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quinta-feira, 20 de setembro de 2018

A Economist se assusta com Bolsonaro, e o compara a outros ditadores da AL

O Estadão resume o editorial (com direito a capa) da Economist, que pretende combater a ameaça de Bolsonaro, mas que pode acabar promovendo-o um pouco mais.
Primeiro transcrevo a matéria do Estadão, depois o editorial da Economist.

Estadão (20/09/2018): 

'The Economist' chama Bolsonaro de 'a mais recente ameaça da América Latina'

Revista britânica defensora do liberalismo traz candidato do PSL na capa, diz que governo de deputado seria 'desastroso' para o País e a região e cita experiência autoritária na Venezuela e na Nicarágua

O candidato do PSL à Presidência nas eleições 2018Jair Bolsonaro, é o destaque da capa da edição desta semana da revista britânica The Economist. No seu artigo principal, a publicação destaca o deputado como "a mais recente ameaça da América Latina" e considera que um eventual governo Bolsonaro seria "desastroso" para o País e a região. Leia a íntegra do artigo.  
O texto compara o avanço de Bolsonaro e de suas propostas ao avanço do populismo nos Estados Unidos, com Donald Trump; na Itália, com Matteo Salvini; e nas Filipinas de Rodrigo Duterte. Para a Economist, Bolsonaro soube explorar a combinação de recessão econômica, descrédito com a classe política e aumento da violência urbana com a apresentação de visões conservadoras e uma proposta de economia pró-mercado.  
"Os brasileiros não devem se enganar. Bolsonaro tem uma admiração preocupante por ditaduras", diz o texto, que o compara ao ditador chileno Augusto Pinochet. 
A revista lembra também que o principal assessor econômico de Bolsonaro é Paulo Guedes, que, assim como a equipe do ditador chileno, foi educado na Universidade de Chicago, um bastião da ideologia do livre mercado. "Guedes é a favor da privatização de todas as estatais e uma simplificação brutal dos impostos", lembra a revista.  
"A América Latina conheceu homens fortes de todo tipo e a maioria dessas experiências foi horrorosa. Provas recentes disso são a Venezuela e a Nicarágua." 
A revista lembra também que o próximo governo precisará do apoio do Congresso e dificilmente Bolsonaro terá maioria parlamentar. "Para governar, Bolsonaro poderia degradar o processo político ainda mais, potencialmente abrindo caminho para algo ainda pior", diz o texto.  
A Economist ainda diz que a chegada do petista Fernando Haddad ao segundo turno pode jogar muitos eleitores da elite e da classe média que culpam o ex-presidente Lula e o PT pelos problemas do País no colo de Bolsonaro.   
"Em vez de acreditar nas promessas vãs de um político perigoso na esperança de que ele resolva todos os problemas, os brasileiros precisam perceber que a tarefa de consertar sua democracia e reformar sua economia não será rápida nem fácil."


Economist (September 20. 2018): 

A mais recente ameaça da América Latina

Caso seja eleito, Jair Bolsonaro pode colocar a própria sobrevivência da maior democracia da América Latina em risco

"Deus é Brasileiro", diz o ditado que batiza um popular filme do cinema nacional. As belezas do Brasil, suas riquezas naturais e a música fazem o País parecer abençoado de maneira única. Mas ultimamente os brasileiros precisam se perguntar se, assim como no filme, Deus saiu de férias. A economia é um desastre, as contas públicas estão sob pressão e a política está bastante apodrecida. A violência urbana também tem crescido. Entre as 20 cidades mais violentas do mundo, 7 são brasileiras. 
As eleições presidenciais do mês que vem dão ao Brasil a chance de um recomeço. Apesar disso, se a vitória for de Jair Bolsonaro, um populista de direita, os brasileiros correm o risco de tornar tudo pior. O senhor Bolsonaro, cujo nome do meio é Messias, promete a salvação; na verdade, ele é uma ameaça para o Brasil e para a América Latina. 
Bolsonaro é o mais recente de um desfile de populistas: de Donald Trump nos Estados Unidos a Rodrigo Duterte nas Filipinas, passando pela coalizão esquerda-direita de Matteo Salvini na Itália. Na América Latina, Andrés Manuel López Obrador, um agitador de esquerda, tomará posse no México em dezembro. Bolsonaro pode ser um acréscimo desprezível para o clube. Caso seja eleito, ele pode colocar a própria sobrevivência da maior democracia da América Latina em risco. 

