domingo, 3 de janeiro de 2021

O presidente não preside, nem governa, não faz nada; o STF governa, investiga, processa, pune, comanda - J. R. Guzzo, Sérgio Florêncio

 Meu amigo e colega Sérgio Florêncio faz observações corretas sobre o artigo, que também transcrevo abaixo, do jornalista José Roberto Guzzo, com críticas corretas, mas tendenciosas, sobre o ativismo do Judiciário em todas as esferas. 

De fato, o STF exagera, mas apenas porque o Legislativo se exime e o Executivo é comandado por uma ANTA!

Aliás, se fosse só uma Anta, ainda poderíamos levar: mas é um ignorante ativo, metido, arrogante, autoritário, psicopata, perverso.

Paulo Roberto de Almeida

Sérgio Florêncio:

Guzzo critica corretamente erros do STF. Mas o artigo  peca no fundamental. Quando um país não tem governante, as instituições passam a governar. Entretanto, ruim com elas ( STF , Congresso, imprensa) , muito pior sem elas. 

Já pensou se não tivéssemos imprensa? Não teríamos dados sobre infectados e mortos pela COVID. O Ministério da Saude suspendeu o levantamento, hoje feito por um consórcio de jornais.  A Policia Federal teria como Chefe o melhor amigo do grande investigado (Flávio Bolsonaro) . O país ficaria sem vacina para a Covid, porque ela é apenas uma gripezinha. 

O  STF erra muito. Mas porque governa muito. E governa muito porque o Presidente nao governa o país. Só governa sua reeleição em 2022. 

O erro fundamental não está nas instituições- que erram sim, mas evitam a ausência total de governo. 

O erro fundamental  está no Presidente autista, inimigo da ciência e sem qualquer empatia com quase 200 mil mortos pela COVID- o terceiro maior número no mundo!!!!

Sérgio Florêncio, 3/01/2021


Supremo dá as ordens

O Estado de S. Paulo, 3 Janeiro 2021

J. R. Guzzo (jrguzzo43@gmail.com)


Talvez pela ruindade sem limites dos políticos brasileiros, talvez por causa da falência geral de órgãos que vai degenerando cada vez mais a vida pública nacional, talvez porque os poderes Legislativo e Executivo raramente foram habitados por gente tão frouxa quanto hoje, tanto nas ideias como na conduta, ou talvez por tudo isso ao mesmo tempo, o fato é o seguinte: os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram que não há mais ninguém no governo da República, e que cabe a eles mandar no Brasil. Comparando uns com os outros, dá provavelmente na mesma. Mas, com certeza, um país está com problemas sérios de funcionamento quando começa a ser governado “por default”, como se diz hoje. Na falta de outra coisa, entra automaticamente em ação um mecanismo que passa a operar o aparelho por sua própria conta, e sem nenhuma consulta ao usuário.

A dificuldade, no caso, é que o STF está operando mal. Como poderia ser diferente? Os onze ministros não apenas governam o Brasil sem serem eleitos, mas sem terem nenhuma das responsabilidades que vêm junto com a tarefa de governar – e, obviamente, com risco zero de responder pelas consequências das decisões que tomam. Não pode dar certo. Na prática, isso significa que eles mandam em tudo mas não se obrigam a pagar por nada – a começar pelo pagamento propriamente dito das despesas que criam ou ajudam a criar. O STF dá ordens, apenas isso, e só dá ordens sobre o que lhe interessa – o Brasil que se vire para cumprir. É onde estamos.

Não há nenhuma lei que esse novo governo se sinta obrigado a obedecer; quem obedece, em sua visão das coisas, são sempre os outros. Como durante o AI-5, quando o regime deu a si próprio o direito de não submeter à Justiça nenhuma das suas decisões, o STF de hoje não responde a ninguém. Ainda outro dia, e mais uma vez, o ministro Alexandre Moraes prendeu um jornalista no inquérito abertamente ilegal que conduz sem nenhum controle há mais de um ano, como se o STF fosse uma delegacia de polícia da ditadura. O ministro Lewandovski decide o que você tem de fazer, e o que não pode fazer, em todas e quaisquer questões relativas à vacina; deu à sua palavra o status de verdade cientifica.

O ministro Fachin proibiu a polícia de sobrevoar com helicópteros as favelas do Rio de Janeiro, e decidiu que a revista íntima às visitas feitas a presidiários é “inconstitucional” – os visitantes estão liberados para levar drogas aos presos, por exemplo, e não podem ser condenados por isso. O ministro Marco Aurélio solta criminosos condenados a 25 anos. O Supremo decide sobre a nomeação do diretor da Polícia Federal, a eleição das mesas do Congresso e as fases da Lua.

