Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quinta-feira, 26 de março de 2020
O destino de uma nação- Paulo Roberto de Almeida
O destino da nação
Paulo Roberto de Almeida
Conclave virtual de instituições científicas do Brasil determinou que existe um ÚNICO grupo de risco no país inteiro: a famiglia Bolsonaro. Recomendou isolamento total do resto da nação e boicote compulsório por parte da sociedade. Fiquem longe, não atendam chamados vindos dela.
Um historiador inglês disse certa vez que a História é um desengonçado carro de bois, avançando lentamente por caminhos esburacados. Mas ela por vezes dá saltos, cai da ribanceira, se recupera e continua na flecha do tempo, sempre para a frente. Carroceiros estúpidos tentam reverter a rota...
O Brasil enfrenta hoje uma gigantesca pandemia de um único indivíduo, que está estrangulando a nação: ela tem um nome, Bolsovirus! Como ele não vai renunciar, terá de ser “renunciado”. Esse é o desenlace. Pode demorar, mas ocorrerá!
Um leitor me fala de Getúlio e de Jânio. Meu argumento: cada situação histórica é sempre única e original. Analogias são sempre enganosas. Mas elas podem ocorrer, com similitudes de forma ou de conteúdo.
Nossa história ainda está em curso. Por vezes se acelera...
Brasília, 26/03/2020
Paulo Roberto de Almeida
Conclave virtual de instituições científicas do Brasil determinou que existe um ÚNICO grupo de risco no país inteiro: a famiglia Bolsonaro. Recomendou isolamento total do resto da nação e boicote compulsório por parte da sociedade. Fiquem longe, não atendam chamados vindos dela.
Um historiador inglês disse certa vez que a História é um desengonçado carro de bois, avançando lentamente por caminhos esburacados. Mas ela por vezes dá saltos, cai da ribanceira, se recupera e continua na flecha do tempo, sempre para a frente. Carroceiros estúpidos tentam reverter a rota...
O Brasil enfrenta hoje uma gigantesca pandemia de um único indivíduo, que está estrangulando a nação: ela tem um nome, Bolsovirus! Como ele não vai renunciar, terá de ser “renunciado”. Esse é o desenlace. Pode demorar, mas ocorrerá!
Um leitor me fala de Getúlio e de Jânio. Meu argumento: cada situação histórica é sempre única e original. Analogias são sempre enganosas. Mas elas podem ocorrer, com similitudes de forma ou de conteúdo.
Nossa história ainda está em curso. Por vezes se acelera...
Brasília, 26/03/2020
quarta-feira, 25 de março de 2020
A pandemia estimula autoritários a expandir seu poder - Democracy Digest
Covid-19’s latest victim: Hungary’s democracy
Democracy Digest, March 25, 2020
Covid-19 is about to claim a new victim: Hungary’s democracy, argues Dalibor Rohac, a resident scholar at the American Enterprise Institute.
The country’s parliament is set to adopt a new law that will give the government of Prime Minister Viktor Orban a legal mandate to rule by decree, without any sunset clause and without parliamentary oversight. The government initially sought to fast-track the legislation and adopt it already on March 24, but it lacked the supermajority needed to accelerate the proceedings. The party, however, does not lack the votes to ensure that the legislation is passed through the normal legislative process a few days later, he writes for The Washington Post.
The brazenness of Orban’s power grab is without parallel in recent European history, Rohac adds.
Orban and Russia’s Vladimir Putin are leading practitioners of the art of political imitation, the subject of a recent book.
Russia’s political development since the end of the Cold War is central to Ivan Krastev and
Stephen Holmes’s insightful and important The Light That Failed, which examines the rise of authoritarianism and the decline of liberal democracy, notes Aryeh Neier, president emeritus of the Open Society Foundations and author of The International Human Rights Movement: A History.
