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sábado, 10 de maio de 2014

Monsieur Piketty e o Brasil: analise de Roberto Ellery

Monsieur Piketty e o Brasil

Blog do Roberto Ellery
1/05/2014

O livro Capital in the Twenty-First Century é certamente o livro do momento entre economistas e demais interessados em temas como distribuição de renda, crescimento econômico e economia política no sentido tradicional do termo. Não vou repetir o que outros já fizeram com mais competência e comentar o livro. Para os interessados basta uma busca na internet para encontrar tantas resenhas quantas queiram. Da resenha favorável feita por Paul Krugman (link aqui) até os comentários mais críticos feitos por Gregory Mankiw (link aqui) e passando por ninguém menos que Robert Solow (link aqui) é possível encontrar comentários sobre o livro que atendam a todos os gostos, recomendo que leiam todos e, se puderem, leiam o livro. Para os que preferem ler em português a Folha de São Paulo publicou um texto do Paul Krugman sobre o livro (link aqui) e tem as resenhas e os comentários de autores nacionais como Rodrigo Constantino (link aqui) e Carlos Góes (link aqui).

Como podem perceber estou atrasado para fazer minha própria resenha. Porém farei uma pequena provocação ao livro sobre um ponto que imagino tenha chamado atenção de economistas que dedicam seu tempo para entender ou pelo menos acompanhar a economia brasileira. Como ainda não vi ninguém trazer este ponto, eu quero crer que desta vez não estou atrasado. Um dos resultados que mais chamam atenção no livro é que o autor encontra uma condição que caracteriza um processo de concentração de renda. A condição é que a taxa de juros seja maior que a taxa de crescimento da economia. A lógica parte da suposição que a taxa de juros representa de forma aproximada a taxa de crescimento do capital. Se o capital cresce mais rápido do que a renda como um todo então a renda dos capitalistas acaba ficando maior em relação à renda dos trabalhadores. O resultado do processo é um aumento da concentração de renda. Piketty argumenta que isto ocorreu no período anterior às Guerras Mundiais e que está acontecendo novamente. Esta explicação para o processo de concentração de renda foi criticada por Mankiw que, de forma bastante apropriada, lembrou que a condição da taxa de juros ser maior que a taxa de crescimento, seguindo Piketty passarei a chamar essa condição de r > g, nada mais é que a condição para eficiência dinâmica.

Mas não estou escrevendo para repetir a crítica do Mankiw. Estou escrevendo para lembrar que existe pelo menos um caso onde a condição r > g foi observada por um período longo e ocorreu redução da desigualdade. O caso somos nós, isto mesmo, o Brasil. A taxa de juros ficou acima da taxa de crescimento da economia em todos os anos desde 2003 (na realidade também era antes de 2003, escolhi o período posterior a 2003 por ser o período que a queda na desigualdade foi mais festejada e comentada), porém em todos os anos o índice de Gini, que mede a concentração de renda, caiu em relação ao ano anterior. A figura ilustra este fenômeno.



As barras azuis mostram a diferença entre a taxa de juros e a taxa de crescimento, r – g, e a linha vermelha mostra o índice de Gini. A menor diferença entre r e g aconteceu em 2010. Durante três anos a diferença ficou acima de 10% e na maior parte dos anos ficou acima de 8%. Mesmo assim a desigualdade caiu. Alguém podia dizer que a queda da desigualdade decorreu de políticas de transferência de renda patrocinadas pelo governo, seria como se o governo estivesse contrapondo a tendência de concentração imposta pela condição r > g. O problema é que o pessoal que estuda desigualdade e pobreza já nos mostrou que a maior parte da redução da desigualdade ocorrida neste período foi devida a salário, também é fato documentado que a participação da renda do trabalho aumentou no período.

Como fica a teoria de Piketty à luz dos dados brasileiros? A teoria não se aplica ao Brasil? Alguma especificidade de nossa economia impediu o resultado previsto de ocorrer? Existem outros países que seguem o mesmo padrão que o Brasil? A teoria de Pikkety está errada? Dúvidas...

ADENDO

André Bueno Castro me cobrou no FB o uso da Selic e não de uma taxa real, ele está certo. Calcular juros reais é tarefa delicada, dentre as opções acessíveis para um post em um blog a mais razoável seria pegar a Selic no início de cada ano e descontar a inflação esperada para o ano, peguei um caminho mais simples e mais sujeito a críticas. Usei a Selic do final do ano, são os valores que estão na figura original, e descontei a inflação. Feito o ajuste o único ano com r- g <0 é 2010. A figura abaixo repete a figura do blog ajustada pela inflação.



A escolha do período não foi descuido nem preguiça, optei por evitar polêmica e peguei só o período pós-2003. Estritamente falando a queda do Gini começou em 1997, no período 1997 a 2003 a taxa de juros ficou bem acima da taxa de crescimento, na realidade os valores de r - g para 1997 e 1998 são tão altos que distorcem o gráfico. De toda forma para os que ficaram curiosos segue o gráfico para o período 1998 a 2012.



*Como os dados do Ipeada não apresentam o Gini para 2000, o valor do Gini deste ano é uma média entre o de 1999 e 2001.

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