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quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Historiografia da politica externa brasileira - IRBr, 21/11, 9hs-18hs

FUNAG / CHDD / IPRI
A Historiografia da Política Externa Brasileira
Auditório Araújo Castro, Instituto rio Branco-IRBr, Brasília – DF 
22/11/2018 às 9h00.
9h00min         Abertura: Apresentação 
Embaixador Gelson Fonseca Júnior, Diretor do CHDD;
Embaixador Paulo Roberto de Almeida, Diretor do IPRI;
Embaixador Marcos Bezerra Abbott Galvão, Secretário-Geral do MRE;

9h30min         Painel da Manhã: A historiografia do Império à Primeira República
Moderador: Amado Cervo.
João Daniel de Almeida. “A independência portuguesa: 200 anos de olhar nacionalista sobre o desmembramento de um império global”;
Francisco Doratioto. “O Primeiro Reinado”;
Gabriela Nunes Ferreira. “O Segundo Reinado (1840-1889)”;
Clodoaldo Bueno. “A Primeira República (1889-1930)”.

12:30               Almoço

14h30min       Painel da Tarde: Da Revolução de 1930 à Nova República
Moderador: Matias Spektor.
Fábio Koifman. “Da Revolução de 1930 até o fim de 1945”;
Antônio Carlos Lessa. “A Nova República (1946-1964)”;
Paulo Vizentini. “O Regime Militar (1964-1985)”;
Embaixador Paulo Roberto de Almeida. “Da redemocratização aos nossos dias (1985-2018)”.

17h00min       Encerramento
Embaixador Gelson Fonseca Júnior.
Conferência de encerramento: Amado Cervo.

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Historiografia da politica externa brasileira - IRBr, 22/11


FUNAG / CHDD / IPRI/IRBr
A Historiografia da Política Externa Brasileira
Auditório Araújo Castro , Instituto rio Branco-IRBr, Brasília - DF 
22/11/2018 às 9h00.
9h00min         Abertura:
Embaixadora Gisela Maria Figueiredo Padovan, Diretora-Geral do IRBr;
Embaixador Gelson Fonseca Júnior, Diretor do CHDD;
Embaixador Marcos Bezerra Abbott Galvão, Secretário-Geral do MRE;
Embaixador Paulo Roberto de Almeida, Diretor do IPRI;

9h20min         Conferência do  Embaixador Rubens Ricupero

10h00min       Painel da Manhã: A historiografia do Império à Primeira República
Moderador: Amado Cervo.
João Daniel de Almeida. “A independência portuguesa: 200 anos de olhar nacionalista sobre o desmembramento de um império global”;
Francisco Doratioto. “O Primeiro Reinado”;
Gabriela Nunes Ferreira. “O Segundo Reinado (1840-1889)”;
Clodoaldo Bueno. “A Primeira República (1889-1930)”.

12:30               Almoço

14h30min       Painel da Tarde: Da Revolução de 1930 à Nova República
Moderador: Matias Spektor.
Fábio Koifman. “Da Revolução de 1930 até o fim de 1945”;
Antônio Carlos Lessa. “A Nova República (1946-1964)”;
Paulo Vizentini. “O Regime Militar (1964-1985)”;
Paulo Roberto de Almeida. “Da redemocratização aos nossos dias (1985-2018)”.

17h30min      Encerramento
Síntese dos trabalhos Professor Amado Cervo.
Embaixador Gelson Fonseca Júnior

segunda-feira, 21 de maio de 2018

Pesquisa sobre a historiografia das RI no Brasil - respostas PRAlmeida


Paulo Roberto de Almeida
Respostas a questionário submetido online.
Feito em 18/05/2018

Este formulário é parte de um projeto de Pesquisa conjunto dos professores xxxx (...). O objetivo é levantar percepções e críticas sobre o nexo História e Relações Internacionais no Brasil. As respostas servirão para estudos, publicações e proposições que privilegiem o avanço da discussão sobre o ensino e a pesquisa em História para a área de Relações Internacionais no país.

Nome e filiação Institucional: *
Sua resposta: PRA: Paulo Roberto de Almeida, Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, IPRI-Funag, vinculado ao Ministério das Relações Exteriores; professor de Economia Política nos programas de mestrado e doutorado em Direito do Centro Universitário de Brasília (Uniceub).