O publico é obrigado, além disso tudo, a ouvir lições de filosofia, de moral e de ciência política dos onze ministros – e ouvir o tempo todo. Todos eles estão convencidos de que têm o direito de pensar por você, e escolher o que é melhor para cada cidadão brasileiro – independente da opinião pessoal que o próprio cidadão possa ter. O último palpite sobre o bem comum foi dado pelo ministro Barroso, um dos que mais se encanta com a própria voz. Segundo ele, “o País” precisa do voto obrigatório; não se deve deixar as pessoas livres para exercerem o direito de votar, pois a seu ver isso leva ao “radicalismo”. E por aí vamos.

Juízes, em qualquer país decente, têm a obrigação de ser imparciais, sobretudo se estão no topo do Poder Judiciário. No Brasil é exatamente o oposto: O STF se transformou num partido político, com militantes, facções internas e todo o resto – um partido que não recebe um único voto. Dá nisso que se vê.

O STF se transformou num partido, com militantes, facções internas e todo o resto.



O Brasil retrocede, rapidamente: 2018 e 2021: exportamos indústrias, e somos chamados de imperialistas

 Em 3 de janeiro de 2018, eu “publicava” a seguinte nota na minha página do Facebook:

Pela definição de imperialismo de Rosa Luxemburgo e de Lênin (que aliás copiaram de Hobson), segundo a qual um país imperialista é um "exportador de capitais", o Brasil já é, desde muito tempo, um país imperialista: 

"70% das novas indústrias no Paraguai vêm do Brasil.

Pois bem, hoje, 3 de janeiro de 2021, fui relembrado disso pelo FB e reproduzi a nota com este comentário inicial:

Creio que deve continuar assim, ou seja, o “imperialista” Brasil “exporta” suas indústrias para o Paraguai, o que é excelente para o vizinho país guarani, que cresce e fica um pouco mais rico (era o de menor renda per capita do Mercosul, não sei se ainda é).

O Brasil se desindustrializa precocemente, seja porque várias dessas indústrias fecham por não serem mais competitivas, em face de importações (ainda que continuemos protecionistas, mas a defasagem não é coberta pela tarifa e outras taxas), seja porque outras se mudam para o Paraguai, para a China, para não desaparecerem justamente. 

A culpa? Não é só da Receita, ainda que esta seja focada exclusivamente na arrecadação, qualquer que seja o estado do paciente. 

Tudo é caro no Brasil: mão de obra, energia, transportes, burocracia, até a corrupção, que saiu da faixa dos milhares para a dos milhões.

O Brasil retrocede? Certamente! Até quando vira “imperialista”.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3/01/2021


Que tal, agora, olharmos a realidade? - Paulo Roberto de Almeida

 Que tal, agora, olharmos a realidade?

Paulo Roberto de Almeida

Algumas constatações simplórias, apenas com base em evidências superficiais, sem qualquer metodologia científica.

Estamos cansados de saber que o personagem principal no cenário nacional nos últimos 24 meses — até bem mais do que isso — tem todas essas características negativas já destacadas inúmeras vezes por comentaristas das diversas mídias: é tosco e grosseiro, é machista, misógino e homofóbico, preconceituoso ao estilo popularesco-ignorante, é politicamente incorreto e faz questão de demonstrar isso, não se importa minimamente em ser brega, não tem nenhuma restrição mental em falar mentiras (aliás, não se preocupa em distinguir entre mentiras e verdades), segue apenas seus instintos naturais (que não são exatamente refinados), tem prazer em contrariar padrões mais sofisticados de conduta (pois considera que assim estaria mais próximo do povão, e de fato está), faz questão de contrariar normas consagradas de conduta, para demonstrar amplamente que é contrário à faixa educada e rica da população, para estar mais próximo das pessoas simples (e confirmar seu status de antissistema e anti-política), utiliza-se de todos os meios admissíveis e até mesmo desonestos para diminuir seus possíveis competidores e/ou adversários, enfim, tem todas as piores qualidades que seriam, em condições normais, não aceitáveis por quem disputa cargos públicos, visando sempre o maior benefício para sí próprio e para os seus (que colaboraram totalmente e sempre com o conjunto de falcatruas que pautaram sua vida pública e suas condutas no plano privado), e ainda assim continua a desfrutar de razoável apoio (até considerável em certas faixas) junto ao seu “povo” e no eleitorado em geral, com destaque para alguns estratos específicos (como os evangélicos, e por isso faz questão de explorar espertamente, e de maneira totalmente hipócrita, tal apoio), e acha (contrariando a maior parte dos analistas políticos) que dessa forma vai garantir sua presença no segundo turno de 2022 e, com isso, uma possível nova vitória eleitoral. 

