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quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Why the Russia Sanctions Are Failing - Anne O. Krueger (Project Sindicate)

 

Why the Russia Sanctions Are Failing

Project Syndicate, Jan 18, 2024 


While the United States and its allies have long used sanctions to influence other countries’ policies, such measures often fail to achieve their stated goals. The ineffectiveness of the current Russia sanctions regime underscores the need for G7 countries to reassess the costs and benefits of economic warfare.

WASHINGTON, DC – When bilateral talks fail to resolve disputes between sovereign countries, aggrieved parties may turn to an international judicial body, such as the International Court of Justice in The Hague. Alternatively, treaties or agreements often incorporate provisions for arbitration or mediation of disputes by a pre-designated entity.

Similarly, the World Trade Organization’s articles, which underpin the international trading system, outline procedures for member countries to follow when trading partners violate the organization’s rules, particularly the most-favored-nation principle. But the WTO rules permit countries to take unilateral actions they deem necessary for national security, even if these measures require breaching agreed-upon tariff ceilings.

When former US President Donald Trump, citing national-security concerns, imposed tariffs on steel and aluminum imports, many of the United States’ trading partners viewed this as a fig leaf for protectionism and filed complaints with the WTO. But America’s refusal to appoint new judges to the WTO’s dispute-settlement body has left members without a functional mechanism to resolve such conflicts.

Goods sanctions are most effective when they are imposed by virtually the entire world. A notable example is the extensive sanctions levied against South Africa in the 1980s, which played a significant role in facilitating the downfall of the apartheid regime. Unless they are nearly universal, however, trade sanctions are often less effective than expected. As Richard Hanania observed in a 2020 Cato Institute analysis, US-imposed trade sanctions “almost always fail to achieve their goals.” Moreover, “sanctions have massive humanitarian costs and are not only ineffective but likely counterproductive.”

One reason for this is that unless there is near-universal global participation, traders can easily redirect sanctioned goods through third-party countries. Iran, for example, has managed to circumvent Western sanctions by constructing a sophisticated oil-smuggling network. Similarly, sanctioned Chinese goods are reportedly still entering the US market, as China-based firms reroute their exports through countries like Vietnam and Mexico.

During the Iraq War, the US used financial sanctions to prevent American companies from dealing with counterparts in third-party countries that facilitated prohibited transactions with Iraq. These “secondary sanctions” proved to be significantly more effective than traditional commodity trade sanctions, largely owing to the dollar’s dominant role in global finance. Consequently, US-imposed sanctions have increased tenfold over the past 20 years.

Following Russian President Vladimir Putin’s full-scale invasion of Ukraine in February 2022, the US and its allies imposed unprecedented trade and financial sanctions on Russia, including a ban on technology and military exports. They also introduced a $60-per-barrel price cap on Russian oil, designed to cripple Russia’s economy while ensuring that Europe could avoid a politically destabilizing energy crisis.

These measures have been largely unsuccessful. While financial sanctions forced oil traders to secure ships with suitable insurance coverage before finalizing transactions, the price of Russian oil did not fall below $60 per barrel. By November 2023, it had risen to $84.20 as Russian companies developed various methods of circumventing Western restrictions, such as inflated shipping costs and a “shadow fleet” consisting of more than 100 old tankers. Meanwhile, more than $1 billion in sanctioned goods have reportedly vanished amid the expansion of the Russian “ghost trade.”

Moreover, the Russia sanctions regime has given rise to a number of intermediaries, with countries like India, China, Armenia, GreeceTurkey, the United Arab Emirates, and Singapore effectively becoming “laundromats” for Russian oil and other sanctioned goods. When a company is identified and sanctioned, a new company, operating under a different name, often takes its place. One Greek company even sold Russian oil to the US military.

In response to the mounting evidence of sanctions evasion, the US and its allies have intensified their enforcement efforts. In December, the US Treasury Department imposed “sweeping” sanctions on more than 250 companies and individuals, including Chinese and North Korean entities.

This is not to suggest that Western countries should not seek non-military methods of exerting pressure on Russia. But the prevalence of sanctions evasion calls into question the effectiveness of the current regime and underscores the need for Western powers to consider the costs and risks to their own economies.

To be sure, Western sanctions have reduced Russia’s revenues and dented its GDP, albeit to a lesser extent than many had hoped. But the longer the global financial system is used as a tool of economic warfare, the more governments and businesses in third-party countries will look for alternatives to the dollar, euro, and the SWIFT international payment system.

While sanctions may be an effective short-term tactic, their impact on the targeted parties tends to wane over time, even as the burden on the countries enforcing them increases. Should the Russia sanctions regime significantly erode the dollar’s prominence in international financial markets, the cost to the US and global economies could far exceed its benefits.

Anne O. Krueger, a former World Bank chief economist and former first deputy managing director of the International Monetary Fund, is Senior Research Professor of International Economics at the Johns Hopkins University School of Advanced International Studies and Senior Fellow at the Center for International Development at Stanford University.


Segundo Round do clash Venezuela contra a Guiana: não será ainda desta vez - Nota do Itamaraty

 NOTA À IMPRENSA Nº 31

Reunião da Comissão Conjunta Guiana – Venezuela em BrasíliaCompartilhe por Facebook

O Palácio Itamaraty sediará, na manhã de 25 de janeiro, reunião da Comissão Conjunta de Chanceleres e Técnicos da República Cooperativa da Guiana e da República Bolivariana da Venezuela. A instância foi estabelecida pela Declaração de Argyle para o Diálogo e a Paz entre Guiana e Venezuela, adotada em 14 de dezembro passado, em São Vicente e Granadinas.

