O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador FFAA. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador FFAA. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 17 de março de 2023

Bolsonarismo deformou as FFAA para a ilegalidade - Estadão

 Relatório aponta apagão da transparência nas Forças Armadas na gestão Bolsonaro

Estadão.com.br - Últimas Notícias | Política, 16/03/2023
BRASÍLIA - Documento produzido durante a transição e até agora mantido restrito responsabiliza as Forças Armadas por um apagão da transparência no governo federal. Foram mapeados casos de reiterado descumprimento da Lei de Acesso à Informação durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. De contratos a notas fiscais, passando por informações sobre a vida funcional de oficiais, os militares se negaram a tornar públicos documentos requeridos por cidadãos entre 2019 e 2022.

"Houve um significativo retrocesso no cumprimento da LAI pelas Forças Armadas durante o Governo Bolsonaro. Questões básicas como contratos, notas fiscais, relatórios de licitação são denegadas sob argumentos muito questionáveis, algumas vezes fundamentadas em portarias internas que não poderiam ou não deveriam se sobrepor à lei de acesso", diz o documento.

O relatório foi produzido pelo grupo técnico da Transparência, Integridade e Controle. O documento estava restrito até então, mas foi obtido pelo Estadão por meio da LAI. As críticas à atuação das Forças Armadas foram omitidas do relatório geral, único documento oficial divulgado pela equipe de transição em dezembro do ano passado. O texto relacionado à transparência não citava Exército, Marinha nem Aeronáutica. Relatava apenas, de uma forma genérica, que houve um "desmantelamento dos órgãos de controle e defesa do Estado".

Desde antes da posse, o governo petista tenta distensionar a relação com os militares. Lula já trocou o comandante do Exército e o ministro da Defesa, José Múcio, vem atuando para vencer resistências dentro da caserna em relação ao PT. Ao liberar o acesso ao relatório, a Controladoria Geral da União (CGU) fez uma ressalva que combina com movimento do governo de evitar novos atritos com os militares. A CGU informou que o documento não expressa necessariamente a opinião do órgão e "constitui-se como manifestação de natureza meramente opinativa, possuindo caráter de sugestão".

'Informações pessoais'

O grupo técnico da Transparência que produziu o documento foi chefiado pelo atual ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias. Também participaram da equipe o ex-ministro Eugênio Aragão e o ex-presidente da Comissão de Ética Pública (CEP) Mauro Menezes.
O relatório obtido pelo Estadão afirma que nos últimos anos foram colocados inúmeros obstáculos para se garantir a transparência e o acesso à informação. A equipe comandada por Messias diz ainda que as "autoridades burocráticas" do governo Bolsonaro atuaram às margens da lei e conseguiram "encurtar em muito o potencial da política de transparência pública". Especificamente sobre as Forças Armadas, aponta uma "forte tendência de sempre ou quase sempre se considerar 'pessoais' informações sobre integrantes do Exército que não seriam informações pessoais para servidores civis".

Como exemplos, o documento relata que o Exército negou acesso a notas fiscais de compras públicas, documentos de pregões eletrônicos, salários de servidores, lista de empresas que firmaram contratos com a Força, pareceres, notas técnicas, processos disciplinares e outros dados básicos. Em relação ao Comando da Aeronáutica, o grupo técnico critica a negativa de acesso à lista de passageiros e ao custo de voos oficiais. Por fim, relata que a Marinha mantém mais de 77 mil documentos em sigilo.

O diagnóstico traçado pelo governo de transição criticou também o sigilo de 100 anos inicialmente imposto ao processo administrativo do Exército contra o general Eduardo Pazuello, atual deputado federal, por ter participado de ato político ao lado do então presidente Jair Bolsonaro, em maio de 2021, no Rio de Janeiro. "O caso chamou atenção, pois, por se tratar de investigação concluída, não haveria justificativa para sigilo, sobretudo em razão de conter dados pessoais, e por um período tão extenso", diz o texto.

Durante a última campanha, o presidente Lula prometeu revogar o sigilo no caso Pazuello, o que foi feito no mês passado por decisão da Controladoria-Geral da União (CGU). Os documentos vieram a público mostrando que o então comandante do Exército, Paulo Sergio Nogueira, alegou que tinha sido avisado por telefone sobre a ida de Pazuello ao ato político e o militar acabou absolvido no processo. O regimento militar veda que integrantes da caserna compareçam a manifestações políticas sem autorização superior.

"As Forças Armadas fizeram e fazem de tudo para resistir à transparência exigida pela redemocratização", avalia a gerente de projetos da Transparência Brasil, Marina Atoji, ao Estadão. A especialista explica que a situação deixa Exército, Aeronáutica e Marinha longe do escrutínio público, não sendo possível realizar um controle social amplo sobre suas atividades e despesas.

Na avaliação de Atoji, mudar esse cenário a curto prazo passaria por algum grau de confronto. "Exige maior cobrança do cumprimento estrito da LAI e responsabilização por violações por parte da CGU e do Ministério da Defesa. Talvez até uma abordagem mais direta pelo próprio presidente, fazendo uso da hierarquia que as Forças prezam. Mas parece pouco provável agora, considerando os outros pontos de tensão existentes entre o novo governo e as Forças Armadas".






Outro lado

Em nota, a Marinha informou que "cumpre rigorosamente as normas da Lei de Acesso à Informação" e reiterou o "firme propósito no cumprimento aos preceitos legais estabelecidos pela Constituição Federal". O Comando da Aeronáutica também disse estar comprometido com a legislação e explicou que "eventuais informações solicitadas podem ser preservadas nas respostas concedidas, sempre com fundamento na legislação em vigor".

Já o Exército afirmou que não teve acesso ao relatório da transição, mas contestou seu conteúdo. Disse que a premissa de que houve "descumprimento da Lei de Acesso à Informação" não se mostra verdadeira. Segundo a Força, os pedidos que foram negados têm amparo legal. "Ademais, o Exército Brasileiro cumpre a transparência ativa e disponibiliza uma gama de informações relevantes em sua página na internet, possibilitando ao interessado ter acesso a diversos assuntos atinentes à Força".

O Exército disse ainda que desde a criação do Serviço de Informações ao Cidadão no Exército Brasileiro foram processadas mais de 13 mil demandas, "sem qualquer omissão" - o que, segundo a Força, atesta "um compromisso com a transparência pública, ativa e passiva, e com o fomento do desenvolvimento da cultura da transparência".

