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segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Mais uma morte em posto diplomatico: evitavel?; inevitavel? - dois protestos

Recebido pela internet e postado aqui, sem necessidade de qualquer comentário de minha parte, apenas como manifestação de solidariedade, pois que muitos já sabem o que, ou como eu penso a respeito disso. 
Não preciso de adjetivos ou palavras eloquentes para expressar minha desconformidade com o que vem acontecendo em certos postos, criados pela diplomacia ativa e altiva de certos protagonistas da fase recente.
Paulo Roberto de Almeida 

Addendum em 17/11/2012: A AC Berenice Ferreira, segundo laudo médico efetuado por dois médicos especialistas, aferiu que a causa de sua morte não foi provocada por malário ou febre, mas por aneurisma. Fica, portanto, descartada a razão apressadamente alegada pelo sindicato e por colegas da vítima. Ainda que ela também tivesse sido afetada por malária, se tratava de doença contraída no Brasil em fase anterior, não diretamente relacionada a sua morte.
PRA


Um diplomata de muito valor, ética e coragem postou a seguinte mensagem acerca da morte da Assistente de Chancelaria Berenice Ferreira:

'Peço desculpas desde já pelo desabafo muito longo no Facebook, mas é necessário. Tudo que digo aqui - com exceção do texto que cito ao final - é de minha inteira responsabilidade e autoria. Reajam como bem entenderem, mas é algo que precisa ser dito.

Anteontem, 7 de novembro, faleceu Berenice Ferreira, servidora do Ministério das Relações Exteriores, em decorrência de malária e febre tifóide adquiridas durante missão realizada a Malabo, Guiné Equatorial.

Menos de um ano atrás, em dezembro de 2011, a Milena, minha colega de turma no IRBr, também faleceu em decorrência de malária adquirida em missão a Malabo.

Casos de profissionais da iniciativa privada ou do serviço público que sucumbem por motivos semelhantes não faltam. Milena e Berenice não foram as primeiras vítimas das intempéries várias que encontramos no serviço exterior. Infelizmente não devem ser as últimas, se virmos o que foi feito pelo Itamaraty a respeito - e principalmente o que não foi feito.

O que foi feito até agora? O MRE colocou no formulário de autorização de viagens a trabalho uma cláusula - que deve ser obrigatoriamente assinada pelo funcionário que viaja - que afirma que este funcionário está ciente dos riscos e das orientações a serem seguidas em viagens a locais com endemias e epidemias, bem como da necessidade de se consultar médicos antes e depois da viagem.

Problemas com a ideia e com a execução dessa cláusula não faltam. Implicitamente, ela busca eximir o MRE de qualquer culpa no envio de seus funcionários a locais de risco, uma vez que a responsabilidade pela prevenção (quando possível e necessária) passa a ser do funcionário. Na prática, incorre em gastos de capital e de tempo adicionais, porque se o funcionário resolve levar essa disposição a sério, acabará gastando um bom tempo para atendimento no serviço de saúde pública ou um bom dinheiro com o (horrível) atendimento da saúde particular em Brasília. O serviço de atendimento médico do MRE não tem sequer remédios para dor de cabeça ou gripe; quem dirá instrumentos para diagnóstico de malária, que são facilmente encontráveis na África e no Norte do Brasil.

Essa cláusula foi introduzida ao dito formulário algumas semanas após a morte da Milena. Não por acaso, a sensação de asco e de revolta não foi pouca.

Mas - como boa parte dos problemas relacionados à "coisa pública" e ao Estado no Brasil - isso é apenas a ponta do iceberg; apenas um sintoma de um mecanismo "decisório" há muito apontado como falho e pouco profissional.

O próprio procedimento de autorização de viagens é feito por via completamente manual. Você imprime o formulário e tem que sair caçando assinaturas de seus superiores em um processo por vezes humilhante, quando sistemas informatizados e impessoais já existem e já são utilizados por outros órgãos do serviço público brasileiro. Casos em que viagens são perdidas porque o formulário misteriosamente sumiu são inúmeros. Evidentemente, considerando que a diplomacia é uma profissão que precisa de viagens, termos - em 2012! - um sistema que dependa de carimbos e de "lobby" pessoal é, no mínimo, patético.

