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domingo, 10 de agosto de 2014

Fronda empresarial: o Brasil precisa de uma - Paulo Roberto de Almeida (Estadao)

O jornal O Estado de S.Paulo, em sua página de artigos de Opinião, traz hoje (10/08/2014), meu artigo mais recente, em que trato, mais uma vez, da necessidade de uma fronda empresarial no Brasil. Nem todos compreendem o significado do conceito de fronda, em sua expressão própria ou em sua analogia histórica, como um dos leitores de quem transcrevo o comentário mais abaixo, juntamente com minha resposta a ele.
Quem desejar ler no site do jornal, eis aqui o link:
http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,fronda-empresarial-o-brasil-precisa-de-uma-imp-,1541582
Transcrevo meu artigo original:


Fronda empresarial: o Brasil precisa de uma

Paulo Roberto de Almeida

Fernand Braudel, o historiador conhecido por seus estudos sobre a evolução das economias de mercado e sobre a expansão do capitalismo – não confundir as duas coisas: este último é apenas uma, ainda que a mais importante, das formas assumidas pelas primeiras – alertava para uma situação bastante frequente nas interações entre os capitalistas e os donos do poder, representados pelos soberanos, em suas diversas modalidades: reis, príncipes, duques, arrivistas armados, condottieri. Se tratava da colusão entre o dinheiro e o poder, para o mútuo benefício de ambos, em detrimento dos cidadãos, dos súditos, de todos os pagadores de impostos. Na época por ele estudada, os capitalistas eram geralmente mercadores e banqueiros, não aqueles industriais de cartola e charuto que só surgiriam depois de bem implantada a revolução industrial; mas a realidade permanece a mesma, em todas as épocas e lugares.
Os criadores primários de renda e riqueza compram a simpatia dos fazedores de leis e de regras, para que estes “fechem” os mercados de maneira a elevar a taxa de retorno das atividades nas quais os primeiros se encontram engajados, seja no setor produtivo de manufaturas, seja nas intermediações comerciais e financeiras. Ocorre também do príncipe querer consolidar o seu poder, para afastar eventuais concorrentes, passando a adiantar esses favores aos agentes econômicos, em troca do financiamento adequado para justamente reforçar o seu monopólio sobre o poder político. Alguma semelhança ou coincidência com o que ocorre hoje no Brasil? Provavelmente, mas o cenário não é exclusivo do nosso país ou da nossa época. Ele é sustentável, aceitável, moralmente justificado, defensável do ponto de vista dos interesses da comunidade?
No limite, esse tipo de relação espúria entre detentores do poder político e criadores da riqueza primária pode levar a uma exacerbação da exação fiscal e a uma deterioração geral das instituições de comando na sociedade, alimentando corrupção, irracionalidades econômicas, inércia gerencial, falta de inovação e descrédito geral dos cidadãos (de preferência a súditos) quanto ao funcionamento da administração pública. Não parece difícil prever a perda de dinamismo na economia e uma descrença geral na legitimidade da representação cidadã, podendo redundar em acirramento dos conflitos políticos. Estaria ocorrendo isso no Brasil atual? Alguma surpresa quanto ao cenário?
Imagino que todos aqueles capitalistas – já sem cartola ou charutos – e todos os banqueiros, e seus lobistas profissionais, que circulam na capital da república de modo contínuo, já estejam cansados de todas essas petições que são obrigados a fazer, regularmente, para tentar melhorar, um pouco que seja, o seu ambiente de negócios, e para tentar preservar, uma parte que seja, dos resultados de suas respectivas atividades produtivas da sanha dos fiscais da Receita e da selva de novos regulamentos que legiões de burocratas setoriais despejam todos os dias sobre eles. Todos os mandarins da nossa república estão empenhadíssimos em construir um Brasil melhor para todos, e por isso precisam retirar os recursos de alguma parte, onde eles estão: nos caixas das empresas e nos bolsos dos cidadãos de classe média, simples trabalhadores indefesos.
Por que será que os nossos capitalistas – industriais, agrícolas e de serviços –, aparentemente tão robustos e tão conscientes da riqueza que geram em benefício da sociedade, resolvem se dobrar a partidos políticos, entregar a eles uma parte dessa riqueza criada com o suor do seu rosto (enfim, a maioria, uma parte se encosta nos empréstimos do BNDES), decidem se submeter a políticos notoriamente incompetentes e aceitam, além disso, fazer a via crucis a Brasília para pedir favores aos governantes? Para mim é um mistério, mas provavelmente tem a ver com a constituição do próprio capitalismo no Brasil, sempre embalado nos braços do Estado, alimentado no leite generoso dos subsídios e da proteção oficial, enquadrado por burocratas eficientes na regulação setorial e na captura de benefícios associados e continuamente mantido sob rédeas curtas por esse mesmo Estado, onipotente, nem sempre onipresente, mas certamente perseguindo como uma sombra o itinerário das riquezas criadas pelos capitalistas em seus afazeres cotidianos.
Se esses capitalistas lessem os livros de história saberiam que os países que alcançaram patamares significativos de prosperidade material e de bem estar coletivo foram aqueles que mais souberam defender as riquezas privadas da cobiça de aventureiros improvisados e de soberanos instalados. Para isso, os barões e os burgueses de outros séculos tiveram de decapitar, guilhotinar, ou exilar alguns dos que tentavam se assenhorear de uma parte desproporcional da sua riqueza. A condição essencial dos progressos materiais está justamente na defesa da propriedade, e é essa defesa que garantiu a pujança das economias de mercado que puderam dispor, paralelamente, de Estados contidos pela sociedade em face de soberanos tendencialmente autocráticos. A despeito de outras evidências históricas, e do que possa ter dito Fernand Braudel, esses fatos também fazem parte da história.
Foram essas frondas que permitiram a acumulação de riqueza e o bem estar de capitalistas e trabalhadores. Malgrado tentativas de “pikettyzação” do debate – uma transpiração estatística para provar que a acumulação se dá em detrimento da maioria e em favor de uma minoria – o fato é que as sociedades ficaram mais ricas lá onde a liberdade econômica foi a mais ampla; a emergência de um punhado de superbilionários jamais impediu a formação de novas fontes de riqueza; ao contrário, até estimulou outros que também buscavam essa condição. Que tal uma fronda no Brasil?