O relatório da transição cita também casos de documentos cujo acesso foi negado por Itamaraty, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Ministério da Justiça e Agência Brasileira de Inteligência (Abin). No caso da área de inteligência, o documento diz que o governo Bolsonaro tentou eximir a Abin de prestar contas. "Artigo da Lei da Abin passou a ser utilizado como fundamento para retirar do âmbito de incidência da LAI qualquer informação de inteligência, independe de classificação. Essa nova interpretação dada a esse dispositivo legal reverte um posicionamento histórico da CGU, segundo o qual informações da Abin não são necessariamente ou automaticamente dotadas de segredo, pela sua própria natureza", pontuou o diagnóstico.

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Lula faz confusão entre políticas de governo e instituições de Estado - Editorial da Folha de S. Paulo

Eu já havia registrado na própria data em que foi noticiada,  23/08/2022, a tremenda confusão e a postura essencialmente autocrática exibida pelo candidato Lula em relação a duas instituições de Estado – Itamaraty e FFAA – que ele pretendia, no dia anterior, que poderiam fazer o que o governo – presumivelmente o seu – quiser, numa revelação involuntária do seu sentimento majestático, típico da época das monarquias absolutas.

Eis a minha postagem em itálico, mais clara impossível, a que se segue o Editorial da FSP no mesmo dia, do qual só tive conhecimento nesta data, 25/08/2022: 

"Blog Diplomatizzando: 

terça-feira, 23 de agosto de 2022

Lula continua sendo o autoritário que sempre foi e se engana com o Itamaraty: Lula e a política externa (UOL) 

 Lula se equivoca profundamente, e arrogantemente, com respeito ao Itamaraty. Ele é composto, na sua IMENSA MAIORIA, por quadros progressistas, e os conservadores são muito poucos, entre eles os oportunistas dispostos a virar casaca e se disfarçar, como fez o patético ex-chanceler acidental durante 30 anos, bem antes de se revelar um vulgar fundamentalista e sabujo a serviço dos novos bárbaros.

Os diplomatas apenas não aderem ao sectarismo ideológico e à diplomacia partidária que pretende fazer o ex-presidente. Eles defendem valores e princípios que sempre foram consenso na política externa NACIONAL, sem as preferências políticas da esquerda.

Paulo Roberto de Almeida

Itamaraty é aquilo que governo quer, assim como Forças Armadas, diz Lula

São Paulo, 22
Notícias UOL, 22/08/2022 21h20"

Segue-se o editorial da FSP.

Paulo Roberto de Almeida


Para inglês ouvir - Ao pregar alternância de poder na Venezuela, Lula ensaia inflexão que soa frágil

Editorial da Folha de S. Paulo, 23.ago.2022 às 21h30

"Defendo alternância de poder não só para mim. Desejo para a Venezuela e para todos os países. Não há presidente insubstituível. O Brasil vai tratar a Venezuela com respeito." A assertiva, proferida pelo presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva (PT), encerra em si uma novidade e uma chave de compreensão.

É salutar enfim ouvir o ex-presidente brasileiro apoiar princípios democráticos na ditadura vizinha, após quase duas décadas de defesa intransigente do regime chavista.

O país no Caribe tinha excesso de democracia, chegou a dizer Lula quando titular do Planalto, em 2007. Assim, ainda que chame opositores de Nicolás Maduro de impostores, um direito seu que contradiz o discurso de respeito universal a resultados eleitorais, fica a sugestão de uma inflexão.

Para inglês ver, no caso, quase literalmente: a plateia de Lula na segunda-feira (22) era composta por jornalistas a serviço de órgãos de mídia internacionais. Já o trecho asseverando que o "Brasil vai tratar a Venezuela com respeito" indica o mais do mesmo do pensamento de política externa do PT.

Nos anos de Lula no poder, a autonomia possível e desejável na arena externa foi muitas vezes confundida com antiamericanismo pueril.

Pior, o amor sincero por ditaduras de esquerda, a começar pela romantizada Cuba castrista, virou política de Estado em ocasiões.

Quando as botas de soldados cubanos pisaram sobre manifestantes nos inauditos atos de 11 de julho de 2021, Lula preferiu dizer que o problema estava nos EUA, comparando a repressão insular a episódios de violência racial americanos.

São incontáveis os exemplos de tal visão tortuosa, ditada, sim, por afinidade ideológica —ainda que seja bastante claro que o antípoda do líder petista, Jair Bolsonaro (PL), provou-se no poder ser muito mais chavista do que o rival.

Numa visão otimista, um Lula de volta ao governo deixaria tais arroubos esquerdistas para o campo da retórica. Pode ser, mas a sequência de declarações do ex-presidente nesta fase da campanha tem deixado pistas de um outro caminho.

No mesmo dia em que ponderou sobre a Venezuela, o ex-presidente também afirmou que o Itamaraty e as Forças Armadas são órgãos de Estado e que, por isso, "serão aquilo que o governo quiser que seja".

Tal grau de incompreensão do arcabouço institucional é incompatível com a estatura pública de Lula, ainda mais quando ele ocupa a dianteira da corrida eleitoral.


editoriais@grupofolha.com.br

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2022/08/para-ingles-ouvir.shtml

 

sábado, 16 de julho de 2022

A estupidez bolsonariana e bolsonarista atingiu as FFAA - O Estado de S. Paulo

A estupidez bolsonarista é uma epidemia altamente contagiosa: já alcançou as FFAA. Até onde ela irá até ser contida? Não tem vacina ainda contra esse virus.

Paulo Roberto de Almeida 

Com todo o respeito que as Forças Armadas merecem no exercício de suas funções constitucionais, assinalo o que parece uma anomalia disciplinar do Ministro da Defesa, um ministro político, que não pode e não deve encaminhar os Comandos das três Forças para o descaminho de um indesejável intromissão no Sistema Eleitoral.
Não foi para contar votos ou testar urnas que nossos respeitaveis militares foram formados!
Embaixador Flavio Perri

Defesa agora diz que só servidor participaria de votação paralela com urna-teste e cédulas de papel
Ministro havia dito que eleitores convidados ou funcionários do TSE participariam de proposta de checagem de segurança nas seções eleitorais, elaborada pelas Forças Armadas
O Estado de São Paulo, 16/07/2022

