Ascensão e queda dos EUA como líderes industriais e o
Partido Republicano
Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.
Nota sobre a evolução econômica dos EUA e os desafios
na segunda Guerra Fria.
A coisa mais
extraordinária, e abominável, que se passou com o Partido Republicano (e seus
caciques) foi a passagem do mais absoluto horror à fraude completa chamada
Trump à total submissão ao mentecapto populista vulgar, misógino, megalomaníaco
e demente que conquistou boa parte da América em declínio da segunda revolução
industrial.
Os EUA da ascensão
pós-guerra civil, e auge pós- Segunda Guerra Mundial, perderam o passo na
passagem para a quarta revolução industrial, da microeletrônica, da qual eles
foram os coo-inventores (junto com japoneses e europeus).
Os Republicanos deixaram
de ser os liberais conservadores do multilateralismo econômico,
antiprotecionismo e promotores do livre comércio, para o mais horrendo e
irracional mercantilismo, quando outros países os alcançaram e superaram na
produtividade industrial, usando as mesmas técnicas e know-how inventado e
desenvolvido por eles, mas aperfeiçoados e incrementados pelos asiáticos,
japoneses, coreanos e taiwaneses, e logo em seguida pela China de Deng
Xiaoping.
No entanto, tanto os americanos,
quanto os europeus e os asiáticos capitalistas democráticos continuam
inovadores e produtivos, e avançados nos planos científico e tecnológico, mas
parecem ter perdido a energia na força de trabalho que os caracterizava
anteriormente, sobretudo os preguiçosos e obesos trabalhadores do Rust Belt,
origem da segunda revolução industrial, a do aço, do automóvel e da manufatura
de bens duráveis, o que não é mais o caso desde os anos 1980.
A era Reagan corresponde
à passagem do Partido Republicano do liberalismo ao protecionismo, da liderança
multilateral para o nacionalismo defensivo, do realismo fiscal para o
acumulador de dívida pública, tanto que foram presidentes democratas - Clinton,
Obama e Biden - que tiveram de corrigir os desequilíbrios fiscais e
orçamentários criados por presidentes republicanos: Reagan, Bush Jr. e Trump.
Atualmente, os chineses,
que tinham completamente perdido a primeira e a segunda revoluções industriais,
e que ainda tinham ignorado a terceira, sob o maoísmo demencial, conseguiram,
sob Deng, engatar na quarta revolução industrial e avançar decisivamente para a
quinta e dar a partida à sexta revolução industrial, graças à energia do seu
povo trabalhador e uma predisposição favorável à globalização e ao livre
comércio. Mas, nos últimos anos, o novo imperador Xi Jinping enveredou
novamente pelo nacionalismo e intervencionismo, o que, junto com problemas
estruturais chineses, de origem demográfica e fiscal, pode conduzir a grande
nação asiática a uma semi estagnação, como o Japão dos anos 1990-2000 (o que no
entanto não obstruiu a capacidade científica e de inovação tecnológica).
Trump representou o
maior retrocesso mental e motivacional nos EUA, fazendo o país reverter do
multilateralismo triunfante do pós-Segunda Guerra para o mais estreito e vulgar
nacionalismo protecionista, sinônimo de declínio irremediável, pateticamente
patrocinado pelo Partido Republicano, cujos caciques se renderam a um farsante
histriônico e medíocre.
Não é irremediável e os
EUA podem se recuperar do atual desastre econômico e político, mas,
curiosamente, muito do novo vigor competitivo dos dois lados oceânicos dos EUA
tem muito a ver com as comunidades imigrantes dinâmicas, não latinas ou
africanas, mas asiáticas e indianas, responsáveis pela nova competitividade
setorial americana.
O Partido Republicano
terá de se desvencilhar do mentecapto que o capturou com base no mais vulgar
populismo demencial, e retomar suas concepções liberais de outrora. Podem
fazê-lo, mas terá de ter sangue novo em suas lideranças, num país que se tornou
doentio pelo armamentismo exacerbado e também desgarrado pelo identitarismo
idiota que penetrou e conquistou o Partido Democrata.
O Brasil perdeu o vigor
do desenvolvimentismo estatizante e nacionalista de uma era já ultrapassada e
ainda não consolidou as bases de um novo crescimento que deveria estar, desta
vez, vinculado à globalização e ao livre comércio, em primeiro lugar na própria
região, o que seria o terreno natural de seu imperialismo hobsoniano, isto é,
baseado nos investimentos externos e na abertura unilateral de seus mercados aos
países vizinhos. Infelizmente, não o fez e não se sabe quando o fará, pois o populismo
lulopetista o empurra de volta ao desenvolvimentismo nacionalista e estatizante
da era geiseliana, todo o contrário do que deveria fazer numa era dominada pela
competitividade asiática nos mercados. Vai demorar mais um pouco para corrigir.
Como evidenciado no farto exemplo de decadência argentina, certos países têm de
passar primeiro pelo declínio econômico, político e até mental, antes de
conseguirem se recuperar. Já é o caso da Argentina - processo que já dura oito
décadas - e pode ser o caso do Brasil, e parece que já estamos nisso há mais de
três décadas. Vamos nos recuperar? Talvez: nossa “americanização” ainda não se
converteu em energia laboral e produtiva asiática. Pode ser que demore mais uma
ou duas gerações…
Brasília, 4733, 15 setembro 2024, 2
p.
Postado no blog Diplomatizzando
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