Russian officials often attributed major responsibility for color revolutions in countries of the former Soviet Union to U.S.-government–funded institutions such as the National Endowment for Democracy (NED), the National Democratic Institute, and the International Republican Institute. (He also blamed my institution, the Open Society Foundations, for contributing to these developments), he writes for The New Republic:
Putin saw support that these bodies had provided to like-minded organizations in these countries as thwarting his efforts to reconstitute the Soviet Union, at least as a unified bloc under Kremlin leadership. Russian legislation adopted in 2012 required nongovernmental organizations that accepted foreign funds to declare themselves to be “foreign agents,” delegitimizing them. Additional legislation adopted subsequently imposed further restrictions on Russian organizations conducting “political activities”—broadly defined—that received funds from the United States and other foreign donors. Putin has called the collapse of the Soviet Union the greatest catastrophe of the twentieth century. As he believed that American institutions played a part in frustrating his efforts to reverse that catastrophe, he had ample incentive to engage in imitative reprisals.
Of course, the manner in which Russia intervened in U.S. elections in 2016 differed from the role played by bodies such as the National Endowment for Democracy in elections in the former Soviet Union, Neier adds. It is one thing to fund a program for the training of election observers; it is quite another to establish fake social media accounts to disseminate false rumors and smear particular candidates.
Authoritarian leaders are constantly searching for scapegoats, working to rile up the fears of their populace, and trying to tighten their grips, note the Atlantic Council’s Melinda Haring and Doug Klain.
To them, the coronavirus pandemic is a bonanza—the liberal democracies that would typically call them out for their violence, repression, and racism are distracted, with the necessities of stopping the virus in their home countries, they write for The National Interest. If these strongmen go unchecked, the COVID crisis may end with all of us emerging to find a world in which authoritarianism triumphs. More political prisoners, more presidents-for-life, and more despotism.
As we witness democratic backsliding around the world, Lawfare is releasing a two-part podcast series on the state of global democracy, notes Jen Patja Howell. In the first segment, Benjamin Wittes interviews Alina Polyakova and Torrey Taussig about “The Democracy Playbook” and strategies for fighting illiberal political movements.
For this episode, David Priess spoke with Michael Abramowitz and Sarah Repucci of Freedom House.
RTWT
Consequências econômicas do coronavirus - Armando Castelar Pinheiro (CB)
02:02:41 | 25/03/2020 | Economia | Correio Braziliense |
Medidas econômicas de combate à crise
ARMANDO CASTELAR
Coordenador de economia aplicada do IBREFGV e professor do IE/UFRG
O Covid-19 chegou ao Brasil com cerca de quatro semanas de defasagem em relação à Europa e aos EUA, mas com a mesma força. Nas duas últimas semanas, o número de casos diagnosticados aumentou à taxa de 34,6% ao dia, acumulando 1924 casos até a segunda-feira, sem dar sinais de arrefecimento. O quadro é preocupante: se não conseguirmos desacelerar o processo, ainda em abril teremos mais de 1 milhão de brasileiros contaminados, com o sistema de saúde abarrotado de pacientes graves e as mortes sendo contadas aos milhares.
A quarentena se mostrou até aqui a forma mais eficaz de impedir a disseminação do vírus, mas ela tem consequências econômicas pesadas, que se somam às que resultam da decisão voluntária de evitar certos locais, como restaurantes, cinemas e shopping centers. Não foi à toa que os governos mundo afora hesitaram em instituí-la, o que em geral acabou resultando em avanço maior da epidemia do que de outra forma teria sido necessário.
O tamanho do choque sobre a economia será não trivial: em vez da expansão que se esperava até um mês atrás, agora se espera forte contração do PIB no segundo trimestre deste ano. O governo estima que o PIB de 2020 ficará no mesmo patamar de 2019, mas hoje em dia um cenário de queda me parece mais plausível. Isso vai ajudar a derrubar ainda mais a inflação e a reduzir o deficit externo do país, mas, em compensação, as receitas tributárias vão cair muito e o desemprego subirá bastante.
O perfil da recessão esperada para este ano será diferente do de outras que tivemos nas últimas décadas: ela afetará bem mais o setor de serviços, como confirmam dados divulgados esta semana para Austrália, Japão e Europa. A contração de serviços derrubará o emprego, em especial de trabalhadores menos qualificados. O drama social que vai daí advir poderá ser bem grave.
Esse quadro, na minha visão, acaba com a pequena chance que ainda havia para a aprovação de reformas antes do recesso parlamentar de julho e das eleições municipais de outubro. Os desafios colocados para a política econômica agora são outros e não triviais.
