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quarta-feira, 28 de abril de 2010
2101) Politica Externa Brasileira: limites e possibilidades
Por Luiz Feldman
Valor Econômico, 27/04/2010
Uma afirmação clássica é de que o Brasil não possui excedentes de poder para atuar.
A recente relevância internacional do país tem motivado reflexão da sociedade brasileira sobre sua imagem A maior relevância do Brasil no plano internacional tem suscitado, nos últimos anos, um debate público cada vez mais amplo a respeito dos erros e dos acertos de sua política externa. As análises do desempenho diplomático do país não dispõem, todavia, de um critério inconteste que se sobreponha aos demais. Esse democrático exercício de avaliação é conformado, na verdade, por uma rica pluralidade de opiniões, que oferece ao espectador diferentes perspectivas sobre o interesse nacional.
É oportuno, nesse contexto, mapear as críticas às relações exteriores no governo Lula, administrador de turno dessa nova importância do Brasil no cenário mundial. Compreendê-las ajuda a identificar alguns dos desafios a serem enfrentados pelos futuros programas de política externa no Brasil.
Três vertentes críticas podem ser delineadas. Elas referem-se ora aos limites materiais da projeção exterior do país, ora aos morais, ora a ambos.
A primeira delas, evocada na recente incursão presidencial em temas de alta política no Oriente Médio, diz respeito à clássica afirmação de que o Brasil não possui excedentes de poder. Questiona-se a eficácia do instrumental diplomático brasileiro, que seria materialmente incapaz de alterar a conduta dos atores envolvidos nos conflitos que pretende mediar. O país deveria, argumenta-se, utilizar de modo mais criterioso o capital político (soft power) de que dispõe.
Essa visão, embora censurando um voluntarismo exagerado, é congruente com o discurso oficial de que, justamente por não ser uma potência militar, a contribuição do Brasil estaria na exemplaridade de seus métodos racionais para o equacionamento de conflitos. No entanto, corre paralelo a esse raciocínio pacifista outro tipo de crítica, segundo a qual o país deveria fazer sentir o poderio que já detém ao menos em seu entorno regional, onde empresas brasileiras estariam operando sob hostilidade e sem uma retaguarda diplomática firme. Para além da reversão das assimetrias estruturais em sua
vizinhança, o desafio para o Brasil, que tem um interesse estratégico em uma ordem global regulada pelo direito internacional, reside em assegurar que esse eventual método da robustez (se e quando necessário em alguma de suas arenas de negociação) seja coerente com o da racionalidade.
A segunda vertente, notabilizada pelas polêmicas acerca das relações com Cuba, Honduras e Irã, diz respeito ao diagnóstico de imoral ideologização da diplomacia brasileira. Em alguns casos, a busca de vantagens de ocasião ou de afinidades valorativas junto a regimes autoritários silenciaria a condenação de violações de direitos humanos por eles cometidas. Em outros, a conveniência recomendaria tomar o partido de aliados de esquerda na vida política interna de países amigos. Por um lado, a identidade democrática do Brasil seria manchada; por outro, o princípio de não-intervenção seria desrespeitado.
O chamado por uma advocacia mais clara dos direitos civis e políticos em outros países é pertinente em vista do princípio de prevalência dos direitos humanos, inscrito no art. 4º da Constituição Federal de 1988. A justa reivindicação de que a diplomacia projete valores caros à sociedade brasileira encerra, entretanto, um dilema. Embora a forma democrática de governo do Brasil possa ter um bem-sucedido efeito demonstração na América Latina, assumir essa irradiação democrática como causa política poderia implicar, como já se aventou, fazer do Brasil um fiscal do Estado de Direito na região, o que tornaria necessário ponderar o (igualmente constitucional) princípio da
não-intervenção.
