quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

A guerra de Lula - Editorial Estadão

 A guerra de Lula

Estadão.com.br, 21 de fevereiro de 2024

O presidente Lula da Silva parece ter declarado guerra ao Ocidente. Uma guerra imaginária, claro, mas nesse delírio o petista pretende posicionar o Brasil na vanguarda da luta contra tudo o que simboliza os valores ocidentais - tendo como companheiros de armas um punhado de notórias ditaduras, como China, Rússia, Irã e Venezuela.

A irresponsável declaração de Lula sobre Israel, comparando a campanha israelense contra os terroristas do Hamas ao Holocausto, está perfeitamente alinhada a esse empreendimento ideológico. Não foi, portanto, fortuita nem acidental.

Lula parece empenhado em usar seu terceiro mandato para lançar-se como líder político do tal "Sul Global", uma espécie de aggiornamento do "Terceiro Mundo" dos tempos da guerra fria. Nessa nova ordem, as características distintivas do Ocidente - democracia, economia de mercado e globalização - são confrontadas por regimes autocráticos que buscam reviver o modelo que põe o Estado e a soberania nacional em primeiro lugar, à custa das liberdades individuais, direitos humanos e valores universais, denunciados como armas retóricas das democracias liberais para perpetuar sua supremacia.

No confronto Ocidente-Oriente, a geopolítica e a segurança nacional prevalecem sobre a economia e a globalização. A geopolítica multilateral do pós-guerra se fragmenta em arranjos insuficientes para as necessidades de cooperação ante desafios globais, como mudanças climáticas, pandemias, terrorismo e guerras.

O Brasil não está imune a essas incertezas, mas, comparativamente, tem vantagens. Suas dimensões, sua democracia multiétnica e pacífica e sua economia relativamente industrializada e diversificada o tornam uma potência regional. Seus recursos o colocam numa posição-chave para equacionar o tripé do desenvolvimento sustentável global: segurança alimentar, energética e ambiental.

Nessas águas turvas e tumultuosas, sem grandes instrumentos de poder, o País precisa, para defender interesses nacionais e promover os globais, de sutileza, inteligência e credibilidade. Felizmente, conta com uma tradição diplomática consagrada nos princípios constitucionais do respeito aos direitos humanos, à democracia e à ordem baseada em regras, e corporificada nos quadros técnicos do Itamaraty.

Mas esse capital está sendo dilapidado pela diplomacia sectária do presidente Lula da Silva. Lula já disse que a democracia é relativa. Mas sua política externa é definida por um princípio absoluto: a hostilidade ao Ocidente (o "Norte", os "ricos") e o alinhamento automático a tudo o que lhe é antagônico.

Sua passagem pela África foi um microcosmo desse estado de coisas. Interesses econômicos foram tratados de forma ligeira. Em entrevista, ele se evadiu de cobrar a Rússia e a Venezuela por sua truculência autocrática, ao mesmo tempo que insultou judeus de todo o mundo ao atribuir a Israel práticas comparáveis às dos nazistas.

Seja em conflitos onde o País teria força e autoridade para atuar, como os da América Latina, seja naqueles nos quais não tem força, Lula se alinha ao que há de mais retrógrado e autoritário. Abrindo mão de sua neutralidade, o País se desqualifica como potencial mediador. O Brasil poderia promover seus interesses econômicos e pontos de cooperação com a Eurásia sem prejuízo da defesa de valores civilizacionais comuns ao Ocidente. Mas Lula sacrifica os últimos sem nenhum ganho em relação aos primeiros. Em sua ânsia de se autopromover como líder global dos "pobres" contra os "ricos", reduziu a máquina do Itamaraty a linha auxiliar de sua ideologia maniqueísta e seu voluntarismo narcisista.

