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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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sábado, 27 de março de 2021

A irresistível queda do chanceler acidental: uma tentativa de perfil psicológico - Paulo Roberto de Almeida

A irresistível queda do chanceler acidental: uma tentativa de perfil psicológico

  

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivorefletir sobre o estado psicológico do chancelerfinalidadedebate público]

 

 

Desde o início do desgoverno do Bolsovirus (mas ele só se tornou genocida um ano depois), as notícias sobre política externa e diplomacia brasileira que eu sempre recebi pelos Alertas do Google eram invariavelmente negativas, com as poucas exceções da imprensa comprada e daqueles setores ideológicos identificados com a direita burra.

Agora a coisa se tornou avassaladora, não apenas contra a diplomacia, mas contra o próprio chanceler acidental, o capacho preferido da família que desmanda no país, como se pode constatar abaixo

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Ernesto Araujo

Daily update  March 27, 2021

NEWS 

Brazil's Foreign Minister Faces Possible Demission

Folha de S.Paulo

According to interlocutors, Bolsonaro understood that it will be difficult to keep Ernesto on the Esplanade—although he only wants to make the switch ...

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Brazil's Foreign Minister hangs on to his job as pressure for his departure mounts

MercoPress

Tags: COVID-19, Ernesto Araujo, Jair Bolsonaro. Top Comments. Disclaimer & comment rules. No comments for this story. Please log in or register (it's ...

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After meeting with Bolsonaro, Pacheco increases the pressure, says foreign policy 'is always ...

KSU | The Sentinel Newspaper

Senate President Rodrigo Pacheco (DEM-MG) has returned to ask President Jair Bolsonaro for changes in Brazilian foreign policy, which the senator ...


Agora se trata da credibilidade do Itamaraty e da diplomacia profissional, que foram ambas emporcalhadas pela gestão não apenas lamentável do chanceler acidental, mas especialmente desastrosa, terrivelmente catastrófica, para o MRE, para o Brasil e até para a região e o mundo. Nem tudo é culpa dele, claro, pois, como capacho obediente, ele faz, dá continuidade prática, segue caninamente, sabujamente o que lhe mandam fazer ou dizer. É um capacho falante e ambulante, dos mais fiéis para a franja lunática que manda nesse setor no desgoverno do capitão degenerado. 

Acredito que EA deve se sentir desconfortável com essa situação, pois é isso que se vê por suas hesitações – dezenas de "eh...", "hum...", "é...", "ah..." – pelos seus balbuciamentos irracionais e gaguejamentos repetidos, pela incapacidade de formular seu pensamento numa frase simples, obedecendo às regras elementares da língua e da gramática – com sujeito, predicado, verbo e complemento –, e também pelo fato, evidente, de ficar voltando sempre ao mesmo assunto, tentando se justificar, geralmente de forma canhestra. Esse desconforto também se revela na gestualidade, no olhar, na transpiração, naquela busca de algum socorro em papeis dispersos à sua frente, enfim, na confusão mental que só faz se aprofundar com o avanço das acusações, das críticas, das recomendações para demissão ou renúncia.

Conheço pouco esse personagem ímpar da carreira diplomática – ele não tem precedentes, é absolutamente inédito –, só tendo resenhado uma obra da qual ele participou nos anos 1990, ainda jovem secretário, e não posso dizer que eu partilhe de sua estima, sequer convivência ou qualquer outro gesto de aproximação: somos tão distantes quanto podem ser Mercúrio e Plutão, e não creio que jamais voltaremos a falar novamente: ele tem ódio de mim, pelas críticas que fiz ainda antes de sua assunção (já antecipando o desastre que seria) e sobretudo depois dos desastres evidenciados desde sua posse, com o discurso mais alucinado que se ouviu no Itamaraty. 

Não gostaria de estar nos seus sapatos, e na verdade nunca estaria, não só no desgoverno fanático do capitão degenerado, mas em qualquer outro governo também. Não sou apegado a cargos, só a livros, e não aspiro a servir o poder, apenas observá-lo, com toda a liberdade para avaliar suas obras e criticar no que for preciso. Eu era completamente indiferente ao que ele pudesse pensar, até que, num convite que fiz, quando diretor do IPRI-MRE, em 2017, para que ele comentasse questões atinentes à política comercial do governo Trump, eu o vi retirar um maço de papeis no bolso e começar a desfilar a sua litania sobre Trump como “salvador do Ocidente”. Era inconveniente e não tinha nada a ver com a palestra do convidado americano, um professor da George Washington, e não servia aos propósitos para os quais eu o havia convidado, ou seja, debater sobre o tema para introduzir a sessão de perguntas e respostas posteriormente, como encarregado do Departamento que cuidava da América do Norte (agora existe um, que ele criou, exclusivamente para os EUA, com duas divisões, por mais louco que possa parecer).

Mas, não cortei sua palavra e deixei-o falar por tempo quase equivalente ao do palestrante convidado. Eu apenas "desliguei", e fiquei escrevendo em meu computador ou em algum Moleskine, que sempre trago comigo. Muito posteriormente soube que ele tinha dito verdadeiros absurdos, tanto que uma das perguntas sobre os "conspiradores do globalismo" (Google, Facebook, Amazon) lhe tinha sido dirigida, e não ao palestrante, o que me surpreendeu. Quando EA confirmou que pensava aquilo mesmo, ouviu-se aquele zumbido na audiência, e alguns risos sardônicos. Mais, passons... 

Depois, recebi um artigo inteiro para publicar na revista da qual eu era editor, os Cadernos de Política Exterior. A despeito do assunto não ser exatamente enquadrável na temática da revista, pois era o depois tristemente famoso “Trump e o Ocidente”, não me opus a que ele fosse publicado na revista: achei simplesmente que ninguém prestaria muita atenção naquela peça absurda e também muito ridícula.

Mas, só vim a saber muito depois, só após que ele tivesse sido escolhido para ser o chanceler da “diplomacia sem ideologia”, que EA havia retirado vários exemplares da revista com esse seu artigo e levado pelas mãos de Nestor Forster, então ministro-conselheiro na embaixada em Washington, a uma visita ao guru da extrema-direita no Brasil, aquele guru presidencial, sofista expatriado na Virgínia, que eu chamo de Rasputin de Subúrbio (embora reconhecendo que ele tem 10% de artigos razoáveis, sendo o resto material dispensável ou lixo completo). 

Foi aí que eu percebi que EA, de forma dissimulada e clandestina, tinha preparado desde muito tempo antes sua ascensão ao cargo, juntando-se à tropa de meliantes políticos que manipulou redes sociais, mobilizou apoios no submundo dos saudosistas da ditadura militar, conquistou franjas lunáticas e fanáticas do eleitorado e tratou de enganar liberais, empresários, classe média e todos aqueles que tinham ficado horrorizados com a extensão da corrupção mafiosa do PT.

Fiquei aliviado quando fui exonerado do IPRI, pois eu me sentiria extremamente mal se continuasse a servir o bando de aloprados do desgoverno. Até demorou: foi só no Carnaval de 2019 (3 de março), quando eu estava esperando já no dia 2 de janeiro. Deve ter sido porque não tinham ninguém para colocar no meu lugar. Mas, me proibiram de fazer qualquer coisa desde o dia 1/01/2019, ou seja, eu não poderia implementar NENHUM dos programas legalmente aprovados pela Funag em dezembro de 2018: tudo congelado e assim ficou por muito tempo, bem como interromperam, desmantelaram, eliminaram diversos projetos que eu mantive de forma regular de agosto de 2016 ao final de 2018 (o último evento, em dezembro, e corri extraordinariamente para que ficassem prontos, foram os dois volumes com os textos do ex-ministro Celso Lafer sobre relações internacionais). 