A terceira vertente, que tem sido enunciada em artigos de opinião em língua inglesa, diz respeito aos parâmetros para que o Brasil se qualifique como uma potência responsável. O argumento, assentado no receio de que maiores excedentes de poder dêem alcance e repercussão mundiais a um comportamento autônomo imoral do país, distingue-se da crítica anterior à medida que seu parâmetro de sensatez para a diplomacia brasileira se torna a compatibilidade desta com os interesses globais das potências do Atlântico Norte.
A insinuação de que o Brasil corre o risco de se tornar um pária internacional é descabida. Como se sabe, a política externa da Nova República tem priorizado a credibilidade, pela adesão à ordem político-econômica ocidental.
A bem dizer, recorrendo a Machado de Assis, o que se coloca para as potências emergentes é a liberdade para teimar pela reforma da ordem global e pela redefinição da própria ideia de conduta responsável. De um lado, trata-se da redistribuição do poder decisório em foros internacionais, caso da Organização das Nações Unidas e das instituições de Bretton Woods. De outro, trata-se da construção de novas agendas e da legitimação de velhos direitos na governança global. Pense-se, por exemplo, na criação de um quadro legal que regule as migrações internacionais (dificultada pelas reservas dos países receptores de população, mas justificada pelo imperativo de proteção de nacionais no exterior), e no domínio pleno dos usos pacíficos da energia nuclear (defendido de forma coerente com a obrigação de não desenvolver artefatos atômicos, apesar das reticências das potências centrais).
O aumento da relevância internacional do país em tempos recentes tem motivado reflexão na sociedade brasileira sobre sua imagem. Como observa oprofessor Hans U. Gumbrecht, a própria ideia de um duplo perfil externo do Brasil - ora Terceiro, ora Primeiro Mundo - pode vir a ser colocada em cheque, onde sirva para justificar complacência com as mazelas internas. Isso ilustra a importância do debate público sobre o status do Brasil no mundo, que ao esclarecer as potencialidades do país no cenário internacional mas também os limites inerentes à sua projeção, ajuda a delinear os caminhos que a política externa trilhará na busca do sempre fugidio equilíbrio entre seus vários pesos
e suas muitas medidas.
Luiz Feldman é mestre em Relações Internacionais pela PUC/Rio.
9 comentários:
UMA SUGESTÃO PARA UM POST...
A “Revista Time” acaba de escolher Lula como o líder mais influente do mundo (categoria 'leaders'). Barack Obama ficou em quarto lugar na mesma lista da revista americana. O cineasta Michael Moore escreveu um texto sobre ele. Para conferir: http://www.time.com/time/specials/packages/article/0,28804,1984685_1984864_1984866,00.html
Eis a lista: Leaders:
1. Luiz Inácio Lula da Silva
2. J.T. Wang
3. Admiral Mike Mullen
4. Barack Obama
5. Ron Bloom
6. Yukio Hatoyama
7. Dominique Strauss-Kahn
8. Nancy Pelosi
9. Sarah Palin
10. Salam Fayyad
11. Jon Kyl
12. Glenn Beck
13. Annise Parker
14. Tidjane Thiam
15. Jenny Beth Martin
16. Christine Lagarde
17. Recep Tayyip Erdogan
18. General Stanley McChrystal
19. Manmohan Singh
20. Bo Xilai
21. Mark Carney
22. Sister Carol Keehan
23. Sheik Khalifa bin Zayed al-Nahyan
24. Robin Li
25. Scott Brown
Para conferir:
http://www.time.com/time/specials/packages/completelist/0,29569,1984685,00.html#ixzz0mUnFUmJ1a
Luiz Inácio Lula da Silva
By MICHAEL MOORE Thursday, Apr. 29, 2010
When Brazilians first elected Luiz Inácio Lula da Silva President in 2002, the country's robber barons nervously checked the fuel gauges on their private jets. They had turned Brazil into one of the most inequitable places on earth, and now it looked like payback time. Lula, 64, was a genuine son of Latin America's working class — in fact, a founding member of the Workers' Party — who'd once been jailed for leading a strike.
