terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Apartheid, na pratica (Little Rock, Arkansas, 1959)

Deve ser terrível viver numa sociedade segregada racialmente.
Que bom seria se o Brasil JAMAIS criasse distinções baseadas em "raças", ou na cor da pele.
Infelizmente, sou obrigado a constatar que os novos "racialistas" se empenham ativamente em dividir o Brasil em negros (incluindo aí abusivamente os mestiços) e não-negros, que aliás são minoria, segundo a PNAD...
Paulo Roberto de Almeida

Calendário Histórico
1957: Os Nove de Little Rock
Rachel Gessat
Deutsche Welle, 24.09.2010

Em 24 de setembro de 1957, o presidente Dwight Eisenhower envia tropas militares a Little Rock, capital do Arkansas, para escoltar nove escolares negros que deveriam frequentar uma escola de brancos.

Final da década de 50 nos Estados Unidos: com base numa sentença da Corte Suprema, todas as escolas do país foram conclamadas a eliminar as restrições raciais. Também em Little Rock, capital do estado de Arkansas, as autoridades escolares começaram a preparar um plano de integração.

Chegou-se a um consenso: seriam mantidos os colégios exclusivos dos negros, mas alguns escolares negros teriam permissão para frequentar os colégios dos brancos. Foram escolhidos nove candidatos negros, seis moças e três rapazes, que deveriam frequentar a Central High School no ano letivo que se iniciava, juntamente com 1.900 escolares brancos.

Resistência aberta
Para muitos, no sul dos EUA, era inaceitável a eliminação da segregação racial nas escolas. Um dos principais adversários da integração era o governador de Arkansas, Orval E. Faubus. Ele conclamou abertamente à resistência e ordenou às tropas da Guarda Nacional de Arkansas que cercassem a escola.

No dia 3 de setembro de 1957, os escolares negros tentaram, pela primeira vez, entrar no colégio. Foram impedidos pelos soldados, os quais receberam aplausos frenéticos da turba de brancos, reunida diante do prédio da escola. No dia 4 de setembro, Elisabeth Eckford, uma das escolares negras, quase foi linchada pela multidão. Os soldados presenciaram o incidente sem intervir.

Mas logo a imprensa americana divulgou os acontecimentos e as autoridades federais ficaram cientes do conflito. Uma sentença judicial obrigou o governador de Arkansas a retirar, finalmente, as tropas da escola. No dia 23 de setembro de 1957, os escolares negros tentaram mais uma vez assistir às aulas.

O New York Times informou sobre os acontecimentos do dia da seguinte maneira: "Uma turba de manifestantes em pé de guerra, aos berros e histéricos, obrigou hoje nove escolares negros a deixarem a Central High School. Apesar da presença de um grande número de policiais locais e estatais para proteger os negros contra ataques, essas forças policiais acabaram desistindo em face da fúria de cerca de mil manifestantes brancos e, por volta do meio-dia, ordenaram aos alunos negros que deixassem a escola. A tentativa de integração durou 13 minutos. Os negros foram escoltados pela polícia através da turba e levados para as suas casas, sem serem feridos".

A posição de Eisenhower
No entanto, diversos repórteres, especialmente os negros, foram atacados e espancados pela multidão. Na noite de 23 de setembro, o presidente Dwight Eisenhower fez um pronunciamento pela televisão, dirigindo-se ao povo americano: "Como se sabe, a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu que são inconstitucionais as leis sobre a segregação racial nas escolas. Nossa opinião pessoal quanto à decisão não desempenha qualquer papel na imposição do cumprimento da lei. A base dos nossos direitos e liberdades individuais é assentada na garantia de que o presidente e o Poder Executivo apóiam e impõem as decisões da Corte Suprema. Se necessário, com todos os recursos à disposição do presidente".

O discurso do presidente deixou duas coisas claras. Em primeiro lugar, Eisenhower não era exatamente um paladino do movimento em prol dos direitos civis dos negros. A sua argumentação foi mantida quase exclusivamente no nível formal. Mas também ficou muito claro que o presidente estava decidido a acabar com a resistência em Little Rock. O conflito em torno dos nove escolares negros transformara-se também numa luta de poder entre as autoridades estaduais e federais.