As surpresas do novo regime não se fizeram esperar, e começou logo no dia 2/01, com o extraordinário, patético discurso de posse do chanceler acidental: não foi um policy statement de política externa e sim um manifesto às imbecilidades da nova direita, ainda que enfeitadas por referências eruditas e alguma com ar de popularidade. Mas já em novembro e dezembro de 2018, o patético serviçal do novo regime começou a atacar seus colegas diplomatas, nos acusando de termos sido convivente com a esquerdalha dos governos anteriores, com o marxismo cultural, com o comunismo mundial, de sermos alienados em relação a uma "política externa para o povo" e um aglomerado de outras bobagens que devem ter chocado todos os diplomatas, e até o corpo diplomático estrangeiro. 

Não faltaram, claro, os adesistas, os cúmplices, os oportunistas na carreira que começaram a elogiá-lo (pela "inteligência"), e correram atrás daquelas coisas que os medíocres sempre sabem fazer: promoção, boas remoções, boas chefias, distinção, a glória de fazer parte do inner circle (mas são poucos, menos do que uma dúzia, com o resto da Casa permanecendo silente, submissa, acovardada). 

A coisa toda continuou se agravando pelas semanas e meses seguintes, numa sequência de absurdos que estão todos refletidos nos quatro livros que já produzi desde que esse bando de loucos, dirigidos de forma canhestra pelo chanceler capacho, começou a DESTRUIR a diplomacia brasileira e DESMANTELAR a política externa: Miséria da Diplomacia (2019), O Itamaraty num labirinto de sombras e Uma certa ideia do Itamaraty (ambos de 2020), seguidos agora por este que estou publicando: Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira (2021, em revisão editorial).

Foi sofrível, por exemplo, ver pelo YouTube do MRE, o chanceler acidental dar uma “aula magna” (mínima, na verdade), em sala fechada do Instituto Rio Branco, quando o normal fosse que isso se fizesse em auditório aberto a todo o corpo diplomático. Foi um sofrimento assistir, e imagino que os estudantes tenham sofrido ainda mais. Eventos como esse, com tiradas subfilosóficas atiradas contra políticos, empresários e jornalistas, passaram a ser um exercício contínuo de constrangimentos gerais.

O que pode estar na origem das loucuras atuais? 

Existe a parte objetiva, ou externa ao EA, que se refere à loucura geral dos Bolsonaros e dos fanáticos que apoiam sua postura destrambelhada no plano externo, e disso não se pode acusar o patético serviçal capacho que se aproximou deles, que pode sim, ser acusado de se aliar e de servir, caninamente a esse bando de aloprados. 

E existe o componente pessoal, intelectual, psicológico, doentio, próprio a EA, que interpreto como sendo o resultado de um profundo desconforto dele, sendo um reacionário sincero, um fundamentalista religioso legítimo, ao ter de conviver com um Itamaraty progressista e alguns governos até esquerdistas, quando não laicos e “abortistas”, entre eles marxistas, comunistas, anarquistas e até contrarianistas, como este que aqui escreve.

EA deve ter atravessado 30 anos de progressismo e de esquerdismo na diplomacia profundamente angustiado, com todos aqueles ateus esquerdosos mandando na diplomacia do seu Brasil cristão e profundamente conservador. Deve ter sido um sofrimento ficar no armário durante tanto tempo, e até fingindo que concordava com todas aquelas coisas horrorosas, toda aquela conivência com ditaduras comunistas e convivência com gramscianos da academia, todos eles comprometidos com uma visão do mundo, uma Weltanschauung como ele diria, profundamente contrária a tudo o que ele defende.

Mas, atenção, EA é um sujeito preparado, até culto em suas leituras e reflexões, mesmo partilhando, legitimamente a meu ver, de uma visão do mundo distorcida pelos instintos direitistas e carolas que herdou do pai e dos intelectuais da direita. Imagino que deva ter sido um enorme sofrimento para ele ter de se rebaixar ao nível do capitão degenerado e ignorante, do 03 totalmente despreparado para qualquer assunto de política internacional, ter de se submeter a ordens, instruções e diretivas que ele sabia, OBJETIVAMENTE, que eram contrárias não apenas com uma prática diplomática NORMAL, mas também contra o BOM SENSO e a racionalidade.

Imagino que todo esse sofrimento interior, ao ter de decorar com palavras bonitas, com referências intelectuais, o besteirol crasso que emergia desse bando de idiotas deva ter atuado em seu intelecto, deixando em tremenda confusão interior, o que se refletia inteiramente em sua gestualidade angustiante. 

Mas, uma parte do horror a que assistimos durante todos esses meses também refletiu o seu desequilíbrio mental, suas angústias existenciais, sua confusão verbal, suas incertezas intelectuais, justamente quando precisava aderir ao horror produzido pelo capitão ignorante e grosseiro e ainda ter de gritar "MITO! MITO! MITO!", de forma até descontrolada e aparentemente entusiasta. Confesso que foi novamente sofrível, para mim, assistir a um colega até preparado intelectualmente, protagonizar aquelas cenas degradantes, não só para a inteligência de pessoas normais, mas ofensivas para diplomatas profissionais. 

Imagino, novamente, que tudo isso foi se acumulando nessa mente perturbada, mas fazendo com que EA insistisse nas demonstrações de sabujismo exemplar, mesmo tendo consciência de que estava prejudicando o Brasil, a diplomacia, a sua própria carreira profissional e seu status pessoal. Uma degradação dessas não passa impunemente na vida de qualquer quadro especializado, qualquer mandarim do Estado de uma das corporações mais preparadas da burocracia federal. 

EA sabe que deu um passo em falso, que se atirou na cova dos leões, que começou a andar na beira do precipício, mas agora já era tarde e, em lugar de honestamente renunciar, ele insistiu em ficar, e em aprofundar a sua indignidade e covardia, sua extrema submissão a um bando de parvos, de ignorantes, de fanáticos reacionários, uma tropa de energúmenos que está destruindo o Brasil.

Ele foi muito longe, e agora terá de pagar um pesado preço por isso, que não é nem uma degradação ou expulsão da carreira: apenas o DESPREZO dos colegas!

Não o desprezo, pois sei que se trata de pessoa preparada intelectualmente e eu valorizo muito o debate de ideias. Até me permiti comentar seu patético artigo “Trump e o Ocidente” em meu primeiro livro do ciclo: Miséria da diplomacia, tentando mostrar onde estavam os erros. Ele respondeu com raiva, até com ódio, mandando cortar todo o meu salário de janeiro de 2020, me cobrando mais R$ 23 mil por supostas “horas não trabalhadas”, e iniciando um processo por “faltas injustificadas” (em algumas, eu até estava com ele em cerimônias na Defesa), que deveria, se não fosse a pandemia, levar à minha demissão sumária, por causa justificada, e à expulsão do serviço público sem NENHUM direito. Esse é o EA vingativo e intolerante, talvez nesse caso pressionado pelo bando de fanáticos que o tem no laço e o obriga a tomar atitudes contra os “inimigos” do desgoverno. 

Eu teria muito mais coisas a dizer do lado “psicológico” do chanceler acidental, pois todo o seu desequilíbrio é absolutamente transparente, mas não tenho qualificação técnica para fazê-lo. Só posso lamentar pelo Itamaraty e pelo Brasil, o fato de termos tido, neste desgoverno, o PIOR CHANCELER de todos os tempos, em qualquer época, em qualquer lugar, de qualquer diplomacia que se possa pensar. EA não tem precedentes na história do Itamaraty, nem terá sucessores. Podemos até ter pessoas medíocres, enquanto durar o desgoverno do capitão, novamente a envergonhar a nossa diplomacia, mas acredito que capacho desequilibrado como EA nunca mais.

Eis meu depoimento, sincero, aberto, franco, sobre o patético chanceler acidental, anum momento em que todos pedem a sua saída, e ainda quando o capitão teimoso insistirá em mantê-lo. Eu entendo: ninguém conseguiria ser tão capacho quanto foi EA, ninguém aceitaria se diminuir tanto ao nível de ignorância crassa da Bolsofamiglia, ninguém conseguiria suportar durante tanto tempo tantas humilhações acumuladas e aceitas com tanta disposição para o auto-rebaixamento. É difícil chegar a esse nível de indignidade pessoal, e por isso vai aqui até um gesto de solidariedade compassiva com quem suportou tão humildemente a escória com que lhe obrigavam a conviver. 

