Diplomatizzando

Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).

terça-feira, 9 de julho de 2013

Gastos publicos: ainda o debate sobre politicas de investimentos edespesas correntes

O debate econômico no país da meia-entrada

07/07/2013 por mansueto
Ao contrário do que costumo fazer, hoje vou escrever para sugerir, enfaticamente, que vocês visitem o site do sociólogo, Simon Schwartzman, e leiam o que Samuel Pessoa (economistas do IBRE-FGV) e colunista da Folha escreveu sobre o artigo do economista André Lara Resende que foi publicado na sexta-feira no Valor Econômico. Vou colocar o link no final deste post, mas antes faço algumas observações.
Primeiro, todos sabemos que André Lara Resende é um economista brilhante que junto com Pérsio Arida , Edmar Bacha, Francisco Lopes, Gustavo Franco entre outros foi uma das cabeças por trás da concepção do Plano Real. No entanto, confesso que concordo com todos as críticas que Samuel escreveu no pequeno texto no blog do Simon Schwartzman.
Segundo, a discordância de Samuel em relação ao artigo do Lara Resende concentra-se em três pontos: (i) Lara Rezende acredita que o Nacional Desenvolvimentismo era um projeto que combinava uma rede de proteção social com a industrialização forçada. Da mesma forma que Samuel, não concordo com essa interpretação e existe até uma literatura nova que se chama “O Novo Estado Desenvolvimentista” que mostra bem a diferença entre um modelo que prioriza industrialização forçada (que foi o nosso velho estado desenvolvimentista) versus outro no qual a politica industrial e de promoção setorial competem por recursos com politica social – tem três bons textos sobre isso: dois do Peter Evans e outro do David Trubek. O nosso modelo dos anos 70 não foi ativo em politica social. 
(ii) Samuel discorda da ideia que a maior parte do que o Estado arrecada de nossa elevada carga tributária se transforma em aumento do consumo do governo – ineficiência da máquina pública. É como se o Estado fosse uma grande máquina inchada e que para reduzirmos o gasto público precisaríamos, apenas, de um fabuloso gestor privado. Isso é pura ficção. O Brasil gasta muito com transferências e consegue-se explicar quase todo o aumento do gasto público desde 1990 olhando apenas para as contas públicas ligadas as transferências (previdência e gastos sociais com LOAS, Bolsa Família, seguro desemprego e abono salarial).
É nesse segundo ponto que aparece o “problema da meia-entrada” que Samuel explica e que vem sendo popularizada em um texto do Marcos Lisboa e Zeina Latif. O Estado, no Brasil, gasta muito porque fizemos opção por várias “meias-entradas”, mesmo que essas decisões (como bem lembra meu amigo e ex-presidente do IPEA Fernando Rezende) estejam sujeitas a problemas de assimetria de informação e atuação de grupos organizados (aqui que entra o problema de ação coletiva da Mancur Olson). Nas palavras de Samuel: “a própria sociedade, e não um estamento apartado da sociedade, que se beneficia das meias entradas”.
Concordo com isso. Não foi uma elite dominante que ainda sofre influência do Estado Português colonial que decidiu sobre “nossas jabuticabas”. Infelizmente fomos “nós” com todas os vícios e imperfeições de nosso processo político e a atuação de grupos de pressão. Por isso que Samuel fala, e concordo com ele, que uma forma de tentar corrigir o problema do excesso de “meias-entradas” é deixando claro o custo das políticas: se as pessoas tomam consciência do link entre o que pagam de impostos e como o dinheiro é aplicado isso pode começar um interessante debate que poderia levar a uma reforma tributária e fiscal.
(iii) Por fim, o último ponto que Samuel discorda é que André Lara Resende  associa os movimentos das ruas às necessidades de moderar a demanda por crescimento econômico em função das limitações de recursos naturais do planeta. Lara Resende tem essa ideia fixa que o mundo se aproxima de um limite ao consumo e, assim, precisamos aprender a viver com menos e priorizar qualidade de vida e não mais o crescimento. Acho uma tese interessante, mas tenho uma imensa dificuldade de concordar com essa ideia e não vi ninguém nas ruas defendendo essa tese.
Querer melhor qualidade de vida não significa reconhecer as limitações de recursos naturais do nosso planeta. Na verdade, nós brasileiros adoramos gastar, algo que o próprio Lara Resende reconhece na sua entrevista hoje à jornalista Alexa Salomão, no Estado de São Paulo, quando fala de nossa “estrutural insuficiência de poupança”. – clique aqui para ler a matéria do Estadão.
Já falei muito. Clique aqui e vá ao Blog do Simon Schwartzman para ver a discordância do economista Samuel Pessoa do texto escrito por André Lara Resende e publicado no Valor Econômico (texto do valor aqui). Boa leitura porque esse é um excelente debate, independentemente de você concordar com um ou com o outro.