Primeiro dia de aula "normal"
Como a situação em Little Rock continuasse inalterada, Eisenhower pôs todas as unidades policiais e militares de Arkansas sob o comando federal, no dia 24 de setembro. Além disso, enviou mil homens da 101ª divisão, uma tropa federal regular, para Little Rock. Os soldados postaram-se diante da escola e dissolveram imediatamente toda tentativa de agrupamento de manifestantes. Cada um dos nove escolares recebeu um guarda-costas, que o acompanhou à sala de aulas, montando guarda à porta, todo o tempo.

Com tal proteção, os nove escolares negros puderam a 25 de setembro de 1957 frequentar, pela primeira vez, um dia inteiro de aulas no seu novo colégio. Mas os nove adolescentes tiveram de enfrentar, sem qualquer amparo, as provocações verbais, sociais e, em parte, físicas dos seus colegas brancos.

Aos leitores deste blog: conversa tete-a-tete (ou blog-au-blog)...

Aos leitores deste blog Diplomatizzando
Paulo Roberto de Almeida

Tendo ultrapassado a marca de 200 seguidores, conforme constato por uma simples consulta ao rodapé desta página, este blog “obriga” seu responsável a efetuar pequena reflexão sobre suas responsabilidades enquanto “escrevinhador” voluntário, enquanto disseminador de materiais de terceiros (informações de imprensa, estudos e ensaios ocasionais) e enquanto veiculador e debatedor de “ideias”, como indicado na caixa de apresentação, com especial ênfase nos temas que motivaram sua criação e que estão simbolizados em seu título: relações internacionais e política externa do Brasil. Aqui seguem, portanto, estas minhas reflexões, no que talvez possa vir a constituir uma série de cartas mensais de interação entre este autor e seus leitores.
Entendo que muitos dos que aqui se inscreveram, o fizeram com objetivos e por motivos eminentemente práticos, sabedores da condição profissional de seu responsável e unicamente interessados, portanto, em materiais relevantes vinculados à sua preparação para a carreira diplomática. Outros, que nele esbarraram por acaso, podem ter ficado apenas curiosos, e resolveram então testar o blog, para ver o que ele poderia trazer de novo ou de interessante em função de suas preocupações específicas ou de seus objetos de pesquisa acadêmica. Muitos já podem ter desistindo de acessar o blog, ou descartam alertas eventuais que entram em suas caixas ou “assembladores” de notícias; não tenho ideia do que pode estar ocorrendo com os 200 e tantos alinhados no bloco dos seguidores. Sei apenas que eles existem.
Por não dispor de instrumentos adequados, e tampouco dispor de tempo para esse tipo de verificação, não tenho condições de afirmar se estou satisfazendo, ou não, a gregos e goianos, ou seja, a todos aqueles que resolveram seguir regularmente os posts aqui colocados (além daqueles que podem passar ocasionalmente). Apenas sei dizer que, tendo alcançado a marca de quase 120 mil visitas desde o início deste ano, quando resolvi colocar o sitemeter que figura na banda direita, isso representa aproximadamente 630 visitas por dia e mais de 4 mil por semana, o que é, sem dúvida, uma tremenda responsabilidade para quem assina os comentários e textos pessoais aqui postados. Provavelmente, mais de 80% dos materiais aqui constantes são feitos de empréstimos involuntários a terceiros autores, ou a despachos de agências de comunicações, o que talvez conforma um simples serviço público de compilação de materiais diversos. Algo é meu, no entanto, os comentários iniciais colocados em quase todos os posts, e alguns textos para leitura mais pausada, por representarem produção acadêmica ou de cunho jornalístico.