Vai também um RIP ritual, para que ele descanse em paz em algum posto secundário, talvez até nos Arquivos, onde ele me lotou com raiva, unicamente para me humilhar. Aliás, tenho de agradecer: a impossibilidade de trabalhar em algo útil para o ministério e para o Brasil me deu lazer suficiente para escrever quatro livros, incontáveis artigos, muitas notas, sobre o horror do governo a que ele serviu com orgulho, mas imagino também que com enorme DESCONFORTO.

Vá em paz EA, retire-se aos seus livros e observe o desastre que vocês fizeram no Brasil, que você faz na imagem internacional do nosso país e da nossa diplomacia.

Adeus!

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3879, 27 de março de 2021

 

O Cronista Misterioso já decretou: “A moléstia brasileira tem um nome: o Bolsonarismo.” - Tem Vacina para esse mal horrível?

 47 Moléstia Brasileira (semana 47)

 

 

[Nota PRA: O Cronista Misterioso já decretou: “A moléstia brasileira tem um nome: o Bolsonarismo.” Ele acha que essa grave doença nos infectou em outubro de 2018 e segue contaminando todo mundo. O Brasil não tem salvação se não eliminar essa doença terrível, que invade o cérebro, paralisa o pensamento e torna os contaminados como que abestalhados. Ele não tratou da questão de uma vacina para esse mal, mas eu acho que o Bolsovirus precisa ser eliminado completamente, erradicado totalmente, extirpado da vida da nação, como a varíola.]

 

 

O Brasil está doente. Não me refiro aqui apenas à óbvia destruição que o covid vem nos causando. A moléstia brasileira não é a causadora da pandemia, mas é, ao menos, sua agravadora. Trata-se de uma doença da alma, da política e da sociedade. Algo que deixamos que nos dominasse sem que pudéssemos lutar contra. Obviamente houve alertas e houve aqueles que buscaram tratamentos de conscientização da população, mas, mesmo assim, a maioria foi contaminada em outubro de 2018 e acabou por os infectar a todos. Agora, todos pagamos o preço.

 

Temos dois ministros da saúde que, em tempos normais, deveriam nos auxiliar a combater todas as moléstias que afligem essa pátria, já tão exaurida de por percalços históricos. Contudo, o ministro demissionário é um lambe-botas incompetente e cúmplice do excelentíssimo senhor genocida da República e o futuro ministro é mais um assecla acéfalo do bolsonarismo tacanho. E mais, Queiroga já prometeu que seguirá todas as ordens do poderoso chefinho, bem como irá pessoalmente a hospitais investigar se as pessoas estão realmente morrendo de covid ou se seria mais um complô do comunismo internacional.

 

Eu me daria por aliviado se esses fossem os únicos problemas no horizonte, mas não, o “terra a vista” desta nau infectada ainda está muito longe. Uma odisseia própria ainda nos aguarda. Nesse meio tempo, ainda temos que lidar com os efeitos colaterais da moléstia brasileira. 

 

Mais do que os quase 300 mil que já perderam suas vidas, somos obrigados a ver os militares se recusando a oferecer leitos para covid em seus hospitais. É tamanho o grau de canalhice desses estrupícios que, além de defenderem o genocídio bolsonarista e de emitirem notinhas repugnantes onde fazem ameaças pouco veladas de que podem fazer um golpe a qualquer momento, ainda se recusam a ceder seus leitos ociosos para a salvar a vida da população (isso não sou eu quem diz, são, sim, as investigações do TCU). Peço perdão pela digressão, mas absurdos como esse me tiram do prumo…

 

Somos obrigados a ver Bolsonaro recorrendo ao STF para barrar acertadas políticas de lockdown postas em prática pelos governadores. Somos obrigados a ver, vez após vez, a redução das previsões de vacina que serão oferecidas. Somos obrigados a ver a defesa desenvergonhada do absurdo. Somos obrigados a ver os mortos tombando pelas filas de UTIs…   

 

A moléstia brasileira tem um nome: o Bolsonarismo. Resta saber se ela nos consumirá até os ossos ou se tomaremos o antídoto de razão que expurgará este facínora.

 

Ministro Ereto da Brocha, OMBUDSMAN

Atenção: as novelas vão salvar o Brasil: pelo menos é o que espera o Cronista Misterioso do Itamaraty: ele gosta de novelas...

 46 Deus nos Acuda (semana 46)

 

[Nota PRA: Nosso Cronista Misterioso tem uma cultura enciclopédica, que atinge vários campos do conhecimento humano, material, vegetal e animal, e até literário, da mais refinada literatura às novelas da TV. Aqui ele se socorre de uma dessas novelas dos velhos tempos, “Deus nos Acuda”, para sinalizar que o Brasil já não tem mais salvação a não ser com alguma intervenção divina, a menos que a população se levante contra o degenerado, ou seja, o inominável dirigente do qual eu não digo o nome, mas o considero Genocida (agora pode; o STF disse que tempos liberdade para xingar o sujeitinho). Novelas, como vocês sabem, são coisas extremamente poderosas no Brasil, capazes até mudar a realidade do mundo lá fora, provocar golpes de Estado, assassinatos, sei lá; eu, por exemplo, estou bastante convencido de que, muito mais do que a pílula anticoncepcional, foram as novelas as principais responsáveis pela transição demográfica no Brasil, provocando baixas significativas nas taxas de fertilidade, de natalidade, e quem sabe até de mortalidade. Chute meu, claro...] 

 

 

Quem me conhece sabe que eu sou um convicto e desenvergonhado admirador da teledramaturgia brasileira. Não se trata de uma “confissão” que faço encalistrado, pois as telenovelas são a mais típica forma de expressão audiovisual brasileira, são a nossa verdadeira Hollywood. Traduzem nossos anseios e desesperos, nossas esperanças e paixões e nossa mais pura brasilidade, em todas as suas qualidades e defeitos. 

 

Já falei nestas crônicas de algumas obras indiscutíveis de Dias Gomes, mas hoje me veio à mente uma novela que acompanhei em uma das minhas encarnações em Brasília, no início dos anos 90, e que acredito ser estranhamente atual. Eram os anos do Governo Collor (1990-1992), do confisco da poupança, da hiperinflação galopante, do desespero. Mas também foram os anos do Impeachment e do início do governo de reconstrução de Itamar (1992-1995), da esperança. Em 1992, entre mais um escândalo e os passos rumo ao impedimento de Collor — a quem ainda nutro rancor, embora incomparavelmente menor ao desprezo que nutro pelo calhorda Bolsonaro —, Silvio de Abreu trouxe à tela “Deus nos Acuda” (1992-1993).

 

Na novela, Deus está preocupado com o tamanho do cataclisma em que se enfiou o Brasil ao longo das décadas que foi supervisionado pela Anja Celestina, Dercy Gonçalves. Ante o desleixo de Celestina, Deus faz um ultimato à Anja, ou arruma o país ou será condenada à mortalidade e, pior, uma mortalidade de aposentada brasileira. Desesperada com o prospecto, sem seguridade social nem acesso à saúde, Celestina passa a interferir na vida dos brasileiros e tenta salvar o país do lodaçal. Havia quem dizia à época que fora Deus, Sarney e até o PT quem acelerara o Impeachment, mas eu creio que foi Celestina 

 

Além da Anja, a trama contou com um divertidíssimo personagem arquetípico que emulava as mazelas socioeconômicas do país, símbolo dos erros que nos trouxeram até aqui. Aqui não, até lá no governo Collor (acho que as similaridades podem ter me confundido). Brasílio da Silva, o Brasil, interpretado por Jorge Fernando, também diretor da novela, era um bêbado que vivia largado nas mesas das boates e que sempre era hostilizado pelos outros personagens, os brasileiros.

 

Os brasileiros, em catarse épica,  gritavam  “Levanta, Brasil!” E diziam que Brasil era um preguiçoso e uma vergonha para seus filhos que, há muito, fugiam para outros países por vergonha do pai. Barbudo, sujo, bêbado e com roupas que emulam as cores da seleção brasileira (em notável semelhança com a atualidade), Brasil era a visão que tínhamos daquele país.