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Publicado em Economia | Etiquetado carga tributária, contrato social, Industrialização,Nacional Desenvolvimetismo, política social | 9 Comentários

9 Respostas

  1. em 07/07/2013 às 8:29 PM | Resposta
    vinicius
    Essa fixacao do ALR em relacao ao esgotamento iminente dos recursos o descolou da realidade. Não sei se eh reflexo de algum sentimento de culpa em consequencia da sua colecao de carros, mas o fato eh q, a despeito de seu brlhantismo, varias barbaridades tem sido apontadas em suas declaracoes recentes. Um periodo de purificacao, q passe por abrir mao da fortuna amealhada no Matrix pos-bandadiagonalendogena, com retorno a academia, pode devolver-lhe a lucidez

    • em 08/07/2013 às 11:55 AM | Resposta
      Maradona
      Depois de colecionar porsches é normal ter uma indigestão de consumo. Morar muito tempo em Londres pode fazer o cara imaginar que o desejo do brasileiro seja a frugalidade. Mas o cara é muito bom.
      A rede de proteção no anos 50 somente funcionava para uma elite, tipo ex-funcionário do BB, e o seu custo era pequeno demais, mesmo sendo uma certa aberração. Levar o assistencialismo para a “geral” é que ficou caro, que acaba gerando outro tipo de aberração.
      Mas o Estado arrecada muito e a classe média, ex-BB e BF, percebe que o retorno é pífio. E a corrupção dos políticos e a falta de vergonha na cara incomodam. Um gestor faria a diferença sim! Com um mandato de diminuir custos poderia cortar, por exemplo, a dezena de bilhões que o poder legislativo em todas esferas gasta. Bem como impedir que os juízes tenham mais féria que meu filho. Poderia cobrar universidade para quem tem grana.
      Ia esquecendo: o governo petista é retrógrado e o texto está interessante.

  2. em 07/07/2013 às 8:56 PM | Resposta
    opiniaoeanalise
    Sugiro a leitura do texto de Rodrigo Constantino sobre o assunto. Um abraço.

  3. em 08/07/2013 às 9:35 AM | Resposta
    Joana Duarte
    Caro Mansueto,
    Sou jornalista do site Opini�o e Not�cia e admiradora do seu blog, cujas novidades recebo por email. Gostaria de poder publicar algumas de suas opini�es no site, dando cr�dito e link para o blog. Por favor me diga se uma parceria nesses moldes, atrav�s da qual ajudar�amos a divulgar suas opini�es e blog reproduzindo textos no Opini�o e Not�cia, te interessaria.
    Agrade�o desde j� por sua aten��o e pelo envio de novas publica��es do blog via email. Sucesso.
    Abs, Joana Duarte Opini�o e Not�cia

    • em 08/07/2013 às 9:43 AM | Resposta
      mansueto
      Claro Joana, Seria um prazer. Mas como funciona? voces publicariam parte do artigo com o link para o meu blog ou publicariam o artigo completo no site de vocês? Nunca fiz antes esse tipo de parceria e gostaria de saber como funciona antes de tomar decisão. Abs, Mansueto