Quaisquer que seja os motivos dos freqüentadores aqui presentes, e quaisquer que sejam os materiais aqui colocados, creio que meu dever, para com todos, a começar para comigo mesmo, seria estabelecer claramente o seguinte conjunto de compromissos.
Meu único critério de produção – ou seja, de leitura, resumo, compilação, síntese e produção original de textos – é o esclarecimento inteligente a respeito de questões relevantes, brasileiras e internacionais.
Meu único critério de seleção – dos materiais e do que eu mesmo possa escrever, como elaboração original – é a discussão honesta e bem informada dessas realidades, sem quaisquer compromissos partidários, políticos, ideológicos, religiosos ou de natureza associativa. Entre a tela, ou o teclado, e o meu cérebro, ou o meu pensamento, está apenas uma única pessoa e uma única vontade: ler um pouco de tudo, refletir sobre o que foi lido, tentar sintetizar esse conjunto de informações e de ideias, e depois devolver à “sociedade” aquilo que dela retirei como inputs e ensinamentos, da maneira mais aberta, transparente e honesta possível.
Não pretendo converter a ninguém, e não envio textos não solicitados a ninguém: apenas exponho o que penso sobre as questões que me interessam. Assumo plena responsabilidade pelo que escrevo e declaro ser imputável pelas minhas ideias e posições, mesmo as mais erradas, equivocadas ou aparentemente chocantes.
Meu único critério de interação é de haver um debate inteligente sobre temas relevantes, descartando o anedótico, o superficial e o apenas formal, ou circunstancial. Não me recuso a publicar posições contrarias às minhas, desde que incidam sobre o objeto em discussão, e não constituam mera expressão de discordância descortês, ou seja, ataques sem qualquer argumento substantivo.
Gostaria de agradecer a confiança de todos e dizer que estou ciente de minha responsabilidade em manter o nível deste blog, ao cumprir os objetivos que são os dele: informar, refletir, debater, contribuir para o avanço do Brasil na construção de uma sociedade melhor, mais educada e, por que não dizer?, mais refinada.

Paulo Roberto de Almeida (Shanghai, 28.09.2010)

Vivendo e aprendendo: um pouco de cultura inutil...

Poderia ser também: pausa para o besteirol, mas não é.
Creio que pouca gente conhece a origem da palavra shit, embora muitos usam o famoso bullshit.
Enfim, certos serviços burocráticos, pela linguagem usada, têm a peculiaridade de produzir muito bullshit, mas não estou denunciando ninguém. Apenas trazendo um pouco de cultura geral para deleite dos curiosos e sedentos de saber...
Paulo Roberto de Almeida

Living and learning

Manure... An interesting fact
Manure : In the 16th and 17th centuries, everything had to be transported by ship and it was also before the invention of commercial fertilizers, so large shipments of manure were quite common.

It was shipped dry, because in dry form it weighed a lot less than when wet, but once water (at sea) hit it, not only did it become heavier, but the process of fermentation began again, of which a by product is methane gas of course. As the stuff was stored below decks in bundles you can see what could (and did) happen.
Methane began to build up below decks and the first time someone came below at night with a lantern, BOOOOM!

Several ships were destroyed in this manner before it was determined just what was happening.
After that, the bundles of manure were always stamped with the instruction 'Stow high in transit' on them, which meant for the sailors to stow it high enough off the lower decks so that any water that came into the hold would not touch this volatile cargo and start the production of methane.

Thus evolved the term 'S.H.I.T' , (Stow High In Transit) which has come down through the centuries and is in use to this very day.
You probably did not know the true history of this word.
Neither did I.
I had always thought it was a golf term.

A frase da semana, do ano, da historia do socialismo...

Temos que apagar para sempre a noção de que Cuba é o único país do mundo em que se pode viver sem trabalhar.

Raul Castro, presidente de Cuba, em discurso na Assembléia Nacional de Cuba
(setembro 2010)

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Um premio Nobel tambem pode ser desonesto intelectualmente

Eu comecei a ler Paul Krugman pelos seus livros de economia, e o achava um economista razoável, mesmo inventivo.
Logo em seguida ele começou a escrever para o New York Times, em algum momento do final dos anos 1990. Achei seus artigos mais políticos do que econômicos, mas ainda assim continuei a ler.
Desde o começo da era Bush -- que, reconheçamos, não é exatamente uma sumidade em economia -- passei a constatar que os artigos de Krugman no NYT eram inacreditavelmente politizados para um economista digno desse nome.
Ele nunca retrocedeu, mesmo depois de ter ganho o prêmio Nobel.
Seus artigos mais recentes são inacreditavelmente desonestos, no plano intelectual.
Não sou o único a achar isso, como prova este blogueiro e um ex-economista chefe do FMI.

Krugman criticism from Rajan
Super-Economy
Kurdish-Swedish perspectives on the American Economy
September 20, 2010

Paul Krugman is very smart, tremendously well-informed and a skilled writer. But he lacks wisdom, judgment and character. Thus he has become not only partisan, but also exceptionally dishonest as a debater.

There is a professional ethic among economists to be intellectually honest in debates. Krugman keeps violating this rule, with articles heavy on ad-hominem personal attacks, straw-man misrepresentations of the claims of his opponent, a refusal to ever admit that he is wrong, and ignoring fact and logic whenever it suits him just to appear stronger in the debate.