BRASÍLIA — O Ministério da Defesa afirmou que a proposta de levar uma “votação paralela” para as seções eleitorais em 2 de outubro, como forma de melhorar a testagem de segurança das urnas eletrônicas, não vai exigir que eleitores votem também à mão em cédulas de papel e numa segunda urna, exclusiva para testes. A informação contradiz o próprio ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.
Em audiência pública no Senado, o ministro afirmou na quinta-feira, dia 14, que tanto eleitores quanto funcionários da Justiça Eleitoral poderiam, participando do procedimento de segurança sugerido pela pasta, registrar votos à mão, em cédulas de papel, para conferência com o boletim de uma urna-teste.
“No teste de integridade, no dia da votação, há um voto na mão. É aquele elemento que faz ali - ou é um servidor do TSE, ou, se atenderem a nossa demanda, é um eleitor - à mão, que testa a urna e que confere se o que ele fez à mão é o que saiu na urna”, disse o general, depois de o Estadão publicar detalhes sobre o modelo de teste de integridade sugerido pelas Forças Armadas.
Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) promove audiência pública interativa para debater as recomendações dadas pelo Ministério da Defesa ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para o aprimoramento do processo eleitoral.
Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) promove audiência pública interativa para debater as recomendações dadas pelo Ministério da Defesa ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para o aprimoramento do processo eleitoral. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Auxiliares do ministro disseram à reportagem que o general Paulo Sérgio, embora tenha falado sobre voto à mão e na urna, queria se referir somente ao uso de biometria pelos eleitores. A assessoria do ministro esclareceu que apenas funcionários da própria Justiça Eleitoral participariam da votação paralela. Nesse sentido, o esquema proposto pela Defesa repetiria parte do que já ocorre desde 2002, em testagens públicas das urnas, conduzidas pelo Tribunal Superior Eleitoral. O formato, no entanto, é diferente do que sugerem os militares.
Atualmente, no dia da eleição as seções eleitorais sorteadas para testes têm as urnas substituídas. A urna originalmente distribuída é transportada até o Tribunal Regional Eleitoral, onde o procedimento de votação eletrônica é realizado, monitorado por câmeras, e checado com votos registrados em cédulas de papel. Em vinte anos, nunca houve divergências de resultado, segundo a Corte.
Apesar disso, os militares entendem que a testagem atualmente feita não é suficientemente segura e pode deixar escapar ameaças internas, como vírus adormecidos, que seriam acionados apenas em determinadas condições, como o ritmo real de votação ou pelo uso de biometria de um eleitor cooptado para fraudar o pleito.
Por isso, a equipe de fiscalização das Forças Armadas sugeriu as mudanças na auditoria. Além de realizar os procedimentos na própria seção eleitoral, diante dos eleitores, após saírem da cabine de votação oficial, eles seriam convidados a liberar, por meio da biometria, o funcionamento de uma segunda urna eletrônica, a ser instalada no local apenas para essa testagem. Foi o que o coronel Marcelo Nogueira de Sousa, especialista do Exército, chamou durante a audiência pública de “gerar um fluxo de registro” na urna-teste, segundo a Defesa. O coronel, no entanto, omitiu que após o procedimento o eleitor seria dispensado e não deixou claro quem digitaria os votos na urna-teste. Segundo o ministério informou agora, os funcionários da Justiça Eleitoral conduziriam exclusivamente essa “votação paralela”, tanto na segunda urna, quanto nas cédulas em papel.
Apresentação do Ministério da Defesa propõe votação paralela com uso de cédulas e segunda urna para teste de integridade no dia da eleição.
Apresentação do Ministério da Defesa propõe votação paralela com uso de cédulas e segunda urna para teste de integridade no dia da eleição. Foto: Estadão
A mudança de informação por parte da Defesa ocorreu depois da repercussão da proposta das Forças Armadas, nos meios jurídico e político. Em privado, ministros do Supremo Tribunal Federal comentaram que a ideia poderia dar margem a fraudes. Os militares não esclareceram se o procedimento de auditoria proposto por eles, uma vez realizado na seção eleitoral, também será gravado por câmeras e transmitido ao vivo via internet, como ocorre atualmente nos tribunais.
O advogado Marco Aurélio de Carvalho, do Grupo Prerrogativas, ligado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), disse que a votação como sugerida pelo ministro era “mais fraudável do que a que ele pretendia auditar”. Ele classificou a proposta como “perigosa” e disse que o ministro agiu de forma “ousada” ao “transbordar o papel das Forças Armadas previsto na Constituição”. “Essa atitude atenta contra as instituições e deveria colocar a manutenção dele no cargo em xeque. Ele se mete onde não deve”, afirmou Carvalho.
Parlamentares também criticaram que não haveria como garantir que pessoas mal intencionadas registrassem uma coisa na urna eletrônica e outra no papel. “Essa sugestão é coisa de quem quer criar problema”, disse o deputado Fausto Pinato (PP-SP). “É um caso típico de alguém que está querendo criar baderna e isso definitivamente não é função de um ministro da Defesa.”
Embora já rechaçada pelo TSE para as eleições de 2022, a proposta das Forças Armadas foi detalhada pela primeira vez durante a audiência no Senado, dominada por parlamentares governistas. A exposição pública feita pela Defesa pressiona a Justiça Eleitoral e coincide com a estratégia adotada pelo presidente Jair Bolsonaro de estimular a desconfiança nas urnas eletrônicas, antecipando-se a um eventual resultado desfavorável nas eleições. O principal adversário do presidente, o petista Luiz Inácio Lula da Silva, aparece como eventual vencedor na disputa, segundo pesquisas de intenção de voto. O ministro da Defesa, porém, negou agir com viés político.


terça-feira, 24 de maio de 2022

As Forças Armadas e o momento político nacional - Rubens Barbosa

 COLUNISTA Rubens Barbosa

Presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e ex-embaixador do Brasil em Londres (1994-99) e em Washington (1999-2004), Rubens Barbosa escreve mensalmente na seção Espaço Aberto


Não tenho dúvida de que, se houver qualquer quebra das regras democráticas com o apoio das FA, a reação vinda de fora será imediata. 

Opinião


As Forças Armadas e o momento político nacional

Rubens Barbosa

O Estado de S.Paulo. 24 de maio de 2022


Um ano após o ataque de apoiadores trumpistas ao Congresso dos EUA, contestando o resultado da eleição que, estimulados pelo então presidente, julgavam fraudada, um general norte-americano publicou artigo no Washington Post manifestando preocupação com o dia seguinte das eleições presidenciais em 2024 e a ameaça de divisão entre os militares, o que poderia pôr em risco a democracia no país.