A "frente ampla democrática" propagandeada na campanha eleitoral deveria ter sido projetada para as relações internacionais. Mas também aqui ela se mostrou uma fantasia eivada de sectarismo ideológico - arrastando consigo o Brasil, obliterando suas oportunidades de integração econômica e prejudicando possibilidades de cooperação pela promoção da paz, da democracia, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais que a Constituição traçou como norte da diplomacia nacional.

Morre Mauro Boianovsky, professor de economia da UnB - Pedro Sales (Congresso em Foco)

 Enorme perda. Tenho dezenas de trabalhos dele em meu computador.

Morre Mauro Boianovsky, professor de economia da UnB

Pedro Sales

Congresso em Foco, 21/02/2024

https://congressoemfoco.uol.com.br/area/pais/morre-mauro-boianovsky-professor-de-economia-da-unb/?utm_source=pushnews&utm_medium=pushnotification

O professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Mauro Boianovsky morreu na manhã desta quarta-feira (21), aos 64 anos, em decorrência de câncer. Referência no campo de História do Pensamento Econômico, foi considerado um dos pesquisadores mais influentes do mundo, conforme lista elaborada pela Universidade de Stanford e pelo repositório de dados Elsevier em 2023.

Formado em Economia pela UnB, em 1979, Mauro fez mestrado na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro e doutorado em Cambridge, na Inglaterra. Era professor titular na Universidade de Brasília, onde lecionava Teoria do Desenvolvimento Econômico, na graduação, e História do Pensamento Econômico na pós-graduação.

Com a morte de Mauro, o Brasil perde duas referências da área da economia no mesmo dia. Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central, também morreu nesta quarta-feira.


Imigração italiana ao Brasil: 150 anos - Gabriel Rodrigues

Imigração italiana ao Brasil: 150 anos  


Há 150 anos, imigração italiana foi pioneira e transformou o Brasil 

Cultura e economia brasileiras foram impactadas pela chegada dos imigrantes, que atravessaram o oceano em busca de uma vida melhor 

Grupo de italianos as vésperas de embarque para o Brasil (Museu da Imigração/Reprodução) 

Por Gabriel Rodrigues 

O Tempo, 21 de fevereiro de 2024 | 03h00 


(Fotos disponíveis no URL original do artigo, abaixo)


https://www.otempo.com.br/especiais/150-anos-da-imigracao-italiana-no-brasil/a-chegada-ao-brasil/ha-150-anos-imigracao-italiana-foi-pioneira-e-transformou-o-brasil-1.3331317

Uma história de 150 anos que começa com uma viagem de um mês e meio em condições precárias, nos fundos de um navio, agarrando-se à família e à esperança de um futuro do outro lado do oceano. Assim chegavam cerca de 400 italianos à costa brasileira em 21 de fevereiro de 1874, pioneiros de um movimento que atraiu 1,4 milhão de pessoas em 50 anos. A travessia, realizada no navio La Sofia, de Gênova rumo ao Espírito Santo, alterou para sempre não somente a vida de cada um desses desbravadores, mas a cultura e a economia brasileiras, que ganharam contornos italianos inegáveis desde então.

“Há um processo muito profundo nas imigrações, uma amálgama, uma mudança entre aqueles que estão no local e aqueles que chegam, caso eles se permitam se transformar”, introduz a professora de história da Universidade de Caxias do Sul (USC) Terciane Ângela Luchese. A decisão de sair de seu país, especialmente em uma época em que a travessia era tão perigosa e precária, não se explica por simples capricho dos migrantes, sublinha a pesquisadora. Foram abalos profundos nos dois países que abriram caminho para esse movimento.

A imigração italiana para o Brasil não é um deslocamento isolado, mas parte de um momento que historiadores chamam de grandes migrações internacionais do século 19, explica Luchese. Como outras nações europeias, a Itália vivia um processo de unificação tardia, com diferentes povos em conflito no território cujos limites ainda se consolidavam. Ao mesmo tempo, a Revolução Industrial e o turbilhão de um capitalismo em formação empurrava milhares de pessoas para a pobreza. “A instabilidade gera o desejo pela imigração. Outro contexto é o hábito de migrar internamente na Europa. Muitos imigrantes italianos tinham tido experiências de trabalhar temporariamente na França, na Suíça, na Inglaterra”, pontua a historiadora.

