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domingo, 4 de abril de 2010

1023) O Brasil no Wall Street Journal - Rodrigo Constantino

Toda vez que sai uma matéria na imprensa internacional dizendo que o Brasil está bem, as "gentes" ficam entusiasmadas e correm para cantar novas loas a quem vocês sabem. Uma análise mais promenorizada, como esta que faz o economista Rodrigo Constantino, mostraria que os motivos de comemoração são bem outros, e que os de preocupação continuam presentes...

A matéria do WSJ
Rodrigo Costantino
29 de março de 2010

Em matéria sobre o Brasil, o renomado The Wall Street Journal conclui, de forma bastante otimista, que o amanhã chegou para o "país do futuro". Naturalmente, alguns esquerdistas já correram para soltar fogos de artifício: viva Lula! Seria bom mais cautela para esta turma, que já se queimou com a comemoração precipitada da matéria da The Economist com o Cristo Redentor na capa. Fica parecendo que essa gente nem sequer lê as matérias, e que o complexo de vira-lata é tão forte que eles vibram de emoção sempre que algum ícone do capitalismo faz elogios ao país. Se ao menos lessem a reportagem, evitariam tanto constrangimento. Tentarei facilitar a tarefa deles, colocando alguns trechos da matéria (em itálico), comentados em seguida por mim (em negrito).

"But the country has enormous challenges it must overcome before it can fully live up to its potential. Its public sector is bloated and riddled with corruption. Crime is rampant. Its infrastructure is badly in need of repair and expansion. The business environment is restrictive, with a labor code ripped from the pages of Benito Mussolini's economic playbook. Brazil also risks patting itself on the back so much that it fails to see the colossal work that remains to be done."

Logo no começo, o WSJ faz um caveat: os desafios que o país ainda enfrenta são enormes! E quais seriam esses desafios? Ora, justamente aquilo que a esquerda defendeu a vida inteira! O que ainda temos de ruim, de empecilhos ao progresso, é exatamente aquilo que figuras como Lula e Dilma sempre defenderam. Abaixo, maiores detalhes desses pontos.

"Things started changing in the 1990s. The government adopted strict monetary policies and a laser-like focus on balancing the books. That fiscal prudence has given the country remarkable cash reserves—and breathing room during crises."

O que aconteceu com a "herança maldita"? O WSJ parece pensar diferente do PT: o que veio ANTES é o que foi responsável pelas mudanças mais estruturais, e justamente aquilo que o PT lutou para impedir: estabilidade da moeda, responsabilidade fiscal, abertura comercial etc.

"Even a pledge for a bigger state role in the economy by Dilma Rousseff, Mr. da Silva's outgoing chief of staff and his hand-chosen successor as the party's candidate, isn't scaring off the business community. "It's refreshing to have an election and see there's no fuss about either outcome," says Andrew Béla Jánszky, a Brazilian investment lawyer in the São Paulo office of Shearman & Sterling LLP. "For once, stability is almost a given."

Ou seja, ATÉ MESMO uma Dilma da vida não assusta tanto, porque eles acreditam que ela não vai fazer... o que sempre defendeu na vida! Aqui está o maior ponto de discordância entre mim e o WSJ: considero a visão deles bastante ingênua. A Dilma não é "mais do mesmo"; ela é uma ameaça enorme de retrocesso, de mais autoritarismo ainda, de passos largos rumo ao modelo venezuelano. Souberam iludir o jornalista do WSJ direitinho com a retórica deles. Para cada público, um discurso diferente. Acorda, minha gente!

"For one thing, even after sweeping reforms, the government's role in the economy remains relatively big. Government spending totals more than 20% of the country's gross domestic product, compared with about 15% in the U.S., 13% in China and 7% in Indonesia, another fast-growing emerging market, according to data compiled by Mosaico Economia Política, a Brazilian consultancy."

Ops! Um dos maiores problemas do país: o tamanho excessivo do governo! E o que Dilma defende? Justamente mais governo ainda, um Estado "forte", ou seja, um monstrengo inchado que se mete em tudo na economia e nas nossas vidas. O que o país tem de pior é aquilo que Dilma mais gosta!

"Another problem is the restrictive business environment, especially strict labor laws that date back to the 1940s and were originally modeled on the statist policies of Mussolini."

Pois é... um dos piores pontos para o Brasil é a nossa lei fascista trabalhista, aquela que garante infindáveis privilégios aos sindicatos, aquela que dificulta a vida dos empresários, que gera desemprego e informalidade, e sim, que a esquerda adora e não aceita mudar! O país precisa de reformas liberais trabalhistas. A esquerda defende isso?