Não afastando a possibilidade de contestação dos resultados da eleição e de um golpe de Estado, o militar apontou para o risco de confrontação no interior das Forças Armadas (FA) e a eventual quebra da hierarquia para respaldar essa diferente visão. Todos os militares juram respeitar a Constituição, mas numa eleição contestada, com lealdades divididas, alguns poderão seguir as ordens do comandante-em-chefe e outros, o comando trumpista. Como exemplo, mencionou a recusa da Guarda

Nacional em acatar pedido do presidente Biden para que todos os seus membros se vacinassem. Com o país muito dividido, as FA e o Congresso deveriam tomar medidas para prevenir qualquer tentativa de insurreição e adotar providências cautelares, observou.

O alerta do militar norte-americano sobre a ameaça à quebra dos valores democráticos nos EUA, a partir de uma ação política das FA, não poderia ser mais atual para o cenário político brasileiro. A descrição feita pelo militar muito se assemelha a uma série de atitudes que colocam as FA brasileiras no centro do debate político nacional.

A gradual profissionalização das FA nos últimos 35 anos está sendo testada nos dias que correm. No atual governo, surgiu uma situação diferente dos governos anteriores desde 1985. Desde o período de governos militares, nos últimos 30 anos, podem ter surgido tensões esporádicas, mas atualmente elas se acentuaram a partir da participação de grande número de militares da ativa e da reserva em cargos públicos no governo federal. A crescente exposição dos militares no governo, com acusações de

corrupção, de ameaça à democracia e de contestação das urnas eletrônicas e das ações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), está causando um forte desgaste à imagem pública das Forças Armadas. Os acontecimentos do 7 de setembro, com o silêncio eloquente dos comandantes militares, contudo, reafirmaram o papel profissional e constitucional das FA. A politização das Polícias Militares estaduais preocupa, em especial se apoiarem pessoas armadas, não militares, passíveis de reforçar um

movimento de apoio ao presidente, porque poderão se chocar com as FA.

Nas últimas semanas, afirmações de que as Forças Armadas não assistirão passivamente ao pleito, de que as FA deverão fazer apuração paralela da votação, por questionar o sistema de urnas eletrônicas e a lisura das apurações (auditoria privada), e o pedido do ministro da Defesa para a divulgação das sugestões de aprimoramento da eleição apresentadas pelos militares, sobre a função das FA (“o permanente estado de prontidão das Forças Armadas para o cumprimento de suas missões 

constitucionais”) parecem reforçar a ideia de que as FA poderiam desempenhar um papel de poder moderador, à luz do artigo 142 da Constituição, quando, na realidade, não há uma nova missão para as Forças Armadas além daquela definida pela Carta Magna, como decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Apesar da dubiedade de afirmações sobre a preservação da democracia, sobre eleições conturbadas, sobre ato de força que ponha em risco as instituições (“só Deus me tira daquela cadeira”) e parcialidade do TSE, não há sinais de que as FA, como instituição, poderão se engajar numa aventura que ameace as eleições e a democracia. A discrição da maioria das lideranças militares, em especial do Alto Comando, parece indicar que os militares deverão se manter dentro de seu papel de instituição de Estado,

profissional, sem interferência política em apoio de partidos ou grupos políticos ou em decisões tomadas pelas instâncias civis competentes.

Assim, não me parece haver ameaça à realização das eleições nem ações violentas antes de 2 de outubro, mas o roteiro que está sendo traçado indica que, dependendo do resultado da eleição, é real o risco de, no dia 2, haver mobilização de grupos radicais, armados, para tentar atacar o STF ou o TSE, não o Congresso, como no caso dos EUA. De qualquer forma, a sociedade civil, o Congresso e as próprias Forças Armadas devem estar atentos e mobilizados para evitar qualquer tentativa de ameaça à democracia.

As eleições brasileiras estão despertando crescente atenção no exterior também pela presença dominante de dois políticos que, por razões diferentes, despertam fortes reações e apreensão sobre as perspectivas políticas e econômicas do País. A preocupação com a preservação da democracia e a condenação do autoritarismo estão muito presentes hoje num cenário de grande instabilidade global e de crescente confronto entre os dois regimes de governo representados pelos EUA e por China/Rússia.

Não tenho dúvida de que, se houver qualquer quebra das regras democráticas com o apoio das Forças Armadas, a reação vinda de fora será imediata e o Brasil poderá ser alvo de sanções econômicas e comerciais que, além de aumentar o isolamento internacional do País, afetarão ainda mais o crescimento e os setores mais dinâmicos da economia nacional.

*

É PRESIDENTE DO CENTRO DE DEFESA E SEGURANÇA NACIONAL (CEDESEN)

quinta-feira, 3 de março de 2022

Pra que serve a guerra - Maria Cristina Fernandes (Valor)

 Pra que serve a guerra

Só o front interno da guerra sucessória explicaria a troca no comando do Exército

Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico, 3/03/2022

https://valor.globo.com/politica/coluna/pra-que-serve-a-guerra.ghtml


Ao final dos oito minutos e 37 segundos que durou sua declaração depois do encontro com o presidente brasileiro, quase o dobro do que falou Jair Bolsonaro, Vladimir Putin encarregou-se de informar ao público sobre o ineditismo da reunião que, naquele momento, se desenrolava entre os chanceleres e os ministros da Defesa dos dois países. A inclusão do ministro Walter Braga Netto e de sua contraparte russa Serguei Choigu na reunião dos chanceleres Carlos França e Serguei Lavrov foi uma tentativa da Rússia de vender armas para o Brasil às vésperas do ataque à Ucrânia.

Não deu em nada, mas expôs a esquizofrenia da política externa de um presidente cuja diplomacia, duas semanas depois, votaria pela condenação da Rússia na Assembleia Geral da ONU, descolando-se dos outros três parceiros do Brics (China, Índia e África do Sul), que se abstiveram.

Só o front interno explicaria a troca no comando do Exército

O que o Brasil ganhou com a exposição pública dessa esquizofrenia? Não se sabe se o vereador Carlos Bolsonaro e sua turma aprenderam alguma coisa em Moscou, mas a viagem está longe de ter sido um desperdício para o bolsonarismo. Tem uma aposta retórica e outra, estratégica - para o front interno de sua disputa, esclareça-se. Ambas arriscadas.

Se, como disse duas vezes em Moscou e repetiria no Carnaval do Guarujá, Bolsonaro foi à Rússia compartilhar com Putin “a crença em Deus e nos valores da família”, a carnificina da guerra tratará de contradizê-lo. Além disso, parece ter resolvido enfrentar sua base olavista, liderada pelo ex-chanceler Ernesto Araújo, mantendo a viagem à Rússia porque achou que pegava mal essa coisa de não conseguir ser levado a sério por ninguém fora do Brasil.