Concorda que suas respostas sejam utilizadas para as finalidades desta pesquisa? *
Sim PRA

Quais as principais inspirações intelectuais na sua formação? *
Sua resposta: PRA: Adquirir uma base sólida em sociologia e em economia, com vistas a influir no processo de transformação estrutural, nos campos político e econômico, no Brasil, e desenvolver uma carreira vinculada a atividades acadêmicas, no plano da pesquisa e da docência. Circunstâncias especiais orientaram-me para a carreira diplomática, na qual continuei a desenvolver, paralelamente, atividades acadêmicas, de pesquisa e produção de material vinculado à area internacional, tanto na vertente da história, quando da ciência política, e especialmente em relações econômicas internacionais, com ampla produção de artigos e livros nessas áreas.

De qual geração de historiadores de relações internacionais no Brasil você se considera?
1a Geração(Aquela que inaugurou os estudos no Brasil, mas que teve sua formação fora do Brasil); PRA
2a Geração (Aquela formada nos estudos no Brasil pela 1a Geração)
Nova Geração
Descreva brevemente o seu método de trabalho como historiador das RI.  *
Sua resposta: PRA: Na verdade, não me considero um "historiador" de RI, sendo formado em sociologia e em economia, com doutoramento em sociologia histórica, mas no terreno do desenvolvimento econômico e dos regimes políticos. Gradualmente, por sólidas leituras em história – ainda que não formado metodologicamente nessa disciplina – inclinei-me para os estudos de sociologia das relações internacionais com profundo embasamento na história (política e econômica). Meu método combina pesquisa em arquivos, mas não de forma extensiva, documentação primária da época, literatura secundária, sobre os temas cobertos em meus estudos, geralmente numa perspectiva histórica e comparada, com amplo apoio em indicadores econômicos seriais.

História das Relações Internacionais e História da Política Externa. O que se faz no Brasil, na sua opinião?  *
Sua resposta: PRA: Tradicionalmente, sempre foi história diplomática – ou seja, baseada principalmente na atuação da chancelaria –, posteriormente voltada para as relações exteriores do país – compreendendo, portanto, fatores econômicos, políticos e sociais, externos ao âmbito exclusivo da diplomacia oficial – e complementada, mais recentemente, por uma visão mais ampla da política externa brasileira nos contextos regional e internacional. Mais raros são os estudos e pesquisas que visam colocar o Brasil no contexto global, ou seja, ver a trajetória das relações internacionais do país tal como inserido numa história global, que guarda alguma relação, mas não é a mesma coisa, com os estudos de "sistema-mundo", ou de economia mundial.

Como você avalia o diálogo com os historiadores-internacionalistas vizinhos? *
FracoPRA
Razoável
Bom
Muito Bom

Como você avalia o diálogo com os historiadores-internacionalistas do Sul-Global (África e Ásia especialmente)? *
Fraco
Razoável
Bom PRA
Muito Bom

Qual a sua opinião sobre a formação de algum tipo de institucionalidade de Historiadores das Relações Internacionais da América do Sul como meio para a integração regional?
Sua resposta: PRA: Pode ser positivo, e de certa forma já existe na área de história econômica, por exemplo, mas para a América Latina como um todo, não restrito à América do Sul. Poderia ser positiva uma iniciativa nesse sentido, uma vez que existem conexões reais entre os povos e Estados da região, em vista dos fluxos econômicos e humanos desenvolvidos ao longo de uma longa trajetória histórica.

Como avalia a conformação de um Forum Específico de Historiadores das Relações Internacionais dos BRICS para o avanço de uma História Global das Relações Internacionais ?
Irrelevante: PRA
Pouco relevante
Relevante
Muito Relevante

Qual a sua avaliação sobre a importância das teorias para o estudo da História das Relações Internacionais? *
Sua resposta; PRA: Sou menos propenso a estudar a história das relações internacionais do Brasil no plano teórico, ainda que aceite que possa existir, implicitamente a esses estudos, algumas concepções teóricas sobre a organização e o desenvolvimento de algumas tendências fortes nesse terreno. Podem ser interessantes, mas não as considero relevantes para um estudo caracterizadamente histórico.

Qual sua opinião sobre o ensino de história para os cursos de relações internacionais no Brasil e as pesquisas da área na pós graduação? *
Sua resposta: PRA: Não apenas necessário, como absolutamente indispensável para o estudo e uma compreensão objetiva, fundamentada em bases sólidas, da política externa e das relações internacionais do Brasil. Não se pode apreender objetivamente características atuais das relações internacionais e da política externa do Brasil atualmente, sem levar em conta fases pregressas, antecedentes dos processos atuais.

