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terça-feira, 13 de junho de 2023

Plano de paz de Lula está paralisado e é visto com ceticismo pela Ucrânia - Patrícia Campos Mello (FSP)

Existem várias ambiguidades nesta matéria sobre o plano de paz de Lula para a Ucrânia, não necessariamente por parte da jornalista, mas em função das posições dos principais interlocutores.

A verdade é que NÃO EXISTE um plano de paz de Lula para a paz na Ucrânia, apenas uma vaga aspiração para que países que "desejem a paz" se congreguem por iniciativa do líder brasileiro para "FALAR DE PAZ", sendo que nenhum deles pode estar fornecendo "armas para a guerra", o que significa que a Ucrânia DEVE PERDER para conseguir a paz.

Paulo Roberto de Almeida


Plano de paz de Lula está paralisado e é visto com ceticismo pela Ucrânia

Kiev tem duas objeções à proposta brasileira e demonstra ceticismo em relação à influência do petista sobre Putin

Patrícia Campos Mello
12.jun.2023 às 23h15

O plano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para negociar o fim da Guerra da Ucrânia está paralisado e enfrenta o ceticismo de Kiev. Após o desencontro na cúpula do G7, no Japão, em maio, não houve mais contato entre o alto escalão do governo brasileiro e a equipe do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, e tampouco há telefonemas ou reuniões planejados para o curto prazo.

Mesmo antes do fracasso da reunião, a Ucrânia se queixava de pouco interesse do Brasil para ouvir o seu lado. Em Hiroshima, o Itamaraty disse ter oferecido três horários para Zelenski, que, ao fim, não foi ao encontro. À Folha, o líder ucraniano se eximiu da culpa pelo fiasco, mas tampouco explicou o que ocorreu.

Em reserva, autoridades ucranianas disseram ser necessário criar uma relação de confiança para que o Brasil tenha um papel relevante num eventual plano de paz para acabar com o conflito. O chefe de gabinete de Zelenski, Andrii Iermak, disse em entrevista à CNN Brasil que vai convidar Brasília para uma cúpula de paz na Ucrânia, ainda sem data para ocorrer.

Lula e Zelenski conversaram por vídeo em 2 de março. Na conversa, o ucraniano pediu que o brasileiro ajudasse a organizar uma reunião com líderes da América Latina, mas o petista teria ponderado que vários países da região, como Nicarágua e Venezuela, tinham posições firmes a favor da Rússia, e outros não gostariam de dar a impressão de que estão se aproximando de um dos lados.

Por isso, segundo Lula, seria difícil promover uma cúpula dessa natureza e ficou acordado que voltaria a falar com Zelenski após retornar da viagem à China, em 12 de abril. Na versão dos ucranianos, o petista disse que tentaria organizar o encontro com líderes latino-americanos, mas nunca mais falou com Kiev.

Depois da visita à China, no entanto, o governo brasileiro recebeu em Brasília o chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, uma passagem que causou mal-estar e críticas. Na tentativa de aparar arestas, Lula enviou Celso Amorim, seu assessor especial para política externa, à Ucrânia. O ex-chanceler, arquiteto da ideia de o Brasil mediar o conflito, reuniu-se com Zelenski em 10 de maio no palácio presidencial em Kiev.

Lá, ouviu do presidente ucraniano que existem diversos planos de paz, mas que a Ucrânia só está disposta a debater aqueles que passem pelos 10 pontos propostos pelo governo em Kiev no final do ano passado.

Desde o desencontro no G7, em 21 de maio, não foi discutido se haverá outra reunião. O governo brasileiro diz que poderia haver uma chance no final de junho, no encontro sobre financiamento ao desenvolvimento promovida pelo francês Emmanuel Macron ou na Assembleia-Geral da ONU, em setembro, em Nova York.

Antes disso, Lula pode se reunir virtual ou presencialmente com Vladimir Putin, mas um encontro bilateral com o presidente russo, após o petista não ter se encontrado com Zelenski, seria visto como mais um gesto brasileiro em favor de Moscou, comprometendo a reivindicação de ser mediador do conflito.