A curto prazo, o governo precisa criar uma rede de segurança para proteger as empresas e famílias que forem mais afetadas, ficando sem receitas e rendimentos, e que não tenham como se sustentar com suas reservas. É o caso, em especial, das micro, pequenas e médias empresas e dos trabalhadores de baixa renda, em particular os informais, que não contam com a proteção de programas como o seguro desemprego. A própria viabilidade da quarentena vai depender, na prática, da criação dessa rede de proteção social, pois sem ela muita gente pode decidir simplesmente sair às ruas do mesmo jeito para garantir o sustento de algum jeito.
Ainda a curto prazo, o governo precisa garantir o bom funcionamento dos mercados, em especial do financeiro, já que a tendência natural neste momento é todos protegerem seu caixa. Isso em geral significa problemas para bancos e fundos de investimento e pode levar a que certos mercados não funcionem bem, como o de dólar e de títulos de dívida corporativa, por exemplo.
Por fim, o governo precisa adotar medidas de estímulo para compensar o efeito depressivo das quarentenas, voluntárias e obrigatórias. Nesse caso, há uma discussão relevante do momento certo de dar os estímulos. Fazer isso em momento de grande retração de consumidores e empresas pode dar pouco resultado.
Por seu lado, a pressão por pacotes maiores, em especial de gastos públicos, vai aumentar conforme a crise na saúde pública avança. É o que se viu nos EUA e na Alemanha, por exemplo: o volume de gastos previstos foi se multiplicando ao longo da semana, conforme os políticos reagiam à pressão dos eleitores.
O governo também terá um grande desafio para decidir quando e como começar a reverter a quarentena e normalizar o funcionamento das empresas. O governo federal terá incentivo para fazer isso cedo, pois o desempenho da economia influencia mais na popularidade presidencial do que a de outros políticos. Os governadores e prefeitos, por seu lado, estarão mais preocupados com a pressão que a epidemia coloca sobre os serviços de saúde.
Por fim, penso que o mundo e o Brasil não vão voltar simplesmente a ser como eram, como se uma onda tivesse passado por cima e depois partido. Haverá um esgarçamento do tecido social e novos atores devem ganhar destaque, com novas propostas de como devemos avançar nos anos à frente.
O Impacto geopolítico do coronavirus - Rubens Barbosa
O IMPACTO GEOPOLÍTICO DO CORONAVIRUS
Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 24/03/2020
A epidemia do coronavirus – a pior dos últimos cem anos – terá profundas consequências sobre um mundo globalizado, sem lideranças alinhadas e pouco solidários entre si. O impacto econômico e social vai ser profundo, com o custo recaindo nos mais pobres, fracos e idosos e em países menos preparados e desenvolvidos.
Os efeitos sobre os países e sobre a economia global estão sendo sentidos e deverão se agravar antes de melhorar.
Como a geopolítica global poderá ficar afetada pela epidemia? O que poderá mudar no cenário global?
Duas observações iniciais. A crise atual mostrou que as fronteiras nacionais desapareceram com as facilidades do transporte aéreo e o imediatismo das comunicações. E que as políticas econômicas domésticas estão intimamente influenciadas pelo que ocorre no resto do mundo. Nenhum pais ou continente é uma ilha. Por outro lado, a extensão e a repercussão da crise, em larga medida, deriva do peso da China na economia global. No inicio da década, quando ocorreu a SARS, o pais representava 4% da economia global, hoje representa 17%. A China é a segunda economia mundial, o maior importador e exportador do mundo e, para culminar, se transformou em um centro de suprimento de produtos industriais para as cadeias globais de valor.