Quais rumos você acredita que a História das Relações Internacionais deve seguir para continuar como um campo relevante de estudo das RI? *
Sua resposta: PRA: Sólida base empírica – ou seja, estudos econômicos e políticos amplamente amparados em pesquisa primária, com interpretação dos dados em seu contexto próprio – e visão integrada dos processos abordados. Não tomar documentos produzidos por governos como evidências reais, ou fieis, dos problemas estudados, não tomar o discurso dos atores como representativos dos processos subjacentes às questões abordadas, tentar sempre enquadrar esses estudos num contexto mais amplo, que por vezes não está suficientemente refletido na literatura disponível ou nos documentos compulsados. Finalmente, desenvolver uma metodologia séria para esses estudos, sair do amadorismo característico dos primeiros anos, afastar modismos ou vieses de qualquer tipo – ideológicos, geralmente – e exigir pesquisa primária e leituras paralelas ao objeto principal de pesquisa.

Envie-me uma cópia das minhas respostas.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Historiografia brasileira das relacoes internacionais (1993, 1997) - Paulo Roberto de Almeida

Dois trabalhos meus, para os quais minha atenção foi chamada pelo fato de alguém ter selecionado tais arquivos para leitura ou download:


Revista Brasileira de Política Internacional (nova série: Brasília: ano 36, nº 1, 1993, p. 11-36). Relação de Trabalhos n. 346; Publicados n. 136.

Brasília, 4 novembro 1997, 90 pp. Atualização do trabalho nº 346 (Brasília: 02 junho 1993, 37 pp.) sobre as grandes obras de história diplomática do Brasil, incorporando novos trabalhos, entre outros o de José Honório Rodrigues e Ricardo Seitenfus, Uma História Diplomática do Brasil (1995). Incorporado ao livro Relações internacionais e política externa do Brasil: dos descobrimentos à globalização (Porto Alegre: EdUFRGS, 1998). Relação de Publicados nº 226.

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Evaldo Cabral de Mello: O Negocio do Brasil: Portugal, os Paises Baixos e o Nordeste, 1641-1669

Apenas uma miniresenha como recomendação para esta nova edição, agora ilustrada, de uma obra magnífica: 



Evaldo Cabral de Mello:  
O Negócio do Brasil: Portugal, os Países Baixos e o Nordeste, 1641-1669 
(edição ilustrada com imagens da época; Rio de Janeiro: Capivara Editora, 2015, 272 p.; ISBN: 978-85-89063-53-1)

            Quarta edição de um clássico, inteiramente revista, agora ilustrada e dedicada à memória de José Guilherme Merquior, mas que ainda carrega no frontispício a frase do negociador português, Francisco de Sousa Coutinho, que confessava seu “talento incapaz para negócio tão grande”, que era simplesmente a devolução do Nordeste ocupado pelos holandeses da Companhia das Índias a seus antigos donos. A primeira edição do livro se situava entre duas outras obras de uma trilogia do autor, Olinda restaurada e Rubro veio, abordando aqui o contexto internacional e as negociações diplomáticas que permitiram por fim ao primeiro conflito internacional do “Brasil”. Em todos os seus livros, os temas centrais são a produção de açúcar, o tráfico de escravos e o comércio em geral, ademais da questão das mentalidades. Neste aqui, a visão diplomática global foi fundamental.

            Do Prefácio de 2010 de Evaldo Cabral de Mello: 
“O assunto aqui versado, como em geral os de história política e diplomática, presta-se idealmente às análises contrafatuais relativas às possibilidades alternativas, ou seja, àquilo “que poderia ter sido e não foi”, como no verso de Manuel Bandeira. De tão cultivada a moda, especialmente entre os historiadores de língua inglesa, caberia falar num novo gênero histórico, a história virtual. Contudo, a novidade não é tão grande quanto parece, na medida em que a contrafatualidade é inerente ao raciocínio historiográfico, embora não seja quase nunca explicitada, como há muito percebeu Max Weber. Na fórmula de Raymond Aron, “todo historiador, para explicar o que foi, se pergunta o que poderia ter sido”. A atribuição de relevância a determinados acontecimentos é realizada mediante operação comparativa pela qual o historiador indaga-se o que teria ocorrido na inexistência deles.”(p. 14)
            Neste caso, a unidade territorial do Brasil poderia ter ficado inteiramente comprometida. 