Os italianos foram pioneiros e abriram caminho para outros fluxos de migração em massa no Brasil, enfatiza o coordenador de formação do Museu do Café, Henrique Trindade. “Eles foram responsáveis por transformar o fenômeno migratório em um movimento de massa. São os italianos, de fato, a enfrentar em conjunto os primeiros grandes obstáculos das fazendas de café no interior de São Paulo, por exemplo, e que começam a se organizar para tentar melhorar de vida, a ter certa poupança para enviar aos parentes que ficaram na Itália ou para reconstruir sua vida no Brasil”, elabora. 

Deste lado do Atlântico, o Brasil vivia sua própria revolução. O tráfico de pessoas escravizadas estava proibido desde 1850, e a abolição se aproximava. Assim, o país procurava uma nova mão de obra e estimulava a vinda de imigrantes. Um dos programas de incentivo prometia terras aos italianos sob uma espécie de financiamento que se arrastava pelos anos.

“O pagamento durava 15, 25 anos. Encontramos diferentes modos de contrato e de sobrevivência”, completa Luchese. “Há um dissenso muito grande entre aquele sonho, o desejo de se tornar proprietário de terra e ter uma vida melhor, e a realidade. Havia o mito da prosperidade. Era uma terra com vegetação subtropical ou mata atlântica, sem nenhuma referência habitacional próxima, e assim muitas permaneceram por anos”.

Nesse processo, os imigrantes começavam a se perceber, eles próprios, como um grupo unido. “Muitos se enxergavam como lombardos, sicilianos, tinham muitas identidades. Quando chegam ao Brasil, começam a ser chamados de italianos”, menciona a historiadora. Se, naquela época, a identidade italiana estava sendo construída, hoje é um alicerce herdado inclusive pelos descendentes de imigrantes. A Embaixada da Itália no Brasil estima que 32 milhões de brasileiros têm descendência italiana, e são tantos os pedidos de cidadania que o Judiciário de municípios italianos já se diz sobrecarregado.

Brasil e Itália, uma afinidade de séculos

Não raro, ouve-se de brasileiros que visitam a Itália pela primeira vez que se sentem, em certa medida, em casa, rodeados por um povo tão caloroso quanto o do Brasil. Para o embaixador da Itália, Alessandro Cortese, a afinidade entre os países remonta há séculos, antes mesmo de 1874.

“Não podemos esquecer que a imigração italiana para o Brasil começou muitos anos antes. Por exemplo, a última Imperatriz do Brasil, Teresa Cristina, era italiana (napolitana), e entre os imigrantes ilustres, antes mesmo dos anos 70 do século 19, destaca-se um certo Giuseppe Garibaldi”, comenta, em referência ao chamado “herói de dois mundos”, que lutou tanto na unificação da Itália quanto foi uma peça-chave na Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul.

Para além da gastronomia, que incorporou a pizza (em uma versão abrasileirada), a lasanha e o panetone, por exemplo, a afinidade cultural do Brasil e da Itália é mais profunda, atesta o embaixador. "Não se trata apenas da partilha de uma matriz latina comum, que também deriva da considerável presença portuguesa, mas é uma influência mais refinada, que pode ser observada na busca pela beleza, na tradição artística, na poesia e na arquitetura. Basta mencionar os nomes de grandes artistas ítalo-brasileiros, como Portinari, Alfredo Volpi, Anita Malfatti e Lina Bo Bardi”, conclui.