Em Brasília, acompanharão o diálogo os governos do Brasil, por intermédio do Chanceler Mauro Vieira, de São Vicente e Granadinas (em exercício da presidência da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos - CELAC) e de Dominica (em exercício da presidência da Comunidade do Caribe - CARICOM), que atuam como interlocutores principais no processo.

Também assistem ao encontro representantes da Secretária-Geral da CARICOM, em apoio à presidência da CARICOM, e do Secretário-Geral das Nações Unidas, na condição de observador.

O Governo brasileiro valoriza o compromisso da Guiana e da Venezuela com o processo de diálogo ora em curso, facilitado por atores e mecanismos regionais. Ressalta ainda o espírito de integração que move os países da América Latina e do Caribe com vistas a consolidar a região como uma zona de paz, cooperação e solidariedade.

Comunicações e Transparência Pública

Momentos decisivos da história do Brasil na vertente diplomática - Paulo Roberto de Almeida

Momentos decisivos da história do Brasil na vertente diplomática 

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre os caminhos errados tomados pelo Brasil desde o início do século. 

 

Em algumas fases do caminho nacional, a estrada bifurca, como já demonstrou Antonio Paim, num livro portando esse título: Momentos Decisivos da História do Brasil. Ele acha que tomamos o caminho errado na estrada que poderia nos ter levado ao desenvolvimento com democracia. Toma três casos da política interna, econômica e institucional.

Eu vou apenas me concentrar num aspecto da política externa, mas que me parece reproduzir essa bifurcação da estrada diplomática, que influenciou a projeção internacional do Brasil no último quarto de século.

As trajetórias de Putin e de Lula desde o final dos anos 1980 são totalmente independentes, mas bastante coincidentes e incrivelmente convergentes: enfraquecer a hegemonia dos EUA no mundo e abrir caminho para uma “nova ordem mundial”. No caso de Putin de forma muito consciente. No caso de Lula, parece ser o produto de certos instintos primitivos incutidos por um dos componentes ideológicos do PT. Tais crenças arrastam o Brasil para caminhos divergentes dos seus reais interesses nacionais na continuidade do seu processo de desenvolvimento econômico e social, com plena preservação dos ideais e instituições democráticas.

Essa bifurcação começou em 2003, com a escolha das alianças externas, não exatamente os velhos parceiros do Ocidente democrático e capitalista, mas algumas ditaduras execráveis do Terceiro Mundo, duas democracias de baixa qualidade no assim chamado Sul Global e duas grandes autocracias historicamente totalitárias. Vamos exemplificar com as siglas apenas: IBAS, CASA, UNASUL, BRIC, BRICS, BRICS+. Tem mais, mas essas siglas bastam para representar os caminhos tomados em algumas bifurcações da estrada do Brasil na política externa presidencial. A diplomacia simplesmente seguiu atrás. 

Como diria um filósofo, as consequências sempre vêm depois. O Brasil já tem e terá algumas consequências dessas escolhas no futuro à nossa frente.

Os últimos 30 anos foram marcados pela retomada do projeto imperial russo. Lula e o PT parecem concordar plenamente com os objetivos do atual neoczar. Esse é o caminho para a política externa do Brasil? Esse é o empenho da atual diplomacia? Os diplomatas profissionais sabem o que isso representa para o futuro do mundo e do Brasil? Seguem na estrita obediência? 

Existe uma clara falta de compasso moral na política externa do Brasil; a diplomacia profissional tem sido incapaz de incutir qualquer noção ética nas tomadas de posição do governo Lula em favor de ditaduras absurdas, que perpetram crimes de guerra e contra os direitos humanos.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4568, 25 janeiro 2024, 2 p.


Ucrânia ataca pontos sensíveis da infraestrutura econômica russa - Tendar

From X, January 24, 2024

The strike against Russian oil facilities in Tuapse, Russia, only days after the successful strike against the Ust-Luga terminal removes all doubt that we are dealing with a targeted effort to eliminate all major Russian oil and gas ports, so that they are rendered useless for any operations.

When looking at the Russian oil and gas pipeline map, then you will notice that almost all of them head West. There is a small pipeline going east, but it is not connected to the main oil fields in Western Siberia and only small in size. Russia's economic lifeline goes all the way West. In the past, this was the matter of problems for the West, since Russia used this power to blackmail Europe. Now, its close proximity has become the source of weakness.

Among all of those pipelines only 5 end in Russian sea ports. Every other pipeline, especially the Druzhba pipeline, enters Western (NATO) territory and are therefore subject of sanctions or worse. The Druzhba pipeline goes anyway partly through Ukrainian territory and the rest such as the pumping stations are anyway in firing range.

3 of the pipelines end near Sankt Petersburg in the Baltic Sea, 2 of them go the Black Sea. Among of them, Ukraine successfully struck 2 already. Ust-Luga is inoperable for the next weeks or even months. Shipping companies will increasingly reconsider sending their vessels to those ports which are military targets.

This will be a big headache for the Russian war effort. The current attacks are still small in size, using a handful of drones, but already caused considerable damage. When Ukraine starts mass-hitting those ports, then the Russian air defense will not be able to stop the outcome, even when destroying 99% of all drones. 

The National Geographic map is from 2006 and yet not much has changed since then. The major difference I see is the extension of the natural gas pipeline grid of which some have been turned into "sea water pipelines". The irony behind that speak for itself. Putin and his oligarchs never ever anticipated this situation, like everything since February 2022. Everything what Moscow does makes a bad situation worse and I'm sure that sooner or later somebody in Putin's circle (of which nobody is a saint but simply tired of this vicious cycle) will do the math that it is easier to remove Putin than remove the Ukraine will for freedom and independence.

