência às regras. Ainda assim, será preciso oferecer assistência a alguns países para a realização do trabalho. Muito mais difícil foi o entendimento em torno da pretensão indiana de manter subsídios à formação de estoques de segurança alimentar.
Também foram acertados benefícios para os produtores africanos de algodão e os ministros do mundo rico reafirmaram o compromisso de liquidar em alguns anos os subsídios à exportação. Pacto semelhante havia sido firmado em Hong Kong, em 2005, para cumprimento até o fim deste ano. Mas, com a paralisação da rodada, em 2008, a promessa foi abandonada. Foi combinada em Bali, também, uma discussão de regras para a administração de cotas tarifárias - parcelas nem sempre preenchidas de importação com impostos reduzidos.
Mas a agenda total é muito mais ampla e os negociadores terão um ano para definir o roteiro. De toda forma, destravar a rodada foi uma realização importante. A OMC foi salva da irrelevância. Além do mais, a superação da crise internacional deverá criar um ambiente mais propício a compromissos globais.

Tecnicamente, está reaberto o caminho da modernização do comércio global. Só a facilitação de procedimentos poderá, segundo estimativa muito citada, abrir espaço para mais US$ 1 trilhão de negócios, graças à redução de custos e à simplificação de operações. Mas, para esse passo, foi preciso também vencer a resistência de Cuba, Venezuela, Nicarágua e Bolívia. Seus representantes cobraram o fim do bloqueio comercial dos Estados Unidos a Cuba, ameaçando vetar o acordo e levar a reunião ao fracasso. Acabaram recuando, mas deixaram clara, mais uma vez, a qualidade das alianças ideológicas do governo brasileiro.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Ironias da Historia: por vezes ele faz uma reviravolta...

...  e pega personagens por trás (no bom sentido da palavra...)
Sem outros comentários: 


Por que eles mentem tanto? - a pergunta da semana

Bem, o que posso fazer?
Normalmente, se trata da frase da semana, mas até agora não me deparei com nada de relevante.
Só denegações, só mentiras...

Acho que sei a resposta: é genético, eles nasceram assim, são feitos assim, não conseguem viver sem mentir, sem fraudar, sem trapacear; enfim, eles são isso o que a gente está vendo no noticiário: um imenso mar de... whatever...

