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quarta-feira, 7 de maio de 2014

A polarizacao do debate no simplismo e no maniqueismo - Cesar Gandhi e Guilherme Brandao

Surpreendente como o Brasil de hoje vive, bem mais pelo lado de uma esquerda anacrônica do que da "direita" (que praticamente não existe), uma simplificação do discurso político extremamente danosa para um debate profícuo visando nosso avanço cultural.
Paulo Roberto de Almeida 

Muito além do muro
“Falamos da miopia de um mundo binário, maniqueísta: esquerda/direita, bem/mal, certo/errado. Falamos da teimosia em se manter em polos enquanto a vida social segue de forma multitudinal, policromática e ambidestra”
por Congresso em Foco · Publicado em 07/05/2014 08:00
César Gandhi e Guilherme Brandão *

Todo muro tem dois lados. Posições claramente invertidas na história política brasileira, vemos hoje discursos revolucionários da “direita” e até reacionarismos da “esquerda” – aspas porque atualmente poucos se enquadram perfeitamente nessas nomenclaturas. O debate político é demais salutar e muito bem vindo em termos de se lançar luzes sobre o que queremos ser enquanto nação. Todavia, o que preocupa é a crescente fulanização dos discursos, a superficialidade, o excesso de radicalização, e o voo longe da análise dos crescentes obstáculos e das reais oportunidades nacionais.
O sagrado diálogo está cada vez mais distante.
Fulanização
Se há algo claramente em comum hoje entre a esquerda e a direita no Brasil é, tristemente, o discurso do ódio. A falta de empatia é doentia e os dois grupos se digladiam – e não debatem. Esses discursos são lidos e aplaudidos. Opiniões são formadas. E o pensamento político brasileiro é modelado conforme.
Entretanto, talvez o maior problema dessa rinha de galo seja outro: a fulanização. Atacar o individual é quase sempre o retrocesso no debate e impossibilita o clareamento de soluções: o discurso muda de debatedor para debatedor, é transitório, é raso e se perde no ego de cada um.
A crítica pessoal pode até ser pertinente em alguns casos. Afinal, não daria pra analisar homens públicos, que estão na TV, têm biografias publicadas etc., sem partir para aspectos mais subjetivos. Mas quando o debate se restringe ao embate físico fica claro o desserviço que se presta ao país.
São os “esquerdistas”, os “coxinhas”, os “esquerdopatas”, os “entreguistas” que, ao usarem e abusarem desses termos, infantilizam os bate-bocas e estacionam o desenvolvimento político brasileiro. A criatividade ofensiva não cessa; mas pouco se vê de propostas efetivas, inovadoras, empolgantes para ultrapassar nossos obstáculos como nação.
Na retórica, o nome disso é “envenenamento de poço”. Tememos, porém, que esse poço seja a República Federativa do Brasil, e não fulano ou sicrano.
Superficialidade
A falta de proposições é pulsante nesse UFC à distância. Como esponjas, o grosso dos dois grupos absorve o que pode nas manchetes breves dos grandes veículos e se armam com analises alheias rápidas. Pouco se vê em aprofundamento nos grandes temas, e menos ainda em oferta de alternativas. Os canais de comunicação – os tradicionais e os novos – têm grande responsabilidade nesse ponto.
A modernização da administração pública, um salto de qualidade na educação, um sistema de saúde digno, a transfiguração da nossa mobilidade pública do século XXI, são alguns dos temas urgentes que estão a anos-luz do embate rasteiro que hoje se vê. É mortificante assistir a discussões estéreis que, além de ofensas pessoais e saudosismo romântico, passam ao largo de propostas de solução de problemas reais e urgentes.
Quanto mais lançamos nossos olhos, mais parece que a sociedade está se apequenando, se paralisando, se fraudando. Desafios vindos de forma universal para pessoas fragmentadas, binárias, xiitas.
A verdade é que muito além da superficialidade dos debates e da personalização dos conflitos, há desafios titânicos congênitos da República brasileira que não se inserem claramente nas conotações desbotadas da esquerda/direita. Aqui, os intelectuais de cada lado têm falhado.
Temas como sistema de voto proporcional, sistema de governo presidencialista de coalizão, repartição tributária, acesso à cidade e justiça célere são alguns dos pontos fora dos quadrantes estanques. São quase neutros, por isso a maiorias dos nossos intelectuais preferem não cuidar deles. Quem não tem lado, não tem apoio, não tem espaço.
Pontos de conversão: o que há além do muro
Sem pessimismos sombrios, acreditamos que há saída para esse impasse ideológico. Devemos buscar os pontos de contato entre os tais polos. Repetimos: todo o muro tem dois lados. Todo o ponto de vista é a vista de um ponto. Ainda: os desafios do Brasil não são “de lados”. São ambidestros, plurais.
A busca pelo amparo aos incapacitados, a eliminação da pobreza, a equidade competitiva deve ser também uma busca da direita, como já o é para muitos. De igual forma, a esquerda deve visualizar as vantagens da competitividade, da meritocracia, da busca pela eficiência do Estado, os valores da criatividade, inventividade e iniciativa humana. É sonhar demais?
Falamos da miopia de um mundo binário, maniqueísta: esquerda/direita, bem/mal, certo/errado. Falamos da teimosia em se manter em polos enquanto a vida social segue de forma multitudinal, policromática e ambidestra.
Parece urgente falar de alteridade, de visualizar o outro, em 2014?

César Gandhi e Guilherme Brandão são bacharéis em Direito, funcionários públicos e coordenam, ao lado de Walter Brandão, o projeto Erga Omnes, uma iniciativa de caráter apartidário e voluntário que promove a educação política nas escolas públicas de ensino médio do Distrito Federal.
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