Paulo Roberto de Almeida

sábado, 6 de agosto de 2016

O golpe de 1964 e os academicos de 2013: persistem os maniqueísmos - Paulo Roberto de Almeida


O golpe de 1964 e os acadêmicos de 2013: persistem os maniqueísmos

Paulo Roberto de Almeida

Leio, num dos trabalhos apresentados no VI ENABED, Sexto Encontro Nacional da Associação dos Estudos de Defesa (2013), esta frase, emblemática do pensamento de acadêmicos atuais, sobre o golpe de 1964:
As novas gerações de oficiais ainda são formadas com a ideia de que o golpe de 1964 foi um bem para o país! Nada mais revelador da subordinação da sociedade ao falso e vão orgulho corporativo. A grandeza está no reconhecimento da verdade, não em sua obtusa negação. Esse passo é fundamental para que as corporações [militares] se abram efetivamente ao diálogo amplo com a sociedade.

A razão desse texto encontra-se num parágrafo anterior, no qual o mesmo acadêmico diz o seguinte:
Muitos brasileiros concordam que é premente a necessidade de equipar as corporações militares em consonância com as aspirações do Estado brasileiro no que diz respeito à presença no cenário internacional. (...) Mas é intrigante o silêncio quanto a algo fundamental para a legitimação das instituições militares: o pedido de desculpas pelos crimes praticados contra comunistas, patriotas e democratas durante a sangrenta ditadura militar.

O autor acredita que:
Esse assunto é tabu até em certos ambientes acadêmicos, pretensamente mais livres para a expressão do pensamento. (...) A simples menção de fatos do passado recente é tida como provocação desajuizada. O fato de mencionar que brasileiros... foram torturado em estabelecimentos militares é tido como 'revanchismo de derrotado'. Ora, os derrotados não foram os que lutaram contra a ditadura, mas os que a sustentaram!

Meu comentário a partir do que li. O autor parece acreditar que o golpe de 1964 foi um mal para o país, ou pelo menos para pessoas como ele, que se opuseram ao golpe e foram provavelmente submetidas a tratamento rigoroso por parte da repressão policial e militar, eventualmente tortura. Esse fato, essa realidade, a da repressão e da tortura, são o resultado de um desenvolvimento ulterior do movimento militar que derrubou o governo Goulart que não estava necessariamente inscrito na lógica do “golpe” enquanto tal, ou seja, o ato de derrubada de um governo e a instalação de um governo autoritário, que pretendia corrigir certas “mazelas” do sistema político brasileiro, para depois tentar voltar à “normalidade”, isto é, um regime democrático civil, mas expurgado daqueles “elementos subversivos” que os militares identificavam como responsáveis pela deterioração da governança sob o regime Goulart.
O autor fala de “crimes praticados contra comunistas, patriotas e democratas durante a sangrenta ditadura militar”, mas esquece de mencionar que esses crimes foram perpetrados depois que a esquerda armada deu início a uma ofensiva contra o regime e o governo, num projeto de luta pelo socialismo no Brasil. Em outros termos: esses “crimes” teriam ocorrido se a oposição política ao regime e ao governo fosse apenas limitada ao terreno político civil, sem as tentativas de guerra de guerrilhas, urbana ou camponesa? Ele também esquece que o golpe não foi dado por uma motivação de seus principais atores no sentido de instaurarem um regime de exceção, autoritário, ou de imediato comprometido com a eliminação física de seus oponentes. Esses traços da ditadura militar são uma consequência ulterior de um longo processo político que viu o governo Goulart entrar em virtual colapso, no plano do parlamento e dos movimentos civis, quando forças aparentemente majoritárias na sociedade pressionam os militares para intervir mais uma vez no cenário político, que vivia praticamente em colapso nos momentos finais desse governo.
Com todos os equívocos de julgamento sobre o “golpe de 1964”, o autor em questão representa uma communis opinio de grande parte, senão da maioria, da comunidade acadêmica brasileira, que parece desempenhar o papel dos historiadores jacobinos da revolução francesa, ou seja, uma visão comprometida com uma versão peculiar da história, feita mais de ideologia do que de exposição objetiva dos fatos.
A trajetória do Brasil sob o regime militar merece uma avaliação menos passional e mais equilibrada de uma deterioração política que deve tanto à esquerda armada quanto à direita radical o fato de ter enveredado por caminhos tortuosos e desenvolvimentos dramáticos, que provavelmente não teriam ocorrido caso a oposição, a resistência e a luta contra a ditadura tivesse assumido formas essencialmente políticas, ou seja pacíficas, de expressão.
Vou escrever a respeito, aliás já estou escrevendo. Divulgarei no momento oportuno.

Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 6 de agosto de 2016

domingo, 23 de novembro de 2014

Sobre as ‘causas’ do golpe militar de 1964 - Paulo Roberto de Almeida


Sobre as ‘causas’ do golpe militar de 1964

Paulo Roberto de Almeida

Um historiador, já famoso por seus trabalhos de outra forma equilibrados e bastante conhecidos sobre o golpe “civil-militar” de 31 de março de 1964 – mais propriamente civil, como ele mesmo gosta de enfatizar – e de ensaios igualmente meritórios sobre o regime militar e de todo o período que se seguiu, termina um recente artigo sobre a questão de forma absolutamente surpreendente. Ele afirmou o seguinte:
 Quando um jornalista me perguntou qual era a causa, ‘em uma palavra’, do golpe de 1964, eu respondi: ‘o medo’. O autoritarismo que marcava e marca a sociedade brasileira expressou-se, naquela ocasião, no medo das elites e da classe média diante das possíveis conquistas sociais que as propostas de reforma de base representavam: mais vagas nas universidades, tabelamento dos aluguéis, reforma agrária etc. Essa talvez seja a principal atualidade do golpe de 1964.
(Carlos Fico, “50 anos do golpe: balanço”, blog Brasil Recente, 20/11/2014; link: http://www.brasilrecente.com/2014/11/50-anos-do-golpe-balanco.html?spref=fb)