Foi isso que disse no Guarujá: “Fui o último chefe de Estado que foi lá. Pelo espaço que [Putin] deu para mim, somos importantes. Somos bem recebidos em qualquer lugar (...) o Brasil é um exemplo para o mundo”. Um repórter levantou a bola e ele cortou, certo de que destroçaria o presidente francês, Emmanuel Macron e afagaria o autocrata russo a quem chamou de “amigo” incapaz de promover um massacre: “Macron foi recebido sozinho no aeroporto. Para mim teve honras militares. Ele ficou afastado da mesa, apesar de vacinado. Putin ficou sem máscara ao meu lado. Achei uma deferência enorme, carinho mesmo pelos brasileiros”.

Se não colar, ele muda o discurso. Mais consolidada é a parceria de Braga Netto, com quem parece ter escolhido ir adiante em sua jornada de mistificação. Desde a viagem a Moscou, Bolsonaro passou a colocar Braga Netto no mesmo patamar de França como ministros aos quais ele recorre para definir sua política externa.

Se Hamilton Mourão lhe ofereceu a blindagem contra impeachment, o ministro da Defesa promete mais. É um combo de vantagens que precede a eleição de 2018 e ultrapassa a de 2022. Ao retornar da Rússia, onde Braga Netto era a estrela de uma comitiva composta de ministros de origem militar, à exceção do chanceler, Bolsonaro foi à reunião do Alto Comando do Exército.

Encontrou um colegiado ressabiado com a aproximação do Brasil com a Rússia mas tolerante com o azedume do presidente com o Supremo Tribunal Federal. Não apenas compartilhou sua intenção de nomear Braga Netto para a vice como a de fazer do atual comandante do Exército, general Paulo Sérgio Oliveira, o ministro da Defesa. A primeira informação já parecia ser do conhecimento de todos, dada a percepção de que a Defesa tem se dedicado à divulgação das ações da Pasta com especial afinco.

A escolha do general surpreendeu mais. Não apenas porque Bolsonaro chegou a pedir sua cabeça no episódio que resultou na saída do ex-ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, como também porque Paulo Sérgio Oliveira, tem conduzido a tropa à maneira de seu antecessor - sem declarações e rigoroso no controle da politização dos quartéis.

Sua saída neste momento, lembra um general da reserva com franca interlocução naquele colegiado, aproxima a dança das cadeiras no comando do Exército brasileiro com aquele do governo João Goulart. Em dois anos e meio o Exército de Jango foi comandado por quatro generais. Na Nova República, a permanência dos comandantes por quatro anos só foi quebrada no impeachment de Collor. Se a troca se efetivar agora, será o terceiro comandante do Exército no mandato do capitão.

É por esta razão que outro general da reserva, conhecedor dos fatos, teme que a escolha seja feita não para levar o general Paulo Sérgio Oliveira para a Defesa, mas para tirá-lo do comando do Exército. É uma repetição do que aconteceu na Defesa em 2021. A necessidade de abrigar o Centrão na Casa Civil foi a desculpa para colocar o ex-titular da Pasta, Braga Netto, na Defesa quando o que se queria mesmo era desalojar Azevedo e Silva e, em seguida, o general Leal Pujol do comando do Exército.

Para isso, seria preciso que o nome a ser escolhido para o comando do Exército rezasse pela cartilha de Bolsonaro. O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Luiz Eduardo Ramos, reza, mas não é aceito pelo Alto Comando. Marco Antonio Freire Gomes, comandante de Operações Terrestres e único general da ativa na comitiva de Moscou, passa, até porque o colegiado não aposta que um dos seus se guie pela cartilha do capitão. Mas tem uma vaga no Superior Tribunal Militar prometida, sinecura que lhe garantiria 12 anos de sombra ante a aventura de 9 meses no comando de uma tropa que o capitão quer manipular.

A costura de uma troca no comando do Exército no meio da guerra na Ucrânia dá uma ideia da dramaticidade de seu destino. O atual ministro da Defesa, que foi interventor na segurança pública do Rio em 2018, não é apenas a caixa-preta das relações da polícia militar com as milícias cariocas. Ele era o coordenador do comitê de crise na covid-19.

Nessa condição, participou da reunião em que foi proposta a troca da bula da cloroquina, esteve à frente da negociação com o consórcio da OMS pela Covax facility, que resultou no atraso de recebimento de vacinas pelo Brasil, e das decisões retardadas que resultaram na crise do oxigênio em Manaus. Por isso, foi arrolado pela CPI da Covid no crime de pandemia, previsto no Código Penal. É um dos 68 de uma lista encabeçada pelo presidente da República.

Ao colocar Braga Netto na vice, Bolsonaro busca uma equação para o presente, com um exército sobre o qual possa influenciar, e para o futuro. Quer a cumplicidade das Forças Armadas para evitar que ele e seu vice acabem no xadrez. Arrisca findar num abraço de afogados.


Maria Cristina Fernandes é jornalista do “Valor”. Escreve às quintas-feiras

E-mail: mcristina.fernandes@valor.com.br

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Presidente diz que tem certeza de apoio total das Forças Armadas - FSP

 O brochável se acredita invencível, e por isso vem recrudescendo a cada vez, mas será devidamente enquadrado pelo Judiciário e pelas próprias FFAA:


Presidente diz que tem certeza de apoio total das Forças Armadas

Folha de S.Paulo | Poder

13 de Agosto de 2021

Ricardo Delia Coletta, Marianna Holanda e Mateus Vargas

Brasília - O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a se referir às Forças Armadas como "poder moderador" e disse ter certeza do apoio dos militares às "decisões do presidente para o bem da nação".

As falas desta quinta-feira (12) ocorrem num momento de crise como Judiciário e em meio a críticas contra o presidente por tentativa de politizar as Forças Armadas.

"Nas mãos das Forças Armadas, o poder moderador. Nas mãos das Forças Armadas a certeza da garantia da nossa liberdade, da nossa democracia, e o apoio total às decisões do presidente para o bem da nação", disse, em cerimônia de cumprimento a oficiais promovidos.

O ato ocorreu no Palácio do Planalto. Também estiveram presentes o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e os comandantes do Exército, Paulo Sérgio, da Marinha, Almir Garnier, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista.

O evento inaugurou, oficialmente, o uso optativo da máscara no Planalto. A diretriz foi dada pelo locutor, que fez uma pausa antes de dizer que o item era "opcional". Na palco, Bolsonaro e os ministros Augusto Heleno (GS 1 ), Ciro Nogueira (Casa Civil) e Braga Netto ficaram sem máscara.

Apesar de o acessório ainda ser recomendado para locais fechados e aglomerações, nas cerimônias com o presidente não é indispensável. O próprio Bolsonaro não o usa em muitas ocasiões.