  4. em 08/07/2013 às 1:16 PM | Resposta
    Vanessa Ferrante
    Adorei o texto do Lara e gostaria de dar a minha opinião: acho que a melhora do país só acontecerá com a maturidade da sociedade. A sociedade brasileira acredita que o bom é ser malandro (vou comprar barato e vender caro sem esforço, não vou trabalhar e vou deixar o governo me sustentar, só trouxas trabalham e poupam). Essa mentalidade do brasileiro, o ganha-perde (eu ganho e o resto da sociedade que se dane) é o que destrói as possibilidades de melhoria. O governo age da mesma forma, assim como os empresários. Enquanto cada um estiver interessado em puxar a sardinha para o seu lado, não andaremos. E isso passa sim por um crescimento que não esgote recursos naturais, acessível à todos, sem o capitalismo feroz. É simplesmente nos acostumarmos a ter a nossa parte, sem querer a do outro, e a separar o básico do supérfluo. Temos que resgatar o valor de fazer um trabalho bem feito, e usar isso para nos motivarmos, e não o lucro desenfreado. É pagar e receber o justo por tudo. O problema do Brasil não é o Estado. É o brasileiro. O Estado ruim é consequencia dos brasileiros que trabalham nele.

  5. em 08/07/2013 às 10:26 PM | Resposta
    Manoel Galdino
    Olá,
    você tem um link ou referência do tal texto do Lisboa e Latif?
    grato
    Manoel

    • em 09/07/2013 às 12:27 AM | Resposta
      mansueto
      Acho que eles ainda não publicaram. Vou checar com eles.

  6. em 09/07/2013 às 12:27 AM | Resposta
    Victor (@PANFLECONOMICS)
    Mansueto, se o ser humano já apresenta vieses comprovados que dificultam o entendimento das consequências não intencionais de políticas públicas (o livro do Kahneman, Thinking Fast and Slow, trata com maestria o tema) e, no caso brasileiro, ainda padece de ínfimas ferramentas cognitivas (temos mais de 70% de analfabetos funcionais, infelizmente é um fato), como vamos esperar que deste mesmo povo venha a compreensão e pressão esperada para fazer as reformas que você e o Samuel descrevem ?
    A verdade é que temos grupos de interesse com poder de vocalização que obstrui qualquer avanço rápido em termos de adoção das pautas corretas. Minha avaliação é que o amadurecimento institucional para isto só virá (e se vier, isto não é uma certeza) na mesma velocidade que andarem a nossa educação.
    Com relação à crítica do consumismo preconizado pelo Lara Resende. Uma análise mais detida, lendo o livro dele “Os Limites do Possivel” dá para entender (e concordar com o ponto dele). Vou tentar resumir aqui meu entendimento àcerca dos argumentos dele: (1) A ciência econômica não pode ter como “drive” o formalismo matemático per si, para isto o cientista social precisa sempre que possível beber de outras fontes. (2) Diante do exposto, ter tão somente o crescimento do PIB como Norte é “too narrow”. Evidências empíricas já demostram que a partir de determinado nível de renda (àquele que supre as necessidades primárias e secundárias) o aumento da felicidade só ocorre através da diminuição das desigualdades. (3) O equilíbrio está a meio caminho entre poupadores contumazes (Alemães e Chineses) e gastadores tresloucados (Gregos e Americanos), caso contrário viveremos de crises em crises e a função do economista é oferecer remédios para estes desequilíbrios. (4) A transferência de renda intergeracional também refletida nas dívidas gigantescas dos países gastadores não é sustentável. Diante do exposto é que a questão da austeridade, como barreira ao consumo irrefreável (leia-se consumismo) vem à tona na tese colocada pelo André. Sugiro a leitura do livro dele e caso não comungue desta mesma interpretação, ficarei contente em receber seu e-mail.


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