"Yet another obstacle to growth is a lack of infrastructure—from roads, railways and bridges to docks, airports and pipelines."

E o PAC?! Ah sim, Lula já vai lançar o segundo PAC, e o primeiro mal começou! Os setores que ficam sob a responsabilidade do governo são os mais caóticos? Não acredito!

"Crime is still a big problem in most cities and in lawless rural areas where ruthless prospectors, loggers and landowners at times ride roughshod over their neighbors."

Acho que o WSJ não defenderia muito o "movimento social" chamado MST, tão próximo do PT.

Em resumo, a matéria do WSJ se mostra bem otimista com o Brasil, é verdade. Mas aponta os pricipais obstáculos, todos eles bandeiras que os esquerdistas defenderam a vida toda. Para superá-los, o país necessita de muitas REFORMAS LIBERAIS. Mas não há partido que defenda tais reformas, muito menos o PT. Ao contrário: Dilma representa um retrocesso em relação a todas essas mudanças necessárias. E eis o maior erro do WSJ, em minha opinião: ignorar este risco, aceitar a premissa de que Dilma é apenas "mais do mesmo". Não é! Dilma é a candidata de Chávez. Ela representa, mais ainda que Lula, uma guinada rumo ao modelo autoritário venezuelano.

O segundo erro do jornal é pegar a foto relativamente favorável da economia brasileira, e ignorar seus pilares de areia. Aumento de transferências do governo para os mais pobres, crédito público explodindo, aumento de gastos públicos, nada disso representa um modelo de crescimento sustentável. Sem as reformas estruturais, o país terá apenas vôos de galinha, e continuará sim sendo o eterno "país do futuro". O WSJ tem a obrigação de saber bem disso. Afinal, ao lado do Heritage Foundation ele publica o Índice de Liberdade Econômica todo ano, que coloca o Brasil entre os menos livres do mundo. Sem liberdade econômica, não há progresso de longo prazo. O governo Lula e sua candidata Dilma, por acaso, defendem mais liberdade econômica ou mais Estado gerindo a economia? Pois é...

8 comentários:

Anônimo disse...

Paulo,

Como estudante de economia, antenado na imprensa internacional, fico impressionado com o tamanho da falta de informação sobre o Brasil no exterior. Na minha avaliação, o governo Lula não fez absolutamente nada que fosse realmente relevante para o desenvolvimento da nação. A educação continua uma porcaria, a infra-estrutura precária, e a política fiscal constantemente pró-cíclica. Sempre me lembro deste artigo de Gustavo franco para a Época: http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/Epoca39_Causas_Efeitos.html .

Abraços, Zamba

Glaucia disse...

Professor,

Acho essa histeria toda um pouco fútil. Evidentemente que não é pelos belos olhos de Franklin Martins que o Brasil se tornou uma das mais sérias realidades (promessa é a Indonésia) a merecer atenção entre investidores internacionais. Enquanto nossos liberais negarem o aumento de bem-estar econômico experimentado pela maior parte da população, ameaçando com base em suas filosofias bem-alimentadas sucessos de público e de crítica como o bolsa família, estão fadados a fazer sucesso para mães que leem a Veja na piscina do clube, e talvez seus maridos na sala de bilhar.

Acho que a oposição tem mais chances com uma pergunta do tipo da do FHC: "Há quem acredite que certo autoritarismo burocrático com poder econômico-financeiro pode favorecer o crescimento econômico. A China está aí para demonstrar que isso é possível. Mas é isso o que queremos para nós?"

Paulo Roberto de Almeida disse...

Glaucia,
Voce precisa fundamentar melhor suas afirmacoes:
Quem foi ou quem sao os liberais que negam o aumento do bem-estar economico. Se voce se refere aos tucanos, eles podem dizer que foram eles que comecaram esse aumento, posto que o controle da inflacao representou o maior programa de redistribuicao positiva de renda que o Brasil ja conheceu desde Cabral (como diriam um aproveitador de programas alheiros).
Ridiculo afirmar que liberais se comprazem em negar aumento de bem-estar, quando o que eles pedem, justamente, é uma economia mais livre, um Estado menos despoupador, para que os investimentos aumentem e com ele os empregos e a renda.
Liberais sao sim contra programas de distribuicao de beneficios sem contrapartida, com objetivos claramente populistas, como o Bolsa-Familia, um imenso curral eleitoral.
Nao sei o que é uma filosofia "bem alimentada". Você que parece saber o que é, poderia escrever uma tratado a esse respeito e eu terei prazer de publicar neste blog.
Parece que você tem especial ojeriza da revista Veja, uma revista que não deve ser melhor ou pior das demais que estão no mercado disputando leitores, que eles apenas conseguirão reter se possuirem credibilidade. Revistas sem credibilidade costumam viver de subsídios públicos, como algumas que entraram na lista de ajuda pública do MinC, você deve saber quais são..
Pessoas que têm raiva de Veja, geralmente rezam por uma cartilha determinada, que você também deve saber qual é...