Já comentei esta surpreendente afirmação – que destoa de outros argumentos mais razoáveis nesse seu curto artigo – em uma postagem rápida de meu blog, escrita on spot, ou seja, apenas como reação inicial a uma questão que me parece importante no quadro dos debates que tivemos durante o ano, pela passagem dos 50 anos do golpe (ver o link: https://www.facebook.com/paulobooks/posts/838895436173908?pnref=story). Também já escrevi o suficiente sobre a farsa das “reformas de base” do governo Goulart – que ficaram como um slogan, apenas, pois nunca vi algum desses que se referem a elas se aprofundarem em seu exame – para não ter que voltar ao exame de cada uma nesta oportunidade. Quem quiser conhecer a análise que fiz, pode buscar este texto: “Deformações da História do Brasil: o governo Goulart, o mito das reformas de base e o maniqueísmo historiográfico em torno do movimento militar de 1964”, Revista do Clube Militar (Rio de Janeiro: ano LXXXVI, no 452, fevereiro-março-abril de 2014; edição especial: “31 de Março de 1964 – A Verdade”, p. 107-122; ISSN: 0101-6547; disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/9430621/2590_Deforma%C3%A7%C3%B5es_da_Hist%C3%B3ria_do_Brasil_o_governo_Goulart_o_mito_das_reformas_de_base_e_o_manique%C3%ADsmo_historiogr%C3%A1fico_em_torno_do_movimento_militar_de_1964_2014_).
Vou tratar aqui mais em detalhe da afirmação do professor, acima transcrita, e ater-me estritamente às suas palavras, no que julgo ser um saudável exercício de debate acadêmico, aberto a todas as pessoas que dispõem de argumentos substantivos sobre os conceitos emitidos e o sentido que se lhes pode atribuir no contexto daquele processo histórico, de tão profundas consequências para mais de uma geração de brasileiros.
As palavras-chaves de sua resposta ao jornalista, talvez formulada rapidamente, sem a necessária reflexão (mas ela foi transcrita, posteriormente, para artigo escrito e, como tal, publicado num blog, o que é evidência de reflexão e de aprovação pessoal do argumento desenvolvido), são as seguintes: (a) “causa” (em uma palavra); (b) “medo”; (c) “possíveis conquistas sociais”; (d) “reformas de base”; (e) “atualidade do golpe de 1964”. Se todos concordarem com isso, procedo agora ao exame de cada um desses conceitos, tentando ser fiel ao contexto da época e ao espírito do historiador que trabalha sobre temas tão graves, em suas consequências políticas, e de tal complexidade para justificar inclusive certa fratura historiográfica, o que também não deixei de registrar na abertura de meu artigo acima referido.
Em primeiro lugar, poucos historiadores, ou cientistas sociais, seriam capazes de realizar uma síntese tão arriscada quanto apontar “a causa, ‘em uma palavra’, do golpe de 1964”. Parece evidente que evento, ou episódio tão momentoso, não possui uma causa podendo ser expressa numa única palavra, e seria difícil encontrar um único conceito que pudesse resumir toda a complexidade de uma grave crise política que vinha se arrastando desde o segundo governo Vargas, pelo menos, e talvez durante toda a era Vargas. As crises políticas brasileiras, constantes e regulares durante toda a República de 1946, refletiam as divisões existentes igualmente em outras formações políticas da América Latina, que colocavam em confronto estatistas e “livre-mercadistas”, liberais e “desenvolvimentistas”, conservadores e “progressistas”, e várias combinações possíveis dessas classificações. O uso de aspas em vários desses conceitos se justificam em função de possíveis interpretações ambíguas sobre seu real significado.
Não existiu uma única causa para o golpe – ou o movimento civil-militar, como prefere o próprio professor – e se as causas pudessem ser resumidas sob algum conceito provavelmente este não seria o “medo” das elites e da classe média das “reformas de base” do presidente Goulart (e dos movimentos que o apoiavam). Vou estender-me sobre esse suposto medo mais abaixo, mas antes vou abordar um outro conceito usado como suposto real da sociedade brasileira naquele momento, que é incorporado ao discurso do professor como algo natural, ou esperado: o “autoritarismo”. Por que a sociedade brasileira seria autoritária, mesmo naquela época e naquele contexto? Haveria algum tendência política majoritária que impeliria a sociedade para o autoritarismo?
A afirmação é tanto mais surpreendente porque nenhuma sociedade, em seu conjunto, pode ser considerada autoritária, como se isto fosse uma emanação cultural, ou algum traço civilizatório que pudesse marcar estruturalmente sociedades modernas, que são sempre mais complexas do que simples comunidades agrícolas ou pastoris, divididas entre diferentes classes, com interesses e objetivos políticos muito diversos entre elas. Vamos ver alguns precedentes históricos em torno desta questão.
Ao examinar a evolução da sociedade moderna, poderíamos, por acaso, considerar a sociedade francesa do final do século XVIII e do decorrer do século XIX como autoritária, em primeiro lugar porque passou pelo Terror do período do Termidor, quando Robespierre deu início ao período mais autoritário da revolução francesa, um período aliás admirado por Lênin e alguns outros? Seria ela autoritária porque seguiu o primeiro cônsul Bonaparte no seu 18 Brumário, e depois ao criar o maior império centralizado que já conheceu aquele velho país de tradições libertárias? Ou ao apoiar, novamente, o sobrinho, em sua eleição presidencial pós-1848, e depois novamente quando este fez o seu próprio 18 Brumário e se proclamou imperador, como o tio?