Vandalismo diplomático (Lula-Holocausto) - Editorial Estadão

 De O Estado de São Paulo:

Vandalismo diplomático

Ao dizer que guerra de Israel contra os terroristas do Hamas equivale ao Holocausto, Lula avilta a História, a memória dos judeus assassinados pelos nazistas e os interesses do Brasil

Editorial Estadão 

Por Notas & Informações

20/02/2024 | 03h00

O presidente Lula da Silva não precisou de mais do que um punhado de frases carregadas de ranço ideológico e antissemitismo para fazer do último domingo um dia infame na história da diplomacia brasileira. Ao dizer que a guerra de Israel contra os terroristas do Hamas se assemelha ao Holocausto, Lula, a um só tempo, vandalizou a História, a memória das vítimas da indústria da morte nazista e os interesses do Brasil. Nem os mais ferozes inimigos de Israel ousaram ir tão longe nas críticas à campanha militar conduzida pelos israelenses na Faixa de Gaza – uma campanha que decerto inclui atos que podem ser classificados como crimes de guerra, mas que nada tem a ver, nem sob licença poética, com o assassinato sistemático dos judeus europeus na 2.ª Guerra.

Durante uma entrevista coletiva na Etiópia, onde esteve para a Cúpula da União Africana, Lula afirmou que “o que está acontecendo em Gaza (as mortes de civis) não existiu em nenhum outro momento histórico”, a não ser, segundo o petista, “quando Hitler resolveu matar os judeus”. Das duas, uma: ou Lula é profundamente ignorante ou está de má-fé.

A hipótese benevolente, a da ignorância, é remota. Custa acreditar que Lula, que está no terceiro mandato presidencial, desconheça a natureza e a singularidade do Holocausto, talvez a maior tragédia humana do século 20. Por isso, a hipótese da má-fé é a mais plausível, sobretudo porque, é forçoso dizer, Lula mal escondeu que tinha lado nesse conflito ao relutar, por semanas, em reconhecer o ataque do Hamas como o ato de terrorismo que foi, além de subscrever a frágil acusação de “genocídio” contra Israel apresentada à Corte Internacional de Justiça pela África do Sul.

Fiel ao discurso esquerdista raivoso contra o Ocidente, Lula sempre dá um jeito de deslegitimar Israel. O estado da arte dessa tentativa de deslegitimação é atribuir a Israel – fundado sobre as cinzas dos milhões de judeus assassinados nas câmaras de gás – crimes semelhantes aos da Alemanha nazista.

Não haveria nenhum problema se Lula fosse líder estudantil e estivesse numa assembleia de centro acadêmico, que é o lugar ideal para esse tipo de discurso inconsequente. Mas Lula é o presidente da República, e suas falas são consideradas, por quem as ouve, como manifestação do Estado brasileiro. Assim, até prova em contrário, Lula alinhou o Brasil ao Hamas – que, não por acaso, elogiou a fala do presidente brasileiro.

O Hamas, convém lembrar, é um movimento que defende a eliminação física dos judeus – em outras palavras, genocídio. No dia 7 de outubro do ano passado, lançou um ataque covarde e particularmente cruel contra civis israelenses, que incluiu tortura, estupros e o sequestro de bebês. Para enfrentar o previsível contra-ataque israelense, os terroristas do Hamas se escondem entre a população civil palestina, usando hospitais como quartéis, com o objetivo evidente de provocar o maior número possível de mortes de inocentes e usá-las em sua campanha de propaganda contra Israel e os judeus.

Nada disso foi levado em conta por Lula. O presidente também não levou em conta o fato de que os judeus assassinados pelos nazistas na 2.ª Guerra não haviam atacado a Alemanha ou qualquer outro país, diferentemente do que fez o Hamas em outubro passado; não levou em conta que os nazistas mataram milhões de judeus não em bombardeios ou em tiroteios em zonas densamente povoadas, mas em campos de extermínio cuidadosamente projetados para otimizar esse processo, num deliberado projeto genocida, algo que nem remotamente está acontecendo em Gaza; e finalmente não levou em conta que o Brasil, tradicionalmente neutro nos conflitos no Oriente Médio, perderá qualquer capacidade de fomentar o diálogo ao comparar Israel à Alemanha nazista.