Não vejo, por fim, nenhuma contradição entre a primeira parte de seu comentário e a pergunta do FHC: uma coisa não tem absolutamente nada a ver com a outra. FHC estava se referindo ao modelo autocrático de desenvolvimento, que o PT parece preferir, posto que está sempre elogiando os planos econômicos dos governos militares.
Deve ser o vezo estatizando do PT, que o faz se aproximar da China, sem saber que a China é muito mais capitalista do que o Brasil, no plano da competição de mercados, justamente.
Petistas precisam viajar mais para a China. Você também aliás...
Paulo Roberto de Almeida
(Dubai, 5 de abril de 2010)

Vinícius Portella disse...

Paulo,

Lamento que Rodrigo Constantino, apesar de falar de coisas importantes, não trabalhe com esmero seu argumento. Há uma esquerda não muito bem delimitada, ainda que possamos concordar quanto a sua oposição a uma série de reformas econômica e politicamente necessárias. É fato: o argumento desenvolvido é fraco, com uma série de asserções que não encontram apoio no texto. E aqui deixo claro que não me refiro à inexistência de bases para elas, mas que estas bases não são apresentadas, decorrendo disso a deficiência argumentativa do expresso por Constantino. E como a esquerda não é abordada com riqueza de detalhes nem o projeto de Dilma é apresentado, o texto peca também por ser um tanto vago. Além de não lançar maiores esclarecimentos sobre a situação atual enfrentada pelo país e em como Dilma pode de fato ser um retrocesso e nos lançar mais ainda para o buraco. Eu não compartilho o alarmismo de Constantino, apesar de endossar a ideia de que o modelo petista reforça um paquiderme estatal que sufoca e impõe grandes obstáculos ao crescimento do país. No entanto, eu gostaria de ver essa questão tratada de maneira mais hábil e competente do ponto de vista lógico, de modo que eu pudesse refinar minhas concepções. Rodrigo Constantino não defende da melhor maneira, ao proceder assim, as ideias que advoga. Diante disso, penso aprender mais com teus textos e o de outros do que com os do economista citado, os quais, infelizmente, algumas vezes tangenciam a irrelevância formal. Em verdade, acredito que problemas e opiniões semelhantes são apresentados e desenvolvidos nos últimos artigos publicados por Roberto Campos de maneira muito mais refinada, contundente e alinhavada. Valem mais a leitura.

Quanto à Veja, sabemos que ela é atacada principalmente por antípodas ideológicos à linha editorial dessa publicação. Entretanto, um exame pormenorizado da revista também revelará artigos marcados pela inconsistência e pela frouxidão argumentativa. O que não impede de serem publicados ótimos artigos na revista - isto ocorre, mas em menor número. Todavia, os problemas de Veja não são exclusivos da revista e se apresentam em grande parcela do mercado editorial brasileiro. Sem mais palavras: quem se incomoda com a revista, é simples, basta não a ler. Se a revista sobrevive, é porque muitos não compartilham tal desconforto...

Um grande abraço!

Vinícius Portella disse...

DESCULPAS, MAS NÃO ME LEMBRO SE CONSEGUI ENVIAR ESTE RECADO ANTES...

Paulo,

Lamento que Rodrigo Constantino, apesar de falar de coisas importantes, não trabalhe com esmero seu argumento. Há uma esquerda não muito bem delimitada, ainda que possamos concordar quanto a sua oposição a uma série de reformas econômica e politicamente necessárias. É fato: o argumento desenvolvido é fraco, com uma série de asserções que não encontram apoio no texto. E aqui deixo claro que não me refiro à inexistência de bases para elas, mas que estas bases não são apresentadas, decorrendo disso a deficiência argumentativa do expresso por Constantino. E como a esquerda não é abordada com riqueza de detalhes nem o projeto de Dilma é apresentado, o texto peca também por ser um tanto vago. Além de não lançar maiores esclarecimentos sobre a situação atual enfrentada pelo país e em como Dilma pode de fato ser um retrocesso e nos lançar mais ainda para o buraco. Eu não compartilho o alarmismo de Constantino, apesar de endossar a ideia de que o modelo petista reforça um paquiderme estatal que sufoca e impõe grandes obstáculos ao crescimento do país. No entanto, eu gostaria de ver essa questão tratada de maneira mais hábil e competente do ponto de vista lógico, de modo que eu pudesse refinar minhas concepções. Rodrigo Constantino não defende da melhor maneira, ao proceder assim, as ideias que advoga. Diante disso, penso aprender mais com teus textos e o de outros do que com os do economista citado, os quais, infelizmente, algumas vezes tangenciam a irrelevância formal. Em verdade, acredito que problemas e opiniões semelhantes são apresentados e desenvolvidos nos últimos artigos publicados por Roberto Campos de maneira muito mais refinada, contundente e alinhavada. Valem mais a leitura.