Mais cedo, Bolsonaro criticou o presidente do STF (Su premo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, por ter defendido seu colega Luís Roberto Barroso, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Em entrevista à Rádio Jovem Pande Maringá (PR), sugeriu "corporativismo" da corte. "O próprio ministro do Supremo Tribunal Federal, presidente Fux, na sua nota, disse que 'mexeu comum, mexeu com todos'. Não é assim."

"Se um militar aqui faz alguma coisa de errado, eu sou militar, o que nós fazemos? A gente investiga. Se tiver responsabilidade, vai pagar o preço. Altíssimo. Agora, não pode ter corporativismo nessas questões", acrescentou.

Na semana passada, a ameaça de Bolsonaro de usar armas "fora das quatro linhas da Constituição" irritou mi nistros do STF e levou Fux a fazer um discurso contundente. Ele disse que Bolsonaro não cumpre a própria pa lavra e cancelou reunião entre os chefes dos Três Poderes que havia convocado.

As novas declarações do presidente se somam a afirmações golpistas em que ele disse, até, que as eleições de 2022 podem não ocorrer caso não fosse instituído o voto impresso no país - na última terça-feira (10), PEC (proposta de emenda à Constituição) para obrigar a impressão do voto foi rejeitada pela Câmara.

Também na terça, antes da votação, Bolsonaro acompanhou, da rampa do Planalto, um desfile de blindados visto como uma tentativa de intimidação contra o Parlamento.

Em breve discurso, declarou que os militares têm compromisso de agir contra "ameaças externas e internas" sem detalhar sobre o que se referia.

"Obrigada por existirem [Forças Armadas], pela tradição e pelo compromisso de dar vida pela pátria, se precisofor. Quer sejam ameaças externas ou internas. Nós sabemos o que é bom e o que é justo para o nosso povo. A nossa liberdade não tem preço."

Não foi a primeira vez que Bolsonaro falou sobre um suposto papel decisório das Forças. Em janeiro, em meio ao debate sobre início da vacinação contra a Covid e as medidas de isolamento social, chegou a afirmar, em tom de ameaça que "quem decide se um povo vai viver na democracia ou na ditadura são as su as Forças Armadas".

Nesta quinta,à rádio, disse que iria reduzir a pressão pela adoção do voto impresso, mas voltou a insinuar, sem provas, que as eleições no Brasil não são seguras e ter "ouvido falar" sobre as suspeitas.

"Vou diminuíra pressão da minha parte, vou diminuir a pressão, sim, porque tem mui ta coisa para fazer pelo Brasil, mas não podemos esquecer, porque se esse pessoal conseguir, no ano que vem, não me cobrem nome do país, por favor, botar alguém sentado na minha cadeira presidencial mais simpático a outras ideologias."

O mandatário levantou ainda a possibilidade de eleições para governadores e senadores serem fraudadas no ano que vem. "Poderiam, não estou afirmando."

"Vamos conviver com essa sombra de dúvida. Não é sombra não, isso aí é tempo fechado."

Em determinado momento da entrevista, Bolsonaro também chegou a ironizar a decisão da CPI da Covid de sugerir indiciá-lo por charlatanismo e curandeirismo, por incentivar o uso de medicamentos sem eficácia comprovada. A informação foi antecipada na quarta-feira (11) pela coluna Mônica Bergamo, da Folha.

"Como não tem como me acusar, vão me denunciar por charlatanismo e curandeirismo", disse e soltou uma gargalhada, em seguida.


sexta-feira, 18 de junho de 2021

Existe algum risco de golpe militar no Brasil? Não, embora o capitão gostaria que ocorresse - Paulo Roberto de Almeida

 Existe algum risco de golpe de Estado por militares no Brasil? Não, mas o capitão está preparando algum. Não conseguirá...

Paulo Roberto de Almeida

Não veja riscos imediatos de o Brasil resvalar para um governo autocrático, ou seja, uma ditadura aberta, em moldes tradicionais; o próprio regime militar, na sua longa duração de duas décadas, se encarregou de “vacinar” o Brasil contra novas incidências desse tipo. Mas é um fato que os últimos dois anos e meio de um desgoverno medíocre e caótico redundaram numa deterioração sensível de muitas das instituições de Estado, bem como da qualidade das políticas públicas de governo. Não existe nenhuma dúvida que o personagem nefasto que ocupa a cadeira presidencial gostaria de se ver dotado ou investido de poderes que a Constituição lhe veda, ou de exercer algum controle sobre as duas outras instituições de Estado, e suas agências especializadas. Entre estas, também é notório que as FFAA, de modo geral, mas o Exército em particular, se envolveram ou se deixaram envolver numa ação de apoio político (e até logístico, quando não eleitoral) que redundaram nessa deterioração institucional que já é evidente e perigosa. 

Os militares, em geral, e determinados setores em particular, atuaram em total contradição com os requerimentos de uma situação em completo descalabro financeiro, buscando e obtendo vantagens corporativas e pessoais que estão em nítido descompasso com o presente estado econômico do país e das contas públicas. O mais surpreendente é, justamente, a subserviência demonstrada em diversos episódios constrangedores aos olhos da opinião pública, quando não da ética e da moralidade política. Esse rebaixamento de padrões já se manifestou em pesquisas de opinião registrando a nítida diminuição e deterioração da imagem geralmente positiva que as FFAA tinham conquistado três décadas depois do final da ditadura militar, da qual elas saíram bastante chamuscadas em seu prestígio e imagem pública, quando não em sua qualidade técnica a serviço da nação. 

Assim como o presente desgoverno não tem precedentes em toda a história do país, não existem registros comparáveis quanto à imagem pública das FFAA, salvo em momentos de comoção política mais forte: revoltas tenentistas do início do século XX, golpe do Estado Novo e implantação de uma feroz ditadura, novamente golpe militar em 1964, com episódios sombrios que mancharam a honra e a reputação das Forças e de seus integrantes – envolvidos em casos de torturas, assassinatos, desaparecimentos, arbítrio e violência, atos de crueldade e de desumanidade raramente vistos em nossa história – e inclusive colocaram certos setores das FFAA numa situação de rompimento com o Estado de Direito e com preceitos claros de natureza constitucional. 