Quais as consequências na relação entre os EUA e a China, as duas superpotências atuais? Nos últimos anos, cresceu a competição entre os dois países pela hegemonia global no século XXI. Os EUA, ao se isolarem e ampliarem ações confrontacionistas, protecionistas, nacionalistas e xenófobas, dificultam a interdependência entre os países como ocorre com a globalização. Enquanto os EUA apontam a China como adversária estratégica e criticam o governo pela condução da epidemia (vírus chinês), Beijing, ao invés de fechar as fronteiras como fez Washington, favorece a abertura e a ampliação do comércio externo e manda médicos e equipamentos para a Itália, Espanha e Brasil a fim de ajudar a combater o coronavirus. A guerra fria econômica, a nova fase da confrontação, evidencia-se pela iniciativa chinesa da Rota da Seda, pela competição nas redes 5G, e por conflitos sobre propriedade intelectual e inovações tecnológicas. A pandemia poderá também ter um efeito relevante no cenário interno dos dois países com consequências geopolíticas. Xi Jim Ping disse que caso a epidemia se prolongasse haveria o risco de estabilidade econômica e social no país. A maneira como, de início, Trump conduziu a crise epidêmica em seu país foi muito criticada e sua popularidade caiu. As prévias do partido Democrata veem definindo Joe Biden como o candidato contra Trump com o apoio do centro moderado. Caso essa tendência se firme, pela primeira vez seria possível pensar numa derrota do atual presidente. O resultado da eleição em novembro poderá ter efeitos importantes sobre a geopolítica global caso haja uma mudança da atitude do governo de Washington em relação ao mundo.
Outra questão é como países e empresas reagirão para reduzir sua dependência do mercado e da produção de partes e componentes chineses nas cadeias produtivas. A tendência poderá ser uma gradual redução dessa dependência e alguns países mais preparados e organizados, como o Vietnã e alguns outros países asiáticos, poderão sair ganhando com investimentos para substituir a China. A médio prazo, a projeção externa das grandes economias vai depender de sua base produtiva nacional e de sua competitividade.
A estabilidade politica e econômica global poderá ser significativamente afetada pela vigilância biométrica, que poderá vir a ser implantada para evitar epidemias futuras. A preocupação com a saúde poderá levar à invasão da privacidade, com possíveis reflexos em políticas totalitárias. Quanto à dramática queda do crescimento dos EUA e da China, as projeções apontam para uma redução nos EUA de 4% no primeiro trimestre e 14% no segundo. Para a China, as estimativas de crescimento não são maiores de 3,5% para 2020. Caso os EUA entrem em recessão e as projeções sobre a China se confirmem, não se pode afastar a possibilidade de recessão e, no pior cenário, de uma depressão, talvez mais dramática do que a de 1929, por não ficar limitada ao setor financeiro. Como os países emergentes, produtores agrícolas, sairão de um cenário tão dramático como esse?
A Europa está debilitada pela saída do Reino Unido e viu a situação humanitária, social e econômica agravada pela crise em alguns países, como a Itália e a Espanha. Em um cenário dramático como o atual, é possível prever que o continente sairá com seu poder relativo diminuído.
O Brasil, uma das dez maiores economias do mundo, terá que se ajustar rapidamente à nova geopolítica global, sob pena de perder mais uma vez a oportunidade de projetar-se como uma potência média em ascensão.
Em outros momentos da história, movimentos tectônicos transformaram o equilíbrio de poder entre as nações e os rumos da economia. O mundo pós-coronavirus deverá emergir com novas prioridades e com um novo cenário geopolítico, com a Asia – em especial a China –melhor posicionada para ocupar um crescente espaço politico e econômico.
Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)
Diplomata britânico de 37 anos, na Hungria, abatido pelo Codiv-19
Senior British diplomat, 37, dies after contracting coronavirus
By Rob Picheta, CNN
Updated 1918 GMT (0318 HKT) March 25, 2020

Steven Dick, 37, passed away on Tuesday after contracting Covid-19, the UK Foreign Office said.
London (CNN)A senior British diplomat stationed in Hungary has died after contracting coronavirus, the UK's Foreign Office said on Wednesday.
Steven Dick, aged 37, was the Deputy Head of Mission for the British embassy in Budapest.
He passed away on Tuesday after contracting Covid-19, the Foreign Office said.
UK Foreign Secretary Dominic Raab said: "I am desperately saddened by the news of Steven's death and my heart goes out to his parents Steven and Carol."
"Steven was a dedicated diplomat and represented his country with great skill and passion. He will be missed by all those who knew him and worked with him."
Dick joined the Foreign Office in 2008 and has also worked in British embassies in Riyadh and Kabul, according to his biography on the UK government's website.