Sim, ainda que muito disso possa ser pura fabricação e encenação deliberada para fins diretamente políticos, ainda que estes sejam os piores possíveis, parece acreditar que está fazendo, e trazendo, o bem para o Brasil e os brasileiros, pois na sua imensa ignorância natural considera que os perigos maiores do Brasil sejam, ou seriam, o esquerdismo e o progressismo, mas também agita espertamente a ameaça de um “comunismo” que sabe não existir, mas que é conveniente para seus fins explorar como espantalho adequado para certa faixa do eleitorado (os saudosistas da ditadura militar, que também existem aos montões, inclusive entre os militares que precisam se escudar de acusações de condutas impróprias durante aquele período).

No total, e desculpando-me junto a meus leitores pela prolixidade desta exposição, acredito que estejamos, no Brasil em face de um fenômeno — não um movimento, ou de uma doutrina — que dispõe de razoável aceitação popular, mas que corresponde a uma conjuntura específica de nossa história recente: a tremenda decepção da classe média com a corrupção do PT e dos políticos em geral, e o choque real, junto a largas faixas do eleitorado não instruído e de renda mais baixa, com uma enorme reversão de expectativas quanto ao aumento de renda — estimulada de forma artificial e não sustentada — que existia até a grande crise de 2015-16, deterioração não revertida até aqui.

Termino, dizendo simplesmente o seguinte: nós, cidadãos de classe média (que somos os incluídos neste tipo de reflexão e de debate), acadêmicos em geral, jornalistas e  fazedores de opinião em particular, estamos singularmente DISTANTES e não compreendemos as angústias e preocupações da massa da população. 

Não cabem surpresas, portanto, quando se toma conhecimento das pesquisas de popularidade: estamos num universo muito diferente do da maioria do povo. 

Desculpem decepcionar alguns...

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3/01/2021

sábado, 2 de janeiro de 2021

Separando acusações "externas" de características "internas" no caso do capitão - Paulo Roberto de Almeida

 Separando acusações "externas" de características "internas"

Paulo Roberto de Almeida

Vamos abstrair as acusações suspeitas de preconceitos esquerdistas, e vamos até esquecer a pandemia e todo o negacionismo anti-prevenção e anti-vacinal e outros "crimes" derivados do culto ao fascismo, as mentiras da campanha eleitoral, a traição feita a milhões de eleitores, etc.
Vamos julgar apenas o que é permanente, o que é "estrutural" e inerente ao personagem.

Ainda assim, sobram:
1) o elogio a um torturador, o que demonstra uma perversão inaceitável de caráter;
2) a carreira militar medíocre, levada ao terrorismo puro e simples, e ainda assim parcialmente absolvida por uma corte militar complacente e desejosa de afastar "escândalos" públicos;
3) o "lamento" pelo fato de que a ditadura militar "matou pouco", pois deveria ter eliminado mais ou menos "30 mil";
4) o desejo de "fuzilar" FHC por privatizações;
5) o machismo, a homofobia, o desprezo pelos direitos humanos, a ignorância chocante em qualquer assunto de governança, os instintos destrutivos em relação ao meio ambiente;
6) a corrupção evidente em dezenas e dezenas de transações imobiliárias e outras de alto valor, feitas em dinheiro vivo, as rachadinhas e fraudes na administração dos gabinetes, o fato de que os filhos nunca tiveram qualquer contato com trabalho no setor privado, as ligações de todos com laranjas, mas sobretudo com meios milicianos criminosos;
7) o persistente culto da morte, a indiferença pelo sofrimento e até pela vida dos outros, o autoritarismo ao pretender subordinar todos os auxiliares à sua vontade;
8) o uso da instituições públicas para fins particulares, desprezando partidos e programas, fazendo as mais bizarras alianças apenas visando vantagens pessoais, não o bem público.