Everything is about maximizing the short run argument in favor of the policies that Krugman favors, rather than finding out the truth, which is what economists are supposedly supposed to do.

For example Krugman pretends that European policies do not harm economic performance by looking at growth rates, despite the fact that he knows perfectly well that established economic theory predicts that the costs of policies that dampen economic activity appear as different levels of output, not growth paths.

Krugman's audience are unsophisticated non-trained economists, which makes all his violations of the academic rule of conduct worse.

When the policies pushed by Krugman did worse than he promised, he does not update his views. He just becomes even louder, claiming that the lack of success of Krugmaonomics just proves we need more of the exact same Krugman-style economics.

Imagine Krugman's reaction if the Bush administration people argued that the failure of their foreign policy and economic policy just proves we need more of the exact same recipe.

One of Krugman's dubious and partisan claims is that government policies to increase home ownership among poor americans and minorities had nothing to do with the sub prime-mortgage bubble. Here star Raghuram Rajan, a University of Chicago professor takes Krugman to task. Read it carefully.

If I understand the history involved correctly, the government sponsored enterprises that we have all come to know and love in the last few years invented sub-prime mortgage backed securities (MBS), which gives them a part of the blame of the crisis even if they had done nothing after this (which they did).

So, go read it all. It´s good for you.

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Transcrevo apenas o início e o final do artigo de Rajan.
Leiam a integralidade neste link.

Reviewing Krugman
Fault Lines Official Blog, September 16

Paul Krugman and Robin Wells caricature my recent book Fault Lines[i] in an article in the New York Review of Books.[ii] The article, and their criticism, however, do have a lot to say about Krugman’s policy views (for simplicity, I will say “Krugman” and “he” instead of “Krugman and Wells” and “they”) which I have disagreed with in the past. Rather than focus on the innuendo about my motives and beliefs in the review, let me focus on differences of substance. I will return to why I believe Krugman writes the way he does only at the end.

First, Krugman starts with a diatribe on why so many economists are “asking how we got into this mess rather than telling us how to get out of it.” Krugman apparently believes that his standard response of more stimulus applies regardless of the reasons why we are in the economic downturn. Yet it is precisely because I think the policy response to the last crisis contributed to getting us into this one that it is worthwhile examining how we got into this mess, and to resist the unreflective policies that Krugman advocates.
(...)
There is also a matter of detail suggesting why we cannot only blame the foreigners. The housing bubble, as Monika Piazzesi and Martin Schneider of Stanford University have argued, was focused in the lower income segments of the market, unlike in the typical U.S. housing boom. Why did foreign money gravitate to the low income segment of the housing market? Why did past episodes when the U.S. ran large current account deficits not result in similar housing booms and busts? Could the explanation lie in U.S. policies?

My book suggests that many – bankers, regulators, governments, households, and economists among others – share the blame for the crisis. Because there are so many, the blame game is not useful. Let us try and understand what happened in order to avoid repeating it. I detail the hard choices we face in the book. While it is important to alleviate the miserable conditions of the long-term unemployed today, we also need to offer them incentives and a pathway to building the skills that are required by the jobs that are being created. Simplistic mantras like “more stimulus” are the surest way to detract us from policies that generate sustainable growth.

Finally, a note on method. Perhaps Krugman believes that by labeling other economists as politically extreme, he can undercut their credibility. In criticizing my argument that politicians pushed easy housing credit in the years leading up to the crisis, he writes, “Although Rajan is careful not to name names and attributes the blame to generic “politicians,” it is clear that Democrats are largely to blame in his worldview.” Yet if he read the book carefully, he would have seen that I do name names, arguing both President Clinton with his “Affordable Housing Mandate” (see Fault Lines, page 35) as well as President Bush with his attempt to foster an “Ownership Society” (see Fault Lines, page 37) pushed very hard to expand housing credit to the less-well-off. Indeed, I do not fault the intent of that policy, only the unintended consequences of its execution. My criticism is bipartisan throughout the book, including on the fiscal policies followed by successive administrations. Errors of this kind by an economist of Krugman’s stature are disappointing.

Jorge Castaneda sobre a politica externa do Brasil (2): reservas

Necessidade de uma política externa madura
JORGE G. CASTAÑEDA
O Estado de S.Paulo, 26 de setembro de 2010

Solidariedade descuidada limita influência global do Brasil

O primeiro turno das eleições presidenciais do Brasil, no dia 3, pode se revelar o único. Isso porque a sucessora escolhida a dedo pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, está muito perto de conquistar uma maioria absoluta dos votos.

