Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
Um texto publicado por Paulo Brondi, promotor do Ministério Público de Goiás, viralizou na internet nesta quinta-feira (5). O conteúdo está sendo reproduzido por milhares de internautas e chegou a ser postado no blog de Juca Kfouri.
Algumas pessoas consideram que Paulo Brondi pode sofrer represálias por ter sido um dos primeiros membros do Ministério Público a ter coragem de traçar um panorama sincero daqueles que hoje ocupam o poder central no Brasil.
“Nem todo bolsonarista é canalha, mas todo canalha é bolsonarista.”
Bolsonaro é um cafajeste. Não há outro adjetivo que se lhe ajuste melhor. Cafajestes são também seus filhos, decrépitos e ignorantes. Cafajeste é também a maioria que o rodeia.
Porém, não é só. E algo que se constata é pior. Fossem esses os únicos cafajestes, o problema seria menor.
Mas, quantos outros cafajestes não há neste país que veem em Bolsonaro sua imagem e semelhança?
Aquele tio idiota do churrasco, aquele vizinho pilantra, o amigo moralista e picareta, o companheiro de trabalho sem-vergonha…
Bolsonaro, e não era segredo pra ninguém, reflete à perfeição aquele lado mequetrefe da sociedade.
Sua eleição tirou do armário as criaturas mais escrotas, habitués do esgoto, que comumente rastejam às ocultas, longe dos olhos das gentes.
Bolsonaro não é o criador, é tão apenas a criatura dessa escrotidão, que hoje representa não pela força, não pelo golpe, mas, pasmem, pelo voto direto. Não é, portanto, um sátrapa, no sentido primeiro do termo.
Em 2018 o embate final não foi entre dois lados da mesma moeda. Foi, sim, entre civilização e barbárie. A barbárie venceu. 57 milhões de brasileiros a colocaram na banqueta do poder.
Elementar, pois, a lição de Marx, sempre atual: “não basta dizer que sua nação foi surpreendida. Não se perdoa a uma nação o momento de desatenção em que o primeiro aventureiro conseguiu violentá-la”.
Muitos se arrependeram, é verdade. No entanto, é mais verdadeiro que a grande maioria desse eleitorado ainda vibra a cada frase estúpida, cretina e vagabunda do imbecil-mor.
Bolsonaro não é “avis rara” da canalhice. Como ele, há toneladas Brasil afora.
A claque bolsonarista, à semelhança dos “dezembristas” de Luís Bonaparte, é aquela trupe de “lazzaroni”, muitos socialmente desajustados, aquela “coterie” que aplaude os vitupérios, as estultices do seu “mito”. Gente da elite, da classe média, do lumpemproletariado.
Autodenominam-se “politicamente incorretos”. Nada. É só engenharia gramatical para “gourmetizar” o cretino.
Jair Messias é um “macho” de meia tigela. É frágil, quebradiço, fugidio. Nada tem em si de masculino. É um afetado inseguro de si próprio.
E, como ele, há também outras toneladas por aí.
O bolsonarismo reuniu diante de si um apanhado de fracassados, de marginais, de seres vazios de espírito, uma patuléia cuja existência carecia até então de algum significado útil. Uma gentalha ressentida, apodrecida, sem voz, que encontrou, agora, seu representante perfeito.
O bolsonarismo ousou voar alto, mas o tombo poderá ser infinitamente mais doloroso, cedo ou tarde.
Nem todo bolsonarista é canalha, mas todo canalha é bolsonarista.
Jair Messias Bolsonaro é a parte podre de um país adoecido.
Bolsonaro teve reuniões secretas com ex-presidente golpista presa na Bolívia
O possível encontro com Jeanine Añez pode ser a ponta de uma meada onde conspirações, fugas clandestinas de ministros e talvez entrega de armas se enredem
Brasil 247, 18 de janeiro de 2022, 12:19 h
Por Dario Pignotti Garcia, no Página 12- Jair Bolsonaro reconheceu ter se encontrado com a ex-presidente boliviana Jeanine Añez, confirmando as suspeitas sobre o apoio brasileiro ao golpe que derrubou o presidente Evo Morales. O possível encontro pode ser a ponta de uma meada onde conspirações, fugas clandestinas, fuga de ministros e talvez entrega de armas se enredem. Em um ato aparentemente involuntário, o capitão e presidente aposentado afirmou: "a ex-presidente da Bolívia, Jeanine... Eu estive com ela uma vez, ela é uma pessoa legal que está na prisão". Para depois acrescentar, com raiva, "você sabe qual é a acusação contra ela? (ter cometido) atos antidemocráticos". Como até o momento não há notícias de nenhuma cúpula oficial entre os dois, essa conversa ocorreu secretamente.
Segundo essa declaração, para Bolsonaro, atacar instituições é algo que não deve ser punido com a prisão da ex-presidente, que permanece detida em um presídio em La Paz, onde se prepara para enfrentar um novo julgamento. O que Bolsonaro não disse é quando e onde ocorreu o encontro com a mulher que governou de fato entre novembro de 2019 e dezembro de 2020, quando o presidente Luis Arce tomou posse. Nesse período de pouco mais de um ano, o avião presidencial boliviano, que só pode decolar com autorização do chefe de Estado ou com ele a bordo, voou com frequência e clandestinidade para o Brasil.
A confissão Em alguns canais bolsonaristas do YouTube, eles aparentemente perceberam a gravidade das declarações do presidente sobre sua nomeação com Añez e as retiraram do ar. O comentário presidencial, ou melhor, a confissão, poderia ser levado à consideração do tribunal, que a partir desta semana começará a julgar Añez junto com os ex-chefes militares e de polícia no processo denominado "Golpe de Estado II".