#Ukraine #Russia #Oil #NaturalGas

O mundo virado para trás: da URSS para o império neoczarista de Putin (documentário da PBS)

O mundo virado para trás: da URSS para o império neoczarista de Putin

Documentário da PBS

Tudo começou em Dresden, 1989, quando um jovem funcionário do KGB viu o mundo da URSS ruir até o desaparecimento do império soviético dois anos depois. Começou aí a brutal reconstrução do regime totalitário. A partir de 2003, a opção dos governos lulopetistas foi a de apostar no projeto de Putin: BRIC, BRICS e BRICS+. Em 2024 essa é a mesma orientação para a política externa do Brasil; a diplomacia segue obediente atrás.

Existe uma clara falta de compasso moral na política externa do Brasil;  a diplomacia profissional tem sido incapaz de incutir qualquer noção ética nas tomadas de posição do governo Lula em favor de ditaduras absurdas, que perpetram crimes de guerra e contra os direitos humanos.

Assistam a este documentário:

Putin and the Presidents 

(full documentary) | PBS FRONTLINE

https://youtu.be/aJI8XTa_DII?si=sEvVae2Jxs278Gtb 

FRONTLINE investigates Russian President Vladimir Putin’s clashes with five American presidents as he’s tried to rebuild the Russian empire.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

O silêncio do Brasil sobre a derrocada da democracia na Guiné-Bissau - Vanicleia Silva Santos, Marcos Leitão de Almeida, Abdulai Silá (FSP)

 O silêncio do Brasil sobre a derrocada da democracia na Guiné-Bissau País que busca liderança no Sul Global está omisso diante de virtual ditadura 

 Vanicleia Silva Santos, Professora na Universidade da Pensilvânia (EUA); Marcos Leitão de Almeida, Professor na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) Abdulai Silá, Escritor guineense 
Folha de S. Paulo, 

A Guiné-Bissau é lembrada pelos brasileiros por sua conexão ancestral com as populações afrodescendentes, especialmente na região amazônica. Após uma longa história de escravidão, colonialismo português e independência conquistada em 1973, o país africano enfrentou desafios políticos e sociais. A guerra civil de 1998-99 deixou marcas duradouras. Desde então, a democracia tem sido instável, com frequentes mudanças de governo. Em 2020, o general Umaro Sissoco Embaló, conhecido como o "Bolsonaro da África", ganhou as eleições com um discurso religioso e étnico, voltado para as populações muçulmanas do país. Seu governo é marcado por tensões com a Assembleia Nacional Popular e o Judiciário, além de uma crise econômica persistente.

 Em fevereiro de 2022, ocorreu uma suposta tentativa de golpe de Estado, seguida por tensões políticas. Em junho de 2023, a oposição obteve maioria absoluta nas eleições parlamentares, mas o presidente se recusou a indicar o líder do partido vencedor como primeiro-ministro. Com a finalidade de buscar a conciliação, a coligação vencedora indicou outro nome, que foi aceito e, então, formou-se o novo governo. No entanto, em dezembro de 2023, alegando outra "tentativa" de golpe, Sissoco dissolveu o Parlamento, sem respeitar a constituição. Para piorar, ele escolheu e nomeou um novo governo, sem consulta, e não estabeleceu data para novas eleições para o Congresso, indicando que poderão ser realizadas somente no final deste ano.

 Diante das intenções ditatoriais do presidente, a oposição convocou uma manifestação pela democracia em 8 de janeiro último, mas a polícia dispersou os manifestantes antes mesmo de o ato começar. Portanto, está caracterizado o caráter ditatorial do golpe institucional e a violação da Constituição da Guiné-Bissau. Durante os dois primeiros governos Lula, o Brasil passou a ter uma presença na Guiné-Bissau com alguns programas de cooperação na área de segurança e da massiva vinda de estudantes guineenses para estudar nas universidades brasileiras.

 Isso gerou um saldo muito positivo, como a formação de milhares de quadros qualificados para a Guiné-Bissau, que possui precária estrutura de ensino superior. O impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016 e os governos seguintes mudaram as prioridades diplomáticas brasileiras para a África. O governo Lula 3 representa uma esperança na retomada das relações Brasil-África. Porém, o país está omisso diante desta ditadura virtualmente instaurada na Guiné. 

O Itamaraty emitiu apenas uma nota curta na qual declara que "acompanha com preocupação a corrente situação na Guiné-Bissau, no âmbito da qual foi recentemente dissolvida a Assembleia Nacional Popular, eleita em julho passado. O Brasil insta ao diálogo entre as partes e conclama as autoridades ao respeito dos direitos fundamentais". Esta fraquíssima nota pública contrasta com o enorme esforço diplomático do governo para dialogar nos conflitos na Ucrânia, Venezuela e em Gaza, por exemplo. Apesar de haver muitos países envolvidos nos casos citados, o Brasil buscou se apresentar como mediador. 

No entanto, no caso da Guiné-Bissau, onde há uma enorme conexão com o Brasil, o governo segue se omitindo, deixando os diálogos com Portugal e até mesmo com os EUA. Esse episódio nos lembra que, em 1974, Samora Machel questionou a ausência do Brasil durante a luta contra o colonialismo e recusou a presença brasileira na celebração da independência de Moçambique e a abertura de uma embaixada em Maputo. Portanto, o Brasil não pode negligenciar essa grave ameaça à democracia em um momento em que busca a liderança do Sul Global. 

O país deve dialogar ativamente entre as diferentes partes para defender a democracia e os direitos humanos também na Guiné-Bissau. A valorização dos laços com a África deve ir além da celebração das ancestralidades africanas em nossa sociedade e se efetivar em uma verdadeira cooperação.  

terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Direito sem Fronteiras: BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional (TV Justiça) - Paulo Roberto de Almeida


 Na continuidade da emissão anterior da TV Justiça, recebi o link da segunda parte deste programa da série Direito Sem Fronteiras, apresentado pelo jornalista Guilherme Menezes. Permito-me retomar, na sequência exata, separadas por uma semana, as duas gravações das entrevistas, como registrei em minha lista de publicados: 

1540. “BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional”, Direito sem Fronteiras, Parte 1, 10/01/2024: https://www.youtube.com/watch?v=ZN9B7NR2yT0.