His role of Deputy Head of Mission made him a key adviser to the UK's Ambassador to Hungary, Iain Lindsay. Dick has also worked in the UK government's Department for Digital, Culture, Media and Sport.
"Steven was a much-loved son, grandson and nephew," Dick's parents said in a statement to the UK's PA news agency.
"He was kind, funny and generous. It was always his dream to work for the Foreign & Commonwealth Office and he was very happy representing our country overseas."
The UK has recorded more than 8,000 coronavirus cases and 435 deaths, while Hungary has 226 cases and 10 fatalities, according to Johns Hopkins University on March 25.
A introversão do império sob Trump - Nicholas Burns (Foreign Affairs)
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O socialismo é uma miséria moral - entrevista de Paulo Roberto de Almeida a Celso Assis (2017)
Paulo Roberto de Almeida
Entrevista concedida ao animador do Clube Bastiat de Goiânia, Celso Assis
Goiânia, 24 de março de 2017; Divulgado em formato de vídeo anteriormente (link: https://www.youtube.com/watch?v=SZYneYwri8M) e em forma transcrita
Medium (24/03/2020, link: https://medium.com/@celsoassis03/paulo-roberto-de-almeida-o-socialismo-%C3%A9-uma-mis%C3%A9ria-moral-14281d4726f2).
Paulo Roberto de Almeida: “O socialismo é uma miséria moral” — entrevista
Medium, Mar 24, 2018 · 7 min read
Diplomata conta como foi marxista quando jovem, explica sobre o caos na Venezuela e descreve a figura de Roberto Campos
Entrevista realizada em 24 de março de 2017 para o Clube Bastiat na oportunidade que Paulo Roberto de Almeida ministrou uma palestra na Universidade Federal de Goiás. Foi transcrita recentemente para melhor aproveitamento do material.
Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira, professor universitário e doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas (1984). Desde agosto de 2016, é diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IPRI), afiliado à Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), do Ministério das Relações Exteriores.
COMO O SENHOR CHEGOU AOS IDEAIS LIBERAIS?
Paulo Roberto de Almeida: Eu não me defino teoricamente como um liberal ou como um progressista ou qualquer outro rótulo. Eu tive um caminho vindo do marxismo na juventude e tanto no plano teórico pelas leituras, quanto no plano prático pela observação, pelas viagens, pela vida vivida em diversos socialismos e capitalismos, eu fui caminhando naturalmente para soluções mais racionais. Aquela que encarnam uma relação, uma compatibilidade entre as verdades dos fatos e as intenções.
É claro que na juventude você tem aquelas aspirações igualitárias, socializantes, de justiça social, construídas sobre utopias, sobre falsas soluções. É um fato que se descobre pela vida de que o socialismo é um fracasso material. Mais que um fracasso material, o socialismo é uma miséria moral. Um regime de delação, de repressão.
Saindo do Brasil, jovem com vinte anos, fui direto ao socialismo, na Europa central, no socialismo real de tipo soviético. Eu me deparei não apenas com a penúria material, mas com a miséria moral. Ao cabo de pouco tempo, menos de três meses, eu saí e me estabeleci na Bélgica. Não é o socialismo real, mas o capitalismo quase ideal. Trabalho e estudando, sobretudo na biblioteca, fui fazendo o caminho natural do socialismo estatizante da juventude indo para um socialismo mais light. Depois naturalmente, eu aceitei a realidade das democracias de mercado.
MESMO COM TANTOS RELATOS DAS MISÉRIAS QUE PASSARAM E PASSAM AS PESSOAS EM NAÇÕES SOCIALISTAS, POR QUE AINDA HÁ PESSOAS QUE INSISTEM EM UMA “REVOLUÇÃO”?
PRA: A concepção marxista do mundo é instigante e atraente. Ela proclama as misérias materiais do mundo e nenhum regime é perfeito, as pessoas têm que trabalhar duro. Ela proclama um ideal mais elevado, o da igualdade. Aponta a causa da miséria a propriedade privada dos meios de produção, a existência de burgueses concentradores de riquezas. Apontam também o caminho revolucionário ou pelo meio eleitoral, mas para superar o capitalismo e a propriedade privada.