Mas, todos os episódios anteriores tinham um claro contexto de conflitos no próprio tecido social e no sistema político nacional. Atualmente, temos o primeiro exemplo histórico, e espera-se o único e derradeiro, no qual a própria chefia do governo e do Estado se apresenta como o fator de ruptura na normalidade democrática e da quebra de padrões institucionais, sem a conivência das FFAA, mas tampouco com uma atitude de distanciamento crítico que seria de se esperar de comandantes comprometidos com a manutenção de um ambiente de plena vigência do Estado de Direito: as ameaças atuais parte do chefe de Estado e comandante das FFAA, que invoca abusivamente o apoio de que supostamente dispõe nas corporações de defesa e de segurança do país, inclusive com sérias ameaças de quebra de disciplina e de hierarquia. Por algo menos do que isso, os militares se insurgiram em 1963-64, resultando no golpe militar que dividiu o país por mais de duas décadas. O país volta a estar dividido atualmente, e um pouco da responsabilidade incumbe claramente às FFAA. 

Não vejo, portanto, riscos imediatos de o Brasil resvalar para um governo autocrático, ou seja, uma ditadura aberta, em moldes tradicionais; o próprio regime militar, na sua longa duração de duas décadas, se encarregou de “vacinar” o Brasil contra novas incidências desse tipo. Mas é um fato que os últimos dois anos e meio de um desgoverno medíocre e caótico redundaram numa deterioração sensível de muitas das instituições de Estado, bem como da qualidade das políticas públicas de governo. Não existe nenhuma dúvida que o personagem nefasto que ocupa a cadeira presidencial gostaria de se ver dotado ou investido de poderes que a Constituição lhe veda, ou de exercer algum controle sobre as duas outras instituições de Estado, e suas agências especializadas. Entre estas, também é notório que as FFAA, de modo geral, mas o Exército em particular, se envolveram ou se deixaram envolver numa ação de apoio político (e até logístico, quando não eleitoral) que redundaram nessa deterioração institucional que já é evidente e perigosa. 

Os militares, em geral, e determinados setores em particular, atuaram em total contradição com os requerimentos de uma situação em completo descalabro financeiro, buscando e obtendo vantagens corporativas e pessoais que estão em nítido descompasso com o presente estado econômico do país e das contas públicas. O mais surpreendente é, justamente, a subserviência demonstrada em diversos episódios constrangedores aos olhos da opinião pública, quando não da ética e da moralidade política. Esse rebaixamento de padrões já se manifestou em pesquisas de opinião registrando a nítida diminuição e deterioração da imagem geralmente positiva que as FFAA tinham conquistado três décadas depois do final da ditadura militar, da qual elas saíram bastante chamuscadas em seu prestígio e imagem pública, quando não em sua qualidade técnica a serviço da nação. 

Assim como o presente desgoverno não tem precedentes em toda a história do país, não existem registros comparáveis quanto à imagem pública das FFAA, salvo em momentos de comoção política mais forte: revoltas tenentistas do início do século XX, golpe do Estado Novo e implantação de uma feroz ditadura, novamente golpe militar em 1964, com episódios sombrios que mancharam a honra e a reputação das Forças e de seus integrantes – envolvidos em casos de torturas, assassinatos, desaparecimentos, arbítrio e violência, atos de crueldade e de desumanidade raramente vistos em nossa história – e inclusive colocaram certos setores das FFAA numa situação de rompimento com o Estado de Direito e com preceitos claros de natureza constitucional. 

Mas, todos os episódios anteriores tinham um claro contexto de conflitos no próprio tecido social e no sistema político nacional. Atualmente, temos o primeiro exemplo histórico, e espera-se o único e derradeiro, no qual a própria chefia do governo e do Estado se apresenta como o fator de ruptura na normalidade democrática e da quebra de padrões institucionais, sem a conivência das FFAA, mas tampouco com uma atitude de distanciamento crítico que seria de se esperar de comandantes comprometidos com a manutenção de um ambiente de plena vigência do Estado de Direito: as ameaças atuais parte do chefe de Estado e comandante das FFAA, que invoca abusivamente o apoio de que supostamente dispõe nas corporações de defesa e de segurança do país, inclusive com sérias ameaças de quebra de disciplina e de hierarquia. Por algo menos do que isso, os militares se insurgiram em 1963-64, resultando no golpe militar que dividiu o país por mais de duas décadas. O país volta a estar dividido atualmente, e um pouco da responsabilidade incumbe claramente às FFAA. 


Brasília, 18/06/2021

domingo, 6 de junho de 2021

Militares se dobram a Bolsonaro - Daniel Carvalho, Ricardo Della Coletta (FSP)

 Sob Bolsonaro, militares vão de moderadores a controlados por presidente

Depois da demissão do general Fernando Azevedo do Ministério da Defesa, ingerência de mandatário sobre Forças Armadas ficou mais evidente

Daniel CarvalhoRicardo Della ColettaFolha de S. Paulo, 5/06/2021
BRASÍLIA

Se no início do governo Jair Bolsonaro os militares espalhados pelo primeiro escalão serviam como um anteparo para conter o radicalismo gestado no gabinete do ódio e nos braços ideológicos da gestão federal, a situação mudou dois anos depois.

Há quem perdeu a força ou até mesmo o cargo, enquanto outros militares se aproximaram do bolsonarismo e do jogo político conduzido pelo presidente. Tanto que alguns ganharam de colegas de farda um apelido: "generais do centrão".

O movimento permitiu que as Forças Armadas passassem a sofrer uma interferência política cada vez maior —evidenciando que quem manda é Bolsonaro— a despeito da hierarquia e das regras tão caras aos militares.

O principal sinal de enfraquecimento militar até então havia sido, no fim de março, a demissão do general Fernando Azevedo e Silva do Ministério da Defesa. A troca na pasta resultou na saída dos comandantes das três Forças, coroando a maior crise militar desde 1977.

Nos últimos dias, porém, a ingerência de Bolsonaro sobre os militares foi além.

Na quinta-feira (3), o comandante do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, aceitou a pressão do mandatário ao decidir livrar o general da ativa Eduardo Pazuello de qualquer punição por ter participado de um ato político ao lado do presidente.

Além disso, Pazuello ainda ganhou o cargo de secretário de Estudos Estratégicos da Secretaria de Assuntos Estratégicos, vinculada à Presidência da República. Ao levá-lo para um posto no Planalto, Bolsonaro deixou ainda mais claro que não aceitaria castigo para o ex-ministro.

Diante do desfecho produzido pelo presidente, muitos integrantes da cúpula das Forças Armadas que defendiam uma punição para Pazuello protagonizaram um contorcionismo retóricopara não se opor à decisão forçada por Bolsonaro —ou evitaram se manifestar em condição de anonimato, ao contrário do que fizeram nos últimos dias.

