Parece que o governo ficou (um pouco ou muito) assustado com o tom de dois relatórios recentes sobre o Brasil: o da OCDE e o do FMI. Para mim não houve surpresa alguma porque eu havia conversado com a equipe técnica das duas instituições quando visitaram o Brasil para fazer as entrevistas para esses relatórios.
O meu tom nas conversas com os dois órgãos internacionais foi que mais do que os indicadores macroeconômicos, a administração da política macroeconômica piorou muito nos últimos anos – para mim a data de corte foi meados de 2009, quando se deu continuidade a uma política de expansão da demanda que não era mais necessária.
Adicionalmente, (i) a dificuldade de o governo federal aumentar o investimento público desde 2011, (ii) a crescente incerteza dos agentes econômicos , (iii) o esgotamento do forte crescimento do crédito não imobiliário, e (iv) os fatores estruturais tradicionais que limitam o nosso crescimento pelo lado da oferta parecem indicar que o governo termina o atual mandato com crescimento médio do PIB próximo a 2% ao ano; taxa de juros de volta a dois dígitos com inflação média perto de 6% ao ano; e queda do superávit primário de 3,1% do PIB, em 2011, para a faixa de 1%-1,5% do PIB com dívida bruta em alta, ultrapassando a marca de 60% do PIB.
Além disso tudo, uma notícia particularmente ruim recente vem do Ministério da Fazenda, em especial, da Secretaria de Política Econômica (SPE). Como se sabe, devido as constantes cobranças do Tribunal de Contas da União (TCU), a SPE é obrigada a calcular o custo dos benefícios financeiros e creditícios de todas as politicas do governo que envolvem algum tipo de subsídio.
Nas tabelas enviadas como anexos do Projeto de Lei Orçamentário Anual de 2014 que ainda está em tramitação no Congresso Nacional, a SPE do Ministério da Fazenda mostra que a conta de subsídios financeiros e creditícios do governo federal foi de R$ 45 bilhões e R$ 42,9 bilhões, em 2011 e 2012, e que esse custo será de, respectivamente, R$ 69,9 bilhões e R$ 73,4 bilhões, em 2013 e 2014 – crescimento de mais de 60%!
Gráfico 1 – Custo Anual dos Benefícios Financeiros e Creditícios do Governo Federal (2011-2014) – R$ bilhões
Fonte: PLOA 2014. Projeções para 2013 e 2014 da SPE-Ministério da Fazenda.
Adicionalmente, uma grande parte dos subsídios não é computada porque não eles estão sendo pagos. Essa dúvida eu tirei diretamente com dois técnicos da própria SPE que me alertaram que, por exemplo, no caso do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), como o governo vem atrasado o pagamento dos subsídios e desde o ano passado esses subsídios só passam a ser devidos depois de 24 meses (
já escrevi aqui sobre o assunto), o que não está sendo pago não é computado nessas tabelas.
Além do mais, o diferencial de juros pela metodologia da SPE é calculada em cima do custo do titulo emitido, por exemplo, na data do empréstimo do Tesouro ao BNDES e não em relação ao custo médio de endividamento do Tesouro. Assim, mesmo por uma metodologia que subestima o custo fiscal dos subsídios financeiros e creditícios, o Ministério da Fazenda mostra crescimento de mais de 60% no custo financeiro e creditício das operações de subsídios do governo federal em 2013-2014, quando comparado com 2011-2012.
Em resumo, o governo vai terminar, em 2014, com investimento público baixo (em torno de 1,3% do PIB com o Minha Casa Minha Vida), crescimento médio do PIB de 2% ao ano, forte queda do primário (queda de 50% do superávit primário em relação ao início do governo), com a divida bruta ultrapassando 60% do PIB e com uma conta de subsídios que cresceu rapidamente fruto de politicas públicas cujo os custos não são adequadamente explicitados para a sociedade.
No Brasil, tenho convicção que precisamos de maior transparência quanto ao volume de subsídios que hoje, além de não sabermos o volume a contabilização desses subsídios segue critérios diferentes. Por exemplo, quando o Tesouro pede ao BNDES que empreste à uma taxa de juros de 3,5% ao ano, o Tesouro tem que fazer uma equalização de juros que será uma despesa primária. A conta não está sendo paga, mas em algum momento vai aparecer.
E no caso do crédito educativo -o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) que emprestar recursos para estudantes de ensino superior à uma taxa de 3,5% ao ano? Nesse caso, a meu ver, da mesma forma que no PSI deveria ocorrer uma equalização de juros de tal forma que o subsídio fosse claro. Isso ocorre? não! Por que? porque este programa é bancado por uma emissão especial de títulos públicos (Certificado Financeiro do Tesouro - Série E) e o seu custo fica "escondido" no custo de rolagem da dívida. E como todos os programas que o custo não fica claro a tendência é de crescimento rápido. E quando falo rápido é mais ou menos o seguinte - ver gráfico 2:
Gráfico 2 - Valor total contratado pelo FIES (Crédito Educativo) - R$ bilhões - 2009-2012
Fonte: Secretaria de Educação Superior - Min da Educação.
O próximo governo começa sem nenhum espaço para corte de impostos e crescimento do investimento público. Mesmo assim, ainda é um cenário melhor do que, em 2003, mas um cenário “longe do que poderia ser”, pois perdemos uma grande oportunidade de trazer a dívida bruta para menos de 50% do PIB e, dessa forma, pagar menos juros e até namorar com a ideia de déficit nominal zero no futuro próximo.
Se o governo não entendeu o tom dos relatórios do FMI e da OCDE, o recado é esse acima. Por fim, acho que a equipe econômica parece agora sinalizar uma mudança no uso do dos empréstimos para bancos públicos e do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) muito mais porque a conta "salgada" começou a chegar e não devido a uma genuína percepção de que a chamada nova Matriz Econômica fracassou. É por isso que muita gente acredita que, quem quer que seja o presidente, em 2015-2018, o próximo governo será mais liberal, mesmo que seja o atual (com uma nova equipe econômica).
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