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terça-feira, 5 de janeiro de 2021

O ano Merquior (7): o que perdemos em 30 anos de ausência de José Guilherme Merquior? - Josué Montello

 Destaco, do discurso de recepção do acadêmico Josué Montello ao novo acadêmico José Guilherme Merquior, em 11/03/1983, o trecho abaixo, no qual ele destaca o que o novo membro poderia ainda fazer pela cultura e inteligência do Brasil.

Menos de dez anos depois, Merquior falecia, vítima de um câncer fulminante, não detectado pelos médicos franceses em seu início, e ficamos privados do brilho de sua inteligência, desde janeiro de 1991.


De: Josué Montello, no discurso de recepção a José Guilherme Merquior, na ABL: 

(...)

É preciso não esquecer, porém, que essa obra está em pleno processo formativo. Ides ainda em meio do caminho. E pertenceis à linhagem dos escritores que se aprimoram diante do público. Uns esplendem ao amanhecer, como o sol de primavera. Outros, ao meio-dia, como o sol do outono. Outros no entardecer, como o sol de verão.

Este encontro com a Academia ocorre numa hora de plenitude. Mas sei que sois daqueles mestres que têm o sentido da continuidade do trabalho literário, como Alceu, como Jorge Amado. De um de vossos confrades, já ouvi esta determinação: que só deixará de escrever, quando Deus lhe tomar a caneta.

Compreendo que seja assim. A palavra escrita, para o verdadeiro escritor, é uma forma de vida que só a morte tem o dom de interromper. Perguntai a Austregésilo de Athayde qual o segredo de sua vitalidade? E a Alceu? E a Barbosa Lima Sobrinho? E a Afonso Arinos? E a resposta é a mesma: a fidelidade ao trabalho literário. Porque ele é também o nosso testemunho.


 Eu gostaria de chamar a atenção de nossos confrades para um de vossos ensaios, Ut Ecclesia Parnassus, incluído no volume Estruturalismo dos Pobres e outras Questões. É nesse estudo que debateis a função social do escritor na civilização industrial, tomando como ponto de partida o problema da emancipação do pensamento literário, de que a obra de Goethe é mais do que o exemplo – é o testemunho vivo, nas três modalidades fundamentais da mimese poética: a Lírica, a Narrativa e a Dramática.

Nossa época tem esta singularidade: o pensamento político tende a assumir uma postura religiosa, vizinho do fanatismo, na radicalização da luta pelo poder. Chega a ser dogmático. E com este parentesco com a velha Igreja inquisitorial: inclina-se mais a condenar que a tolerar e salvar. Não quer compreender. Sobretudo quando está em causa o velho pensamento liberal. Ortodoxo, sim, heterodoxo, não.

Não creio que Goethe, hoje, depois de dialogar com Napoleão, pudesse manter a sua postura olímpica, acima das controvérsias irritadas. Seria empurrado para a Direita. Com todo o esplendor de seu gênio. Ou insultado, ou condenado ao silêncio.

(...)

A íntegra do discurso de Josué Montello figura neste link: 

https://www.academia.org.br/academicos/jose-guilherme-merquior/discurso-de-recepcao

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