 

Muito tempo se passou e o orgulho de ser brasileiro foi sendo lentamente reconstruído depois dos 21 de ditadura militar e dos 7 anos e meio de governos Sarney e Collor. Aquela novela já não deveria fazer mais nenhum sentido depois de quase 30 anos de sua estreia, mas aparentemente faz. Vamos reconstruir, disso tenho certeza, mas quanto tempo hemos de demorar? Não sei, mas sei que demoraremos tanto mais quanto deixarmos Bolsonaro agir livre e desimpedido. 

 

Levanta, Brasil!

 

Ministro Ereto da Brocha, OMBUDSMAN

sexta-feira, 26 de março de 2021

Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira - meu próximo livro está pronto, só falta publicar - Paulo Roberto de Almeida

 Apogeu e demolição da política externa

 itinerários da diplomacia brasileira 

 

Índice

(26 de março de 2021)

 

 

Uma história sincera do Itamaraty?

 

Primeira Parte: História

 

1. Relações internacionais do Brasil: uma síntese historiográfica

1.1. A historiografia: uma quase esquecida na história das ideias

1.2. A historiografia brasileira das relações exteriores: principais historiadores

1.3. Varnhagen, o pai da historiografia, o legitimista da corte

1.4. João Ribeiro inaugura a era dos manuais de história do Brasil

1.5. Oliveira Lima: o maior dos historiadores diplomatas

1.6. Pandiá Calógeras: o início da sistematização da história diplomática

1.7. Interregno diversificado: trabalhos da primeira metade do século XX

1.8. Os manuais didáticos de história diplomática: Vianna, Delgado e Rodrigues

1.9. O ideal desenvolvimentista: Amado Cervo e Clodoaldo Bueno

1.10. A diplomacia na construção da nação: Rubens Ricupero

1.11. A historiografia brasileira das relações internacionais: questões pendentes

 

2. As relações internacionais do Brasil em perspectiva histórica

2.1. Padrões e tendências das relações internacionais do Brasil

2.2. Etapas das relações internacionais do Brasil

       2.2.1. O Império: a construção da nação e as bases da diplomacia

       2.2.2. A Velha República: os mitos e as deficiências da política externa

       2.2.3. A era Vargas: escolhas estratégicas, a despeito de tudo

       2.2.4. O regime militar: consolidação do corporatismo diplomático

2.3. A redemocratização e as relações exteriores do Brasil

       2.3.1. Uma periodização diplomática para o período contemporâneo

       2.3.2. A restauração constitucional e os erros econômicos

       2.3.3. Os anos turbulentos das revisões radicais do momento neoliberal

       2.3.4. Estabilização macroeconômica e nova presença internacional

       2.3.5. A primeira era do Nunca Antes: a diplomacia personalista de Lula

       2.3.6. Uma transição pouco convencional: retornando a padrões anteriores

       2.3.7. Uma segunda era do Nunca Antes: a diplomacia bizarra de Bolsonaro

2.4. O que concluir de tudo isto? Que lições ficam de nossa trajetória histórica?

2.5. Nota final: reformas internas e inserção na globalização

 

3. Processos decisórios na história da política externa brasileira

3.1. O que define um processo decisório: observações preliminares

3.2. A diplomacia brasileira como instituição

3.3. A estrutura orgânica da diplomacia brasileira

3.4. Os processos decisórios na diplomacia brasileira

3.5. Virtudes e defeitos do processo decisório na diplomacia lulopetista

3.6. A degradação da cadeia de decisão no governo Bolsonaro

3.7. Conclusões: como funciona, como talvez devesse funcionar...

 

4. A política da política externa: as várias diplomacias presidenciais

4.1. Participação dos presidentes em política externa: da omissão ao ativismo

4.2. O início da liderança presidencial em política externa: a era Vargas

4.3. JK e o desenvolvimentismo: a caminho da política externa independente

4.4. O regime militar: tudo pelo “Brasil Grande Potência”

4.5. Redemocratização: crise externa e integração regional

4.6. Os anos FHC: enfim, uma diplomacia presidencial

4.7. Os anos Lula: o ativismo como norma, o personalismo como finalidade

4.8. A tímida diplomacia presidencial de Michel Temer

4.9. A antidiplomacia de Bolsonaro e dos assessores aloprados: afundamento

4.9. Conclusões: caminhos erráticos da diplomacia presidencial brasileira

 

5. O outro lado da glória: o reverso da medalha da diplomacia brasileira

5.1. Tropeços na independência e durante o império

5.2. Os fracassos da primeira diplomacia republicana

5.3. A difícil construção de uma diplomacia autônoma, e consciente de sê-la

5.4. A diplomacia profissional, como base da diplomacia presidencial

5.5. A deformação da política externa sob a diplomacia bolsolavista

 

 

Segunda Parte: Atualidade

 

6. Degradação democrática e demolição diplomática

6.1. O destino da nação: declínio ou renovação da democracia brasileira?

6.2. A História não se repete, nem mesmo como farsa

6.3. O que fazer na ausência de um estadista circunstancial?

6.4. Uma inédita ruptura nos padrões tradicionais da política externa 

6.5. O alinhamento automático ao presidente Trump: um escândalo temporário

6.6. A hostilidade em relação à China como critério da identidade comum

6.7. O isolamento na esfera internacional e no contexto regional

6.8. O caso da tecnologia 5G: prejuízos reais em qualquer hipótese

6.9. O caso da Amazônia: uma extraordinária vocação para o erro

6.10. A postura no caso da pandemia da COVID: negacionismo em toda a linha

6.11. Uma nova Idade das Trevas?

 

7. Relações com o Big Brother e os vizinhos regionais

Introdução: a importância da descontinuidade, em circunstâncias inéditas

7.1. A importância histórica das relações regionais e hemisféricas

7.2. Da aliança não escrita aos impasses políticos e econômicos

7.3. Bolsonaro e uma inédita relação de alinhamento sem barganha

7.4. A desintegração regional e o desalinhamento com os vizinhos 

7.5. Qual o futuro da integração, do Mercosul, da política externa brasileira?

 

8. Um novo animal na paisagem: o globalismo e os seus descontentes

8.1. O espectro do globalismo: a emergência da irracionalidade oficial

8.2. Dos antiglobalizadores aos antiglobalistas?

8.3. À la recherche du globalisme perdu

8.4. Os nacionalismos canhestros: genitores do antiglobalismo irracional

 

9. Um exercício de planejamento estratégico para a diplomacia 

Introdução: demolição e reconstrução da diplomacia brasileira

9.1. A política externa e a diplomacia no desenvolvimento nacional

9.1.1. Etapas percorridas em 200 anos de história institucional

9.1.2. Os desafios: uma matriz dos recursos e das debilidades nacionais

9.2. Campos de atuação da diplomacia e da política externa 

9.2.1. Multilateralismo, regionalismo e bilateralismo como instrumentos

9.2.2. A política externa multilateral: interfaces políticas e econômicas

9.2.3. A geografia política e a geoeconomia global das relações exteriores

9.2.4. América do Sul: eixo de um espaço econômico integrado

9.2.5. O multilateralismo econômico: eixo da inserção global do país

9.2.6. Ambientalismo e sustentabilidade: eixos dos padrões produtivos
9.2.7. Direitos humanos e democracia: eixos da proposta ética do país

9.2.8. Blocos e alianças estratégicas na matriz externa

9.2.9. Relações com parceiros bilaterais e regionais

9.2.10. Vantagens comparativas e exploração de novas possibilidades

9.2.11. Integração política externa e políticas de desenvolvimento

9.3. O Itamaraty como força motriz da inserção global do Brasil

9.3.1. Gestão da Casa, com base nas melhores práticas da governança

9.3.2. Responsabilização, abertura e transparência nas funções

9.3.3. Capital humano de alta qualidade: base de uma diplomacia eficaz

9.4. Planejamento estratégico como prática contínua da diplomacia 

 

10. Quo vadis, Brasil? 

10.1. Estaríamos enfrentando uma fase tendencial de declínio?

10.2. O que é verdadeiramente estratégico na vida da nação? 

10.3. Quão baixo, quão fundo, uma sociedade pode descer?

10.4. Um “exército de ocupação” interno? 

 

 

Apêndice: O Estado do Brasil em 1587 e sua condição atual

 

 

Bibliografia e referências

Nota sobre o autor

 

(em breve)

quinta-feira, 25 de março de 2021

Rupturas na diplomacia e desenvolvimento interrompido do Brasil - Paulo Roberto de Almeida; debate com Renato de Oliveira

 Participei, nesta tarde, de uma conversa com o sociólogo Renato de Oliveira, sobre temas da diplomacia e da sociologia do desenvolvimento, cujo video está disponibilizado neste link: https://www.facebook.com/100055583565581/videos/230131248849659/?d=n



Abaixo transcrevo o texto que eu tinha preparado para a ocasião, mas que obviamente não li.