Putin participará da cúpula do Brics na África do Sul, em agosto. Como o Tribunal Penal Internacional emitiu um mandado de prisão contra ele, sob a acusação de crimes de guerra pelo suposto sequestro de crianças ucranianas, não se sabe se o líder russo comparecerá de forma remota ou presencial. A África do Sul ratificou o estatuto de Roma, que criou o tribunal, e, em tese, teria de cumprir o mandado e prender Putin ao desembarcar, algo que não ocorrerá, porque o país concedeu imunidade aos líderes na reunião.

A Ucrânia tem duas objeções à proposta de Lula. Não aceita decretar cessar-fogo nem iniciar o diálogo sem que os russos devolvam os territórios que anexaram ilegalmente. A Rússia ocupa parcialmente quatro regiões na Ucrânia: Donetsk e Lugansk, no leste, e Zaporíjia e Kherson, no sul, além da Crimeia, península tomada em 2014. As áreas são equivalentes a cerca de 18% do território do vizinho invadido.

"Congelar o conflito dá aos russos tempo para treinar e equipar as tropas. Enquanto isso, o mundo vai dizer que a guerra acabou, o conflito terá muito menos atenção, receberemos menos armas, haverá uma normalização", diz Andrii Zagorodniuk, ex-ministro da Defesa e atual assessor do governo da Ucrânia.

Já o deputado ucraniano Artur Gerasimov faz uma analogia: "Imagine que você tem um apartamento de três quartos. O vizinho invade a casa, ocupa a cozinha e começa uma guerra. Aí ele diz: 'Quero paz, mas a cozinha fica com a gente'. É o que a Rússia quer, cessar-fogo, e eles ficam com a Crimeia e o Donbass."

As autoridades ucranianas também demonstram ceticismo em relação à influência de Lula sobre Putin. Sentem mais firmeza na China, que mandou um enviado especial à Ucrânia em maio. Pequim quer que a contraofensiva de Kiev seja suspensa, e as sanções contra Moscou, retiradas, o que o Ocidente descarta.

Ainda assim, eles mantêm aberto o canal de comunicação com os chineses, que, por seu peso político e econômico, têm maior poder de barganha. Kiev acha possível, por exemplo, que a China convença Putin a fazer um gesto de boa vontade, desmilitarizando a região da usina nuclear de Zaporíjia, a maior da Europa.

Outro que estaria mais bem posicionado para mediar o conflito seria o líder da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que dialoga com o Ocidente e com a Rússia, o que permite tanto vender drones a Kiev como se manter em bons termos com Putin a ponto de negociar o pacto para a exportação de grãos ucranianos.

Mas o Brasil tem pontos a seu favor para atrair Kiev e, assim, atuar como mediador. Do Brics, é o país menos pró-Rússia. Xi Jinping e Putin estiveram juntos em Pequim antes da guerra e celebraram uma "amizade sem limites". Em março, o chinês foi a Moscou e reafirmou a aliança. A África do Sul é acusada pelos EUA de fornecer armas à Rússia. E a Índia ajuda a viabilizar a economia russa por meio da compra de petróleo, em volumes bem maiores do que os da venda de fertilizantes ao agronegócio brasileiro.

Além disso, o Brasil é visto como instrumental para influenciar a América Latina. A Ucrânia precisa do apoio do chamado Sul Global —por enquanto, só potências ocidentais têm enviado armas, imposto sanções à Rússia e declarado apoio explícito a Kiev. Na América Latina, apenas Chile, Uruguai, Costa Rica e Guatemala se posicionaram abertamente a favor do país ora invadido, e Zelenski precisa de votos na ONU para criar um tribunal internacional especial que julgue Putin, outro dos pontos de seu plano de paz.

Mas depõem contra o Brasil as seguidas falas de Lula, que, entre outras declarações, chegou a dizer que o líder ucraniano "não pode ter tudo o que pensa que vai querer", algo que foi interpretado como uma sugestão para Kiev abrir mão de territórios como a Crimeia, além da afirmação, na volta da visita à China, de que os EUA incentivam a guerra, referência ao envio de armas para a Ucrânia se defender da invasão.

Na visão do governo brasileiro, Zelenski pode negociar agora ou esperar mais seis meses –a situação militar provavelmente será a mesma, mas outras 100 mil pessoas, estima-se, terão morrido–, enquanto Putin estaria atrás de um fim com algo para mostrar ao público interno. Uma das concessões poderia ser a garantia de que a Ucrânia não integrará a Otan, a aliança militar do Ocidente, o que Kiev descarta.