Isso ficou claro, aliás, quando o governo israelense chamou o embaixador brasileiro em Tel-Aviv para “uma conversa dura de repreensão”, além de declarar Lula uma persona non grata em Israel até que haja uma retratação formal do petista. De fato, Lula deveria se retratar, mas será surpreendente se o fizer. Não é do feitio de um demiurgo reconhecer que errou.

O Impacto no Setor de Defesa Brasileiro Frente ao Desgaste das Relações com Israel Marcelo Barros (Defesa TV)

 O Impacto no Setor de Defesa Brasileiro Frente ao Desgaste das Relações com Israel

Marcelo Barros

Defesa TV, 20/02/2024

Recentemente, o estremecimento nas relações entre Brasil e Israel emergiu como uma fonte de preocupação significativa para o Exército Brasileiro. A tensão, que se desenrola no âmbito político-estratégico, coloca em xeque a continuidade de valiosos projetos de cooperação, especialmente aqueles ligados à transferência de tecnologia de ponta na área de defesa. Este cenário desafiador acena com a possibilidade de impactos negativos em acordos cruciais para a modernização e capacitação das forças armadas brasileiras.

O Cerne da Questão

O cerne da preocupação reside nos projetos conjuntos em áreas críticas como armamentos e sistemas de comunicação, nos quais a tecnologia israelense desempenha um papel fundamental. Integrantes da força militar alertam para as consequências adversas que uma eventual deterioração completa das relações poderia acarretar, afetando a implementação e evolução dessas iniciativas colaborativas.

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Avaliação Estratégica

Apesar das discussões estarem, por ora, limitadas à esfera político-estratégica, sem desdobramentos práticos imediatos, a situação é monitorada com grande atenção. Diplomatas e especialistas reconhecem que o setor militar estaria entre os mais impactados por uma ruptura, dada a importância dos equipamentos e programas israelenses para as capacidades defensivas do Brasil.

Perspectivas e Implicações

Segundo Paulo Roberto de Almeida, diplomata e professor, estamos diante de uma “guerra diplomática” entre governos que, por suas naturezas erráticas, tornam o futuro da colaboração bilateral incerto. Ele sugere que, enquanto os acordos comerciais podem permanecer inalterados, aqueles estabelecidos diretamente entre os Estados correm riscos de interrupção. Essa distinção entre transações comerciais e acordos governamentais é crucial para entender as possíveis trajetórias dessa relação.

O Silêncio e a Vigilância

Até o momento, o Exército Brasileiro manteve-se reservado, sem emitir comentários específicos sobre as tensões. Este silêncio reflete a delicadeza do assunto e a necessidade de uma avaliação cuidadosa dos próximos passos, à medida que as implicações de uma escalada no desentendimento poderiam redefinir aspectos importantes da política de defesa nacional e da cooperação internacional em tecnologia militar.


Atitudes de Lula em questões internacionais prejudicam Brasil na política externa - R7, Portal Correio

Atitudes de Lula em questões internacionais prejudicam Brasil na política externa, dizem especialistas

Presidente brasileiro se tornou 'persona non grata' para Israel após comparar ações de defesa israelense ao nazismo

Os gestos e as atitudes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm prejudicado o Brasil na área da política externa, avaliam especialistas consultados pelo R7. Os exemplos citados são as declarações sobre as ações de defesa de Israel, que o considerou “persona non grata”, do conflito entre Rússia e Ucrânia e a tentativa de relativizar o regime ditatorial de Nicolás Maduro na Venezuela. As informações são do R7, parceiro nacional do Portal Correio.

Desde o início do conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas, Lula tem buscado o papel de conciliador, visando um cessar-fogo permanente na região. A mesma atitude tem sido tomada em relação à guerra da Rússia na Ucrânia. Nas principais ocasiões, o petista enviou o assessor especial para assuntos internacionais, Celso Amorim, para se reunir com membros de ambos os governos na tentativa de se buscar uma solução.