Isso atrai muito a juventude, pois ela é mais propensa a maior justiça social, a maior igualdade, a maior generosidade, a uma grande reforça na sociedade. Eles não atentam que a construção humana é feita de progressos graduais, constantes e acumulativos. Esse é um processo que todas as sociedades atravessam. A tentativa de reordenar a sociedade para construir igualdade redunda geralmente na distribuição da pobreza.
A sociedade precisa ter o processo de acumulação, efeito de trabalho e competição. Não é um sistema generoso. O capitalismo em si mesmo não é um sistema moral ou imoral, ele é amoral. Ele é um sistema amoral. As pessoas trabalham, tem algo para vender, para oferecer. O retorno vem pelo mercado, não pela mão generosa do estado.
O estado é uma extorsão da riqueza social produzida pelos empresários e pelos trabalhadores em benefício do conjunto da sociedade. Com isso você diminui os incentivos à acumulação. É um sistema falho, onde todos esperam receber algo de um ente supostamente neutro que não existe. O estado é uma construção social feita pelos homens para facilitar as relações humanas, mas ele próprio não é um criador de riqueza. Ele vive da riqueza da sociedade.
Basear todo o progresso econômico e social sobre um sistema estatizante é apoiar-se apenas na miséria, na pobreza e na estagnação.
COMO O BRASIL PODE AJUDAR A VENEZUELA E COMO PODEMOS NOS PROTEGER DAQUELE DESTINO?
PRA: A Venezuela é um caso extremo, mas a exacerbação de um fenômeno tipicamente latino-americano. De um lado a demagogia política, as mentiras, as promessas irrealistas e de outro lado o populismo econômico. Isso não acontece apenas na América Latina, mas ela é especialmente devotada a essas deformações.
A Venezuela tem um traço diferente de seus vizinhos latino-americanos que é sua riqueza em petróleo. Pode ser uma coisa boa se bem administrada, mas pode ser uma maldição. Ele deforma as condições econômicas de um país. Muitas vezes ele está à flor da terra, permite uma riqueza imediata.
A sociedade venezuelana foi deformada pelo petróleo durante décadas. Aquilo atraiu comportamentos rentistas, o que os economistas chamam de rent-seeking. A sociedade passou a ficar dependente do petróleo.
O [falecido ditador Hugo] Chávez criou aquilo que se chama assistencialismo estatal, distribuindo a riqueza do petróleo de uma forma desigual. E também atraído pelo socialismo dos cubanos, ele passou a reprimir a atividade capitalista privada e a estatizar e a monopolizar diversos setores. Com isso ele tirou diferentes estímulos de produção. A Venezuela é um estado falido e possivelmente em situação de pré-guerra civil.
A ex-presidente Dilma Rousseff recebe um retrato de Hugo Chávez do ditador venezuelano Nicolás Maduro em 2013.
O Brasil poderia talvez criar um grupo de “amigos do povo venezuelano” e obrigar a Venezuela a fazer uma eleição verdadeiramente livres. Tecnicamente, a Venezuela já é uma ditadura. As instituições estão deformadas. Antes o parlamento era majoritariamente chavista, hoje tem uma oposição maior, mas que está sendo sabotada. O Brasil e os outros países da América Latina, através de mecanismos de defesa da democracia do Mercosul, da Unasul, da OEA, deveriam pressionar a Venezuela por eleições livres. Daí começa um processo muito duro de reconstrução da economia.
[ATUALIZAÇÃO: Algo assim aconteceu em fevereiro de 2018 por um grupo de países latino-americanos, incluindo o Brasil. Mais informações por meio deste link.]
QUANDO O PRESIDENTE MICHEL TEMER DISSE QUE NO GOVERNO DELE O BRASIL NÃO VAI TRABALHAR COM VISÕES DE MUNDO ENVIESADAS, ENTÃO ELE ESTAVA FALANDO SOBRE ISSO?
PRA: Exato. O Brasil, como todo país latino-americano, alterna entre visões mais demagógicas, mais populistas e mais realistas. Infelizmente, o Brasil atravessou nos últimos treze anos, com os governos petistas, por governos estatizantes, dirigistas, apoiadores de governos socialistas e inimigos da liberdade, como o cubano.