By the time Lula finally won the presidency, after three failed attempts, he was a familiar figure in Brazilian national life. But what led him to politics in the first place? Was it his personal knowledge of how hard many Brazilians must work just to get by? Being forced to leave school after fifth grade to support his family? Working as a shoeshine boy? Losing part of a finger in a factory accident?
No, it was when, at age 25, he watched his wife Maria die during the eighth month of her pregnancy, along with their child, because they couldn't afford decent medical care.
There's a lesson here for the world's billionaires: let people have good health care, and they'll cause much less trouble for you.
And here's a lesson for the rest of us: the great irony of Lula's presidency — he was elected to a second term in 2006 and will serve through this year — is that even as he tries to propel Brazil into the First World with government social programs like Fome Zero (Zero Starvation), designed to end hunger, and with plans to improve the education available to members of Brazil's working class, the U.S. looks more like the old Third World every day.
What Lula wants for Brazil is what we used to call the American Dream. We in the U.S., by contrast, where the richest 1% now own more financial wealth than the bottom 95% combined, are living in a society that is fast becoming more like Brazil.
Moore's latest film is Capitalism: A Love Story
Excelente artigo, hein? Parece-me que faltou uma mencao apenas. Como faz lembrar o - embora factualmente errado - post acima, a fascinacao dos estrangeiros com Lula nao deixa de ser fator ponderavel no peso internacional que o Brasil aparenta ter. Da mesma forma, dificilmente se notaria a presenca do pais se a orientacao tivesse sido a de seguir os direcionamentos vindos do Norte sobre conduta responsavel. Verdade, finalmente, que o atual governo deixa um pais significativamente mais presente (tanto economica quanto diplomaticamente) no exterior do que herdou.
O artigo do Feldman é, de fato, muito equilibrado e essencialmente correto, para quem é de fora do MRE. Para quem é de dentro haveria tantos comentários a fazer, que não vale a pena: os universos mentais de acadêmicos e diplomáticos estão, justamente, universos à parte.
Quanto ao artigo de Michael Moore, se trata de uma peça tão mentirosa e demagógica quanto o próprio autor, que só consegue encantar true believers, basbaques e outros enviesados mentais como ele próprio.
É MENTIRA que Lula seja a personalidade mais influente do planeta, vindo em primeiro lugar que tem Obama em quarta posição.
O ridículo de tal assertiva é tal que nem me dou ao trabalho de comentar.
Pessoas que tem olhos, ouvidos e cérebro costumam ter seus próprios julgamentos, não pautar-se por uma seleção que tem Lady Gaga como uma das pessoas mais "influentes" do planeta.
Certas coisas pedem um mínimo de senso do ridículo...
Paulo Roberto de Almeida
MEA CULPA
Gostaria de retificar a informação que postei. A revista Time considera Lula um dos 25 líderes mais influentes do mundo, não o mais influente. A lista divulgada não é um ranking.O fato de Lula estar no topo da lista não quer dizer que ele é o líder mais influente do mundo.
Caro Mr. Moore,
Não cremos que o Sr. Lula seja maior que o Brasil(...eles passarão; nós passarinho...), tampouco que o tenha "reinventado"! Antes de elegê-lo como nosso "Grande Pai Branco", escrevendo tais sandices, sugerimos ao "cara-pálida" que "cruze o Rio Grande"(...genuine son of Latin America's working class..!) e constate, in loco, a verdadeira face de nosso "faroeste caboclo"; para que não incorra no erro de "enterrar nossos corações(juntamente com nossa história) na curva de um rio"!
Vale!
Meu caro Anônimo,
O Moore é um dos mais perfeitos idiotas americanos: um demagogo, um mentiroso, um fanfarrão, além de tudo de má fé. Para mim, um completo desclassificado, embora admirado por um bando de idiotas que também apreciam Noam Chomsky, Boaventura, Emir Sader, e outros idiotas fenomenais.