1544. “BRICS reforça projeto por nova ordem financeira internacional”, Direito sem Fronteiras, Parte 2, 15/01/2024: https://www.youtube.com/watch?v=Zo7UGWQyPhA.

Dois para frente, um para trás: os retrocessos e distorções que sabotam o Brasil - Marcos Lisboa, Marcos Mendes (Brazil Journal)

 Dois para frente, um para trás: os retrocessos e distorções que sabotam o Brasil

Marcos Lisboa, Marcos Mendes

Brazil Journal, 21/01/2024

 

Nas últimas cinco décadas, a economia brasileira tem tido um comportamento ciclotímico: são sequências de anos bons seguidos por crises severas. De acordo com o Banco Mundial, entre 1980 e 2019, nos períodos em que tivemos variação positiva do PIB per capita, o nosso crescimento médio (2,8%) até superou o da economia líder do mundo, os EUA (2,2%). 

O problema é que levamos muito mais tombos: tivemos 14 anos de variação negativa do PIB per capita, contra apenas 7 dos EUA. E nossas quedas foram mais intensas: em média, de 2,6%, contra apenas 1,9% nos EUA. 

Essa volatilidade – que prejudica o investimento, a expansão da infraestrutura e o aumento recorrente da produtividade – tem origem numa política econômica igualmente ciclotímica. 

Em alguns momentos, surpreendentemente conseguimos aprovar reformas importantes, como a da Previdência e a Tributária, que há muito vinham sendo evitadas. Mas assim que o cenário econômico melhora, o Brasil aceita diversos retrocessos, concedendo benefícios a grupos organizados que fragilizam as contas públicas e pioram nossa eficiência produtiva. 

Neste artigo mostramos o risco de que esses retrocessos mantenham o nosso histórico de política econômica ciclotímica, causadora de volatilidade: alguns anos de crescimento razoável seguidos de crises – o clássico “voo de galinha” – resultando num desempenho medíocre no médio e longo prazos. 

Tratamos da ciclotimia da política fiscal em diversos artigos. Com o crescimento da arrecadação, a despesa permanente com salários, aposentadorias e benefícios aumenta, como ocorreu em muitos municípios desde a pandemia. Mas quando os tempos ficam mais difíceis, essa despesa não pode ser reduzida, e a conta cai no colo da União. 

Neste texto vamos nos concentrar nos retrocessos regulatórios recentes bem como nas distorções no ambiente de negócio que prejudicam a produtividade e o crescimento sustentável. Fizemos muitas reformas.

O país passou por reformas significativas, em especial a partir de 2015. Muitos analistas apontam indícios de que a reforma da legislação trabalhista tem parte do mérito pela queda do desemprego sem a correspondente pressão inflacionária. A reforma da previdência ajudou a tornar menos agudo o problema fiscal. 

A autonomia do Banco Central colaborou com o bem-sucedido processo recente de desinflação. Muitas outras ajudarão no crescimento dos próximos anos, desde a Agenda BC# até os marcos regulatórios de infraestrutura. 

O atual governo contribuiu de modo relevante. A aprovação da reforma tributária, discutida há mais de vinte anos, promete grande simplificação, redução de custos e incentivo à racionalização da produção. Um feito de primeira grandeza. 

Além disso, deu-se continuidade a esforços do governo anterior, como na regulamentação de apostas esportivas, no marco regulatório do setor de ferrovias e de garantias de operações de crédito. 

Mas o fato de termos feito muitas reformas não quer dizer que temos uma agenda claramente modernizadora. Pelo contrário. É espantosa a facilidade com que adotamos políticas que deterioram o ambiente de negócios, diminuem a concorrência, criam cartórios e fragilizam as contas públicas. Sinais preocupantes para o futuro O cenário internacional foi melhor em 2023 do que se esperava há um ano, com queda da inflação impondo, até agora, baixo custo sobre a produção e o emprego. Internamente, porém, nos encontramos na perigosa fase do ciclo em que as reformas recentes nos ajudam a tirar o nariz do ambiente de crise, e se abrem oportunidades para retrocessos. Os sinais emitidos desde o fim da pandemia têm sido preocupantes. 

Vamos listar diversas questões regulatórias. O Poder Executivo acredita que o crescimento pode ser impulsionado por meio da distribuição de proteção e subsídios a setores organizados. O Congresso, por sua vez, é bastante sensível ao lobby desses setores. Isso deixa a porta aberta para a rápida aprovação de múltiplas políticas de proteção comercial e subsídios, além de decisões que desrespeitam a segurança jurídica. 

Fernando Veloso sistematiza a evidência empírica das consequências negativas desse tipo de política sobre a produtividade e o crescimento. Retrocessos regulatórios A pesquisa acadêmica com micro dados identifica a importância da integração econômica para o crescimento. 

No entanto, o governo oferece sinais ambíguos nessa área, como ao colocar freio no acordo com a União Europeia sob a justificativa de reservar o mercado de compras governamentais para empresas nacionais. Em especial, o governo está preocupado em manter as licitações do SUS restritas a fornecedores instalados no País, alimentando a ideia de criação de um Complexo Industrial da Saúde. Ou seja, a prioridade deixa de ser atender a população com o menor custo e a maior qualidade possível, e passa a ser a substituição de importações no fornecimento ao SUS. 