Amargor brasileiro

Populistas tiram proveito de um conjunto comum de problemas. Um deles é uma economia em frangalhos, e no Brasil esse fracasso tem sido catastrófico. Na pior recessão de sua história, o PIB per capita encolheu 10% entre 2014 e 2016 e ainda não conseguiu se recuperar. A taxa de desemprego é de 12%. 
O cheiro de uma elite absorta em seus próprios interesses e corrupta é outra queixa - e no Brasil isso se transformou em fedor. O conjunto de investigações conhecido como Lava Jato provocou o descrédito de toda a classe política. Dezenas de políticos estão sob investigação. Michel Temer, que tornou-se presidente em 2016 depois de sua antecessora, Dilma Rousseff, ter sofrido um impeachment com base em acusações não relacionadas (à Lava Jato), escapou de ser julgado pela Suprema Corte só porque o Congresso votou para poupá-lo. 
Luiz Inácio Lula da Silva, outro ex-presidente, foi preso por corrupção e impedido de disputar a eleição. Brasileiros dizem às pesquisas de opinião que as palavras que melhor identificam o País são "corrupção", "vergonha" e "desapontamento". 
Bolsonaro explorou essa fúria brilhantemente. Até os escândalos da Lava Jato, ele era um coadjuvante deputado do Estado do Rio de Janeiro. Ele tem um longo histórico de ofensas  grosseiras. Ele disse que não estupraria uma deputada porque ela era "feia demais"; ele disse que preferia um filho morto a um filho gay"; ele sugeriu que pessoas que vivem em assentamentos fundados por escravos fugidos (quilombolas) eram gordos e preguiçosos. Repentinamente, essa disposição para romper tabus está sendo interpretada como prova de que ele é diferente dos políticos de Brasília. 
Para brasileiros desesperados para se livrar de políticos corruptos e narcotraficantes assassinos, Bolsonaro se apresenta como um xerife durão. Cristão evangélico, ele mistura valores conservadores com liberalismo econômico, ao qual se converteu recentemente. Seu principal assessor nessa área é Paulo Guedes, formado na Universidade de Chicago, bastião das ideias pró mercado livre. Ele defende a privatização de todas as empresas estatais do país e uma brutal simplificação tributária. Bolsonaro pretende também reduzir o número de ministérios de 29 para 15 e colocar generais a cargo de algumas dessas pastas. 
Sua fórmula vem ganhando apoio. As pesquisas dão a ele 28% dos votos e ele é o líder isolado de uma disputa renhida pelo segundo lugar no primeiro turno, em 7 de outubro. Neste mês, ele levou uma facada no abdômen num comício, o que o colocou em um hospital. Isso o fez mais popular e o afastou de um escrutínio mais vigoroso da imprensa e de seus rivais. 
Se ele enfrentar Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), no segundo turno, muitos eleitores de classe média e da elite, que culpam Lula e o PT acima de tudo pelos problemas do País, podem ir para os seus braços. 

A tentação pinochetista

Eles não devem se equivocar. Além de suas visões não liberais no campo do comportamento, Bolsonaro tem uma admiração preocupante por ditaduras. Ele dedicou seu voto pelo impeachment de Dilma Rousseff ao comandante de uma unidade responsável por 500 casos de tortura e 40 assassinatos durante o regime militar, que governou o Brasil entre 1964 e 1985. O vice de Bolsonaro é Hamilton Mourão, um general reformado, que no ano passado sugeriu uma intervenção militar para solucionar os problemas do país. A resposta de Bolsonaro à criminalidade é, com efeito, matar mais criminosos, apesar de, em 2016, a polícia no Brasil ter matado mais de 4 mil pessoas. 
A América Latina já experimentou a mistura entre política autoritária e economia liberal. Augusto Pinochet, o ditador brutal que comandou o Chile entre 1973 e 1990 era assessorado pelos "garotos de Chicago". Eles ajudaram a assentar as bases para a relativa prosperidade chilena de hoje, mas a um custo humano e social terrível. O fatalismo brasileiros sobre corrupção pode ser resumido na frase "rouba, mas faz". Eles não devem se inclinar por Bolsonaro - cuja versão do ditado poderia ser "eles torturaram, mas fizeram." A América Latina conheceu todo tipo de homens fortes, a maioria deles horrorosos. Para provas mais recentes é só olhar para os desastres na Venezuela e na Nicarágua. 
Bolsonaro pode não conseguir converter seu populismo em uma ditadura ao estilo pinochetista, mesmo que ele queira. Mas a democracia brasileira é muito nova. Mesmo um flerte com o autoritarismo é preocupante. Todo presidente brasileiro precisa de uma coalizão no Congresso para aprovar projetos. Bolsonaro tem poucos amigos na política. Para governar, ele poderia ser levado a degradar ainda mais a política, potencialmente abrindo caminho para algo ainda pior. 
Em vez de acreditar em promessas vãs de um político perigoso na esperança de que ele resolva todos seus problemas, os brasileiros precisam perceber que a tarefa de curar sua democracia e reformar a economia não será fácil nem rápida. Algum progresso foi feito, como o veto a doações empresariais e o congelamento de gastos públicos. Mais reformas são necessárias. Bolsonaro não é o homem para entregá-las.
/ TRADUÇÃO DE LUIZ RAATZ


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