É preciso sofrer de indigência mental para apreciar mentirosos como esses, perfeitos fraudadores da realidade, demagogos sem vergonha.
Argh!!!
Paulo Roberto de Almeida
ERRATA
Gostaria de retificar a afirmação que fiz no meu primeiro comentário de que a revista Time escolheu o presidente Lula como o líder mais influente do mundo. Embora o presidente Lula apareça em primeiro lugar na lista divulgada pela revista, essa relação não é um ranking. Desse modo, o correto é dizer que essa publicação o escolheu como um dos 25 líderes mais influentes do mundo.
EXCESSIVA ADJETIVAÇÃO E CARÊNCIA DE ARGUMENTAÇÃO SUBSTANTIVA
Prezado professor Paulo Roberto,
Ao ler o seu comentário sobre Michael Moore, lembrei-me de um ensinamento que o senhor costuma ministrar em relação àqueles que o criticam utilizando-se de excessiva adjetivação com absoluta carência de argumentação substantiva. Isso me parece vir bem a calhar aqui. Impressionei-me com a quantidade de adjetivos utilizados para qualificar Michael Moore: mentiroso, demagogo sem vergonha, enviesado mental, perfeito idiota, fanfarrão, desclassificado, fraudador da realidade, entre outros. Em contrapartida, não há uma única argumentação substantiva no seu comentário. Acrescente-se a isso, o fato de também qualificar com praticamente os mesmos adjetivos aqueles que admiram o trabalho deste cineasta americano. Creio que não deva existir uma única pessoa no mundo que pense exatamente igual a outra. Se considerarmos cada pessoa que pense de forma diferente da nossa como um idiota, penso que não estaremos tão distante daquele famoso personagem do romance “O Alienista” de Machado de Assis... O sublime da razão está justamente em nos capacitar a explorar os argumentos alheios com acurácia e lógica, reajustando nosso próprio pensamento à medida que nos convencemos de nossos erros. Espero que o senhor possa apresentar uma argumentação mais substantiva da próxima vez – sem a necessidade de desqualificar aqueles que não pensam igual ao senhor.
Cordialmente,
José Marcos
José Marcos,
Concedo o ponto quanto ao estilo, mas não quanto ao conteúdo.
Apenas pessoas desinformadas, ou politicamente propensas a aceitar, preventiva e favoralmente, qualquer "argumento" que esse cineasta expresse em seus documentários, conseguem admirar ou apreciar as produções desse indivíduo, conhecido como mentiroso contumaz nos EUA, e por isso mesmo apreciado por certos círculos que estão dispostos a partilhar suas deformações cinematográficas.
Creio que entre as suas posições politicamente favoráveis ao referido cineasta, e as minhas próprias, existe um universo galático, assim que nunca concordaremos quanto à substância.
Por isso recomendo que você fique com suas convicções, que lhe trazem conforto.
Apenas parece que as minhas lhe trazem um imenso problema, e por isso você toma o trabalho de pretender me refutar.
Concluindo, reafirmo que concedo o ponto quanto à forma -- já que o bom método recomendaria que eu trouxesse evidências da falta de caráter do citado documentarista, o que não fiz por falta de tempo, e por achar que não vale a pena me ocupar de tão medíocre e mentiroso personagem -- mas continuo reafirmando minha posição: o trabalho desse cidadão é lamentável do ponto de vista de um trabalho sério de pesquisa e de documentação fiável.
Quem consegue expressar maravilhas do sistema cubano, apenas porque era contra Bush e o sistema de saúde americano, quaisquer que sejam evidências materiais em contrário, só pode ser um mau cineasta e um péssimo analista.
A questão não está em concordar ou não com quem pensa diferente de si mesmo, a questão está em se ater à realidade ou fantasiar sobre ela.
O documentarista se encaixa nesta segunda categoria...
Paulo Roberto de Almeida
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