Um ex-alto funcionário de Morales e diplomata que atualmente trabalha fora de seu país analisou, em diálogo com a condição de anonimato, a conexão Brasília-La Paz e os elementos que ela pode contribuir para o iminente novo julgamento. "Acredito que a declaração do presidente Bolsonaro é importante para este julgamento porque é mais uma prova de que o governo de Evo Morales foi atacado por uma organização internacional, isso significa que foi dada ajuda do exterior para um golpe de estado." Devemos esperar a evolução deste julgamento oral, propõe o ex-funcionário, mas "se Añez aceitar que houve essa reunião, ela terá que explicar por que não a denunciou".
"A senhora Añez está sendo investigada por não ter chegado ao poder constitucionalmente, usando o caminho da violência. O povo boliviano quer que ela seja investigada pelas mortes ocorridas para que ela chegue ao poder", continuou o diplomata.
Añez, bem-vinda A nomeação secreta de Bolsonaro e Añez está em consonância com o apoio público dado por Brasília ao movimento que depôs Morales. Na manhã de 13 de novembro de 2019, horas após a posse de Añez, o Brasil foi o primeiro país da região a parabenizar o novo governo "constitucionalmente" surgido. Añez chegou ao Palacio del Quemado junto com o líder de Santa Cruz de la Sierra, Fernando Camacho, apelidado de "Bolsonaro da Bolívia", que em meados de 2019 havia sido recebido pelo então chanceler brasileiro, Ernesto Araújo. Após a conversa, Camacho e Araújo foram fotografados ao lado da deputada Carla Zambelli, de ardente linhagem bolsonarista.
Vale ressaltar que o golpe boliviano não foi do novo tipo "soft", seja parlamentar ou via "lawfare", como os que derrubaram Dilma Rousseff em 2016 e o ex-presidente paraguaio Fernando Lugo em 2012. O da Bolívia estava no clássico moldes com a participação de policiais e militares, guardando alguma semelhança com aqueles que levaram às ditaduras dos anos 60 e 70 até hoje defendidas pelo presidente brasileiro.
O apoio brasileiro ao regime cívico-militar de La Paz continuou em 2020 com o objetivo de construir uma hegemonia regional de direita, incluindo o apoio aos candidatos Keiko Fujimori no Peru e Antonio Kast no Chile. Para tanto, era preciso impedir o retorno do Movimento Morales ao Socialismo através da candidatura de Luis Arce, que finalmente venceria por larga margem em outubro de 2020. Nesse caso, o Brasil foi o último país importante que manifestou seu desejo de libertar Arce, ex-ministro da Economia e Finanças durante os governos de Morales.
Voos A Página 12 publicou em junho de 2020, quando Añez estava no Palácio del Quemado há seis meses, um artigo assinado por Felipe Yapur sobre os "voos suspeitos e repetidos" do avião presidencial da Força Aérea Boliviana 001, o FAB001, com destino ao Brasil. A investigação é baseada em informações da empresa de rastreamento de voos dos EUA FlightAware.
Na lista de viagens ao Brasil estão várias a Brasília onde poderia ter ocorrido o encontro entre Bolsonaro e Añez, ao qual o ex-capitão se referiu durante uma transmissão ao vivo nas redes sociais ocorrida meses atrás, quando acusou seu rival, Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores para "apoiar a volta do povo de Evo Morales na Bolívia".
O primeiro voo do FAB001 foi em 11 de novembro de 2019 “após a queda do presidente Morales e antes da assunção de Añez”, diz a fonte boliviana consultada por este jornal. "Minha percepção é que a movimentação do avião no dia 11 de novembro é extremamente estranha, não sabemos se foi para levar algo ou trazer algo do Brasil. Sou diplomata de carreira, quando um presidente sai do país ele tem que avisar e deixar o vice-presidente, e isso não aconteceu."
Senador Carvalho O senador brasileiro Rogério Carvalho, do PT, não tem dúvidas sobre a participação brasileira na trama contra Morales. "De zero a dez, a chance de Bolsonaro apoiar o golpe é dez." Questionado por este jornal, o deputado afirmou que "Bolsonaro dá seu total apoio a qualquer governo que seja antidemocrático ou a forças políticas antidemocráticas".
Segundo Carvalho, o Congresso poderia tomar providências sobre o assunto e descobrir como eram as relações de Bolsonaro com Añez e outras possíveis conexões.
Uma área cheia de perguntas sem resposta é a fronteira entre os dois países, com mais de 3.400 quilômetros de extensão, por onde teriam passado recursos para o movimento sedicioso de 2019 e que poderia ter servido como zona de fuga em 2020 para funcionários de Añez. Luis Fernando López e o Ministro do Governo Arturo Murillo.
Armas? O diplomata e ex-funcionário de Morales lembra que Murillo, depois de passar pelo Brasil, foi preso nos Estados Unidos por lavagem de dinheiro e outros crimes relacionados à compra de armas. E suspeita que o ex-chefe da Defesa, López, possa estar escondido no Brasil. A nossa fonte, que entrevistamos em agosto e voltamos a consultar brevemente no domingo, refere-se novamente às viagens clandestinas da FAB001 e destaca a realizada no final de dezembro de 2020.
A data desse voo coincide com a de um documento do Ministério da Defesa boliviano no qual se menciona que uma carga de armas deve ser retirada em 30 de dezembro. Dezembro? ? Sim", "Existe algum documento com papel timbrado do Ministério da Defesa do Estado Plurinacional da Bolívia que diga que haveria entrega de armas no Brasil? Sim. É possível que as armas sejam entregues em um aeroporto no Brasil para outro país. Isso é normal?" pergunta o ex-funcionário boliviano.