Quanto à Veja, sabemos que ela é atacada principalmente por antípodas ideológicos à linha editorial dessa publicação. Entretanto, um exame pormenorizado da revista também revelará artigos marcados pela inconsistência e pela frouxidão argumentativa. O que não impede de serem publicados ótimos artigos na revista - isto ocorre, mas em menor número. Todavia, os problemas de Veja não são exclusivos da revista e se apresentam em grande parcela do mercado editorial brasileiro. Sem mais palavras: quem se incomoda com a revista, é simples, basta não a ler. Se a revista sobrevive, é porque muitos não compartilham tal desconforto...

Um grande abraço!

Paulo Roberto de Almeida disse...

Caro Zamba,
De fato, os jornalistas estrangeiros são bem mal informados sobre a realidade brasileira, salvo alguns postados no próprio Brasil e escrevendo a partir do Brasil (nem todos; tem também aqueles que preferem ficar na praia e resumir a Veja da semana para seus jornais respectivos).
Eles são geralmente superficiais e apenas olham os números do momento, sem seguir os meandros da política econômica e, sobretudo, as intenções reais de certos promotores de "justiça social" (com o dinheiro dos capitalistas e da classe média, obviamente).
Grato pela remissão ao artigo do Gustavo Franco, que vou postar aqui, para um debate mais esclarecido.
Paulo Roberto de Almeida
(Aeroporto de Dubai, 5.04.2010)

Paulo Roberto de Almeida disse...

Vinicius,
De fato, o Rodrigo Constantino simplifica um pouco, ou "estereotipa" demais as posicoes do PT para melhor reforçar seus argumentos quanto ao vezo estatizante das políticas econômicas que trazem a marca do PT.
Mas, o exagero serve justamente para destacar o que de mais característico existe nessas orientações de política econômica, e creio que, exageros retóricos à parte, ele tem perfeitamente razão quanto ao SENTIDO dessas políticas.
Quanto a Veja, eu não me preocuparia muito em distinguir matérias boas de matérias ruins. Como todo veículo de comunicação, tem seus bons e maus jornalistas, gente brilhante e gente mais para o medíocre, e até alguma "má intenção" em determinadas matérias. Imprensa livre é isso mesmo: tem do bom, do mau e do feio.
Leitores inteligentes e bem informados sabem distinguir uma boa matéria e descartar as ruins ou puramente maldosas. Eu descarto provavelmente 90 por cento da revista quando ela me chega (aliás, já terei lido o que de mais interessante existe na internet, versão online, e o que sobra é pura fofoca, que se lê apenas para deleite momentâneo).
Paulo Roberto de Almeida

Vinícius Portella disse...

Paulo,

Todos sabemos do projeto estatizante que o PT tem para o Brasil, que tem buscado implementar em seus governos e que busca dar continuidade com sua candidata à presidência da república. O problema de R.Constantino - e é claro que não só dele - são seus flertes com irracionalismos. Opiniões, ainda que verdadeiras, sem a devida fundamentação lógica, não se prestam ao debate racional. Isso aproxima Constantino de incontáveis esquerdistas que procedem da mesma maneira, além de fazer com que a aceitação ou não de suas palavras se dê em função de juízos de valor ou por outras reflexões que não as por ele apresentadas.
Bem podemos dizer, extrapolando tuas palavras anteriores, que no debate existe o bom, o mau e o feio . No entanto, não encontramos no que se gesta no "Patropi" a mesma graça da trilha de Morriconne.
Não me espanta que o país tenha seguido esses rumos dada a penúria intelectual de tantos círculos dos mais variados matizes ideológicos. Mas abandono este ponto que de nada adianta prosseguir em tais considerações.

Um grande abraço,
é sempre um prazer discutir contigo.