O principal adversário de Dilma, o governador do Estado de São Paulo, José Serra, não ganhou tração junto ao eleitorado por causa de suas posições inconstantes - que variam de críticas ásperas à política externa de Lula ao total apoio a suas políticas sociais. Segundo algumas sondagens de opinião, Serra está mais de 20 pontos atrás.

Lula deixa o cargo com uma popularidade espantosa para um presidente latino-americano em segundo mandato. A economia está crescendo a uma taxa de dois dígitos, e a Copa do Mundo de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 estão no horizonte.

Sob o comando de Lula, milhões de brasileiros saíram da pobreza, e a classe média tornou-se uma maioria - não obstante pequena. O Brasil adquiriu uma estatura internacional digna de seu tamanho e sucesso, embora, talvez, não de sua ambição. Sua democracia é próspera e vibrante, mas nem sempre efetiva ou livre de corrupção.

Mas, há motivos para algum ceticismo sobre o legado de Lula, e o fato de eles raramente serem mencionados não diminui o seu significado.

Primeiro, o crescimento econômico continua tendo como base, fundamentalmente, o consumo doméstico e a exportação de commodities. Não há nada de errado nisso desde que eles sejam sustentáveis no médio prazo e viáveis no longo prazo.

O problema é que a taxa de investimento total do Brasil permanece em torno de 16% do Produto Interno Bruto (PIB), bem abaixo do México ou da média da América Latina, para não mencionar a China (40%). Com essa taxa, a infraestrutura e a competitividade do País inevitavelmente declinarão.

A solução de Dilma é o investimento estatal em massa, financiado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em setores econômicos-chave (petróleo, carne processada, construção). Mas essa estratégia mais provavelmente reforçará a corrupção, que tem sido um apêndice da política brasileira há décadas - e melhorou pouco sob Lula.

Uma segunda questão é o muito alardeado programa Bolsa Família, que começou com o antecessor de Lula como Bolsa Escola, e foi idealizado originalmente pelo economista Santiago Levy no governo do presidente mexicano Ernesto Zedillo. Essas "transferências condicionais de dinheiro" tinham a intenção inicial de barrar a pobreza intergeracional, ajudando a assegurar que as crianças fossem corretamente alimentadas, escolarizadas e mantidas saudáveis. Mas, com Lula (e com Vicente Fox e Felipe Calderón no México, aliás) elas viraram um programa antipobreza direto, voltado para a atual geração de pobres.

Ninguém questiona a generosidade dessa mutação, mas não está nada claro que os quase 15 milhões de famílias que recebem o Bolsa Família conservarão seu nível de renda atual quando o benefício desaparecer, ou que ele possa ser sustentado indefinidamente. O Bolsa Família tem sido um espantoso sucesso eleitoral e, certamente, aumentou o consumo na base da pirâmide no Brasil. No entanto, persistem dúvidas sobre o que o programa pode conseguir no longo prazo para erradicar a pobreza.

Terceiro, as origens e a retórica de militante de esquerda de Dilma alimentam dúvidas sobre se ela dará prosseguimento às políticas econômicas e sociais centristas, pragmáticas, de Lula.

Preocupações. Suas credenciais democráticas são tão sólidas quanto as dele, mas há preocupações sobre seu aparente entusiasmo pela intervenção do Estado na economia - ela parece acreditar nas virtudes permanentes do estímulo fiscal keynesiano - bem como sua habilidade para controlar o Partido dos Trabalhadores, como Lula controlou.

A política externa tem sido o aspecto mais criticado do mandato de Lula, e Dilma mais provavelmente agravara as coisas.

Como adversário da ditadura militar que governou seu país anos atrás, Lula defendeu o respeito aos direitos humanos, eleições livres e limpas, e a democracia representativa. Mas deu pouca atenção a essas questões depois de assumir o cargo, depreciando preocupações sobre direitos humanos e democracia por toda a região e além, particularmente em Cuba, Venezuela e Irã.

Lula acentuou a atitude brasileira tradicional de não se imiscuir em assuntos cubanos, ao ponto de viajar a Havana pouco depois que um dissidente em greve de fome morreu na prisão naquele país. Quando lhe perguntaram o que ele achava, Lula praticamente culpou o grevista pela própria morte.