Rupturas na diplomacia e desenvolvimento interrompido do Brasil

  

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivonotas para entrevista oralfinalidadedebate público sobre diplomacia e Brasil] 

 

1) O Itamaraty sempre foi reconhecido por assegurar um alto nível de formação do seu pessoal, e os diplomatas brasileiros sempre foram respeitados no exterior por sua alta capacidade de representação e negociação, projetando o Brasil como um "player" importante no cenário internacional, apesar dos nossos problemas estruturais internos. De onde surgiu um Ernesto Araújo? É possível falar de uma reação obscurantista na diplomacia brasileira que acabou sendo cooptada pelo bolsonarismo?

 

PRA: A constatação sobre a excelência dos quadros do Itamaraty é a opinião comum no Brasil, embora haja um pouco de exagero na qualidade, isenção ou adequação do corpo de funcionários da diplomacia profissional para fins de desenvolvimento do Brasil ou para a inserção do país na economia global. Somos funcionários bem preparados, mas certamente enquadrados num ambiente que funciona entre a meritocracia e estruturas feudais de comando e controle. Como para os militares, os dois princípios de funcionamento da Casa, sempre repetidos pelos barões do Serviço Exterior, são hierarquia e disciplina, e existe uma grande dependência dos quadros subalternos das chefias ou do gabinete, para quase tudo na carreira: promoções, chefias, postos, prebendas, etc., daí a estrita obediência aos chefes.

Ernesto Araújo é típico burocrata cinzento, que viveu trinta anos enquadrado no espírito da Casa, embora pudesse ter, mas escondidos, seus sentimentos e posturas pessoais de cunho religioso e ultra conservador. Mas passou incólume por mandatos tucanos e petistas sempre cumprindo fielmente seus deveres, no sentido mais anódino da palavra: disciplinado, obediente, respeitoso dos superiores e demonstrando perfeita conformidade com a ideologia do momento: tucanices na era FHC, quando ainda tínhamos uma diplomacia normal, adesão ao lulopetismo diplomático quando foi o caso, defendendo fielmente todas as posturas daquele momento, e isso está documentado. Provavelmente, quando da ascensão da Direita, a partir de 2013 e, sobretudo depois do impeachment de 2016 e a conformação da candidatura do capitão, ele se aproveitou do momento para, de maneira totalmente oportunista, se abrir aos futuros donos do poder para oferecer seus serviços. Ele o fez de forma clandestina, e até de forma ignóbil, pois se uniu a pessoas despreparadas para conduzir a política externa e não hesitou em submeter-se à vontade dos ineptos para praticamente destruir o Itamaraty. Ele certamente merece o desprezo de seus colegas de carreiras por todas as vergonhas a que foi conduzida a diplomacia brasileira, numa das derrocadas mais avassaladoras a que foi levada a diplomacia profissional e a qualidade do Serviço Exterior brasileiro. 

Não existe NENHUMA “reação obscurantista na diplomacia brasileira que acabou sendo cooptada pelo bolsonarismo”, pois o perfil típico do diplomata profissional é o de um quadro muito bem informado, geralmente progressista, totalmente engajado nos grandes princípios e valores da diplomacia brasileira, historicamente, que são os do multilateralismo, da aderência ao Direito Internacional, aos da democracia, dos direitos humanos e da cooperação internacional e da integração regional e da inserção do Brasil no mundo. Nada a ver, absolutamente nada, com a agenda da extrema-direita reacionária, avessa ao verdadeiro liberalismo, antiglobalista e cerceadora dos direitos das minorias e desse ambiente que pode ser chamado de politicamente correto, que é o ambientalismo contemporâneo, dos direitos sociais numa perspectiva avançada, sem cultivar qualquer tipo de ideologia sectária, como é o caso dessa horrível direita conspiratória, primariamente anticomunista e antimultilateralista. Todas essas coisas são perfeitas aberrações, que chocam a vasta maioria dos diplomatas, o que não exclui que também existam aqueles sinceramente conservadores, ou direitistas, mas que sempre se enquadraram nos ares do tempo e serviram ao país da melhor forma possível. Sempre existem aqueles que por puro oportunismo carreirista resolver aderir ao novo credo da chefia, até com certo entusiasmo, o que poderá ser um problema para eles no futuro, quando o Itamaraty voltar a um comportamento normal, digamos assim, livre das loucuras e da completa esquizofrenia da fase atual. 

 

2) O Brasil já pagaria um alto preço por seu isolamento internacional se o mundo continuasse o mesmo no pós-pandemia. No entanto, há tendências mais ou menos evidentes de que muitas coisas mudarão, sobretudo com os Estados nacionais (incluindo a Europa entendida como tal, apesar das suas dissensões internas) recuperando um protagonismo, sobretudo na formulação de políticas econômicas, que havia sido muito relativizado durante a globalização. Isto implicará mudanças estruturais nas políticas exteriores dos países líderes da economia mundial. Que cenário se pode desenhar para o Brasil? Como a diplomacia poderia ser um agente ativo para a recuperação econômica no novo cenário mundial?

 

PRA: Essa radicalização direitista, quase fascistoide, da diplomacia e do governo brasileiro atual vai ser superada em algum momento, e a diplomacia brasileira vai ser restaurada em suas grandes linhas tradicionais, de equilíbrio, ponderação, adequação aos grandes princípios que sempre guiaram nossa política externa, e tudo isso que ocorre hoje será um pesadelo a ser superado. Algumas sequelas persistirão durante algum tempo, como a perda de credibilidade de nossa postura junto a grandes parceiros internacionais, dos quais estamos temporariamente afastados ou com baixo nível de interação. A verdade é que existe um desgoverno geral no Brasil, dado que o chefe de Estado é um inepto despreparado, um, obsessivo com seus interesses pessoas, totalmente incompetente no exercício e no manejo da política externa, e jamais corrigido ou orientado adequadamente por um chanceler acidental que é totalmente submisso às loucuras dos seus chefes. Além de destruir o Itamaraty como instituição respeitável, ele conduziu o Brasil à pior situação no contexto internacional, aliás reconhecido por ele mesmo, ao confessar que não tinha problemas com nossa atual condição de pária internacional. 

Mas os diplomatas são muito submissos para ensaiarem um movimento de revolta contra todos os horrores que ocorrem atualmente na política externa e na diplomacia. As reações ao descalabro vieram de diplomatas aposentados e de figuras do jornalismo e da academia, com uma quase unanimidade na reprovação. Eu sou praticamente o único diplomata da ativa que ousa protestar publicamente e rejeitar completamente a demolição que ocorre hoje na diplomacia brasileira, que é, por sinal, o título de meu próximo livro, depois de três que já publiquei neste ciclo de críticas ao bolsolavismo diplomático: Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty (2019), O Itamaraty num labirinto de sombras e Uma certa ideia do Itamaraty (ambos de 2020).

Tenho certeza de que a reconstrução da política externa e a restauração do Itamaraty começaram assim que conseguirmos nos livrar daqueles que eu chamo de novos bárbaros, uma vez que eles são perfeitamente bárbaros destruidores da antiga qualidade de nosso Serviço Exterior. Haverá algumas sequelas, entre eles o isolamento dos muito convertidos à obra de destruição, mas depois o Itamaraty voltará a servir o Brasil como sempre fez.