Tudo isso, de 1 a 8 (e desdobrando) não tem nada a ver com a atual situação de pressão por causa da pandemia, da crise econômica e outras circunstâncias conjunturais. Tudo isso é próprio do personagem, faz parte de sua personalidade, e não seria aceitável em qualquer contexto político, social, HUMANO simplesmente. O personagem é propriamente EXECRÁVEL.
SURPREENDENTE, assim, que pessoas de classe média, que não dependem de favores governamentais, que têm acesso a todo tipo de informação, e até pessoas de classes altas, consigam, a despeito de TUDO O QUE SE SABE, apoiar o execrável.
Confesso que estou chocado.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2/01/2021

Mini-reflexão sobre o que é verdadeiramente estratégico na vida da nação – Paulo Roberto de Almeida

Mini-reflexão sobre o que é verdadeiramente estratégico na vida da nação 

Paulo Roberto de Almeida


Intelectuais e acadêmicos em geral, militares em especial, adoram falar que carecemos de algum “projeto nacional” (qualquer um, desde que seja grande, ambicioso, magnífico, o que normalmente requer dois PIBs, além do que temos).

Para isso, eles apontam a necessidade de algum tipo de “planejamento estratégico”, e nisso eles se esmeram com todo o ardor de suas capacidades, todo o fervor dos verdadeiros crentes na ideologia natural, e obsessional, do Brasil, que é o desenvolvimento nacional (atenção, o “nacional” é extremamente relevante, não pode faltar nesses planos, e o seu conceito implícito já revela todo um universo mental de pré-disposições patrioteiras).

Não importa agora que o chamado “desenvolvimentismo” seja a doença infantil da ideologia do desenvolvimento e que essa doença tenha contaminado boa parte dos líderes políticos civis, militares e proporção razoável dos acadêmicos.


Pois bem, já tem muita gente engajada em suas planilhas e estudos de viabilidade, traçando o futuro da nação com os tais “projetos nacionais” e fazendo os exercícios de “planejamento estratégico” que lhes são coetâneos e indispensáveis. 

No plano institucional, já existe a SAE da PR, que deveria cuidar, pelo menos em teoria, da soberania da nação e da sua defesa contra ameaças externas, o que implica, justamente, algum planejamento estratégico em relações internacionais, em política externa e em áreas específicas de desenvolvimento que aparecem como absolutamente cruciais para o avanço da nação e a construção de seu bem-estar. 

Os nacionalistas militares e os acadêmicos desenvolvimentistas acreditam que isso passa por políticas de defesa, de desenvolvimento industrial e tecnológico, dessas coisas grandiosas e estupidamente caras. Acho que já eles estão ERRADOS! A realização desses projetos ambiciosos custaria duas vezes o PIB que já não temos, pois parece que estamos andando para trás, estagnando, ou pelo menos crescendo de maneira muito lenta, de forma desequilibrada e socialmente injusta.


O caminho passa pela educação universal de qualidade nos dois primeiros ciclos e pela educação técnico-profissional. Ele começa pela professorinha de aldeia, não pelos militares do Forte Apache ou pelos mandarins corporativos da Esplanada dos ministérios, e menos ainda pelos nossos aristocratas de Ancien Régime, que são os altos magistrados e os membros do Judiciário e do Legislativo de forma geral.


Ele também passa pelo fim da corrupção política em TODAS as suas formas. Mas isso já é bem mais difícil de conseguir. 

Uma das coisas mais difíceis de se obter é a de convencer os integrantes de nossa Nomenklatura, entre eles os milicos, que eles estão errados, que eles querem começar a construir a casa pelo teto, pela superestrutura, e não pelas fundações, que é o ensino universal e compulsório de boa qualidade — e, portanto, estatal, o que não significa que tenha de ser pelo Estado central —, o que NUNCA conseguimos fazer no Brasil, desde pelo menos os duzentos anos em que mandamos em nós mesmos.

Um dia chega...


Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 2/01/2021


Mini-reflexão sobre alguns dos impasses de nossa época - Paulo Roberto de Almeida

 Mini-reflexão sobre alguns dos impasses de nossa época 

Paulo Roberto de Almeida


A construção de realidades alternativas é tudo o que pregam alguns sofistas conservadores ou “tradicionalistas” e o que praticam líderes políticos como Modi, Erdogan, Trump, Orban, Bolsonaro. 

É o caminho da estagnação, do retrocesso, da mediocridade, independentemente das reformas e das mudanças que possam ser feitas.

Parece que é também o que escolhemos para o Brasil: sejam bem-vindos ao impasse.

A pergunta que se deve fazer é a seguinte: tal adesão significa a construção de uma sociedade mais justa, mais avançada, socialmente inclusiva, culturalmente sofisticada, plenamente democrátice e respeitadora dos direitos humanos e das liberdades em geral? 