Ele também recebeu o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad em Brasília e São Paulo quase como um herói meros três meses após Ahmadinejad ter vencido de maneira fraudulenta a eleição presidencial no Irã em 2009, o que resultou numa onda de repressão violenta. E, um ano depois da eleição, Lula viajou ao Irã.

O presidente brasileiro também fez vista grossa para a mão cada vez mais pesada de Hugo Chávez na Venezuela, jamais protestando ou questionando a prisão de adversários do líder venezuelano, suas repressões à imprensa, sindicatos e estudantes, ou a manipulação do sistema eleitoral.

Corporações brasileiras, especialmente construtoras, têm investimentos e contratos enormes na Venezuela, e Lula usou sua amizade com os irmãos Castro e Chávez para aplacar a ala esquerda de seu partido, que nunca ficou confortável com suas políticas econômicas ortodoxas.

A posição ambígua do Brasil sobre direitos humanos e democracia sob Lula caminha de mãos dadas com sua atitude ante a proliferação nuclear.

Um signatário nos anos 60 do Tratado de Tlatelolco - que baniu as armas nucleares da América Latina -, o Brasil desmantelou seu processo de enriquecimento e suas instalações de pesquisa durante os anos 90 e ratificou o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) em 1998.

Acordo com o Irã. No entanto, em maio deste ano, Lula uniu-se à Turquia na proposta de um acordo com o Irã sobre seu programa nuclear (de troca de urânio por combustível para um reator de pesquisas médicas), que Teerã aceitou nominalmente, mas o restante do mundo não.

Enquanto Brasil e Turquia afirmavam que o acordo fora aceito pelos Estados Unidos e a Europa, Washington pediu - e obtive com o apoio de países europeus - novas e mais fortes sanções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, às quais só o Brasil e a Turquia se opuseram.

O Brasil está no limiar de um crescimento sustentável, de uma estatura internacional superior, e da consolidação de seu status de classe média. Mas, até ele desenvolver uma política externa madura que esteja adequada a suas aspirações econômicas - uma política externa com base numa liderança com princípios, e não numa solidariedade descuidada ao Terceiro Mundo - sua influência global será limitada.

TRADUÇÃO DE CELSO M. PACIORNIK
É EX-CHANCELER DO MÉXICO (2000-2003) E PROFESSOR DE POLÍTICA E ESTUDOS LATINO-AMERICANOS NA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK

Politica externa do Brasil: reescrevendo a historia (para tras...)

Só pode ser para trás, para justificar o que veio depois.
"Para o ministro [Celso Amorim], o principal legado do governo do PT no Itamaraty é a "afirmação de uma política externa independente, não-subserviente"."
Então ficamos assim: até o final de 2002, o Itamaraty era composto de dependentes e subservientes. Tivemos de esperar 2003, para inaugurar a era da independência.
Isso inclui todos os que trabalhavam lá antes, se supõe...
Paulo Roberto de Almeida

Amorim: fracassos não atrapalham novo papel na política externa
Eduardo Graça - de Nova York
Portal Terra, 20 de setembro de 2010

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou nesta segunda-feira, em Nova York, nos Estados Unidos, que os "fracassos" da política externa brasileira não "atrapalharam" o novo papel do Brasil no mundo. "A lista de fracassos da política externa brasileira no governo Lula é imensa. Mas todos, inclusive nossos críticos mais virulentos, reconhecem que o Brasil tem hoje um novo papel no mundo. Pode até não ser por conta da política externa, mas ela não atrapalhou", afirmou.

Em maio, Brasil e Turquia fecharam um acordo com o Irã para a troca de urânio pouco enriquecido por combustível nuclear, mas o Conselho de Segurança da ONU, três semanas depois, aprovou novas sanções contra o país. O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, rejeita suspender o enriquecimento de urânio, material de uso militar e civil. A comunidade internacional não aprova o programa nuclear iraniano porque teme que o país tente fabricar armas nucleares.

"Criticavam nossa ênfase em relação aos países em desenvolvimento e à África. Hoje, leio nos EUA artigos dizendo que a África, em conjunto, tem um PIB equivalente ao de um Bric (g'rupo formado por Brasil, Rússia, Índia e China), a importância é clara. Quem sabe agora a imprensa brasileira não valoriza nossa aproximação estratégica com a África?", disse Amorim, em entrevista coletiva após reunião da Comissão Interina para a Recuperação do Haiti, com a presença da secretária de Estado americana, Hillary Clinton. Para o ministro, o principal legado do governo do PT no Itamaraty é a "afirmação de uma política externa independente, não-subserviente".

