Empresários, via de regra, são pessoas focadas exclusivamente nos seus negócios, procurando extrair o máximo de lucros para suas contas privadas ou para a distribuição aos acionistas. Todo o mais deveria ser secundário: políticas públicas, balanço de pagamentos, preocupações sociais, nada disso deveria interferir na busca compulsiva de negócios lucrativos, que sempre podem ser facilitados por um bom ambiente de negócios, estabilidade econômica, câmbio favorável, etc.
Mas persiste a impressão de que o mundo microeconômico pode conviver em bons termos com o mundo macroeconômico, desde que este não atrapalhe a boa marcha do primeiro. E quando atrapalha?
Bem, aí os empresários, se possível unidos, devem pedir aos poderes públicos que consertem o que está errado, do contrário terá de despedir empregados, o setor recolherá menos impostos, etc.
Curioso é quando os empresários não conseguem fazer um diagnóstico correto da situação e se unir para pedir rumos adequados aos poderes públicos.
Esse tipo de cegueira parece caracterizar a FIESP atual, o que talvez se explique por razões eleitorais. Afinal de contas, seu líder máximo, que já foi discretamente social-democrata, depois virou socialista (!!!???), voltou a ser de direita, mas o que lhe interessa mesmo é uma carreira política, o que pode estar em choque com suas funções empresariais (se é que tem alguma).
O editorial do Estadão tenta entender por que a FIESP destoa das outras duas entidades empresariais do setor industrial que menciona. Acaba chamando a FIESP de "bolivariana". Será?
Acho que é só confusão mental, a mesma que está presente nas manifestações de rua.
Paulo Roberto de Almeida
Uma Fiesp bolivariana?
Editorial O Estado de S. Paulo, 20/06/2013
Ou o Brasil busca novos acordos comerciais ou ficará isolado, alertaram recentemente duas das mais importantes entidades empresariais, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi). O País é membro do Mercosul, um bloco marcado pelo protecionismo interno, por uma tarifa externa cheia de furos e por acordos preferenciais com parceiros em geral pouco significativos. O Mercosul é hoje muito mais um empecilho do que uma estrutura capaz de ter peso nas decisões internacionais, disse na terça-feira o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Braga de Andrade. Opinião muito diferente aparece em estudo recém-lançado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Segundo o documento, entender a participação do Brasil no Mercosul como um impeditivo a acordos preferenciais de comércio é apontar um falso problema. Além disso, os vizinhos do Cone Sul são apontados como "a prioridade da política comercial brasileira".
A frase do presidente da CNI é muito mais realista que a avaliação oposta. A opinião da Fiesp é mais alinhada com a do governo e mais adequada às boas relações com o ministro Guillermo Moreno, chefe do protecionismo argentino. Para justificar a prioridade atribuída ao Mercosul, os autores do estudo apontam a expansão do intercâmbio do Brasil com os membros do bloco. Desde o lançamento do Mercosul até 2011, essa corrente de comércio aumentou de US$ 4,5 bilhões para o valor recorde de US$ 47 bilhões, "com uma pauta altamente concentrada em produtos manufaturados". Faltou mostrar se o crescimento teria sido muito menor, se o bloco tivesse permanecido como área de livre comércio, sem os compromissos e amarras de uma união aduaneira.
Essas amarras limitam, sim, as possibilidades de acordos internacionais mais variados e comercialmente mais vantajosos. As limitações teriam sido mais evidentes se o governo brasileiro tivesse buscado esses acordos mais ativamente, em vez de se restringir a uma política terceiro-mundista. "O Brasil", segundo nota recente da CNI, "tem 22 acordos preferenciais, a maioria pouco relevante." Chile, Colômbia, México e Peru têm, cada um, mais de 50, muitos deles com parceiros de grande importância.
Segundo o estudo da Fiesp, o Brasil poderia "estruturar acordos-quadro amplos, com listas e cronogramas de desgravação diferenciados" para permitir a adesão gradual dos outros membros do Mercosul. Em outras palavras: pode-se contornar os limites da união aduaneira, por meio de compromissos menos ambiciosos que os acordos de livre comércio e sempre levando em conta a incorporação progressiva dos demais sócios do bloco. O principal problema continuaria sendo a resistência argentina, um dos principais obstáculos, por exemplo, à conclusão das negociações com a União Europeia.
Ainda segundo o estudo, o Brasil, com seu peso, "tem plenas condições de liderar o Mercosul" em negociações com países ou regiões de fora do bloco. Se tem essas condições, por que deixou de usá-las até hoje? Em termos práticos bem claros, o documento da Fiesp é mais um estímulo à manutenção da desastrosa diplomacia comercial dos últimos dez anos.
Mas o documento contém algo mais grave que argumentos discutíveis e propostas irrealistas. "Não apenas as regras do Mercosul são suficientemente flexíveis para acomodar as prioridades dos membros - vide a suspensão do Paraguai do bloco -, como há formas construtivas para acomodar as circunstâncias individuais de cada Estado." Mais que discutível, essa frase parece uma confissão: a Fiesp considera um exemplo de flexibilidade o golpe vibrado contra o Paraguai para que se pudesse admitir a Venezuela pela porta dos fundos?
Se é esse o caso, o alinhamento vai muito além da sujeição aos padrões de uma diplomacia econômica de quinta categoria. Envolve também o aplauso a uma política de apoio aos governos mais perigosos para a democracia na região. Será a Fiesp bolivariana?
Nenhum comentário:
Postar um comentário