Seria a sociedade japonesa pós-Meiji autoritária? E a da Prússia, antes e depois da formação do Império alemão, também? Seria elas autoritárias porque apoiaram as derivas militaristas de suas lideranças políticas e militares, nos dois processos que presidiram à ascensão dessas duas novas potências no quadro de conflitos interimperiais do início do século XX? Seria autoritária a sociedade italiana dessa mesma época, por ter sancionado e seguido a liderança fascista de Mussolini, até quase o final do mais desastroso experimento político da Itália contemporânea. E seria autoritária a sociedade brasileira, por ter apoiado, em sua ampla maioria, os militares que derrubaram Goulart e deram início a um regime que deveria ser de correção dos problemas do momento – inflação, grevismo político, quebra de hierarquia nas FFAA, ameaça comunista – e de renovação dos quadros dirigentes?
Parece difícil admitir que a sociedade brasileira fosse “autoritária”, sob qualquer critério, inclusive porque a maior parte dos historiadores “progressistas”, ou seja, os que se posicionam claramente contra o golpe, não deixam de mencionar o “amplo apoio das massas” às “reformas de base” e às demais medidas “progressistas” de Goulart. Muitos desses historiadores consideram que tais reformas foram interrompidas por uma minoria conservadora, ou mesmo reacionária, que, lamentavelmente, colocou a alta cúpula das Forças Armadas a serviço dos latifundiários e da alta burguesia, ambos aliados ao imperialismo, segundo as interpretações correntes. Pareceria contraditório, portanto, mencionar o caráter “popular” dessas reformas, e ao mesmo tempo alegar a natureza autoritária da sociedade como um todo.
Creio que se pode, assim, descartar essa característica, que não se fundamenta em alguma análise empiricamente embasada que pudesse sustentar tal argumento para o Brasil de meio século atrás. Sociedades, em geral, não são uniformemente autoritárias, mas lideranças políticas específicas podem conduzir a maioria da cidadania a adotar uma tal postura em função de peculiaridades que se desenvolvem ao longo de uma história política marcada por eventos e processos que favorecem o autoritarismo (crises internas, aumento da anomia, graves desafios externos, ruptura de padrões anteriores). Em resumo, não existem evidências quanto ao “autoritarismo” da sociedade brasileira ao início dos anos 1960: provavelmente ela apenas seria um pouco mais conservadora do que foi o caso no período subsequente, acompanhando tendências comportamentais já detectadas, aliás, outras sociedades em outros países.
Chegamos agora ao suposto medo que teria, não a sociedade brasileira, mas especificamente as classes médias e as elites, de conquistas sociais que estariam embutidas – como se elas fossem uma certeza – nas reformas de base. Na verdade, o que havia, nos meses que precederam o golpe, era uma grande agitação em torno dessas reformas, mas jamais uma ação coerente para colocá-las em vigor, seja mediante medidas administrativas, as que não dependiam de processo legislativo – como a oferta de vagas nas universidades públicas, por exemplo –, seja pelo envio de projetos de lei que teriam de passar pela aprovação do Congresso para se converterem em realidade, como grande parte delas: reforma agrária em modalidades não previstas na Constituição (mas o governo poderia fazê-la sobre terras públicas, obviamente), voto do analfabeto e dos militares (com elegibilidade para ambos), ou diferentes medidas econômicas. Já tratei de cada uma delas no artigo citado acima, para retomar cada uma em detalhe.
O governo Goulart foi incapaz de desenvolver uma ação coordenada para levar adiante seu conjunto de reformas – que de toda forma não existiam como um programa coerente, tendo o conceito sido consolidado praticamente ex-post – e se contentou, às vésperas da crise final – que se desenvolveu de forma independente a qualquer ação em torno das reformas –, em assinar dois decretos: um previa a desapropriação de terras ao longo das grandes vias federais para fins de reforma agrária, e outro a fixação de um teto para os alugueis urbanos, cujo aumento contínuo era creditado à especulação imobiliária, não à inflação que, naquela altura já rodava ao ritmo de 90% ao ano. A classe média – e de fato todos os brasileiros – tinham mais medo da inflação do que de supostas conquistas sociais que seriam asseguradas por reformas diáfanas e vagas, raramente expressas em projetos legislativos.
Poucos historiadores (que são essencialmente políticos) se dão conta dos efeitos devastadores que uma inflação quase ultrapassando os três dígitos poderia ter sobre o poder de compra e os projetos de poupança (sempre remunerada a 6% ao ano) do conjunto dos brasileiros, que até então não tinham sido apresentados à fórmula mágica (e alimentadora da mesma inflação) da indexação, ou correção monetária (introduzida mais adiante sob o regime militar). Poucos desses historiadores se dão igualmente conta dos efeitos devastadores sobre os princípios militares da hierarquia e da disciplina que tiveram a revolta dos sargentos de setembro de 1963 (por motivos essencialmente políticos, diga-se de passagem) e a dos marinheiros, no início do ano seguinte. Mais grave ainda foi a sanção dada pelo poder político a esses atos de insubordinação e de desrespeito aos comandantes militares, o que indispôs a maior parte dos comandantes com o presidente da República e seus principais auxiliares, entre eles sindicalistas ligados ao Partido Comunista, considerado o inimigo principal da soberania do país desde a Intentona de 1935.