Lula registrou diversas dificuldades para colocar em prática seu plano de o Brasil ser protagonista e pacificador nas questões internacionais voltadas para a área da segurança. O líder brasileiro criticou os Estados Unidos, por supostamente alimentar a guerra na Ucrânia, e recebeu uma repreenda da Casa Branca, que afirmou que o Brasil estava “papagueando” o discurso adotado pela Rússia para negar que tem culpa.

O episódio mais recente e polêmico ocorreu nessa segunda-feira (19), quando Israel classificou Lula como “persona non grata” no país até que haja uma retratação sobre as declarações feitas pelo presidente brasileiro.

No fim de semana, o petista comparou as ações de defesa israelense no conflito contra o grupo terrorista Hamas ao nazismo. “O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu. Quando Hitler decidiu matar os judeus”, afirmou o petista na ocasião.

Depois do mal-estar causado pela fala do presidente, o governo israelense tornou Lula “persona non grata” no país. O embaixador brasileiro em Tel Aviv, Frederico Meyer, foi chamado por Lula para consultas e embarca para o Brasil nesta terça (19). 

“Cada vez que o presidente Lula viaja ao exterior, traz estragos e prejuízos em termos de política externa. E são episódios tristes para os brasileiros, que compõem tradicionalmente um povo pacífico, aberto e amigo com as demais nações. No caso de Israel, os gestos parecem fechar as portas aos israelenses e desrespeitam os judeus que em solo brasileiro estão. É uma tremenda ofensa”, avalia a professora de direito da Universidade de São Paulo (USP) Maristela Basso.

“Por outro lado, acirra também a polarização no país, uma vez que, aqueles que seguem o pensamento ideológico-partidário de Lula, se sentem autorizados à revanche antissemita. É extremamente prejudicial nas relações internacional e interna, porque serve de combustível para a eventual prática de crime”, acrescenta.

Para a professora de direito da USP, os gestos de Lula fazem com se que perca completamente o espaço de conciliador que o Brasil buscava ocupar entre países que estão em disputa, como Israel e Palestina e Rússia e Ucrânia.

“Perdeu a credibilidade. Essas manifestações são incompatíveis com o posto de líder, de conciliador. Qualquer pretensão que se tinha, de ser o protagonista, de ocupar espaço de liderança, acabou”, argumenta.

Outro episódio citado pelos especialistas trata-se do regime ditatorial de Nicolás Maduro na Venezuela. No ano passado, Lula disse que o ditador merece mais respeito, apesar de o governo dele ser conhecido por episódios de violação de direitos humanos, censura à imprensa e prisão a opositores. O petista evitou dizer se o país vizinho é uma democracia, mas destacou que a situação política do país não pode sofrer interferência de outras nações.

Para o diplomata e diretor de Relações Internacionais do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, Paulo Roberto de Almeida, as declarações do presidente podem prejudicar a política externa brasileira.

“A declaração de Lula é absolutamente equivocada nos planos histórico, diplomático e político. Não há equiparação possível ao Holocausto, que foi organizado por um Estado contra uma determinada população. Foi um massacre. Não há precedentes na história”, avalia.

“Temos duas questões que caracterizam o [mandato] Lula 3, que deveria ser mais maduro pelas experiências dos mandatos anteriores. O que a gente repara é que tem havido tensões internas e externas que derivam das posturas típicas do PT. No campo econômico, o intervencionismo que vimos em casos como a Vale e a Petrobras. No campo da política externa, o que se nota são posições mais próximas do partido [PT] que as da diplomacia brasileira,” explicou.

“Quando Lula cita o Holocausto, isso ultrapassa a linha do aceitável por ser um fato único na história da humanidade. O Holocausto é algo inimaginável até em relação a outros genocídios, por ter sido um projeto estatal do hitlerismo de eliminar todos os judeus. Isso é algo inédito na humanidade. Essa palavra ‘Holocausto’ o Lula pronunciou por ignorância histórica e causou um choque no povo judeu.”