 

3) Retornando a F. Fernandes... Em “A Revolução Burguesa no Brasil”, ele defende a tese de que a oligarquia brasileira, convertida em burguesia por força dos influxos do mercado internacional, utilizou seu controle sobre o Estado para impedir o desenvolvimento pleno de uma racionalidade capitalista no plano interno, mantendo formas arcaicas de produção do excedente econômico e assegurando seu controle sobre o mercado por mecanismos extra-econômicos. Ou seja, o empresário brasileiro conquista hegemonia no mercado não por sua competência econômica, mas por controlar o Estado, impedindo a generalização da competitividade como padrão de organização da economia. Esta tese traz alguma luz sobre a situação atual do Brasil, seja do ponto de vista do retrocesso da economia, cada vez mais dependente de commodities, seja do ponto de vista do retrocesso nas relações internacionais, como se houvesse uma vocação de "ser periférico"?

 

PRA: Conheço bem toda a obra do mestre da Escola Paulista de Sociologia, em especial seu magnum opus, justamente A Revolução Burguesa no Brasil, e comecei minha tese de doutoramento com a intenção de comprovar e reafirmar seus argumentos principais nessa obra muito profundamente, mas também muito desigual: ela começa por uma postura weberiana-funcionalista muito explícita em sua primeira parte para terminar com tomadas de posição quase leninistas em seu conteúdo explicativo sobre as razões da autocracia burguesa e a persistência do não desenvolvimento. No curso de minhas leituras paralelas à obra de Florestan Fernandes, de Nikos Poulantzas, de Immanuel Wallerstein e de outros adeptos da teoria da dependência, fui revisando meus próprios argumentos, com, base num estudo muito detido das revoluções burguesas e do desenvolvimento do capitalismo periférico, sobretudo com base na leitura de Barrington Moore Jr, assim como de outros autores, o próprio Weber, Marx, naturalmente, mas também Fernand Braudel, Albert Hirschman e uma pletora de outros autores, em história, sociologia, política e desenvolvimento econômico. Devo também ao fato de ter viajado muito pelo mundo, em todos os socialismos e capitalismos realmente existentes, em diferentes países em desenvolvimento, a aquisição de uma visão bem mais matizada dos nossos problemas de desenvolvimento na América Latina, do que aquela que considero excessivamente acadêmica, e puramente conceitual, que é a de Florestan Fernandes e de muitos dos que o seguem na academia.

Dito isto, é preciso considerar que, sim, não exatamente os empresários brasileiros, mas as suas oligarquias, as suas elites econômicas e políticas preservaram formas arcaicas de relações de produção e de trabalho – o tráfico, a escravidão – e impuseram ao conjunto da sociedade uma dominação e controle do Estado que lhes permitiu preservar privilégios, não apenas no controle da terra e do patrimônio fundiário de modo geral, mas na ausência total de algum projeto que permitisse educar o conjunto da população, ademais de outras orientações em política econômica – como o mercantilismo, o protecionismo – que obstaculizaram um processo mais avançado de crescimento econômico e de desenvolvimento social. Não existe uma racionalidade capitalista em abstrato, apenas a extração de recursos a partir da dotação de fatores e das vantagens comparativas do país, e eles estavam na abundância de terras, mas monopolizadas em favor da oligarquia latifundiária, na oferta elástica de mão de obra escrava e depois de imigrantes de baixa escolaridade, e esse controle do Estado, que facilitou todos os comportamentos predatórios por parte dessas elites. E com isso fomos nos arrastando ao longo do século XIX e nas primeiras décadas do século XX.

Os impulsos de industrialização, vindas do alto, e muito vinculadas ao próprio Estado, permitiram alguma mudança de estruturas – como analisada em obras de grandes mestres, como Caio Prado, Celso Furtado e o próprio Florestan Fernandes –, mas não foram suficientes para liquidar com velhos traços patrimonialistas, oligárquicos, mandonistas e centralizadores de nossas tradições políticas, o que redundou num país – sobretudo depois de completada a industrialização de JK aos militares – razoavelmente industrializado, mas apartado da economia mundial e sem ganhos de produtividade para nos inserir na economia global, dada a baixíssima qualificação do capital humano. As teses de Florestan Fernandes podem ser interessantes para elegantes digressões acadêmicas mas não servem muito para equacionar os problemas estruturais e os desafios sistêmicos do Brasil, a não ser na sua absoluta condenação da não-educação, a ausência completa de um projeto de qualificação da mão-de-obra depois da abolição da escravatura. Ele foi um dos pioneiros da educação brasileira, em sua segunda fase, a dos anos 1950 e 60, depois dos pioneiros dos anos 1920 e 30, como Anísio Teixeira, Fernando Azevedo e vários outros. Nisso, Florestan Fernandes estava inteiramente certo, muito embora ele tenha atuado bem mais na superestrutura da educação – isto é, o terceiro ciclo, como aliás fizeram os militares – do que na sua infraestrutura, a educação básica e técnico-profissional. 

O Brasil não é dependente de commodities, ou não há problema algum em continuar exportando, como fizemos durante séculos, produtos de base, agrícolas e minerais, se não fossemos dependentes de nossa péssima educação de base e de um fechamento do país ao mundo, o que nos deixa relativamente apartados do das faixas mais elásticas do comércio internacional e dos investimentos diretos estrangeiros. Nosso retrocesso industrial não é definitivo e podemos voltar a uma maior capacidade competitiva nessa área, se soubermos efetuar reformas radicais em diversas áreas da economia e das políticas setoriais, sobretudo em educação, tecnologia e trabalho. A razão principal de nosso relativo subdesenvolvimento é que nossas elites são medíocres, não tão atrasadas materialmente, mas mentalmente. O atual retrocesso nas relações internacionais é temporário e passageiro, pois que temos ineptos absolutos no comando da diplomacia e da política externa, mas isso também pode ser superado em algum tempo, sem prejuízo maior para o Itamaraty. As relações externas não são, contudo, o terreno preferencial das reformas, que se situam todas no plano interno.

Eu resumiria os requerimentos para um processo de crescimento sustentado, com transformações produtivas e distribuição social dos resultados desse crescimento num conjunto de cinco elementos estruturais: uma macroeconomia estável, uma microeconomia competitiva, uma boa governança, sobretudo no Judiciário, um capital humano de alta qualidade e abertura ao comércio internacional e aos investimentos estrangeiros. Podemos abordar essas questões mais a fundo, como já fiz em diversos trabalhos meus. Em todo caso, as reformas nessas grandes áreas têm pouco a ver com a qualidade de nossos diplomatas e tudo a ver com a qualidade de nossas lideranças econômicas e políticas, pois estas parecem estar singularmente paralisadas por um cenário político divisivo, disputado por populismos de direita e de esquerda, o que obviamente não facilita muito a caminhada em torno de soluções de consenso, ou seja, reformas graduais naquelas áreas selecionadas para atuação a partir do Estado ou da própria sociedade. Infelizmente, nossas elites são patrimonialistas, corporativas, prebendalistas, fisiológicas, e basicamente indiferentes à sorte das camadas mais humildes da população, quando não egoístas e consciente ou inconscientemente predatórias (ou seja, não interessadas na resolução da enorme desigualdade social e regional ainda existente no país). Para que ocorram mudanças reais nas relações de poder e nas estruturas econômicas, políticas, educativas, isso vai exigir um grande esforço por parte de líderes com perfil de estadistas nas próximas fases de nosso itinerário político. 

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3869, 15 de março de 2021

 

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Estimado Embaixador Paulo Roberto de Almeida.

 

O motivo desta mensagem, além de saudá-lo, é fazer-lhe um convite.