A evidência empírica indica que a estratégia de fazer exigências de conteúdo local para desenvolvimento da indústria nacional teve algum sucesso em casos muito específicos, mas se mostrou ineficaz na maioria das experiências internacionais: quanto mais sensível é o Poder Público à ação de grupos de pressão, mais essa política tende a se degradar na proteção de empresas ineficientes, sem ganhos de produtividade no médio prazo, restringindo a competição e a inovação. Há anos temos esse tipo de exigência em diversas políticas: nos financiamentos concedidos por bancos públicos, nos benefícios da Zona Franca de Manaus, na lei de licitações. Não há avaliações de impacto que mostram saldo positivo entre benefícios e custos. 

No entanto, a orientação do governo é para aprofundar a política. Recente reunião do Conselho Nacional de Política Energética desfez parte da reforma de 2017, elevando os requisitos mínimos de compra de insumos nacionais por empresas de exploração de petróleo e gás. Em uma agenda de pesquisa aplicada sobre a regulação no setor de óleo gás, o núcleo de energia da UFRJ constatou que as políticas de conteúdo nacional prejudicam a produção e desestimulam a concorrência, tendo por vezes resultados opostos aos pretendidos. Diana Pietro mostrou que essa política derrubava significativamente as expectativas de retorno e eram determinantes para que uma operadora desistisse de dar lances num leilão ou abandonasse campos já adquiridos. Edmar Almeida e coautores mostraram que em um cenário sem exigência de conteúdo local os investimentos da indústria de petróleo gerariam 60 mil empregos a mais no ano de pico de produção. 

O Governo tenta reverter na Justiça a privatização da Eletrobras, questionando as regras aprovadas em lei. Também tentou interferir em decisões da empresa, agora privada, como no episódio da absorção de Furnas, uma subsidiária da Eletrobras, pela holding. 

A Vale, outra empresa privada, também está na mira do governo. Isso revela a fragilidade do marco legal do País, sujeito ao mando arbitrário de plantão em Brasília, o que prejudica os investimentos. O Congresso Nacional tem dado respaldo a lobbies de diversos participantes do mercado de energia. 

A lei que aprovou a privatização da Eletrobras continha “jabutis” criando mercados cativos ou reserva de recursos para remunerar fontes ou mecanismos de transmissão de energia que não são os mais eficientes, ou obrigando a construção de uma logística desnecessária, que beneficia alguns produtores, mas implicará custo adicional a ser pago na conta de energia das famílias. 

Atualmente discute-se um projeto de regulamentação de geração de energia eólica offshore (PL 11.247/2018), que se tornou um cabide para pendurar diversos outros interesses. O resultado é o aumento da conta de energia. Parlamentares usualmente buscam impedir aumentos de tarifas de energia determinados pela ANEEL, muitas vezes causados por subsídios que eles próprios patrocinaram. Mais uma vez, insegurança jurídica e desestímulo ao investimento. Ao final do ano foi aprovado o “Programa Mover” de estímulo à indústria automobilística. Trata-se de reencarnação de dois programas anteriores, o “Inovar-Auto” e o “Rota 2030”. Todos foram criados com o mote de estimular a inovação e a descarbonização, mas o objetivo principal sempre foi a proteção contra a concorrência internacional. Avaliação independente mostra as fragilidades e o alto custo das iniciativas. 

Simultaneamente, aumentou-se o imposto de importação sobre carros elétricos. A Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), ao longo de 2023, também aumentou a tributação na importação de produtos siderúrgicos, químicos, painéis solares e pneus, revertendo o tímido movimento de abertura dos governos anteriores. Foi enviado ao Congresso projeto de lei prevendo a depreciação acelerada de máquinas e equipamentos, para efeitos fiscais. Tenta-se gerar competitividade mediante subsídios, quando o que a economia precisa é de acesso a máquinas e equipamentos modernos, disponíveis no mercado internacional, como apontado por Lisboa e coautores. 

O governo anunciou um programa para vender passagens aéreas baratas a estudantes e aposentados. Será preciso dar contrapartidas às empresas. Abrir o balcão do BNDES com subsídio, garantir combustíveis mais baratos para este setor ou conceder benefícios tributários serão opções que, cedo ou tarde, serão colocadas sobre a mesa. Além disso, aposentados e muitos estudantes fazem parte de grupos de renda média, que receberão recursos extraídos da sociedade em vez dos grupos sociais mais vulneráveis. 

A Petrobras aprovou um plano de negócios com espaço para voltar a fazer política pública intervencionista. Simbolicamente, o Presidente da República deu início à retomada das obras da Refinaria Abreu e Lima, um símbolo bilionário do mau planejamento e uso político da estatal. A empresa também cancelou a privatização da refinaria Lubnor e sinalizou interesse em reestatizar Mataripe por meio de questionamento judicial da venda. Isso contraria acordo de reversão de conduta anticoncorrencial firmado como o CADE e fragiliza a segurança jurídica. A política de preços da estatal tornou-se opaca. 

Em 2023, com a ajuda da queda do petróleo no mercado internacional, foi possível puxar os preços internos para baixo sem prejudicar a lucratividade. Vejamos o que acontecerá quando os preços começarem a subir no exterior. A experiência passada mostra que essas políticas levaram à perda de valor da empresa, abuso de práticas monopolistas e perda de eficiência econômica. 

A marcha à ré nas privatizações não foi apenas no âmbito da Petrobras e Eletrobras. Houve também a simbólica desistência da extinção da empresa de produção de chips (CEITEC). Além disso, houve a volta das indicações de políticos com pouco conhecimento técnico para a gestão e os conselhos dessas empresas, com base em liminar concedida pelo STF que enfraqueceu a lei das estatais. 