O advogado especialista em direito internacional Bernardo Pablo Sukiennik argumenta que a classificação do brasileiro como ‘persona non grata’, como reação israelense, amplifica a crise gerada pelo petista.

“Isso quer dizer que essa pessoa, no caso o Lula, não é mais bem-vinda em Israel. Não há previsão de visita ao Estado, mas com essa nomenclatura estão deixando claro que, enquanto o governo for liderado por Isaac Herzog e Benjamin Netanyahu, ele não é bem-vindo lá”.

O diplomata Almeida avalia a reação israelense como grave, pois não há precedentes na histórica republicana brasileira deste tipo de movimento e, dessa forma, mostra a gravidade da situação.

“Após a ‘persona non grata’, a retaliação pode atingir acordos e tratados de cooperação entre os dois países. Não creio que chegue a muito, até porque perderiam muito comercialmente, mas pode ser que seja feita uma espécie de corretivo ao Brasil. Além de sinalizar aos demais líderes mundiais de que não vão aceitar manifestações com esse tipo de conteúdo.”

“Não necessariamente envolve romper acordos, porque não seria do interesse do governo nem de empresas israelenses que exportam ao Brasil, principalmente, na área de segurança, mas mostra um descontentamento para a manutenção, pelo menos temporária, de cooperação”, acrescenta Almeida.

Parlamentares evangélicos repudiaram as palavras de Lula

As Frentes Parlamentares Evangélicas (FPE) do Congresso Nacional e do Senado Federal
repudiaram as palavras de Lula. Em nota, os parlamentares disseram que comparar os ataques de Israel ao Hamas com o nazismo, que vitimou seis milhões de judeus, é provocar um conflito ideológico desnecessário.

“Com a ressalva do respeito às pessoas que inocentemente morrem, Israel, ao contrário de Hitler, está exercendo o seu direito de sobreviver diante de um grupo com o objetivo de eliminar os judeus”, diz o documento.

Para a FPE, “não é justo exigir que uma nação se mantenha passiva diante de um ataque covarde que estupra e mata jovens, idosos e crianças das formas mais horríveis e continua com a política de se esconder atrás de reféns (civis inocentes)”.

Ainda de acordo com a nota, as verbalizações do presidente “não representam o pensamento da maioria dos brasileiros e comprometem a política internacional de forma desnecessária”.

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Posição do Brasil em Haia fica no meio do caminho entre direito e diplomacia - Lucas Carlos Lima (FSP)

Posição do Brasil em Haia fica no meio do caminho entre direito e diplomacia

Ausência de referências a eventos posteriores ao ataque do Hamas pode ser sinal de moderação à luz da tensão diplomática

Lucas Carlos Lima

Professor de direito internacional (UFMG), atuou perante

 a Corte Internacional de Justiça; organizador do livro

“A Jurisprudência da Corte Internacional de Justiça” (ed. Del Rey)


Folha de S. Paulo, 20/02/2024

Opiniões consultivas emitidas pela Corte Internacional de Justiça, o principal órgão judicial da Organização das Nações Unidas, são receptáculos do estado do direito internacional num determinado momento histórico. Apesar de não serem vinculantes como decisões em casos contenciosos iniciados por um Estado contra outro, elas possuem grande autoridade pois anunciam o conteúdo e alcance das normas jurídicas aplicáveis ao caso e servem como fonte para auxiliar a resolução de controvérsias futuras.

Essa é a razão pela qual nesta semana mais uma vez os olhos do mundo se voltam a Haia diante do pedido de opinião consultiva formulado pela Assembleia-Geral da ONU em janeiro de 2023 –ou seja, muito antes dos ataques perpetrados pelo Hamas contra Israel no 7 de Outubro– sobre consequências das ações de Israel nos territórios palestinos.