Estou organizando um canal de debates políticos, econômicos  e sobre políticas públicas sobre Brasil e América Latina. O projeto, mais ambicioso, é organizar um centro independente de estudos e debates sobre estes temas, e já tive oportunidade de organizar entrevistas/debates com o arquiteto Jorge Francisconi, de Brasília, com o economista Victor Hernandez Roldan, da Universidade de Concepción, Chile, e estão previstos um com o cientista político Maurício Jaramillo Jassir, da Universidade del Rosário (Colômbia) sobre as recentes eleições equatorianas, nesta próxima quinta, e com o economista Carlos Leyba, ex-Subsecretário de Economia da Argentina e professor da Universidade de Buenos Aires, no próximo dia 18.

 

Gostaria de convidá-lo para uma entrevista sobre os problemas da política externa brasileira. Mais além da atuação ridícula e deplorável do chanceler "acidental", creio que estão sendo criados alguns problemas estruturais pelos quais o país pagará um alto preço: não só estamos perdendo a característica de "soft power" que, me parece, constituiu a essência da respeitabilidade que o Brasil conquistou em sua política externa independente, como perderemos o bonde dos rearranjos internacionais decorrentes da pandemia e das mudanças nas regras do jogo da economia mundial, que colocam em xeque grande parte dos pressupostos da globalização. A recente determinação do governo Biden de examinar 50 cadeias produtivas da economia norteamericana visando identificar os elos de maior dependência externa, bem como a anunciada injeção de mais de 1 trilhão de dólares para minimizar os efeitos sociais da pandemia e recuperar a economia - o que, aliás, coincide com igual iniciativa da Comunidade Europeia, que prevê inclusive transferências financeiras a fundo perdido para os países da Europa Meridional - parece indicar claramente uma retomada do protagonismo dos Estados nacionais no xadrez econômico internacional. Isto por certo trará novas exigências em política externa para o Brasil, que desindustrializou-se nas últimas décadas e ainda não conseguiu formular uma estratégia de inserção competitiva nos mercados internacionais que não seja como produtor de commodities.

 

Creio que são temas relevantes para se pensar uma saída da crise em que estamos mergulhados, e gostaria muitíssimo de contar com sua abordagem, além de, por suposto, sobre outros temas que V. Sa. julgar de interesse.

 

As entrevistas ocorrem através da plataforma StreamYard, às quintas feiras às 18h, com transmissão ao vivo pelo Facebook, ficando posteriormente disponíveis no YouTube.

 

É desnecessário frisar a importância da sua colaboração, se ela for possível.

 

Aguardando sua resposta,

Atenciosamente,

 

Renato de Oliveira (oliveira.remar@gmail.com

Professor aposentado - UFRGS - Depto de Sociologia

Sociólogo - Consultor


 

 

Conselho Federal da OAB apresenta representação contra o PR na PGR: parece que o clima desandou de vez...

 Vamos aguardar o que fará o Desprocurador Particular do Presidente, vulgo PGR.

Paulo Roberto de Almeida


O CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – CFOAB, serviço público dotado de personalidade jurídica própria e forma federativa, regulamentado pela Lei nº 8.906/94, com endereço eletrônico: pc@oab.org.br e

com sede em Brasília/DF, no SAUS, Qd. 05, Lote 01, Bloco M, inscrito no CNPJ sob nº 33.205.451/0001-14, por seu Presidente e pelos/as advogados/as que a esta subscrevem (doc.anexo), vêm, à presença de Vossa Excelência, com fulcro nos artigos 127, caput, e 129, I da Constituição da República, c/c art. 46, parágrafo único, III, da Lei Complementar nº 75/1993, apresentar


REPRESENTAÇÃO


em face do Presidente da República, JAIR MESSIAS BOLSONARO, brasileiro, casado,

militar reformado, ex-deputado federal, ocupante do cargo de Presidente da República, portador da carteira de identidade SSP/DF nº 3.032.827, inscrito no CPF/MF, sob o nº 453.178.287-91, com endereço funcional no Palácio do Planalto, Praça dos Três Poderes – Brasília-DF, CEP 70.150-900, para que seja processado criminalmente pelos crimes comuns previstos nos artigos 132 (Perigo para a vida ou saúde de outrem), 268 (Infração de medida sanitária preventiva), 315 (Emprego irregular de verbas ou rendas públicas) e 319 (Prevaricação), entre outros, todos do Código Penal, mediante denúncia a ser apresentada ao Supremo Tribunal Federal, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir narrados.

(...)


Ler a íntegra do documento da OAB neste link: 


https://www.academia.edu/45613268/OAB_Federal_apresenta_representacao_contra_o_PR_na_PGR



Asia-Pacific, the Gigantic Domino of Climate Change - Vitor Gaspar and Chang Yong Rhee (IMF)

 Asia-Pacific, the Gigantic Domino of Climate Change

By Vitor Gaspar and Chang Yong Rhee (IMF)

Forget the poetic flap of a butterfly’s wings in Beijing causing rain in Central Park. Climate issues in Asia-Pacific are measured in superlatives. The world’s biggest population. Two of the three largest carbon dioxide-emitting countries and the largest share of emissions globally. The most exposed to extreme weather events. Some of the smallest and most vulnerable countries. Also, the fastest-growing part of the global economy and many of the leaders in green technology.

It’s not hard to see that what Asia does to fight global warming will be literally felt across the whole planet.

Pursuing a green recovery in the aftermath of COVID-19 might sound daunting, but it’s actually a great opportunity to direct recovery spending into stimulating sustainable jobs and growth.

Green investment is generally more labor-intensive than the regular kind. The near-term extra spending and jobs would strengthen economies. In the longer-term, Asian economies would become more sustainable and resilient, and could build on their lead in many of the emerging green technologies.

What policies are needed? A newly released IMF staff paper makes recommendations in three areas.

More carbon taxes, more compensation

With the world’s most populous and fastest-growing economies, Asia-Pacific emits the largest volume of greenhouse gas, producing about half the world’s carbon dioxide. China, India (the first and third-largest emitters respectively, with the US second) and other large emitters will need to make greater efforts to reduce emissions if global warming is to be kept to the Paris Agreement’s goal of 1.5–2 degrees Centigrade above pre-industrial levels.

Taxes on the carbon dioxide released when burning fossil fuels can be a highly effective way of reducing emissions, but they are little used in the region. Even a gradually introduced and relatively modest carbon tax of $25 per ton would achieve the region’s aggregate Paris Agreement target. But Asia’s Paris targets, like other region’s, are well below what is needed and models suggest that $50-100 per ton is required globally to keep warming below 2 degrees.

chart 1

 

Rather than taxing all emissions, much can be done by targeting the most polluting fuels. That would be very effective in countries like China, India and Mongolia, heavily reliant on coal, by far the dirtiest fossil fuel. And it comes with the added benefit of reducing air pollution, which could save some 3 million lives in China alone by 2030.

Of course, some households, workers, and firms would be particularly affected by the higher energy prices resulting from carbon taxes. They need to be identified and compensated, ideally with targeted benefits, though universal transfers can also work. For example, China could use carbon tax revenues to increase its minimum guaranteed income scheme, finance green investment or reduce other taxes.

chart 2

 

Other policies can help. For example, more sectors can be included in emissions trading systems, in which the government sets overall limits on emissions and lets the market determine their price. Financial incentives to use less-polluting alternatives, such as electric vehicles, reduce the need to raise energy prices. Stricter regulations on air quality can support decarbonization efforts.

Increase adaptability to climate change

Even in the best of scenarios, historic emissions mean a certain amount of warming and climate change will be inevitable. Extreme weather events are only expected to intensify, so adaptation is urgent. Rising sea levels alone could directly affect a billion people by mid-century, potentially submerging many cities and wiping out entire nations.

Low-income and Pacific island countries are particularly vulnerable and need to invest in protecting infrastructure, making water resources more resilient, adapting dryland agriculture, restoring mangroves, and improving early warning systems for natural disasters.

Chart 3

 

But some of the most vulnerable have the least resources to prepare. Adaptation requires stepping up public investment, on average by about 3 percent of GDP annually. For the smallest, also the least-polluting countries, the price tag is higher. A recent IMF/World Bank assessment concluded that Tonga would have to spend $67 million a year in climate adaptation for 10 years. Doesn’t sound much, until one realizes this is 14 percent of its GDP, which underscores the need for greater international support for such countries.