O processo de remoção de funcionários do serviço exterior é notoriamente complexo, pouco transparente e muitas vezes pré-arranjado. Todo e qualquer funcionário do Itamaraty, de qualquer geração, de qualquer categoria, conhece histórias de horror de pessoas que tinham qualificação e até especialização acadêmica para servir em um posto X, mas por razões de politicagem (me recuso a chamar de "política" ou "interesse da administração") acaba sendo mandado para outro posto Y. Pessoas desperdiçam estudos e esforços em prol de um melhor serviço exterior porque não há um planejamento e uma análise objetivos sobre as reais necessidades da política externa brasileira.

Seria possível escrever um livro sobre tudo isso. Mas o Itamaraty, do alto da torre de marfim na qual acredita estar empoleirado, tenta tratar disso tudo com aquela pretensa altivez romântica da diplomacia - altivez essa que já não existe há muito tempo. Todos esses problemas - os citados acima e outros tantos que quem me ler aqui e for "da Casa" saberá - são sintomáticos de uma crise seríssima de mentalidade, que poderia ser tomada em tom mais leve se não tivesse levado à morte irresponsável de duas funcionárias nos últimos 12 meses.

Ao contrário do que qualquer romântico ou aposentado disser, diplomacia - seja lá por quem seja exercida - não é sacerdócio, não é militar, não é uma casta, não é a realeza da República. É uma profissão civil. Tem suas peculiaridades, obviamente. Mas, como qualquer profissão, deve conter como elementos essenciais à sua sobrevivência duas coisas: respeito à pessoa do profissional e respeito às regras do jogo.

O que se vê no Itamaraty - não apenas hoje, embora recentemente isso tenha vindo à tona mais vezes - é exatamente o oposto: todos nós cansamos de ouvir episódios grotescos de desrespeito, de descaso, de desatenção com o trabalho alheio, de assédio moral... Ou casos de distorções das regras para benefício de poucos, aplicação seletiva de restrições, indefinições, medo de decidir...

Eu tenho muito respeito e muita admiração pelas pessoas do MRE que tentam, por todas as vias possíveis, fazer e administrar a diplomacia de um jeito diferente. Elas não poucas, algumas delas felizmente estão em posições de chefia e elas sabem quem são. Tenho ainda mais respeito por aqueles que tentam fazê-lo em ambientes insalubres e/ou perigosos, em postos em locais difíceis, ou junto a chefias que claramente perderam - ou sequer tiveram - o equilíbrio psicológico e o conhecimento necessários para exercer a diplomacia (ou qualquer outro cargo de chefia em qualquer lugar da iniciativa privada ou do serviço público). Mas é profundamente desanimador perceber que, por mais que tentamos fazer as coisas melhor, o "sistema" impede que esse avanço se consolide.

O Itamaraty só terá uma chance de ser relevante dentro e fora do País se acordar para a realidade. O processo decisório deste Ministério tem que mudar para se adaptar às reais necessidades da diplomacia do século XXI. Não é necessário desmontar a tal hierarquia que alguns da velha guarda tanto defendem; hierarquias são necessárias para a plena execução de planos e políticas. Basta apenas que essa velha guarda lembre-se de um aspecto simples de qualquer sociedade republicana: uma instituição é feita de pessoas, não de peças ou de papéis.

Não somos fungíveis. Somos profissionais. E já passou da hora do Itamaraty profissionalizar-se. Só assim para que o MRE esteja preparado para prevenir e ajudar em casos como os da Berenice, da Milena e de tantos outros.

Da minha parte, se o MRE não descer da torre de marfim, não sou eu que vou ficar.
Xxxxx
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Segue, abaixo, mensagem publicada hoje pela Erika Vanessa, amiga da Berenice, na página do MRE no Facebook.

"Venho manifestar o meu repúdio a uma situação infelizmente tão comum no MRE, mas pouco conhecida de toda sociedade. Veio a falecer uma querida colega que estava em Malabo. A Assistente de Chancelaria Berenice Ferreira faleceu em decorrência do agravamento do quadro de malária e febre tifóide adquiridos durante sua missão. Foi mandada com urgência ao Brasil e não resistiu. Muito se falou e muito se repercurtiu após o falecimento da Diplomata Milena, mas o que acontece de fato é que pessoas continuam morrendo. Servidores públicos a serviço do país continuam morrendo de graves doenças, principalmente em postos C e D no exterior. Muita coisa precisa ser mudada e repensada no tratamento dos servidores públicos a serviço do Governo brasileiro em outros países. Não se pode mais admitir tanto descaso. O apoio necessita ser integral, efetivo. Quantos mais precisarão morrer até que finalmente alguma providência efetiva possa ser tomada? Quantos mais precisarão perder a vida? Isso precisa ser divulgado para toda sociedade, para aqueles que, por desconhecimento, muitas vezes pensam que nós vivemos vida de luxo no exterior. Casos como o da AC Berenice não são divulgados, mesmo sendo o retrato da realidade. Fica aqui o meu manifesto, o meu repúdio à falta de estrutura no exterior. Queremos DIGNIDADE!"'

domingo, 21 de novembro de 2010

Embaixadas: enquanto alguns abrem, outros fecham...