Segundo o chanceler, houve uma ênfase no incremento do processo de integração com os países latino-americanos, incluindo um aumento de comércio gigantesco com os países andinos. "Hoje, 47% da exportação manufatureira do Brasil vai para a região, um aumento de mais de 300% desde o início do governo Lula. Mas o maior ganho, para nós, é a paz na região, a manutenção da estabilidade democrática", disse.

Na quinta-feira, Amorim fará um balanço dos oito anos de política externa do governo Lula na abertura da Assembleia-Geral da ONU. O ministro também se reúne esta semana com os representantes dos membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), onde enfatizará a necessidade de se ajudar o Guiné-Bissau. "Não apoiamos nenhuma solução punitiva. O Brasil pode ajudar na reforma militar necessária em Bissau, mas precisamos do apoio financeiro da Comunidade Europeia. É preciso garantir um sistema de pensões, com a aposentadoria de oficiais, para que os militares se afastem da vida política de Bissau. Repito: uma atitude de isolamento político será infrutífera em relação a Bissau", afirmou.

Reforma no Conselho de Segurança
Na pauta de encontros do chanceler brasileiro estão conversas com lideranças compromissadas com a reforma do Conselho de Segurança da ONU, uma das grandes ambições da política externa do governo Lula. "A reforma é um processo. O que queremos agora é evitar um retrocesso. Há resistência tanto de membros do atual Conselho quanto de outros países que não concordam com o aumento de vagas. Mas não se pode manter uma estrutura que reflete a geopolítica de um mundo que existia há 65 anos. A credibilidade do Conselho de Segurança é maculada quando o órgão não representa mais a realidade internacional", disse. Na sexta-feira, o ministro se reúne com os chanceleres do G-4, que conta ainda com Alemanha, Índia e Japão, outros três países interessados em vagas permanentes no Conselho de Segurança da ONU.

"Um episódio que reflete como a defesa de um aumento das vagas não-permanentes não resolveria a reforma do Conselho de Segurança foi o das sanções contra o Irã. Eu soube da resolução por uma agência de notícias, enquanto os países do Conselho diziam que queriam nossa ajuda e da Turquia. É uma atitude desrespeitosa", afirmou.

Amorim também disse não "haver necessidade de explicação para a ausência do presidente Lula à Assembleia deste ano". "Não se trata de uma cúpula, e ele veio em todos os outros anos, sendo que em 2005 participou apenas das primeiras atividades. Com o calendário político brasileiro, é bastante natural a ausência do presidente. Sua presença no Brasil, agora, é muito importante", disse.

Recursos para o Haiti
O ministro disse ainda que, durante a reunião sobre o Haiti, a secretária Clinton parabenizou a liderança brasileira nos esforços de recuperação do país, devastado por um terremoto há pouco mais de nove meses. "Somos um dos poucos países que enviaram 100% dos recursos prometidos para o Haiti. Dos US$ 55 milhões, 15 já foram utilizados e gostaríamos que os 40 restantes fossem para o projeto da Barragem de Artibinite, que levará energia elétrica para mais de 1 milhão de haitianos. Obviamente, serão necessários mais recursos para finalizar a obra, quem sabe vindos do Canadá e dos EUA. Mas é fundamental enfatizar que a barragem foi um pedido de Porto Príncipe. O Haiti é um país soberano e não uma coleção de projetos", disse Amorim. Dos EUA, o ministro segue para a capital haitiana onde entregará o projeto da barragem especialmente ao presidente René Préval.

Amorim chegou a Nova York no domingo, vindo de Cuba, onde tratou de temas diversos, como a experiência do Brasil no fortalecimento de pequenas e médias empresas, fundamental para as novas diretrizes econômicas do governo Raúl Castro. "Foi um a atitude corajosa a de colocar 500 mil pessoas, 12% da força produtiva fora do serviço público. Mas não vou tratar de temas específicos aqui, como a questão dos dissidentes. Manifestei nosso agrado em relação à liberação recente de presos políticos. Temos um bom diálogo com o governo cubano, somos respeitados justamente por não enfatizarmos reações estridentes que não levam a nada", disse.

Comentários: 285 (21h45)

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Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...