O BNDES foi o motor da política de indução de crescimento no passado recente. Avaliação feita pelo próprio governo federal aponta que os subsídios creditícios oferecidos pelo Banco não tiveram impacto nos investimentos das grandes empresas beneficiárias, resultado similar ao obtido por Bonomo e coautores, a partir de extensa base de microdados sobre os créditos concedidos e o desempenho dessas empresas. Não obstante essas evidências, o Banco está construindo instrumentos para voltar a atuar como no passado, expandindo a concessão de crédito subsidiado para empresas selecionadas, à custa de dívida pública e dos recursos captados por meio de tributos: conseguiu, junto ao TCU, postergar devolução ao Tesouro de empréstimos irregulares e vai lançar título próprio, ganhando autonomia em relação ao Orçamento e, ao mesmo tempo, tornando-se concorrente do Tesouro na captação de recursos. Foi colocado sob gestão do Banco o recém-criado “Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico”. Um fundo privado, voltado a financiar política industrial, fora do Orçamento, mas que receberá recursos públicos. Com isso, aumenta a intervenção pública no mercado de crédito, o que trabalha contra a eficiência alocativa, diminui a potência da política monetária e prejudica as novas empresas em favor das grandes e já estabelecidas. O Banco também está desenhando uma política de proteção cambial a investidores estrangeiros que, ao fim e ao cabo, significa transferir para o contribuinte o custo e risco de oscilações cambiais, que deveriam ser suportados pelos investidores. Assim, se a volatilidade cambial ocorrer, o contribuinte passa a pagar a conta que caberia ao acionista. Foi estancada a venda de ações da carteira do BNDESpar, que seria a forma mais lógica e eficiente de prover funding ao banco, uma vez que não há sentido em manter participação em empresas já consolidadas no mercado. Aproveita-se essa participação acionária do BNDES para instalar políticos nos conselhos de empresas privadas. Abriu-se uma brecha para a realização de financiamentos com taxas subsidiadas, abaixo da TLP. A brecha pode ser ampliada, no futuro, por simples decisão do Conselho Monetário Nacional (Lei 14.592/23 e PL 6.235/23). Conclusões Ao final de 2023 vimos resultados macroeconômicos positivos em termos de crescimento, inflação e emprego. 

Em boa medida, estamos colhendo os frutos de esforços de reforma de governos anteriores, com a ajuda de um cenário externo favorável, e da não concretização de intenções anunciadas pelo novo governo, como a revisão da autonomia do Banco Central ou a revogação de outras reformas. No entanto, o que está sendo plantado hoje não traz bons augúrios para o futuro: temos uma sucessão de medidas contrárias ao crescimento da produtividade e à segurança jurídica. Não são iniciativas isoladas, de baixo impacto. Trata-se da retomada da agenda adotada pelo governo Geisel e resgatada no segundo mandato de Lula. Volta agora como um plano de “reindustrialização” baseado em “missões do governo.” Conteúdo antigo em embalagem nova. 

O fracasso do passado traz preocupação com a reincidência nas mesmas políticas. As perspectivas fiscais, não tratadas neste artigo, também pouco ajudam. Para 2024, há sinais de atividade econômica andando de lado. 

Como o governo reagirá se no primeiro semestre deste ano se confirmar o baixo crescimento? Ele terá a paciência de preservar ajustes e contenção para auxiliar na retomada sustentável da economia a médio prazo? Ou, como feito tantas vezes no passado, vai declarar que temos que estimular a economia no curto prazo e dobrar a aposta nas intervenções discricionárias e fragilizar ainda mais o fiscal, além de tornar o monetário leniente com a inflação? Vamos reincidir nas políticas do passado, como as adotadas a partir de 2008, que resultaram na grave crise iniciada em 2014, com tantos projetos fracassados, incluindo refinarias e estaleiros? Vamos continuar presos à ciclotimia das reformas e retrocessos ou conseguiremos romper com o passado de volatilidade do crescimento?

 

Marcos Lisboa é ex-presidente do Insper. Marcos Mendes é doutor em Economia.

Leia mais em https://braziljournal.com/dois-para-frente-um-para-tras-os-retrocessos-e-distorcoes-que-sabotam-o-brasil/ .

 

A time of unprecedented danger: It is 90 seconds to midnight - 2023 Doomsday Clock Statement (Bulletin of the Atomic Scientists)

A time of unprecedented danger: It is 90 seconds to midnight

2023 Doomsday Clock Statement

Science and Security Board

Bulletin of the Atomic Scientists

Editor, John Mecklin

This year, the Science and Security Board of the Bulletin of the Atomic Scientists moves the hands of the Doomsday Clock forward, largely (though not exclusively) because of the mounting dangers of the war in Ukraine. The Clock now stands at 90 seconds to midnight—the closest to global catastrophe it has ever been.

The war in Ukraine may enter a second horrifying year, with both sides convinced they can win. Ukraine’s sovereignty and broader European security arrangements that have largely held since the end of World War II are at stake. Also, Russia’s war on Ukraine has raised profound questions about how states interact, eroding norms of international conduct that underpin successful responses to a variety of global risks.

And worst of all, Russia’s thinly veiled threats to use nuclear weapons remind the world that escalation of the conflict—by accident, intention, or miscalculation—is a terrible risk. The possibility that the conflict could spin out of anyone’s control remains high.

Russia’s recent actions contravene decades of commitments by Moscow. In 1994, Russia joined the United States and United Kingdom in Budapest, Hungary, to solemnly declare that it would "respect the independence and sovereignty and the existing borders of Ukraine" and "refrain from the threat or use of force against the territorial integrity or political independence of Ukraine..." These assurances were made explicitly on the understanding that Ukraine would relinquish nuclear weapons on its soil and sign the Nuclear Non-Proliferation Treaty—both of which Ukraine did.