Não se pode dizer que o Reino Unido careça de diplomacia. Ao contrário, se trata de uma das mais antigas diplomacias do mundo moderno, aliás iniciada em plena Idade Média, com Portugal, outro Estado precoce no tratamento de questões diplomáticas.
Pois por razões de economia, o Reino Unido está fechando embaixadas e reduzindo o envio de pessoal a partir da capital, como revela a reportagem abaixo.
O Reino Unido não é um país tão rico quanto o Brasil, que está abrindo embaixadas em ritmo acelerado, nas mais diversas capitais do mundo, e algumas que talvez nem pertençam a este mundo...
Paulo Roberto de Almeida

Reino Unido põe embaixadas à venda
George Parker and Alex Barker | Financial Times
Valor Econômico, 19/11/2010 – p. A11


Novos rumos : Diplomacia britânica vai adotar "mentalidade comercial" e investir em "contratações locais"

O Ministério de Relações Exteriores do Reino Unido deverá demitir 1 em cada 10 de seus funcionários, vender prédios onde estão embaixadas e intensificar "contratações locais" mais baratas para tornar-se um departamento mais enxuto, centrado em desenvolvimento comercial.
Simon Fraser, o funcionário de carreira de cargo mais alto na hierarquia no ministério, qualifica o corte 10% em seu orçamento como uma "medida dura, porém boa", e diz que os recursos devem ser empregados para atender à prioridade do governo: promover o crescimento. Em entrevista ao "FT", Fraser disse desejar que sua equipe desenvolva uma "mentalidade comercial" e insistiu que o novo foco em comércio e investimento estrangeiro "não é uma moda passageira". O secretário permanente, uma espécie de "vice-chanceler" britânico, disse que os diplomatas têm as habilidades necessárias para enfrentar o novo desafio e minimizando as sugestões de que o país esteja prestes a nomear uma série de empresários para altos cargos em embaixadas.
A nomeação de Fraser para "primeiro mandarim", neste ano, foi um sinal claro de David Cameron, o primeiro-ministro, e de William Hague, o ministro de Relações Exteriores, de que cabe à Chancelaria liderar a iniciativa britânica de crescimento nas exportações.
Sua carreira recente esteve imersa em questões comerciais. Fraser comandou o escritório de Peter Mandelson no período em que o colega trabalhista foi comissário de Comércio da União Europeia. Ele foi então trazido de volta a Londres como secretário permanente no Departamento de Economia.
Fraser disse que a política externa exige "um equilíbrio a ser atingido" e que a negociação de acordos comerciais não significa que o país deva ignorar outras prioridades, como os direitos humanos.
O secretário quer manter a presença mundial do Reino Unido com sua rede de missões no exterior - possivelmente expandindo em mercados em crescimento como Brasil, China e Indonésia -, mas disse que ganhos de eficiência são necessários. "Nós temos uma estratégia que produzirá outros 10% de redução "natural" - por exemplo, aposentadorias e demissões voluntárias - na força de trabalho ao longo dos próximos três ou quatro anos", disse ele.
Poderá haver mais contratação local para o preenchimento de postos de trabalho, em vez do envio mais oneroso de diplomatas britânicos ao exterior. Fraser também está buscando "modernizar" os imóveis diplomáticos, mas disse que "os edifícios emblemáticos", como a espetacular embaixada em Paris, serão mantidos.
Segundo ele, os dois premiês anteriores, Gordon Brown e Tony Blair, ambos trabalhistas, centralizaram a condução da política externa. E que agora os diplomatas têm uma chance, com o conservador Cameron, para mostrar sua liderança na política externa.
Especulou-se muito este ano que Cameron queria ver figuras do mundo empresarial alçados a embaixadores. Fraser diz que algumas vagas para cargos devem ser divulgadas amplamente, mas que os diplomatas são preparados para defender as empresas britânicas. "É necessária uma série de habilidades para ser um diplomata num posição importante", disse. "É importante não subestimar as competências profissionais dos diplomatas de carreira."