Greener recovery from COVID-19

The COVID-19 crisis does not change the climate crisis, but provides an opportunity to tackle it. How? By ensuring that as much as possible of the very large recovery spending is allocated towards greener activities. Some countries are already doing that, like Korea in its Green New Deal. But much more can be done as the pandemic response shifts from crisis containment to recovery.

Countries seeking to accelerate the transition to carbon neutrality can invest in renewable energy, retrofitting buildings, upgrading the electricity grid, facilitating electric cars, and incentivizing research. When the main challenge is adaptation, they could upgrade infrastructure projects, retrofit existing assets, and develop coastal protection. For many, it will be a combination of both.

Global efforts to promote and finance the transfer of green technologies to developing countries and expanding multilateral climate funds need to be stepped up. The IMF is helping by integrating climate in our annual country economic assessments and scaling up capacity development to ensure government officials have the needed skills to handle these complex issues.

Butterflies still matter… 

In a 1952 short story, American science fiction writer Ray Bradbury imagined a man from 2055 who travels to the past and, by accidentally stepping on a butterfly, changes the outcome of his day’s presidential election. It was “a small thing,” Bradbury writes, “that could upset balances and knock down a line of small dominoes and then big dominoes and then gigantic dominoes.” In our global fight against climate change, Asia-Pacific is a gigantic domino that cannot fall. As the world recovers from COVID-19, now is the time and opportunity to ensure ourselves a better 2055.

Vitor Gaspar is Director of the IMF’s Fiscal Affairs Department.

Chang Yong Rhee is the Director of the IMF’s Asia and Pacific Department.

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300 mil vidas perdidas - Editorial O Globo

 Um editorial devastador: se fosse outro o país, outro o Parlamento, outros os representantes, o degenerado estaria imediatamente escorraçado para todo o sempre. Vamos de aguardar mais cem mil mortos adicionais?

Paulo Roberto de Almeida


EDITORIAL O GLOBO

300 mil vidas perdidas

25/03/2021 • 00:01

Negacionismo, omissão, incompetência e, sobretudo, desprezo pela vida humana arrastaram 300 mil brasileiros ao túmulo. Um ano e um mês após o registro oficial da primeira infecção pelo novo coronavírus, o Brasil é hoje tudo o que não se queria naquele 26 de fevereiro de 2020. Primeiro país em mortes diárias e segundo em total de mortes, atrás apenas dos Estados Unidos. Lá, a curva vem caindo à medida que a população é vacinada. Aqui, não para de subir enquanto faltam vacinas. Na terça-feira, o Brasil superou pela primeira vez a marca macabra de 3.000 mortes por Covid-19 em um só dia — aproximadamente um morto a cada 30 segundos. A cada quatro vítimas fatais do vírus no mundo, hoje um é brasileiro.

As 300 mil vidas perdidas para a Covid-19 no país representam aproximadamente 23% da média anual de mortes antes da pandemia. Grosso modo, de cada cinco mortos no último ano, um estaria vivo não fosse o ambiente hospitaleiro que o vírus encontrou entre nós. Viramos um assumido pária mundial, epicentro da Covid-19 e ameaça sanitária ao planeta.

A história poderia ter sido outra? Certamente. O governo Jair Bolsonaro escreveu de próprio punho cada capítulo do roteiro macabro que nos impôs um luto sem data para terminar. Nada foi por acaso. Em 28 de março do ano passado, quando o país contava apenas 114 mortos pela Covid-19, o presidente foi alertado pelo então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, para a gravidade da pandemia e seus efeitos devastadores. Na época, a pior projeção previa 180 mil mortos, caso não fossem tomadas as medidas necessárias. Àquela altura, era plenamente possível evitar o pior. Bolsonaro ignorou o alerta. Continuou agindo como sempre: desprezou máscaras, provocou aglomerações, atacou medidas de isolamento social decretadas por governadores e prefeitos, menosprezou a pandemia — era “só uma gripezinha” — e desdenhou as mortes que não paravam de crescer. Ressoa até hoje seu indiferente “e daí?” diante da tragédia.

No pronunciamento em rede nacional na terça-feira, abafado por panelaços nas capitais, tentou adotar um tom mais sóbrio. Mas continuou a mentir e a distorcer dados para exaltar as ações do governo. “Quero tranquilizar o povo brasileiro e afirmar que as vacinas estão garantidas”, afirmou. “Ao final do ano, teremos alcançado mais de 500 milhões de doses para vacinar toda a população. Muito em breve retomaremos nossa vida normal.” No mesmo dia, o Ministério da Saúde anunciou a redução de quase dez milhões nas doses previstas para abril, de 57,1 milhões para 47,3 milhões.

Em dois meses de campanha, o país aplicou a primeira dose a pouco mais de 6% da população. De acordo com os dados disponíveis até a última semana para 103 países na plataforma Our World in Data, esse percentual nos coloca na 54ª posição no quesito “proporção da população que tomou ao menos uma dose da vacina”. Nem de longe o que prega a propaganda bolsonarista, na tentativa de eximir o presidente da responsabilidade pela condução desastrosa do combate à pandemia.

Bolsonaro trocou dois ministros da Saúde — os médicos Mandetta e Nelson Teich — pelo general Eduardo Pazuello, cujo único predicado era obedecer-lhe na fixação em adotar um remédio comprovadamente ineficaz contra a doença, a cloroquina. Não tinha como dar certo. Acaba de assumir o quarto ministro na pandemia, o cardiologista Marcelo Queiroga, apresentado ontem a sua primeira crise: o Ministério da Saúde mudou os critérios para registro das mortes e, num passe de mágica, os números despencaram. O governo só voltou atrás depois da grita dos estados.

No Planalto, ainda se procura um cargo para Pazuello, investigado pela tragédia de Manaus, onde pacientes morreram por falta de oxigênio. Os equívocos e as omissões da dupla Bolsonaro & Pazuello ficaram explícitos na atitude diante das vacinas. O governo fez tudo errado. Por omissão, viu-se refém do acordo assinado pela Fiocruz para produzir a vacina da AstraZeneca. Desprezou a oferta da Pfizer em agosto para comprá-la somente agora. Acordou tarde para outros imunizantes. A vacina que sustenta o claudicante Programa Nacional de Imunização é a chinesa CoronaVac, que Bolsonaro torpedeou por ter sido contratada por um adversário, o governador João Doria.

O resultado da gestão inepta é que faltam vacinas, enquanto o vírus e suas variantes fazem a festa. O cenário é caótico. Hospitais entram em colapso, doentes morrem nas filas de espera, faltam oxigênio e sedativos para entubar pacientes, corpos se amontoam em corredores. A pandemia pode até acabar, mas as sequelas durarão anos. Famílias perderam seus provedores, crianças ficaram órfãs, pais e mães enterraram prematuramente seus filhos. Trezentas mil mortes — muitas evitáveis — não podem ficar impunes. Quem será responsabilizado por isso? É preciso que Ministério Público, comissões parlamentares e demais órgãos de controle investiguem as responsabilidades de cada um nessa tragédia sem precedentes.

Por que não se seguiram as recomendações científicas? Por que não foram tomadas as medidas de restrição sabidamente eficazes para conter o vírus? Por que não se testou em massa a população, como fizeram os países que controlaram a epidemia? Por que o Ministério da Saúde abriu mão de coordenar o combate à doença? Por que se desperdiçaram dinheiro e energia com medicamentos inócuos? Por que não foram compradas vacinas a tempo de imunizar a população e salvar centenas de milhares de vidas?

Só ontem, depois de um ano e 300 mil mortes, Bolsonaro anunciou a criação de um comitê nacional para coordenar o combate ao vírus. Ficou claro no discurso do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que a paciência até dos aliados com os erros está no fim. Que este momento, em que Bolsonaro passou a defender a vacinação e aparenta ter caído em si, marque enfim a guinada no combate à pandemia e a adesão a políticas embasadas na Ciência, para que não tenhamos mais de chorar milhares de mortos todo dia.