Defensor da punição, o vice-presidente Hamilton Mourão foi passar o feriado no Rio de Janeiro e, questionado pela Folha, não comentou o caso.

general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz, demitido cargo de ministro da Secretaria de Governo em junho de 2019, disse em uma rede social que não estava falando com jornalistas por vergonha.

"É uma desmoralização para todos nós. Houve um ataque frontal à disciplina e à hierarquia, princípios fundamentais à profissão militar. Mais um movimento coerente com a conduta do presidente da República e com seu projeto pessoal de poder. A cada dia ele avança mais um passo na erosão das instituições", afirmou.

General Santos Cruz
na sexta

VERGONHA!

Ontem, 3 de junho de 2021, fui surpreendido com telefonemas e mensagens de dezenas de jornalistas sobre o encerramento do caso Pazuello. Em atenção ao trabalho que fazem, sempre respondo, mesmo que seja para informar que nada tenho a dizer. Mas ontem eu não disse nada. Por vergonha.

Por formação, me nego a fazer qualquer consideração sobre a decisão.

Sobre o conjunto dos fatos, é uma desmoralização para todos nós. 
Houve um ataque frontal à disciplina e à hierarquia, princípios fundamentais à profissão militar. Mais um movimento coerente com a conduta do Presidente da República e com seu projeto pessoal de poder. A cada dia ele avança mais um passo na erosão das instituições. 

Falta de respeito pessoal, funcional e institucional. Desrespeito ao Exército, ao povo e ao Brasil. Frequentemente, com sua conduta pessoal, ele procura desrespeitar, desmoralizar pessoas e enfraquecer instituições.

Não se pode aceitar a SUBVERSÃO da ordem, da hierarquia e da disciplina no Exército, instituição que construiu seu prestígio ao longo da história com trabalho e dedicação de muitos.
Péssimo exemplo para todos. Péssimo para o Brasil. 
À irresponsabilidade e à demagogia de dizer que esse é o "meu exército", eu só posso dizer que o "seu exército" NÃO É O EXÉRCITO BRASILEIRO. Este é de todos os brasileiros. É da nação brasileira.

A politização das Forças Armadas para interesses pessoais e de grupos precisa ser combatida. É um mal que precisa ser cortado pela raiz. 

Independente de qualquer consideração, a UNIÃO de todos os militares com seus comandantes continua sendo a grande arma para não deixar a política partidária, a politicagem e o populismo entrarem nos quartéis.

Carlos Alberto dos Santos Cruz”


Entre congressistas, o ato do comandante do Exército foi visto como mais uma mancha na imagem da instituição e elevou o temor de que ele abra as portas para possibilidade de anarquia nos quartéis.

O cenário atual em que os militares deixaram de ser uma força moderadora e passaram a ser controlados por Bolsonaro, que já usou diversas vezes a expressão "meu Exército", contrasta com episódios registrados no início do governo ou mesmo na campanha.

​​Quando Bolsonaro ainda era candidato, no Rio de Janeiro, o general da reserva Augusto Heleno(atual ministro da Segurança Institucional) já era conhecido como uma das mentes por trás da campanha.

Na transição em Brasília, o militar também tinha papel de destaque, quando atuava para conter os influenciadores ideológicos mais radicais do presidente, como o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

O papel também era atribuído a outros fardados que se juntaram a Bolsonaro no governo, como Santos Cruz, Azevedo e Hamilton Mourão.

Depois, ingressaram no grupo os generais Luiz Eduardo Ramos, que foi para a reserva somente quando já era ministro da Secretaria de Governo —hoje ele está na Casa Civil— e Walter Braga Netto, que migrou da Casa Civil para a Defesa quando da demissão de Azevedo.

O núcleo militar do governo, como os fardados eram conhecidos, vivia em constante cabo de guerra com o grupo apelidado de ala ideológica, formada por seguidores do escritor Olavo de Carvalho.

Em alguns episódios, os militares fizeram valer sua vontade.

Ainda em fevereiro de 2019, em meio ao aumento de tensão entre com o ditador Nicolás Maduro, os conselheiros militares conseguiram convencer Bolsonaro a escalar Mourão como chefe de uma delegação que participou de uma conferência sobre a crise venezuelana em Bogotá.

À época, Maduro havia recém-fechado a fronteira da Venezuela com o Brasil, em retaliação à autorização dada pelo governo brasileiro para que opositores venezuelanos usassem Roraima como base para envio de ajuda humanitária. A escalação de Mourão foi vista como uma tentativa de reduzir as tensões.

Em outra vitória do grupo militar, ainda no início da gestão Bolsonaro, o então ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo, conseguiu articular a demissão de dois aliados do chanceler Ernesto Araújo da diretoria da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos).

A agência vinha passando por uma série de crises desde o início do governo.

O êxito de Santos Cruz, no entanto, foi breve. Cerca de um mês depois, ele foi demitido por Bolsonaro da pasta que ocupava, após atritos com o vereador filho do presidente.

Mourão, por sua vez, foi acionado em outra ocasião para tentar servir como força moderadora e pragmática frente à agenda bolsonarista.

Diante do aumento da pressão internacional contra a agenda ambiental do governo, Bolsonaro indicou seu vice para coordenar o Conselho da Amazônia. Mourão comanda uma estrutura cada vez mais esvaziada, e Bolsonaro tem respaldado o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) em conflitos recentes com o vice.

Nas demais questões, Mourão nem sequer é consultado e já sabe que não integrará a chapa de Bolsonaro pela reeleição. Ambientado na política, pretende disputar uma cadeira no Senado pelo Rio Grande do Sul em 2022.

Outros generais do primeiro escalão, por sua vez, se aproximaram do ambiente político.

Com bem menos influência, Heleno chegou a dizer que mudou a opinião que tinha sobre o centrão. O grupo era rejeitado por Bolsonaro na campanha e hoje dá sustentação ao governo no Congresso.

Ramos aumentou sua proximidade com a política no período em que esteve à frente da Secretaria de Governo. Muito próximo a Bolsonaro, promoveu rearranjos e hoje é uma das principais vozes que defendem as ingerências de Bolsonaro nos assuntos militares.

Em fevereiro do ano passado, garantiu a saída de Onyx Lorenzoni da Casa Civil e trouxe para a posição seu amigo Braga Netto. Em março, coordenou a dança das cadeiras que trocou os titulares de seis pastas.

Já Braga Netto, ao assumir a Defesa, deixou de lado o perfil discreto que tinha e passou a discursar a militantes do presidente e a acompanhar o mandatário em passeios de moto em agendas extraoficiais.​