E conclui propondo que sejam investigados os pontos de “contato” que relacionam “Bolsonaro dizendo que se encontrou com Añez” com a possível “saída do país do ex-presidente” e a suposta “entrega de armas no Rio”.
Among foreign policy mandarins in present-day Washington, “spheres of influence” have become anathema. Prior generations of U.S. policymakers thought otherwise. Indeed, no great power in recent history has pursued the concept more assertively, albeit with mixed results. To pretend that spheres of influence are alien to the American tradition of statecraft is to engage in self-deception.
As interpreted today, however, the very phrase smacks of appeasement. It carries the suggestion of selling out the cause of freedom and democracy, a sin for which senior U.S. officials are keen to absolve the nation. A decade ago, Secretary of State Hillary Clinton declared categorically that “The United States does not recognize spheres of influence.” More recently, Secretary of State Antony Blinken affirmed that statement. “We don’t accept the principle of spheres of influence,” he said. Some scholars go even further, Hal Brands of the Johns Hopkins University arguing that “spheres of influence clash with fundamental tenets of U.S. foreign policy.” Opposing them, Professor Brands asserts, forms an inherent “part of U.S. diplomatic DNA.”
In fact, the United States has historically shown considerable skill in creating and policing spheres of influence. It has done so not out of devotion to abstract principle, but for entirely pragmatic reasons: as a means to construct and uphold situations favorable to the United States. On that score, the Monroe Doctrine (1823) and its Roosevelt Corollary (1904), rate as Exhibits A and B.
Well, that was long ago, some might reply. Devoted more than ever to promoting freedom and democracy, Washington just doesn’t do things that way anymore. By extension, neither should Moscow, Beijing, or anyone else be permitted to do so.
According to Secretary Blinken, the very concept of spheres of influence “should have been retired after World War II.” In point of fact, the passing of World War II increased Washington’s appetite for carving out new spheres. The putative threat posed by international communism seemed to demand as much. The military and economic power wielded by the United States allowed it to flex its muscles on a scale far greater than anything John Quincy Adams (actual architect of the Monroe Doctrine) or Theodore Roosevelt ever imagined.
By the end of the 20th century, America’s spheres of influence spanned the globe, encompassing not only the Western Hemisphere, but also Western (and eventually Eastern) Europe, East Asia, the Persian Gulf, and large swathes of Africa. The chief substantive expression of these several spheres came in the form of proliferating U.S. regional military commands presided over by four-star viceroys. Whatever the euphemisms employed, each of these commands exists to prevent its assigned “Area of Responsibility” from becoming a source of trouble for the United States. To repurpose an old advertising slogan devised by the Sherwin-Williams Paint Company, the Pentagon’s Unified Command Plan “Covers the Earth.’’
It is fascinating to speculate how Washington would respond to Vladimir Putin announcing plans to permanently station Russian troops in, say, Managua, or to China’s President Xi creating a People’s Liberation Army South American Command, with headquarters in Caracas. To answer that question, look no further than the U.S. response to the Soviet deployment of offensive weapons to Cuba in 1962: Washington would go bonkers.
Yet the brush with Armageddon that was the Cuban Missile Crisis does not lessen the fact that respecting Cold War spheres of influence played a large role in averting World War III. Demanding the liberation of Eastern European “captive nations” formed a staple of U.S. Cold War propaganda. The Hungarian Revolution in 1956 and the “Prague Spring” of 1968 offered U.S. presidents an opportunity to translate rhetoric into action. Yet Dwight D. Eisenhower and Lyndon Baines Johnson each in turn passed on the opportunity, tacitly acknowledging that the far side of the East-West divide fell within the Kremlin’s sphere of influence. This was bad news for Hungarians and Czechoslovaks, of course. But arguably it was good news for the survival of humankind.
Building spheres of influence is an exercise in de facto imperialism. A perpetual challenge in empire-building is knowing when to stop, allowing further expansion to take a back seat to consolidation. The United States in our own time offers a master class on how not to do it. Until the last decades of the 20th century, the Middle East occupied the periphery of the American Empire. After 9/11, fully incorporating the region into Washington’s globe-spanning sphere of influence became a priority and the rationale for multiple wars of choice intended to establish American regional primacy. The result was a debacle.
Today Moscow and Beijing each seem intent on delineating a sphere of influence in their own near abroad. Sooner or later each of them will confront the question of where to stop. Who knows? They might even learn from the folly to which the American empire succumbed.
Andrew Bacevich is president of the Quincy Institute for Responsible Statecraft.
Como vários outros aspectos da diplomacia bolsolavista, este também é inédito: buscar alternativas estaduais — republicanas e presumivelmente trumpistas — à falta de diálogo no plano fedeal em Washington, executivo e, sobretudo, Congresso. Ou seja, a representação diplomática brasileira investindo numa mudança de lideranças políticas nos EUA, num sentido que evidentemente coincide com as aspirações da atual tropa no poder no Brasil.
Se isso ocorrer, porém, Bozo já não mais estará à frente do Estado brasileiro, ainda que possa eventualmente cumprimentar seu “amigo” Trump.
Paulo Roberto de Almeida
Embaixador do Brasil nos EUA busca se aproximar de estados após tensão com Congresso
Nestor Forster teve encontros com governos de Carolina do Sul e Geórgia, que combatem vacinação obrigatória
Folha de S. Paulo, 18.jan.2022 às 7h00 Rafael Balago
WASHINGTON - O embaixador do Brasil em Washington, Nestor Forster, tem apostado em se aproximar de governos e entidades estaduais dos Estados Unidos, em uma estratégia para melhorar a interlocução e desviar da pressão que o Brasil tem sofrido no Congresso americano. Vários parlamentares têm feito críticas fortes ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e pedido por um esfriamento na relação entre os dois países.