Ou apenas de mais sectarismo, de mais divisão social e política, mais enfrentamentos entre tribos rivais de fundamentalismos desagregadores, de seguimento cego de algum líder salvacionista, geralmente autocrático e propenso a satisfazer desejos primários das massas, em lugar de estimular o crescimento semi-anárquico de todas as iniciativas individuais, na plena liberdade de uma sociedade menos regulada por burocratas estatais, bem mais entregue à livre iniciativa das vontades pessoais?

A despeito da longa frase e das afirmações já explícitas, eu fiz uma pergunta: que nação queremos ser, que tipo de sociedade queremos construir?

Uma de condutores ou de conduzidos?

Uma de cidadãos ou de súditos?

Uma de dependentes do Estado ou de seres livres?

Dependendo das constatações que se façam, pode ser que tenhamos adotado o caminho errado...

Não querendo decepcionar ninguém, despeço-me com uma nota de otimismo: no meio de tanta desgraça atualmente, pode ser que surja alguma luz no fim do túnel. 

Pode não vir naturalmente, pela luz do sol ou pela claridade que se instala depois de algum tempo.

Mas também pode ser porque alguém acendeu alguma luz, ainda que artificial e bruxuleante. Cabe aproveitar mínimas oportunidades e possibilidades.

A flecha do tempo humano nunca está pré-determinada em sua direção. A própria seleção “natural” para a humanidade, neste estágio de seu desenvolvimento, é bem mais cultural do que biológica. 

É o admirável mundo novo, que também é desafiador. Mas cabe olhar para a frente, a despeito de meia dúzia de conservadores regressistas - e anti-iluministas- que querem fazer rodar para trás a roda da história. 


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 2/01/2021


Mini-reflexão sobre a opção pelo declínio - Paulo Roberto de Almeida

 Mini-reflexão sobre a opção pelo declínio

Paulo Roberto de Almeida 

Quando sociedades resolvem se suicidar, elas fazem um pouco como Argentina e Brasil, independentemente que seja pela via da “esquerda” ou da “direita”, o que não tem nenhuma importância nesses casos de nações que resolvem entregar seus destinos respectivos a líderes supostamente salvacionistas que, paradoxalmente, só aprofundam o processo de decadência. 

O Brasil, com características próprias, exibe o mesmo itinerário que conduziu a Argentina a mais de 80 anos de declínio continuo e, o que é pior, evitável mas incontornável: o caminho das não-reformas, o da entrega de seus respectivos destinos a elites medíocres, a preservação da não-educação, do desprezo pela cultura sofisticada, a continuidade da corrupção política e também nos meios empresariais, enfim, a preservação de um ambiente de negócios que é totalmente anti-empreendedor e nefasto para o investimento estrangeiro e para a inserção global. 

Sinto dizer, mas o Brasil é um país totalmente preparado para não crescer, para vegetar na mediocridade imobilista durante certo tempo mais. Quanto tempo? Impossível dizer, mas o suficiente para deixar uma ou duas gerações acostumadas à mediocridade, assim como ocorreu, e ainda ocorre, com a Argentina, e isso independentemente de serem introduzidos sinais exteriores, e superficiais, de “modernidade”.

Na verdade, o Brasil se arrasta letargicamente, há duzentos anos em direção a um futuro medíocre: delongado na extinção do tráfico escravo e da própria escravidão, retardado na construção de um sistema de educação de massas de boa qualidade, nunca fez reforma agrária de verdade, e tampouco empreendeu uma revolução industrial — nossa industrialização se fez aos saltos, oportunistas e descontínuos, sem conexões com cadeias de valor internacionais, o que também é devido a nosso nacionalismo entranhado e ao nosso persistente protecionismo que só serve a empresários rentistas – e nunca soube corrigir as taras sempre presentes do mandonismo e do patrimonialismo.

Como querem, agora, que o Brasil seja uma nação próspera e um país desenvolvido? Vai ser difícil, na ausência de um diagnóstico correto de nossos males e de uma disposição clara para adotar as prescrições adequadas em função da realidade e para empreender as reformas necessárias. Para isso seria preciso ter uma visão clara dos desafios e coragem para superá-los, o que requer estadistas, não líderança medíocres como as que temos atualmente.

Sinto ter de anunciar: bem-vindos a um horizonte de declínio e de conformidade com a estagnação secular. Já aconteceu antes, com outras nações; agora é a nossa vez.


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 2/01/2021


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