"Hoje, os ucranianos preferem avançar na contraofensiva a negociar, porque a negociação agora implica perda de territórios", afirma Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da FGV-SP. "Eles têm pressa, e o Brasil quer conversar. A proposta brasileira ajuda a Rússia a ganhar tempo."


terça-feira, 9 de agosto de 2022

O golpe será televisionado, em todos os canais abertos: não precisa de ingresso - Patrícia Campos Mello (FSP)

 Acho que o desenvolvimento do golpe está sendo feito às claras. Não se pode dizer que não ser trata de uma inovação bolsonariana: como é do Bozo será derrotado. E não precisa de Task Force naval americana para, desta vez (e diferente de 1964), para IMPEDIR o golpe. Faremos por nossa própria conta.

Paulo Roberto de Almeida

Convocações golpistas para o 7 de Setembro explodem em grupos de mensagens

Levantamento da UFMG indica crescimento de 290% na última semana de julho em comparação com mesmo período em junho

Filha de São Paulo, 9/08/2022

A circulação de mensagens com menções ao 7 de Setembro em grupos de WhatsApp explodiu na última semana de julho, com crescimento de 290% em comparação com o mesmo período de junho, aponta levantamento do Monitor de WhatsApp da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Segundo a sondagem, feita a pedido da Folha, as mensagens mais compartilhadas citam convocações do presidente Jair Bolsonaro (PL) a apoiadores e têm cunho golpista, com referências a intervenção militar e destituição de juízes do Supremo Tribunal Federal e afirmações falsas sobre as urnas eletrônicas.

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Dentre os mil grupos públicos de WhatsApp monitorados pela UFMG, 469 enviaram mensagens relacionadas ao 7 de Setembro entre 1º de junho e 1º de agosto.

Foram 4.184 mensagens, 69% das quais circularam em grupos de direita, 25,9% em grupos indefinidos —de temática política, mas não alinhados claramente a alguma ideologia— e 5,1% em grupos de esquerda.

"Bolsonaro convocou apoiadores a se unirem a ele no 7 de Setembro, e isso se refletiu, naturalmente, em grupos de WhatsApp e Telegram, que têm apresentado uma grande mobilização, com a organização de caravanas ou conversas sobre o 7 de Setembro como a última vez em que vão às ruas", afirma Fabrício Benevenuto, professor de ciência da computação da UFMG e coordenador do projeto Eleições sem Fake.

"O problema é que muitas dessas mensagens vêm acompanhadas de ataques aos ministros do STF e às urnas eletrônicas e de desinformação relacionada ao processo eleitoral. É preocupante que nos grupos pró-Bolsonaro a convocação para participar dos atos passe por ruptura dos processos democráticos, intervenção militar e ataque às urnas eletrônicas. Parte da motivação envolve extremismo."

O presidente chamou apoiadores para irem às ruas no 7 de Setembro durante discurso na convenção do PL que oficializou sua candidatura. "Convoco todos vocês agora para que todo mundo, no 7 de Setembro, vá às ruas pela última vez. Vamos às ruas pela última vez", disse na ocasião, sob gritos de "mito".

Bolsonaro aproveitou a mesma fala para atacar os ministros do STF, sem mencionar nominalmente seus principais alvos, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin.

"Esses poucos surdos de capa preta têm que entender o que é a voz do povo. Entender que quem faz as leis são os Poderes Executivo e Legislativo. Todos têm que jogar dentro das quatro linhas da Constituição. Isso interessa a todos nós", afirmou.

Em edital publicado no Diário Oficial do Município de quinta-feira (4), a Prefeitura do Rio contrariou os planos do presidente e manteve o desfile na região central, não na orla de Copacabana.

No último sábado (6), Bolsonaro reafirmou que participaria do ato em Copacabana no 7 de Setembro, mas, dessa vez, não citou a participação das Forças Armadas.

A mensagem de texto mais compartilhada nos grupos de WhatsApp monitorados pela UFMG foi enviada 175 vezes em 117 grupos.

"Dia 7 de setembro será o último aviso, a última oportunidade de colocar o país no eixo. Então, presidente, quero te falar, será o último mesmo, se não mudar no dia 7 de setembro e não vier uma resposta do líder que elegemos com quase 70 milhões de votos, EU DESISTO. Eu te elegi para você ficar contra o sistema, te dei autorização para meter o pé na porta do STF, do Congresso e de mais onde for preciso. Estou ratificando esta autorização no dia 7 de setembro", diz o texto.