Nos últimos meses de 2021, Forster fez ao menos quatro viagens. O diplomata alternou idas a estados governados por democratas (como Connecticut e Carolina do Norte) com áreas sob comando republicano (caso de Carolina do Sul e Geórgia), mas é nestes últimos que ele tem obtido mais resultados.
Na Carolina do Sul, por exemplo, o embaixador assinou um memorando de entendimento para ampliar o comércio e a troca de investimentos entre o estado e o Brasil, no final de outubro —em 2020, negociações entre os dois movimentaram US$ 910 milhões. Foi o primeiro termo do tipo já fechado com um ente subnacional dos EUA. "Continuaremos a trabalhar juntos no comércio e nos investimentos e a fortalecer nossa parceria", disse o governador republicano Henry McMaster, ao assinar o documento.
Crítico do presidente Joe Biden, McMaster tem combatido as determinações de vacinação obrigatória impostas pela Casa Branca para controlar a pandemia de coronavírus. A Carolina do Sul foi um dos estados que processaram o governo federal e conseguiram barrar a exigência na Justiça.
"Estamos chocados com os excessos do governo Biden. Nunca vi um presidente agir além da lei como esse. Nenhum morador da Carolina do Sul deveria ter de escolher entre seu emprego e uma vacina contra a Covid-19", disse o governador, em novembro. Ele também assinou um decreto para proibir órgãos estaduais de exigir a vacinação de funcionários.
O republicano se coloca ainda como defensor de pautas conservadoras. Pediu publicamente ao superintendente de educação do estado que investigue denúncias de livros com "trechos obscenos" em bibliotecas de escolas públicas; como exemplo, citou queixas de pais sobre a obra "Gender Queer: A Memoir", de Maia Kobabe, livro em quadrinhos sobre transição de gênero. Ele também defende que a Suprema Corte revogue o direito ao aborto.
Na vizinha Geórgia, cujo governo também processou a Casa Branca para suspender as exigências de vacina, Forster se encontrou com representantes dos departamentos estaduais de Agricultura e Desenvolvimento, no começo de novembro.
Pat Wilson, comissário do Departamento de Desenvolvimento Econômico, disse à Folha ter ficado honrado com a visita do embaixador. Segundo ele, a relação do estado com o Brasil vem de longa data, pois a Geórgia tem um escritório em São Paulo há 25 anos. "Um grande número de empresas brasileiras emprega milhares de georgianos. Negócios da Taurus [fabricante de armas], da Guidoni [de extração de rochas ornamentais] e da Embraer [aviação] se tornaram parte importante da nossa comunidade", disse.
Já em estados sob comando democrata, como Carolina do Norte e Connecticut, a agenda do embaixador se concentrou em visitas a fábricas —como a da Gerdau—, universidades e centros de pesquisa locais. "Assim como o Brasil, os EUA são um país complexo, de grande diversidade regional, e é importante que a embaixada busque ampliar sua presença junto a comunidades locais", disse Forster.
As visitas fazem parte de um plano para ampliar a interlocução do Brasil com estados americanos e buscar mais parceiros fora de Washington. A determinação foi encorajada por Bolsonaro, que antes da pandemia também fez visitas aos EUA em cidades afastadas da capital.
O presidente esteve na Flórida em 2020 e um ano antes foi ao Texas —nesta última viagem, para receber um prêmio que seria entregue inicialmente em Nova York, mas teve a cerimônia alterada após pressão pública do prefeito democrata Bill de Blasio, para que Bolsonaro não fosse à cidade. Os movimentos buscavam também reforçar o alinhamento com o ex-presidente Donald Trump; o brasileiro fez campanha aberta pela reeleição do republicano, que acabou derrotado por Biden em novembro de 2020.
Para Fernanda Magnotta, pesquisadora do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), essa atuação de Forster pode ser parte de um novo cenário global, no qual líderes locais ampliam a atuação internacional, e também uma resposta às ações recentes de governadores brasileiros. "Eles tomaram a frente na importação de vacinas e buscando protagonismo em agendas como a do ambiente. Em Glasgow [na COP26], havia a delegação brasileira e representantes dos estados, muitas vezes dissonantes", avalia.
Funcionários da embaixada também esperam que as viagens estaduais ajudem a fortalecer as relações com parlamentares americanos no Congresso. Forster teve reuniões recentes com o senador republicano Lindsey Graham, da Carolina do Sul, e com o deputado democrata Bill Keatind, de Massachussets.
O governo brasileiro tem sido alvo de fortes críticas no Congresso dos EUA. Desde setembro, nomes democratas do Capitólio mandaram ao menos três cartas ao governo Biden, pedindo um distanciamento na relação entre os dois países. Na mais recente delas, do começo de dezembro, oito senadores democratas pediram um "reset" diplomático e acusaram Bolsonaro de ser responsável pela alta no desmatamento no Brasil e por ameaçar a democracia no país.
Como mostrou a Folha, os textos se inserem em um contexto de pressão feita por ativistas e grupos progressistas do partido do presidente americano.
O embaixador respondeu aos críticos do governo brasileiro, também com cartas, nas quais defendeu as ações de Bolsonaro e chegou a dizer que parlamentares americanos estavam mal informados.
Estamos quase chegando nos 250 anos de publicação da obra magna de Adam Smith, quando os Estados Unidos também estarão comemorando o primeiro quarto de milênio de sua história independente. Uma boa marca para fazer um balanço do que eles fizeram de bom, e de menos bom, para a história da humanidade. Pretendo fazer um balanço de todas essas datas...