Juízes da Corte Internacional de Justiça (CIJ) durante audiência sobre a ocupação de Israel de territórios palestinos - Piroschka van de Wouw - 19.fev.2023/Reuters

As perguntas colocadas à Corte pela Assembleia foram duas. Em primeiro lugar, esclarecer quais são as consequências jurídicas decorrentes da "violação contínua por Israel do direito do povo palestino à autodeterminação, da sua prolongada ocupação, colonização e anexação do território palestino ocupado desde 1967", bem como da "adoção de legislação e medidas discriminatórias relacionadas".

Em um segundo momento, compreender como as referidas políticas "afetam o estatuto jurídico da ocupação e quais são as consequências jurídicas que decorrem desse estatuto para todos os Estados e para as Nações Unidas", visando também entender quais são as obrigações de todos os membros da comunidade internacional diante da situação.

É interessante notar que a linguagem empregada pela Assembleia-Geral faz referência às resoluções e normas internacionais anteriores (bem como a própria decisão de 2004 da Corte Internacional sobre a "Legalidade da Construção do Muro em Territórios Palestinos Ocupados" por Israel), que já estabeleceram a violação, por parte de Israel, de normas e obrigações de direito internacional.

A Assembleia busca, portanto, compreender quais são os efeitos e linhas de ação a serem tomadas diante da situação de violação de territórios ocupados por Israel em contrariedade ao direito internacional. Esse ponto foi alvo de crítica na manifestação de Israel, para quem as perguntas "representam uma clara distorção da história e da realidade atual do conflito israelo-palestino".

Muitos Estados e organizações internacionais resolveram participar do procedimento, apresentando sua posição sobre as perguntas colocadas pela Assembleia. Tal participação revela que os Estados são conscientes de que as suas posições são levadas em alta consideração pela Corte.

O Brasil não é exceção e apresentou suas considerações escritas e oralmente sobre o tema. É possível notar, nos últimos tempos e independente do governo, uma maior preocupação do Brasil em participar de procedimentos consultivos perante tribunais internacionais. Parece se difundir nos corredores de Brasília uma consciência da oportunidade que esses procedimentos representam de influenciar a ordem jurídica internacional.

Em suas observações escritas bem como em sua sustentação pública no Palácio da Paz, a posição brasileira pode ser sintetizada nos seguintes pontos: (1) a Corte Internacional possui jurisdição e deve exercê-la para emitir uma opinião sobre as questões solevadas; (2) a ocupação israelense dos territórios palestinos viola o direito do povo palestino à autodeterminação, e o Brasil defende o caráter peremptório dessa norma; (3) Israel deve pôr fim à ocupação de territórios palestinos; (4) um Estado que viola o direito internacional deve oferecer a devida reparação, e tal princípio se aplica a Israel; (5) todos os Estados, e não apenas os envolvidos no conflito, devem se abster não apenas do reconhecimento dessa situação, mas também de atos que possam implicar tal reconhecimento; (6) nenhum Estado deve colaborar com as ações ou iniciativas israelenses relacionadas à ocupação ilegal dos territórios palestinos; (7) os Estados devem cooperar para pôr fim à ocupação, por meios legais, o mais rápido possível.

A posição brasileira parece alinhada com seus princípios constitucionais e internacionais de política externa jurídica e está em consonância com diversas outras manifestações de Estados em relação ao estado do direito internacional. Em algumas passagens os argumentos jurídicos poderiam ser melhor detalhados ou elaborados, oferecendo uma visão mais precisa e contundente da posição brasileira.

Embora os argumentos brasileiros se encontrem ancorados no direito internacional, em muitas passagens a posição brasileira parece mais um discurso diplomático que uma argumentação jurídica. A ausência de referências aos eventos posteriores ao ataque do Hamas parece também um sinal de moderação à luz da tensão diplomática que tomou o noticiário nesta semana.

Em alguns meses a Corte Internacional emitirá seu parecer sobre a questão. Se a decisão da Corte irá efetivamente influenciar o futuro da situação na Palestina é um questionamento bem mais complexo.



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