Outra mensagem entre as mais compartilhadas, enviada 92 vezes em 13 grupos, afirma: "Eu, brasileiro, como cidadão do bem, convoco quem tem amor pelo Brasil e deseja um futuro melhor para nossos filhos e netos a se levantar. Vamos para as ruas antes que seja tarde e o COMUNISMO cale nossas bocas".

Outra das mensagens com grande circulação diz: "PESSOAL, VÃO EM PESO PARA AS MANIFESTAÇÕES NO DIA 7 DE SETEMBRO, O QUE ESTÁ EM RISCO É O FUTURO DO BRASIL E DE SEUS FILHOS, NÃO PODEMOS ACEITAR SERMOS UMA DITADURA E PASSAR FOME IGUAL NA VENEZUELA E NA ARGENTINA... NÃO PODEMOS CAIR NESSA MESMA IDIOTICE, TEMOS QUE AGIR ANTES, NÃO DEPOIS DAS FRAUDES, DEPOIS NÃO HÁ NADA QUE SE POSSA FAZER."

Além disso, há grupos dedicados à convocação para o 7 de setembro, organizando o evento e preparando caravanas de viagem –por exemplo, o grupo "07 DE SETEMBRO (O CHAMADO)", com 195 participantes.



segunda-feira, 10 de maio de 2021

Ernesto mobilizou Itamaraty para garantir cloroquina, mesmo após alertas - Patrícia Campos Mello (FSP)

 Telegramas mostram que Ernesto mobilizou Itamaraty para garantir cloroquina, mesmo após alertas


Em telefonema, Bolsonaro disse ao premiê indiano que havia resultados positivos da droga contra Covid no Brasil

Folha de S. Paulo, 9.mai.2021 às 23h15
Patrícia Campos Mello

O ex-chanceler Ernesto Araújo mobilizou o aparato diplomático do Brasil para garantir fornecimento de cloroquina ao país, mesmo após a Organização Mundial da Saúde ter interrompido testes clínicos com a droga e depois de associações médicas terem alertado para a ineficácia e o risco de efeitos colaterais.

Isso é o que revelam telegramas diplomáticos obtidos pela Folha e informações de pessoas envolvidas nas negociações. O ex-ministro, que pediu demissão no fim de março, será ouvido na CPI da Covid na próxima quinta (13), para explicar se houve prejuízo na aquisição de insumos e vacinas por causa da política externa de sua gestão.

A corrida do Itamaraty atrás da cloroquina começou pouco depois de o presidente Jair Bolsonaro falar em "possível cura para a doença" em suas redes sociais, em 21 de março do ano passado.

"Hospital Albert Einstein e a possível cura dos pacientes com Covid-19. Agora há pouco os profissionais do hospital Albert Einstein me informaram que iniciaram um protocolo de pesquisa para avaliar a eficácia da cloroquina nos pacientes com Covid-19", escreveu ele.

Um dia antes, a Prevent Senior e o hospital Albert Einstein haviam anunciado que tinham iniciado estudos com o medicamento. Em declaração durante reunião do G-20, em 26 de março, relatada em telegrama, Bolsonaro apontou para “testes bem-sucedidos, em hospitais brasileiros, com a utilização de hidroxicloroquina no tratamento de pacientes infectados pela Covid-19, com a possibilidade de cooperação sobre a experiência brasileira”.

No mesmo dia, mesmo não existindo nenhum “teste bem-sucedido” em hospitais brasileiros, o ministério das Relações Exteriores pediu, em telegrama, que os diplomatas tentassem “sensibilizar o governo indiano para a urgência da liberação da exportação dos bens encomendados pelas empresas antes referidas [EMS, Eurofarma, Biolab e Apsen] e outras que se encontrem em igual condição, cujo desabastecimento no Brasil teria impactos muito negativos no sistema nacional de saúde”. Na época, o governo indiano havia restringido a exportação da cloroquina.

Em outra comunicação, no dia 15 de abril, o ministério pede que a embaixada na Índia faça gestões junto ao governo indiano para liberar uma carga de hidroxicloroquina comprada pela empresa Apsen antes de a exportação ser vetada por Déli e para que a venda da droga seja normalizada.