Paulo Roberto de Almeida
La Nación, Buenos Aires – 17.1.2022
El inmortal Adam Smith
Sus observaciones superaron las utopías caducas de su tiempo y de algunos tiempos que le sucederían
Marcos Aguinis
Merece los laureles del recuerdo. Este hombre vivió y creó sus principales obras antes de la Revolución Francesa. Es importante reconocer su visión profética en tiempos confusos y ardientes. Su cerebro estaba provisto de un enorme telescopio, que se tardó en advertir. Sus descubrimientos sobre aspectos decisivos de las conductas humanas tuvieron una repercusión notable en el devenir de los siglos. Sus datos biográficos generan sorpresa, porque revelan una personalidad enmarañada, que atrapa informaciones diversas. Y a las que somete a un filtro y análisis cuidadoso, incansable, crítico.
Nació en Escocia y se enlazó con personalidades que también contribuyeron a enriquecer su corajuda visión humanística. Supuso que la moral y la filosofía, a las que investigó y sobre las cuales dejó páginas notables, serían el principal legado que podía construir. Pero, provisto de humildad, no advirtió que sobrepasaba ese nivel y pasaba a ser el padre de la moderna economía. Sus observaciones superaron las utopías caducas de su tiempo y de algunos tiempos que le sucederían. El marxismo y otras teorías de trágicas consecuencias, así como las mentiras del populismo, han generado miseria, odio y decadencia mental. No se atreven siquiera Los dejan a un costado porque relumbran. Solo se limitan a citarlo, como a un clásico viejo, caduco, aburrido.a compararlas con los aportes de Adam Smith.
La obra trascendental de este genio fue La riqueza de las naciones. No se limitó a elaborarla durante años, decidirse a escribirla con la mayor objetividad y editarla, sino que la siguió sometiendo a inclementes ajustes con cada reedición, como si estuviese corrigiendo los papeles de un estudiante mediocre. Durante años, mediante investigaciones adicionales, reflexiones, pruebas y contrapruebas que mantuvieron vivo el interés de sus ideas. Los amigos advertían que su rostro sereno escondía una máquina en permanente actividad. A menudo lo encontraban perdido, lejos de su casa, pensando. Se preocuparon por su salud. Lo invitaban a comer, beber, a reuniones sociales. Algunos se burlaban creyéndolo “triste como un perro”. Pero no estaba triste, sino navegando en las aguas de su océano lleno de rutas que debía explorar. Movía el jarro de cerveza, pedía que le repitiesen una pregunta reciente, olvidaba su abrigo, sabía que era un insocial y trataba de saludar con afecto, pero sin recordar con precisión a quién saludaba. Muchas veces lo acompañaban a su casa y lo ayudaban a preparar la comida o lavar la ropa.
Dejando en relativo descanso las múltiples inquietudes humanísticas sobre las que seguía escribiendo y dando clase, perseveraba en los asuntos que le darían originalidad. Y que lo convirtieron en el padre de la economía moderna. Demostró que el mercado libre –que muchos ignoraban o no lo entendían o reducían a las verdulerías– era el motor del progreso. La palabra “mercado” se asociaba y muchos aún asocian a las ventas y las compras. No es así: incluye hasta la cultura. Nadie en particular lo ha inventado, es producto de las agrupaciones humanas. Por lo tanto, se hunde en la prehistoria y fue creciendo paulatinamente. El motor de su desarrollo es el comercio, que no se limita a los bienes materiales, sino también a provenientes del espíritu, el arte y todo lo que intercambian los seres humanos. Su funcionamiento produjo la maravillosa división del trabajo. Sin saberlo, todos los integrantes de una sociedad –sean vendedores, pensadores, compradores y productores– contribuyen a que esta máquina funcione y haga avanzar al conjunto, con menos o mayor beneficio para cada sector o individuo. Donde esta máquina mejor funciona es donde más enérgico es ese progreso. En cambio, donde esa máquina es bloqueada, el atraso es mayor para todos, excepto para los pocos individuos que se benefician de ese bloqueo. Ojo: siempre hay sujetos que perturban el beneficio general; mienten al proclamar lo contrario.
Otro dato interesante –y que sigue siendo cuestionado hasta ahora– es el de la propiedad privada. Haría reír a Adam Smith, y hace reír a todos los que se detienen a reflexionar. Resulta grosero que en numerosas sociedades que se denominan cristianas desconozcan su importancia cardinal. Señalo esto porque ya en los Diez Mandamientos el séptimo ordena: “No robarás”. Si se condena el robo, obviamente está prohibido apropiarse de algo que pertenece a otro. Si “pertenece” a alguien, existe la propiedad. Esto ha sido descubierto desde la antigüedad más remota.
Adam Smith desconcertó con algo más escandaloso aún: demostró que el progreso no se debe a la caridad, sino al egoísmo.Dijo textualmente: “No obtenemos los alimentos por la benevolencia del carnicero, del cervecero o el panadero, sino por la preocupación que tienen ellos en su propio interés, sus necesidades, sus ambiciones”. No nos dirigimos a sus sentimientos humanitarios, sino a su egoísmo, cuando reclamamos esos objetos, porque de lo contrario ellos no producirán ni se ocuparían de exhibir sus productos y venderlos. Ocurre que la palabra egoísmo se ha cargado de color negativo, sin entenderse su funcionalidad. El egoísmo no debe ejercerse contra el prójimo, sino para atenderse a uno mismo sin dañar al otro. Y el otro debe comportarse del mismo modo. El mundo no funciona sobre la base de la clemencia.