Havia, sim, na classe média, nas elites e principalmente nas Forças Armadas um sentimento de medo muito preciso, que não tinha nada a ver com as reformas de base, e sim com esse mesmo espantalho do comunismo, na verdade uma ameaça considerada real para os principais protagonistas do drama político que se desenvolvia no auge da Guerra Fria. Elementos indispensáveis desse clima algo paranoico eram os avanços do comunismo além das fronteiras da Europa oriental, com a revolução cubana, a crise dos misseis soviéticos em Cuba e várias bravatas dos líderes soviéticos sobre a possibilidade de o comunismo “enterrar o capitalismo”, como havia proclamado pouco antes Nikita Kruschov, o Secretário-Geral do PCUS. Ignorar que esse temor fosse uma preocupação legítima de amplos setores da sociedade brasileira seria considerar que a maior parte da população teria de assumir os pressupostos soi-disant progressistas e majoritariamente anti-imperialistas desses mesmos historiadores e analistas políticos da academia.
A verdade é que a maioria da sociedade brasileira estava – independentemente da mobilização dos grupos, partidos e movimentos de esquerda e direita – exasperada com o ambiente quase caótico vivido durante todos os confusos meses de lutas políticas vividos no período imediatamente anterior ao golpe. Esse ato de ruptura na legalidade democrática não estava exatamente planejado, nem obedecia a uma conspiração preparada pelas elites nacionais em conluio com o imperialismo, como tendem a proclamar os adeptos da historiografia de esquerda. Ele acabou se impondo por um conjunto desigual de circunstâncias, entre as quais se contam o ânimo oposicionista de governadores interessados na presidência e a impetuosidade de alguns chefes militares, todos eles observados de perto pelos observadores diplomáticos e agentes do setor de inteligência da embaixada dos Estados Unidos. O Big Brother hemisférico não estava obviamente disposto a deixar se instalar no continente um outro regime que poderia ser não uma nova Cuba, mas uma espécie de nova China, pela dimensão e importância do país. No ambiente exacerbado da Guerra Fria se tratava igualmente de uma preocupação legítima da maior potência capitalista e líder do chamado “mundo livre”.
Cabe considerar, finalmente, o que seria essa “atualidade do golpe de 1964”, que estaria contida na alegação de que foi o medo da classe média das “reformas de base” que precipitou o golpe militar, como se o mesmo processo pudesse se desenvolver nos dias que correm. Reformas são desenvolvidas todos os dias a todos os momentos dos processos políticos conhecidos em quase todas as democracia de mercado, e em alguns regimes menos democráticos também. Não são elas que precipitam a radicalização das forças sociais, se conduzidas pelos canais normais da democracia representativa. O que pode, sim, exacerbar paixões e precipitar rupturas não institucionais é a quebra de padrões e a ameaça de rebaixamento das condições de vida, que soem ocorrer em processos inflacionários virulentos, acoplados à quebra de confiança nas autoridades políticas. Foi isso, finalmente, que ocorreu no Brasil de 1963-64, e é isso que vem ocorrendo atualmente na Venezuela, e em menor escala na Argentina, por exemplo.
As condições “ideais” para a intervenção dos militares na arena política estão, no entanto, longe de se reproduzirem novamente, e pode-se inclusive dizer que o longo regime militar registrado de meados dos anos 1960 aos 80 pode ter imunizado o país de novas aventuras desse gênero. Nem o ambiente internacional, com a derrocada total, e aparentemente definitiva, do comunismo, suscitaria o mesmo clima de exacerbação dos espíritos como ocorria no auge da Guerra Fria. A menos que o mesmo caos político que caracterizou o governo Goulart se imponha novamente ao país, com forte descontrole inflacionário e quebra da legalidade em diferentes instâncias da vida política e social, não existe clima nem condições objetivos para qualquer “atualidade” de um golpe. Não se imagina tampouco qualquer temor da classe média ou das elites por reformas que promovam maior grau de igualdade distributiva e inclusão social, desde que conduzidas pelos canais admitidos do jogo político-partidário e dos mecanismos institucionais de representação política e de ação legislativa. A hipótese, portanto, simplesmente não existe, não cabendo, em consequência, qualquer argumento em favor da “atualidade” dessas “reformas de base”, um conjunto heteróclito e desordenado de propostas que adquiriu foros de mito, sem ter consistência empírica para tal.
Grande parte do trabalho do historiador consiste, entre outras tarefas de cunho interpretativo, em separar os discursos dos atores políticos – sempre tentados pela retórica fácil e muitas vezes demagógica – das ações efetivas tomadas no terreno dos processos em curso na arena das barganhas e negociações entre eles mesmos. Via de regra, sociedades avançam por meio de reformas progressivas, não mediante golpes ou revoluções, que de resto não são planejados, nem passíveis de uma coordenação efetiva entre seus supostos líderes. Tais rupturas são eminentemente acidentais na vida dos países, e se dão no quadro de deteriorações graves da vida social, política e econômica. Esse era o quadro do Brasil meio século atrás; não parece mais ser o caso atualmente, em que pese a permanência de alguns atores que parecem não ter aprendido quase nada com as infelizes experiências tentadas numa sociedade em crise.
As marcas dessa crise podem não ter desaparecido inteiramente no espírito de alguns atores e observadores do drama de meio século atrás. Certos eventos exigem a passagem de mais de uma geração de atores e espectadores para que um julgamento não passional possa ser feito por aqueles que se ocupam de interpretar o passado.

Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 23 de novembro de 2014.