Russia has also brought its war to the Chernobyl and Zaporizhzhia nuclear reactor sites, violating international protocols and risking widespread release of radioactive materials. Efforts by the International Atomic Energy Agency to secure these plants so far have been rebuffed.

As Russia’s war on Ukraine continues, the last remaining nuclear weapons treaty between Russia and the United States, New START, stands in jeopardy. Unless the two parties resume negotiations and find a basis for further reductions, the treaty will expire in February 2026. This would eliminate mutual inspections, deepen mistrust, spur a nuclear arms race, and heighten the possibility of a nuclear exchange.

As UN Secretary-General Antonio Guterres warned in August, the world has entered “a time of nuclear danger not seen since the height of the Cold War.”

The war’s effects are not limited to an increase in nuclear danger; they also undermine global efforts to combat climate change. Countries dependent on Russian oil and gas have sought to diversify their supplies and suppliers, leading to expanded investment in natural gas exactly when such investment should have been shrinking.

In the context of a hot war and against the backdrop of nuclear threats, Russia’s false accusations that Ukraine planned to use radiological dispersal devices, chemical weapons, and biological weapons take on new meaning as well. The continuing stream of disinformation about bioweapons laboratories in Ukraine raises concerns that Russia itself may be thinking of deploying such weapons, which many experts believe it continues to develop.

Russia’s invasion of Ukraine has increased the risk of nuclear weapons use, raised the specter of biological and chemical weapons use, hamstrung the world’s response to climate change, and hampered international efforts to deal with other global concerns. The invasion and annexation of Ukrainian territory have also violated international norms in ways that may embolden others to take actions that challenge previous understandings and threaten stability.

There is no clear pathway for forging a just peace that discourages future aggression under the shadow of nuclear weapons. But at a minimum, the United States must keep the door open to principled engagement with Moscow that reduces the dangerous increase in nuclear risk the war has fostered. One element of risk reduction could involve sustained, high-level US military-to-military contacts with Russia to reduce the likelihood of miscalculation. The US government, its NATO allies, and Ukraine have a multitude of channels for dialogue; they all should be explored. Finding a path to serious peace negotiations could go a long way toward reducing the risk of escalation. In this time of unprecedented global danger, concerted action is required, and every second counts.

Editor’s note: Additional information on the threats posed by nuclear weaponsclimate changebiological events, and the misuse of other disruptive technologies can be found elsewhere on this page and in the full PDF / print version of the Doomsday Clock statement.

Learn more about how each of the Bulletin's areas of concern contributed to the setting of the Doomsday Clock this year:

About the Bulletin of the Atomic Scientists

At our core, the Bulletin of the Atomic Scientists is a media organization, publishing a free-access website and a bimonthly magazine. But we are much more. The Bulletin’s website, iconic Doomsday Clock, and regular events equip the public, policy makers, and scientists with the information needed to reduce manmade threats to our existence. The Bulletinfocuses on three main areas: nuclear risk, climate change, and disruptive technologies, including developments in biotechnology. What connects these topics is a driving belief that because humans created them, we can control them. The Bulletin is an independent, nonprofit 501(c)(3) organization. We gather the most informed and influential voices tracking manmade threats and bring their innovative thinking to a global audience. We apply intellectual rigor to the conversation and do not shrink from alarming truths.

The Bulletin has many audiences: the general public, which will ultimately benefit or suffer from scientific breakthroughs; policy makers, whose duty is to harness those breakthroughs for good; and the scientists themselves, who produce those technological advances and thus bear a special responsibility. Our community is international, with half of our website visitors coming from outside the United States. It is also young. Half are under the age of 35.

Learn more at thebulletin.org/about-us.

Founded in 1945 by Albert Einstein and University of Chicago scientists who helped develop the first atomic weapons in the Manhattan Project, the Bulletin of the Atomic Scientists created the Doomsday Clock two years later, using the imagery of apocalypse (midnight) and the contemporary idiom of nuclear explosion (countdown to zero) to convey threats to humanity and the planet. The Doomsday Clock is set every year by the Bulletin’s Science and Security Board in consultation with its Board of Sponsors, which includes 10 Nobel laureates. The Clock has become a universally recognized indicator of the world’s vulnerability to global catastrophe caused by manmade technologies.

A irracionalidade da luta contra as desigualdades - Fernando Schüler (Veja)

 Soma variável

Fernando Schüler

Veja (20/01/2024)


“Ninguém deveria ter 1 bilhão de reais!”, leio de um ativista. Achei curioso. De onde vem uma ideia dessas? Conheço uma empreendedora que abriu uma empresa, investiu, muita gente apostou, conquistou uma clientela enorme, e em poucos anos suas ações valiam mais de 1 bilhão. O que ela deveria fazer? Vender tudo que passasse da quota de 1 bilhão? Se ela ficasse com o dinheiro, não ia adiantar. Ela poderia doar. O valor das ações passou de 1 bilhão, ela vende e doa o dinheiro. Ou alguém do governo vai lá e confisca. A pergunta previsível, neste caso, seria “mas então por que eu iria continuar trabalhando, correndo risco?”. Por esporte? E se as ações caírem, depois do confisco? Deixa pra lá…

Em um desses “relatórios” sobre a desigualdade, li coisas interessantes. Uma era a “denúncia” de que a riqueza dos cinco mais ricos do mundo “dobrou desde 2020”. Malandragem estatística escolher exatamente o ano de queda abrupta dos mercados, com a pandemia. Mas ok. Um desses ricos malvados é o Jeff Bezos. O self-made man que trocou um bom emprego para abrir a Amazon. Sou um de seus clientes. Não pela cor dos seus olhos, que aliás desconheço. Compro lá porque a Amazon me vende livros a bom preço e entrega rapidinho. Porque a empresa do Bezos torna minha vida mais fácil. Aumenta minha “produtividade”, se alguém quiser um termo mais elegante. Os investidores sabem disso. E é por isso que o “patrimônio” do Bezos dobrou, desde a baixa de 2020. Assim como ele melhora a minha vida, ele faz isso com milhões de pessoas, do sacrossanto ponto de vista de cada um.