Utilizando distintas palabras, puede decirse que siempre se actúa según el deseo o el interés de cada uno. Es propio de la vida en general. Los esfuerzos que se realizan para incrementar la solidaridad y el bien de amplias comunidades oscurecen el motor que trabaja desde el fondo de los inconscientes. Un sabio se esmera en señalar los caminos virtuosos y un delincuente, en realizar un exitoso delito. Pero cada uno opera sobre la base del impulso que le llega desde sus oscuras profundidades. Es horrible lo que suele hacer el delincuente, pero opera siguiendo su deseo, no el del otro.
Agrega Adam Smith: “La propiedad que cada hombre obtiene de su propio trabajo es sagrada y debe ser inviolable, puesto que es la base de los demás beneficios”. Los agricultores florecientes odian la agricultura colectiva, porque solo les ofrece apenas una ganancia ínfima por un trabajo adicional. Lo mismo ocurre con los trabajadores más productivos de una fábrica, quienes pierden interés en ser más productivos si no se recompensan sus esfuerzos. En todas partes brota el descontento cuando se intenta obligar a obedecer en todo, incluso en el pensar. Entonces el ser humano baja al sótano de la esclavitud.
Su voluminoso libro reclama una lectura cuidadosa, porque soluciona muchos de los conflictos que perturban hasta hoy. Este pensador sería atacado a pedradas debido a las ideas prejuiciosas que atan a muchas personas hasta el presente. Las piedras serían arrojadas por quienes suponen que responden a la más elevada moral, sin darse cuenta de que esa moral es reaccionaria.
No es casual que el mismo lúcido pensador que limpió de barro las equívocas ideas sobre los secretos de la riqueza haya sido un obsesivo investigador de la ética. Tampoco es casual que talentos nutridos por la fuerza de una cultura iridiscente como los de Mario Vargas Llosa y Alberto Benegas Lynch (h.) lo hayan homenajeado desde hace mucho, al hacer más comprensibles sus ideas y las de sus sucesores.
A revista mais antiga no setor é a Revista Brasileira de Política Internacional, ininterruptamente publicada desde 1958, em 1993 transferida do Rio de Janeiro para Brasília. A Política Externa foi publicada de 1992 a 2015, com o apoio da Editora Paz e Terra. Agora surge a revista do CEBRI: bem vinda...
Cebri vai lançar revista direcionada para a política externa
Primeira edição terá artigos de ex-ministros e entrevista com Fernando Henrique Cardoso
Também haverá contribuições do brasilianista Abraham Lowenthal e do presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Luís Roberto Barroso.
"Hoje o Brasil carece de publicações de relações internacionais e de política externa. Pela dimensão de quem vai escrever, imaginamos que a revista terá grande impacto", afirma Kalout.
POEMA DE CONSTANTINE CAVAFY, TRADUZIDO DO GREGO PARA O INGLÊS POR EDMUND KEELEY, RETRADUZIDO PARA O PORTUGUÊS POR MARCELO RAFFAELLI, QUE NÃO FALA GREGO
O que estamos esperando, todos juntos no fórum?
Os bárbaros vão chegar hoje.
Por que nada se passa no Senado?
Por que os senadores lá se sentam, sem legislar?
Porque os bárbaros vão chegar hoje.
Para que os senadores fariam leis agora?
Quando os bárbaros chegarem, eles farão as leis.
Por que nosso imperador madrugou, tão cedo,
E sentou-se em seu trono, à porta da cidade,
Em traje solene, com sua coroa?
Porque os bárbaros vão chegar hoje
E o imperador quer receber seu chefe,
Mesmo tem um pergaminho para lhe dar.
Por que nossos dois cônsules e pretores envergam hoje
Suas togas escarlates, todas bordadas?
Por que puseram braceletes com pedras preciosas,
Anéis luxuosos, de esmeraldas magníficas?
Por que envergam elegantes bengalas,
Lindamente trabalhadas em ouro e prata?
Porque os bárbaros vão chegar hoje
E coisas assim encantam os bárbaros.
Por que nossos grandes oradores não vêm, como sempre,
A briga entre cientistas e produtores de soja que gerou racha no agronegócio e foi parar no STF
Camilla Veras Mota - @cavmota
Da BBC Brasil em São Paulo
Crédito, Getty Images
Planta atacada por ferrugem asiática: praga está no centro da discussão
Um desentendimento que se arrasta há pelo menos dois anos entre técnicos e produtores de soja do Mato Grosso escalou e chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A briga gira em torno da extensão do calendário de plantio da soja, que por lei vai de setembro a dezembro no Estado.
Um grupo de agricultores pleiteia a possibilidade de semear por mais tempo, até fevereiro. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por sua vez, alerta que a esticada pode favorecer a proliferação descontrolada de uma praga chamada ferrugem asiática (Phakopsora pachyrhizi) e, no médio prazo, colocar em risco a produtividade da soja brasileira.
Representantes da indústria de defensivos já alertaram que, caso o fungo se torne mais agressivo, não há produtos hoje no mercado ou em desenvolvimento que possam fazer frente a ele.
A questão virou uma novela, com direito a investigação pelo Ministério Público e uma oposição incomum entre a Embrapa e o Ministério da Agricultura, que algumas fontes ouvidas pela reportagem comparam aos atritos entre Anvisa e Ministério da Saúde em relação às vacinas.
A pasta chegou a publicar portaria autorizando a extensão do período de plantio - apesar de os cientistas da Embrapa desaconselharam a medida. Em dezembro, o caso chegou ao STF, que não tem prazo para emitir uma decisão.