Durante todo o mês de abril, houve inúmeros pedidos do Itamaraty para obtenção de cloroquina —defendida por Bolsonaro como “cura” para a Covid-19.

Um dos telegramas, por exemplo, afirma que o Itamaraty teria pedido à Organização Pan-Americana de Saúde que entrasse em contato com o governo indiano para conseguir a liberação de um lote de milhões de doses de hidroxicloroquina.

Em outro, datado de 24 de abril, o ministério pede apoio para uma farmacêutica brasileira conseguir importar sulfato de hidroxicloroquina e relata que ela forneceria habitualmente para "FURP [Fundação para o Remédio Popular], Fiocruz, LAQFA [Laboratório Químico-Farmacêutico da Aeronáutica] e Laboratório do Exército". Na comunicação, o ministério pede à embaixada que sejam feitas gestões junto ao governo indiano para liberar a carga.

Mesmo depois de a Sociedade Brasileira de Infectologia, a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia e a Associação de Medicina Intensiva Brasileira desaconselharam o uso da cloroquina contra a Covid e apontarem efeitos colaterais graves, em 19 de maio, o Itamaraty continuou acionando o corpo diplomático, em telegramas em junho, para garantir o fornecimento de hidroxicloroquina.

Já o empenho do Itamaraty para garantir vacinas e medicamentos da China foi muito menor do que o dedicado à cloroquina. Até novembro de 2020, o ministério não havia enviado instruções específicas para diplomatas prospectarem potenciais fornecedores de vacinas ou medicamentos na China, segundo pessoas envolvidas em negociações.

A China é o país que mais produz imunizantes contra a Covid e foi alvo de ataques constantes durante a gestão de Ernesto. O país tem cinco vacinas aprovadas pelas autoridades sanitárias locais, entre elas a da gigante Sinopharm —ainda que os produtos chineses tenham eficácia menor do que os da Pfizer e da Moderna, por exemplo.

Das chinesas, o Brasil só usa a Coronavac, da Sinovac, produzida em parceria com o Instituto Butantan, em acordo fechado pelo governador de São Paulo, João Doria. Mais de 80% das doses administradas no Brasil são de Coronavac. Segundo pessoas envolvidas na negociação, houve apenas pedidos vagos de informação sobre os desenvolvimentos na área de vacinas, mas nenhuma orientação ativa para obter vacinas, ao contrário do que foi feito com a cloroquina.

Só a partir deste ano, a embaixada do Brasil na China foi acionada para fazer gestões pela liberação de insumos para a produção de vacinas da AstraZeneca.

Um telegrama de 4 de abril de 2020 relata que o presidente Bolsonaro teria dito, em conversa telefônica com o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, que o Brasil havia tido “resultados animadores” no uso da hidroxicloroquina para tratar pacientes com Covid-19.

No entanto, não houve no Brasil nenhum estudo considerado padrão-ouro (randomizado, duplo-cego e com grupo controle) que demonstrasse eficácia da hidroxicloroquina contra a doença. Só duas semanas após o telefonema de Bolsonaro, a Prevent Senior divulgou um estudo preliminar, que foi considerado falho, incompleto e com indícios de fraude.

O Albert Einstein também conduzia um estudo com um grupo de hospitais sobre o uso da hidroxicloroquina —o resultado, divulgado no fim de julho, aponta que a droga não mostrou efeito favorável na evolução clínica de pacientes adultos hospitalizados com formas leves ou moderadas de Covid-19.

No telefonema ao premiê indiano, relatado no telegrama, Bolsonaro pedia a Modi a liberação de carregamentos de hidroxicloroquina adquiridos por empresas brasileiras, dizendo ser “um apelo humanitário” e afirmando que a cloroquina “poderia salvar muitas vidas no Brasil”.

A reportagem entrou em contato com o Itamaraty por e-mail e telefone em busca de posicionamento do ministério e do ex-ministro Ernesto Araújo sobre a questão. Até o fechamento desta edição, o Itamaraty não havia respondido.