Não há nenhum jogo de soma zero funcionando aí. A soma é variável: ele ganha porque seus clientes e investidores também ganham. Valendo o mesmo para as incontáveis ONGs que a MacKenzie Scott, ex-­esposa de Bezos, ajuda, distribuindo incríveis doações. E é precisamente isso que parece não entrar na cabeça de nossos ativistas.

Me lembro quando li O Capital no Século XXI, de Thomas Piketty. Em um certo momento, ele diz que “as desigualdades, a partir de um certo ponto, ameaçam os valores básicos da democracia”. Fiquei curioso para saber qual seria exatamente aquele “ponto”. Seria quando o 1% abocanhasse 25% da riqueza? (De “quem”, exatamente?) Ou quem sabe 20%? Ou 30%? À época, adquiri o hábito de perguntar às pessoas qual era a distribuição da riqueza favorita de cada um. Até colecionava os números, que iam da “igualdade total”, ao “padrão nenhum”. Depois desisti. Agora voltei a ler coisas assim. De um economista, li que era um “absurdo” que nosso top 5% “concentrasse” um terço da renda. Inútil perguntar qual seria sua distribuição “não absurda”. Sugestão mais objetiva tive do Joseph Stiglitz, cuja distribuição favorita seria “os 10% mais ricos não podem ter mais do que os 40% mais pobres”. Só Deus sabe qual a “ciência” usada aí. Nossos ativistas embarcaram: “Ganhou o Nobel, sabe das coisas”, devem ter pensado. Me fez lembrar da turma correndo atrás do Forrest Gump. Mas isso é outra história.

Em qualquer matéria sobre “desigualdade”, o que oferece consistência ética ao problema é o fato da pobreza. Ninguém perde uma hora de sono preocupado com a diferença entre o que chamamos de “classe média alta”, que na verdade são os 5 ou 7% de maior renda, e os mais ricos. O que efetivamente nos toca é o fato de que 90% da população disponha de uma renda mensal inferior a 3 208 reais (dados do IBGE). A pobreza, no Brasil, é um oceano. E é nisso que deveríamos focar. Na pobreza que atinge 49% das crianças de 0 a 14 anos, danificando suas chances de vida. Tudo isso é sabido. Mas mobiliza muito pouco o ativismo ideológico e a política profissional. Por que isso? Por que achamos tão mais excitante falar mal do valor das ações do Jeff Bezos do que focar em como melhorar a vida real dos mais pobres? A maior razão, intuo, é política. A retórica em torno da desigualdade é uma pauta de “combate”. É discurso “contra” essa gente da lista da Forbes. O foco na pobreza supõe um discurso “a favor”. É chato, exige buscar eficiência em políticas públicas, demanda soluções de mercado, com resultados de longo prazo. E dá menos ibope. Bom mesmo é “denunciar as desigualdades”, jogar isso na cara daqueles bilionários, em Davos, entre um e outro jantar bacana.

Indermit Gill, do Banco Mundial, tem uma sugestão simples, se queremos mudar o disco: aprender com as economias mais bem-sucedidas na redução da pobreza. Países asiáticos, como a Coreia do Sul, Singapura, Tailândia, Malásia, China, Indonésia e Vietnã. Todos contam a mesma história: sucesso capitalista e forte investimento em educação. Rigorosamente nada a ver com “combater os bilionários”. Ao contrário. A pobreza foi de 28% para 8,5%, no plano global, desde 2000, enquanto o número de bilionários saltou de 400 para 2 600. O país que mais ganhou bilionários foi exatamente aquele que mais reduziu a pobreza: a China. Logo atrás, a Índia. E isso não acontece porque “bilionários reduzem a pobreza”. Acontece porque a redução da pobreza e o aumento da riqueza são duas faces da mesma moeda: o crescimento econômico combinado a instituições “inclusivas”. Abertura de mercado, aumento da produtividade, capacitação de pessoas, ética pública, racionalidade no gasto governamental, bom ambiente de negócios. Caminho perfeitamente inverso ao da Venezuela, que conseguiu levar a pobreza a 90% da população e expulsar os poucos bilionários que havia por lá.

Há 35 anos, o prestigiado IMD, International Institute for Management Development, avalia o grau de competitividade, ou “ambiente de negócios”, em escala global. Ano passado, em um ranking de 64 países, o Brasil ficou na 60ª posição. Só à frente de países como a Venezuela e a Argentina (antes do Milei). Detalhe: em “eficiência governamental”, ficamos na 62ª posição. Se alguém estiver mesmo interessado em reduzir a pobreza, é nisso que deveria prestar atenção. Qual educação estamos oferecendo, nas últimas posições no Pisa? Que vias de inclusão ao mercado abrimos aos dependentes do Bolsa Família? Qual a qualidade do gasto público? O que significa 4,5% do PIB em incentivos fiscais, sem avaliar seriamente a relação custo-benefício? E os 5 bilhões de reais no “fundão eleitoral”? A Justiça e o Legislativo entre os mais caros do mundo, enquanto os espertos pedem mais carga tributária? E o que se passa quando abrimos mão de reformas cruciais? Não precisamos ir longe, aqui. Mario Covas nos falou sobre um “choque de capitalismo”, na campanha de 1989, mas nunca conseguimos produzir um consenso em torno disso, no Brasil. E talvez seja este, ano após ano, nosso desafio.

Fernando Schüler é cientista político e professor do Insper.