O começo da história
Pelo menos desde 2015 a Embrapa participa de fóruns de discussão sobre a semeadura da soja em fevereiro em Mato Grosso, como ressaltou a entidade recentementeem uma nota de esclarecimento, também encaminhada à reportagem.O posicionamento sempre foi contrário. O plantio da soja por mais tempo diminui o que os pesquisadores chamam de "vazio sanitário", o período em que não há plantação no campo. Sem a vegetação, os ciclos reprodutivos de pragas são interrompidos e a disseminação de doenças se mantém, de certa forma, sob controle.
Crédito, Enrique Marcarian/Reuters
Soja é hoje um dos principais produtos de exportação do Brasil
"Esses vazios sanitários existem de forma natural, por conta de secas ou, em outros países, da neve", explica o professor da Faculdade de Ciências Agronômicas Unesp Ciro Rosolem, vice-presidente de comunicação do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), entidade que se posicionou contra a extensão do calendário.
"Mas o desenvolvimento fantástico da agricultura no Brasil nos últimos anos permitiu que o produtor fizesse mais de uma lavoura por ano, e acabamos ficando sem esse vazio - daí a necessidade de regulamentar [e a criação do calendário]."
Isso porque a extensão do período para semeadura cria uma "ponte verde" (ou seja, uma sequência ininterrupta com plantas vivas no campo) que permite que algumas pragas, entre elas a ferrugem asiática, que chegou ao Brasil em 2001, consigam continuar se proliferando.
"Isso resulta na aceleração do processo natural de seleção de resistência do fungo aos fungicidas", diz a Embrapa.
Esse posicionamento, segundo o professor Rosolem, hoje é consenso na comunidade científica.
"A briga é essa, é ciênciaversus mercado. O que não quer dizer que o mercado é bandido e a ciência é boazinha, é complicado", ele afirma. "Mas temos dados suficientes para ficar com a ciência."
Crédito, AFP Técnicos alertam para possibilidade de desenvolvimento de resistência da ferrugem aos agrotóxicos
Plantio ilegal e investigação do MP
No início de 2020, antes da explosão da pandemia de covid-19, o Ministério Público em Mato Grosso (MP-MT) começou a receber diversas denúncias de que um grupo de produtores no Estado vinha descumprindo a legislação e plantando soja após a data permitida.
Os promotores pediram então esclarecimentos aos produtores, que responderam que se tratava de um experimento científico realizado no âmbito de uma entidade representativa, a Aprosoja, e não de cultivo comercial propriamente dito.
Para se configurar como experimento, contudo, a prática agrícola deveria seguir uma série de padrões científicos que não foram observados, entre eles contar com a aprovação da comissão de ética de algum órgão científico, diz o promotor Joelson de Campos Maciel, que atuou no caso.
"Nós conversamos com a Embrapa e entendemos por bem fazer uma notificação recomendatória para fiscalizar [o cumprimento do vazio sanitário]."
Mesmo após a fiscalização, contudo, os produtores mantiveram as lavouras, o que motivou a abertura por parte do MP de uma série de ações civis públicas, que têm entre os réus a Aprosoja, que vinha conduzindo o plantio dito experimental, e Antônio Galvan, presidente da Aprosoja MT na época, que realizou o plantio em sua propriedade. Algumas delas, segundo o promotor, já tiveram ganho em primeira instância e seguem tramitando.
Essa não foi a única polêmica recente envolvendo a entidade. Foi na sede da Aprosoja em Brasília que, no último mês de agosto, o cantor sertanejo Sérgio Reis publicou um vídeo em que fazia convocação de manifestantes nos dias anteriores ao feriado de 7 de setembro para que acampassem em defesa do presidente Jair Bolsonaro.
Após a divulgação do vídeo,tornou-se público um áudio enviado pelo cantor a um amigo, em que se referia em tom de ameaça ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e aos ministros do STF.
Por conta do episódio e de seus desdobramentos, Reis e Galvan, desde 2021 presidente da entidade nacional, foram convocados a depor na Polícia Federal, no âmbito do inquérito que investiga a organização e financiamento de atos que defendem bandeiras antidemocráticas. Às vésperas do 7 de setembro, o Supremo chegou a determinar o bloqueio temporário de saques da conta bancária da Aprosoja.
Apesar de autorização do MAPA, Estados como Mato Grosso de Sul e Goiás mantiveram calendário original
Racha no agro
A entidade foi apontada por três fontes do agronegócio ouvidas pela reportagem como líder de um grupo pequeno que tem defendido a extensão do calendário de plantio da soja e pressionado o Ministério da Agricultura a autorizar a prática mesmo com a recomendação contrária dada por seu órgão técnico, a Embrapa. Procurada, a Aprosoja informou por meio de sua assessoria de imprensa que não comenta sobre o tema.
Um deles é o empresário Carlos Ernesto Augustin, vice-presidente da Associação dos Produtores de Sementes de Mato Grosso (Aprosmat), que se diz crítico à liberação para o plantio no início do ano pelo risco sanitário que representa. Em sua visão, uma das motivações dos produtores que têm pressionado pela medida seria aproveitar os meses de janeiro e fevereiro, mais secos, para produzir as próprias sementes (em vez de comprar de terceiros) e buscar maior lucratividade.
"A produtividade 'normal' da soja geralmente é de 60 sacas [por hectare], mas em fevereiro é menos da metade - a intenção aí é fazer semente", diz ele. "Mas pra isso querem colocar em risco a disseminação do fungo."