Paulo Roberto de Almeida 

Commodities: bye-bye preços altos? - Wall Street Journal

Inovação e investimentos desfazem bolhas globais de commodities


The Wall Street Journal, December 10, 2013

Ningde, China
O preço do níquel, metal usado na fabricação de aço inoxidável para coisas que vão de panelas a cordas de guitarra, disparou em 2007 para mais de US$ 50.000 a tonelada, comparado com menos de US$ 10.000 apenas alguns anos antes.
Como grande parte da produção de níquel é controlada por firmas ocidentais, a alta deixou a pujante economia da China particularmente vulnerável — até que algumas siderúrgicas do país descobriram como produzir um "ferro-gusa de níquel" de menor grau, gerando uma enorme oferta de metal barato.
A inovação derrubou os preços do níquel para menos de US$ 14.000 a tonelada e transformou a China num dos principais produtores do metal no mundo. O país agora produz mais de 400.000 toneladas de ferro-gusa de níquel por ano, o equivalente a 20% da demanda mundial.
Os economistas alertaram por anos que a crescente demanda da China e outros mercados emergentes por recursos naturais superaria a oferta, provocando escassez de bens como níquel, carvão, cobre e milho. Mas um período notável de inovação e investimento produziu um quadro diferente. A expansão da oferta ajudou a moderar os preços das commodities nos últimos doze meses, após dez anos de aumento da demanda da China terem levado muitos preços à estratosfera.
O índice do Fundo Monetário Internacional que reúne todos os preços das commodities caiu cerca de 12% desde picos recentes. Ele tinha quase triplicado entre 2000 e 2011. O preço do cobre recuou 28% desde que atingiu um recorde, em 2011, enquanto o do carvão mineral caiu mais da metade ante seu pico de 2008.
A queda de preços é também resultado de uma demanda mais fraca, especialmente devido à desaceleração da economia chinesa. E os preços de muitas commodities, como o petróleo, permanecem muito acima de sua média de 10 ou 15 anos atrás.
Mas o panorama global da oferta é o melhor em anos. "A escassez sempre induz algum tipo de inovação", diz David Jacks, um professor da Universidade Simon Fraser, no Canadá, que estudou os ciclos de commodities no século passado.
A inovação mais conhecida se deu na indústria petrolífera com o chamado fraturamento hidráulico, ou "fracking", uma técnica de injeção de água e outros materiais em rochas que possibilitou o boom da exploração de petróleo e gás de xisto. Na agricultura, os produtores estão tendo acesso a mais terra arável e usando sementes híbridas que permitem uma produtividade maior.
No setor de mineração, empresas agora usam brocas de diamante para alcançar maiores profundidades. Empresas que misturam produtos químicos com minerais para criar metais desejados hoje extraem mais material do que nunca de depósitos de menor grau de pureza.
E muitos projetos que foram financiados anos atrás — incluindo minas novas ou ampliadas de cobre, prata e níquel — já começaram a produzir.
Com tudo isso, a produção dos principais metais quase dobrou ou triplicou ao longo dos últimos 20 anos, segundo a Agência de Pesquisa Geológica dos Estados Unidos e outras organizações. Entre 2000 e 2012, a produção de alumínio aumentou de 24,7 milhões de toneladas para 45,7 milhões, segundo a consultoria Raw Materials Group, de Estocolmo. A produção de minério de ferro foi de 975 milhões de toneladas para 2 bilhões no período.A produção mundial de milho, por sua vez, aumentou em cerca de 270 milhões de toneladas ao longo dos últimos dez anos, de acordo com a Organização das Nações Unidas.
Todo esse incremento com frequência se dá com custos ambientais, como poluição, desmatamento e contaminação da água por produtos químicos. Ainda não está claro como o mundo poderá sustentar os ganhos na produção de commodities necessários para atender a demanda futura. O consumo per capita de energia e outros recursos na China continua menor que no Ocidente e deve subir à medida que a economia chinesa cresce. Muitas fontes de minerais mais fáceis de explorar foram esgotadas, o que deve aumentar os custos de produção no futuro.
Mas as inovações dos últimos dez anos mostram como os sinais do mercado ajudam a criar nova oferta.
A produção de níquel da China é um dos exemplos mais drásticos dessa nova tendência. No início de 2000, os preços estavam abaixo de US$ 10.000 a tonelada. Aí a economia da China decolou, criando uma nova demanda para o aço inoxidável, que exige níquel e ferro. Os preços do níquel ultrapassaram US$ 51.000 a tonelada em meados de 2007.
A maior parte da produção mundial de níquel na época era dominada por empresas como a Vale, a BHP Billiton Ltd. BHP.AU +0.14% e a MMC Norilsk NickelNILSY +0.36% . E a maior parte do metal vinha dos chamados depósitos de sulfeto em regiões como Canadá e Rússia, onde as minas estavam se esgotando.
Havia uma abundância de depósitos de laterita na Indonésia e outros lugares. Ela podia ser refinada em ferro-gusa de níquel, que contém uma porção relativamente pequena de níquel, geralmente inferior a 15%, misturado com ferro. Mas seu processamento demandava muita energia e era muito poluente.
Analistas calculavam em pelo menos US$ 20.000 o custo de produzir uma tonelada de ferro-gusa de níquel, mais que o dobro do preço de mercado do níquel no início dos anos 2000.
Quando o preço do níquel subiu, a China identificou uma vantagem competitiva: ela ainda tinha dezenas de altos-fornos velhos e ineficientes. Com ajustes, eles poderiam refinar minério laterítico para produzir ferro-gusa de níquel. Com a alta dos preços, o ferro-gusa de níquel se tornou economicamente viável e fornos em toda a costa leste da China foram acionados.
A Tsingshan Holding Group, uma das maiores produtoras de aço inoxidável da China, precisava de muito níquel. Ela começou a testar fornos elétricos rotativos, que usam menos energia do que altos-fornos e podem extrair mais níquel do minério de ferro. O processo deu certo, reduzindo o consumo de eletricidade em até 40%, segundo sua subsidiária em Xangai. A Tsingshan agora produz ferro-gusa de níquel com 11% de níquel, informa a firma, ante 2% ou menos quando usava as velhas técnicas. Ela afirma que hoje recebe cerca de metade do níquel que precisa da sua própria produção de ferro-gusa.
Os avanços da Tsingshan foram replicados em toda a China. Como a tecnologia de ferro-gusa de níquel melhorou, dizem os analistas, o custo de processamento caiu até US$ 12.500 por tonelada.
Isso "certamente destruiu o mundo" do níquel tradicional, disse Jim Lennon, consultor do australiano Macquarie BankMQG.AU +1.22% acrescentando que a oferta poderia voltar a cair no futuro.
Enquanto isso, as mineradoras ocidentais lutam para lidar com a nova disponibilidade do produto no mercado. Analistas estimam que até 40% da indústria de mineração de níquel está perdendo dinheiro hoje.
Ivan Glasenberg, diretor-presidente da Glencore GLNCY +0.50% -Xstrata, quarta maior produtora de níquel do mundo, disse no início do ano que estava pessimista sobre o preço do metal. Em outubro, a empresa anunciou que fecharia uma mina na República Dominicana, por causa da queda dos preços.
(Colaboraram Yue Li e James T. Areddy.)
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Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...