Nisso a política externa foi deformada, ela passou de abstencionista da democracia para um apoiador de ditaduras. O Brasil é em grande parte responsável pela manutenção do Chávez e de outros regimes populistas e bolivarianos na América Latina.
Felizmente acabou, houve um desastre na economia. A presidente Dilma foi impedida de continuar seu mandato. O presidente Temer é um político tradicional e o Itamaraty retoma seu caráter profissional e isento, sem esse viés progressista e bolivariano dos últimos treze anos.
EM ABRIL (DE 2017), ROBERTO CAMPOS COMPLETARIA 100 ANOS. O SENHOR PODERIA DIZER QUAL FOI O LEGADO DELE PARA O BRASIL?
PRA:O Roberto Campos (1917–2001) foi um intelectual de qualidade excepcional. Vindo de estudos seminaristas, entrou na diplomacia e ao ser encarregado de questões econômicas, tanto no Itamaraty quando na sua primeira missão nos Estados Unidos, ele participou de conferências extremamente importantes, como a Bretton Woods e a de Havana.
Com isso ele se tornou um economista altamente capacitado em uma fase que o Brasil estava se deslanchando para o desenvolvimento. Ele fez uma tese de mestrado sobre flutuações e ciclos econômicos de qualidade tão excepcional que Joseph Schumpeter, famoso economista que lecionava em Harvard, disse que ela tinha qualidade de doutorado — e de fato tinha.
Observando o Brasil, os Estados Unidos, a América Latina, o Roberto Campos concluiu que a melhor forma de desenvolvimento para o Brasil seria via mercado, estabilidade macroeconômica, combatendo a inflação, competição no campo microeconômico, instituição de governanças fiáveis, alta qualidade de capital humano — ele sempre insistiu na educação — e sobretudo a abertura ao mercado internacional e aos investimentos estrangeiros. Ele tinha uma receita para o desenvolvimento e tentou aplicar.
Roberto Campos foi um dos criadores e um dos presidentes do BNDE [posteriormente renomeado BNDES], um dos principais relatores do Plano de Metas do Juscelino Kubitschek em 1955. Essa experiência prática, de não só estudar economia e comparar o Brasil a outros países, mas também de formular políticas econômicas, de ver o efeito devastador da inflação e de um mercado protecionista, fez com que ele chegasse nessa receita ideal.
Infelizmente o Brasil não era propenso a aceitar essas receitas liberais. Tanto que ele era chamado de Bob Fields [a tradução do nome Roberto Campos para o inglês] por sua visão americana do mundo. Mesmo não tendo parte no golpe militar de 1964, ele foi convidado posteriormente para o Ministério do Planejamento. De 1964 a 1967, junto com o Ministro da Fazenda Otávio Gouveia de Bulhões, um liberal, ele pode transformar radicalmente a economia brasileira, modernizá-la e fazer todas as reformas necessárias para colocar o Brasil em um patamar de desenvolvimento. E ele conseguiu.
Em 1967, quando ele saiu do governo, o Brasil enveredou em um ciclo de crescimento extraordinário, em taxas chinesas, digamos — aliás, os asiáticos vinham ao Brasil para tomar receitas de crescimento econômico. Chegou a 14% o crescimento em 1973, mas os militares exageraram. O Roberto Campos criticava seus antecessores e seus sucessores. Apontava a leniência com a inflação, a estatização exagerada, o apoio no endividamento externo. Ele não tinha problema em criticar.
E durante todos esses anos, de 1950 até sua morte, ele foi um debatedor. Escrevi artigos semanais para os grandes jornais do Rio e de São Paulo. Lembro que quando eu era jovem, eu até tentei me opor ideologicamente a ele, mas não consegui.
Se a gente ler os escritos dele desde aquela época, todas as prescrições econômicas que ele fez para o Brasil continuam válidas e pungentes. Ele tem uma atualidade muito concreta. Teve a felicidade de sobreviver ao socialismo e também a felicidade de não ver essa lástima que aconteceu à economia graças aos petistas.
Algumas semanas depois desta entrevista, o professor Paulo Roberto de Almeida lançou o livro “O homem que pensou o Brasil — trajetória intelectual de Roberto Campos” (Editora Appris, 2017).
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