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2021/05/telegramas-mostram-que-ernesto-mobilizou-itamaraty-para-garantir-cloroquina-mesmo-apos-alertas.shtml


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Permito-me remeter a minha postagem sobre essa matéria: 

sábado, 12 de setembro de 2020

A bolsodiplomacia autoriza os EUA a adotarem medidas unilaterais CONTRA o Brasil - Patricia Campos Mello (7/11/2019)

Um dos primeiros exemplos da completa subordinação da diplomacia brasileira aos interesses americanos. Esta notícia é de novembro de 2019, mas ela se seguiu e antecedeu a várias outras demonstrações de sabujice da bolsodiplomacia ao governo Trump.

Não se trata aqui de apoiar a ditadura cubana, mas sim de enviar uma mensagem clara que o Brasil não tolera leis extra-territoriais, e não tolera medidas unilaterais.

O governo Bolsonaro começou por aí dizendo que os EUA podem sancionar unilateralmente o Brasil, e que vamos acatar essas medidas como legítimas.

Uma vergonha para a nossa diplomacia.

Paulo Roberto de Almeida

Brasil cede aos EUA, rompe tradição de 27 anos e não condena embargo a Cuba

Itamaraty ignorou argumentos de embaixador brasileiro na ONU, que defendia abstenção

Patrícia Campos Mello

Folha de S. Paulo, 7 de novembro de 2019

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/11/brasil-cede-aos-eua-rompe-tradicao-de-27-anos-e-nao-condena-embargo-a-cuba.shtml

Pela primeira vez em 27 anos, o Brasil cedeu às pressões dos EUA e votou contra a resolução anual da ONU que condena o embargo econômico americano a Cuba. Apenas Israel e Estados Unidos votaram da mesma maneira que o Brasil.

Nas últimas semanas, o governo americano, por meio da divisão de Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado, pediu duas vezes que o Itamaraty mudasse seu posicionamento histórico de rechaço a medidas econômicas unilaterais e se alinhasse aos EUA na votação.

Os americanos argumentaram que, ao condenar o embargo contra Cuba, o Brasil passaria a mensagem de que o país caribenho pode continuar interferindo impunemente na Venezuela e que o governo brasileiro tolera as violações de direitos humanos da ditadura cubana.

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, durante discurso na Assembleia Geral da ONU, em Nova York
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, durante discurso na Assembleia Geral da ONU, em Nova York - Johannes Eisele - 24.set.19/AFP

Segundo os americanos, venezuelanos e cubanos já obtiveram uma vitória com a eleição da Venezuela para o Conselho de Direitos Humanos da ONU, em outubro, e o voto do Brasil seria outro trunfo internacional para o regime hoje liderado por Miguel Díaz-Canel.

O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, cedeu às pressões americanas, apesar de grande resistência do atual embaixador do Brasil na ONU, Mauro Vieira.

Mesmo países que têm relação muito próxima aos EUA e dependem pesadamente de ajuda econômica americana resistiram às pressões de Washington. A Colômbia e a Ucrânia, por exemplo, abstiveram-se na votação.

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A Guatemala, único país a acompanhar os EUA e transferir sua embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, votou a favor.

No total, foram três votos contra a resolução, duas abstenções e 187 votos a favor do texto que condena o embargo americano imposto há 50 anos, no início da revolução promovida por Fidel Castro. A Moldova não votou.

O voto brasileiro contraria o posicionamento histórico do Itamaraty de condenar medidas unilaterais econômicas contra países, vetadas pela legislação internacional e pela ONU.
 
Em telegramas nos últimos meses, o embaixador Mauro Vieira tentou argumentar que um voto a favor da resolução não representaria um sinal de apoio à política de direitos humanos da ditadura cubana, mas sim uma posição tradicional do governo brasileiro em relação à ingerência em outros países.

Também defendeu que um voto contrário não seria visto apenas como um gesto contra o país, mas um posicionamento contra o princípio de não interferência, o que desagradaria todos os países sujeitos a essas medidas.

Vieira ainda defendeu que um voto como esse poderia prejudicar os interesses brasileiros —por exemplo, no caso da possibilidade de sanções econômicas contra o Brasil devido à política ambiental na Amazônia.

Assim, o governo Bolsonaro teria dificuldade em angariar apoio de países contra esse tipo de interferência.

Ao responder as argumentações de Vieira, as mensagens do gabinete do chanceler Ernesto Araújo eram sempre secas, afirmando apenas que o governo brasileiro manterá a instrução previamente passada.