O empresário diz que, inicialmente, até 2014, 2015, ele mesmo tinha posição favorável à extensão do calendário de plantio. Mudou de ideia depois que a Embrapa e seu "consórcio antiferrugem" enviaram uma pesquisadora ao Estado, que, além de acompanhar de perto as lavouras, passou a se reunir com os produtores e explicar por que o vazio sanitário e o calendário era necessário.
Entre 2010 e 2014, segundo ele, a ferrugem vinha se espalhando de forma rápida no Mato Grosso. Após a normativa de 2015 que instituiu as mudanças, a produtividade da lavoura cresceu significativamente, diz Augustin.
O ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues também mencionou a questão das sementes. "É uma discussão difícil. Mas eu sou engenheiro agrônomo, então rezo a cartilha acadêmica, técnica, embora seja produtor rural e conheça os interesses dos produtores", diz ele, que é coordenador do Núcleo de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas (FGV Agro).
Para Christian Lohbauer, presidente da Croplife, que reúne instituições e empresas que atuam na pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de germoplasma, biotecnologia e defensivos químicos, apesar das possíveis motivações dos produtores, o ponto central da discussão não está nas sementes, mas na resistência dos fungos e na efetividade dos fungicidas.
"Uma dezena de instituições técnicas, além da Embrapa, já alertaram que é preciso ter um vazio sanitário, dois, três meses livre de soja, para que o fungo fique impedido de se proliferar. A indústria [de defensivos] está afirmando que não há produtos novos nopipeline [para combater o fungo caso ele se torne mais agressivo], diz.
"Combater a ferrugem é um trabalho difícil, caro e necessita de novas tecnologias - precisamos dar vida longa aos produtos que a gente tem. Uma minoria barulhenta acha que não tem perigo, mas quem vai pagar por isso no final é a agricultura brasileira", completa.
"Nós temos que obedecer as regras sanitárias que foram estabelecidas pela ciência", faz coro Eduardo Daher, diretor-executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), uma das entidades signatárias de uma carta enviada à ministra da Agricultura, Tereza Cristina, em setembro do ano passado pedindo a revogação da liberação.
"Eu fico tão nervoso com desrespeito às portarias do vazio sanitário… é como encontrar alguém que fala que não vai se vacinar, o raciocínio é o mesmo", diz ele.
O presidente da Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Ricardo Arioli, por sua vez, afirma que a entidade vem "discutindo com especialistas no assunto há muito tempo" e diz que seu posicionamento é o mesmo da Embrapa.
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Caso foi parar no STF
Autorização do ministério à revelia da Embrapa
Um indicativo de que a medida é defendida por uma minoria e fruto de pressão política interna, na visão de Augustin e Lohbauer, seria o fato de que, mesmo com a autorização do Ministério da Agricultura, Estados do Centro-Oeste como Mato Grosso do Sul e Goiás mantiveram o calendário até 31 de dezembro.
"O ministério, que deveria ser entidade que arbitra, sempre disse que não podia [estender o calendário], até esta vez. E jogou para as secretarias de Estado, falou que elas é que decidiriam. E aí elas foram decidindo - Mato Grosso de Sul, Goiás, Paraná disseram que não podia, Mato Grosso disse que sim. É uma questão política", opina Lohbauer.
Segundo ele, esse tipo de arranjo é problemático porque as pragas não conhecem ou respeitam as fronteiras entre os Estados. Caso haja descontrole da reprodução da ferrugem por conta da extensão do calendário, o problema pode se alastrar geograficamente e atingir os Estados que estão respeitando a recomendação dos cientistas.
O ministério não respondeu o pedido de posicionamento feito pela reportagem.
A Embrapa não tem comentado publicamente sobre o assunto. Ao pedido de entrevista, sua assessoria de imprensa enviou o último "esclarecimento oficial", de setembro de 2021. O posicionamento assertivo da empresa, contudo, foi reiterado por seu presidente, Celso Moretti, em outubro do ano passado em uma audiência no Senado. Questionado por um parlamentar sobre sua opinião, ele afirmou: "A posição da Embrapa é sempre balizada pela ciência. Podem não gostar, mas a ciência é nossa baliza".
Sem resolução da contenda, em dezembro o PSB entrou com uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) contra as portarias do Ministério da Agricultura. O texto da peça, além de expor as questões relacionadas à possível resistência da praga aos fungicidas, destacou que o uso intensivo de agrotóxicos também é um problema, já que pode prejudicar o solo e o meio ambiente de forma geral.
À BBC News Brasil, a Aprosoja afirmou não se manifestar sobre o assunto e pediu que a reportagem entrasse em contato com Erlei Melo Reis, pesquisador da Fundação Rio Verde e coautor de umestudo que vem sendo usado pela entidade para defender a extensão do calendário de cultivo.
O agrônomo afirmou que o foco do estudo conduzido por ele e outros três pesquisadores foi "comprovar" que a semeadura em fevereiro é atingida de forma menos intensa pela ferrugem do que em dezembro. Assim, o cultivo demandaria menos fungicidas, o que seria "bom para o meio ambiente e bom para o produtor".
As entidades que têm se colocado contra a extensão argumentam que a pesquisa não avalia a questão da seleção natural de formas mais resistentes do fungo com o período maior de plantio, tida como ponto central da preocupação dos que são críticos à medida.
O pesquisador, por sua vez, afirma que a medida que estabeleceu o calendário em 2015 foi tomada "com pouca base científica" e que organizações como a Embrapa não têm uma pesquisa que comprove o risco do plantio em fevereiro.
Reis disse ainda ter se reunido com a ministra Tereza Cristina em dezembro para apresentar, junto aos demais coautores, os resultados da pesquisa. O encontro, realizado no dia 7 de dezembro, está identificado na agenda da ministra como "Audiência com a Aprosoja/MT".