Vieira teria argumentado que, caso o Brasil quisesse mandar um sinal ao regime cubano, poderia pedir a palavra durante o voto na sessão e fazer uma declaração, deixando claro que o gesto não é um apoio a violações de direitos humanos em Cuba.

Por fim, o embaixador sugeriu que o Brasil se abstivesse em vez de votar contra a resolução, porque não seria um movimento tão grave nem isolaria o país. De novo, foi ignorado.

"Sanções indiscriminadas como embargos afetam negativamente a população em geral e, por isso, são consideradas já há anos uma medida inadequada”, diz Camila Asano, coordenadora de programas da Conectas Direitos Humanos.

“A mudança de voto também preocupa por ser mais um exemplo do alinhamento automático do Brasil com a política externa americana sem que tais mudanças dramáticas sejam devidamente debatidas no Brasil, como junto ao Congresso Nacional."

O governo brasileiro vem se alinhando sistematicamente a interesses americanos. O país abriu mão do tratamento especial e diferenciado na OMC (Organização Mundial do Comércio) a pedido dos Estados Unidos, que querem modificar o mecanismo para não beneficiar a China em negociações comerciais.

Bolsonaro chegou a anunciar a transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, mas acabou recuando e abrindo apenas um escritório comercial, diante de ameaças de países árabes, grandes importadores de carnes brasileiras.

O Brasil ampliou e renovou neste ano cotas sem tarifa para importação de etanol e trigo, reivindicações americanas. Por outro lado, frustrando expectativas, os EUA não removeram as barreiras sanitárias que impedem a importação de carne bovina in natura nem anunciaram modificações na proteção do açúcar americano, outro pedido brasileiro.

O apoio dos EUA à entrada do Brasil na OCDE, o clube dos países ricos, prometido pelo presidente Donald Trump em março, tampouco se materializou. O governo de Bolsonaro vê a entrada no órgão como um selo de qualidade de políticas macroeconômicas.

Recentemente, em carta à organização, Washington reiterou o apoio às candidaturas de Argentina e Romênia na OCDE, mas se opuseram a uma ampliação maior no número de membros do órgão, o que, na prática, solapa as ambições brasileiras.

O governo Trump vinha se opondo à ampliação da OCDE, dando a entender que a entrada muito rápida de novos membros desvirtuaria a organização, que ficaria inchada e sem propósito —além da ojeriza natural da atual gestão da Casa Branca a instituições multilaterais.

ENTENDA O EMBARGO

Quando começou?
Os EUA impuseram sanções econômicas a Cuba em 1960, cerca de um ano depois de a Revolução Cubana de Fidel Castro ser bem sucedida e ele assumir o poder.

A medida foi resposta à estatização de empresas e propriedades americanas. As relações diplomáticas foram rompidas.

Qual o efeito das sanções na economia cubana?
Em 2018, a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe da ONU confirmou a estimativa do regime cubano de que o embargo já tinha custado US$ 130 milhões nos últimos 60 anos.

Como o embargo afeta da vida dos americanos?
Washington não emite vistos de turismo para a ilha. Qulquer pessoa partindo dos EUA em direção a Cuba deve pedir autorização ao Departamento do Tesouro.

Cartões de crédito e débito emitidos nos EUA raramente são aceitos.

E a dos cubanos?
O turismo é uma das principais atividades econômicas do país, mas o embargo e as restrições de viagem prejudicam o mercado.

As sanções também limitam o fluxo de dinheiro de cubanos vivendo no exterior, importante fonte de renda para a população.

Há escassez de alguns produtos básicos, incluindo alimentos, e o governo impõe racionamento.

Cubanos podem viajar aos EUA desde que obtenham um visto.

Como Obama se aproximou do regime cubano?
O então presidente restabeleceu relações diplomáticas, autorizou empréstimos de empresas americanas às cubanas da área de infraestrutura e permitiu que a ilha exportasse alguns produtos para os EUA.

O que mudou no governo Trump?
No início de junho deste ano, os EUA expandiram as restrições a viagens de americanos à ilha.

O governo pôs fim aos vistos de cinco anos para cubanos, que agora têm de pedi uma autorização para cada viagem.

Transações financeiras com entidades ligadas às Forças Armadas cubanas foram restringidas.