[Hartford, 28 de julho de 2014

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Um leitor não entendeu muito bem o que eu queria dizer, e escreveu o seguinte comentário a este meu artigo:

On Aug 10, 2014, at 9:21, ARIOVALDO BATISTA <ariobaxx@xxxxx.com> wrote:

Para começar foi difícil entender o linguajar do professor provavelmente de história e diplomata sr. Paulo R. de Almeida. Fronda que não encontrei em dicionários que tenho, parece que se refere ao termo ' La Fronde' de uma revolução social na "França das luzes" de Luiz XIV, na realidade um "ensaio" para a Revolução Francesa ocorrida no final do séc. XVIII, junto com a independência americana. Discordando um pouco do professor sobre a Revolução Francesa, não se tratou de uma revolução social propriamente dita, MAS DA PRIMEIRA INTENTONA COMUNISTA MAL SUCEDIDA, a segunda foi a Soviética depois da I Guerra. Ambas, incluindo a independência americana, a "história dos bastidores" até mais confiável, diz que foram financiadas pelos grandes banqueiros Rotschild, Rockfeller e Morgan, PORTANTO, NADA DE SOCIAL, mas negociatas de banqueiros mesmo.
Pelo que se depreende do texto, o autor parece dizer que a administração pública em particular no Brasil, ESTÁ TÃO EM DESCRÉDITO pela imoralidade, burrices, incompetências etc etc., que respinga para os assuntos econômicos. E daí estaria propondo uma "revolução empresarial" nos moldes da revolução social iniciada na tal "La Fronde", e ainda inacabada pela cambada comunista que ainda deita e rola nas ideologias políticas e até econômicas?
Parece que é isso que se pode concluir do texto complicado do sr. Almeida, que o Estadão apresenta no sua parte editorial.

Ariovaldo Batista
s.b.do campo sp

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Ao que eu respondi isto:



    Sr Ariovaldo,
    Sinto muito não ter sabido me fazer entender por todos os que leram o meu artigo, mas creio que ele cumpriu pelo menos uma missão: a de fazer alguns leitores, no caso o Sr mesmo, buscar nos dicionarios ou na internet, o significado da palavra fronda, que poderia ser entendida, genericamente, como uma revolta das elites contra um soberano arbitrário e extrator de recursos.
    Basicamente é isso, e fora disso o que temos são revoluções. Estas não são planejadas, encomendadas ou organizadas, simplesmente acontecem em situações extremas de crises sociais profundas, e acabam sendo precipitadas pela ação de forças incontroláveis. Então, partindo da premissa de que o Brasil está em crise, não profunda, mas numa situação de baixo crescimento, inflação em alta, contas públicas em déficit e contas externas também, podemos concluir que seria preciso fazer alguma coisa.
    Imagino que o Sr. concorde também que a indústria perde cada vez mais competitividade, o que vai gerar desemprego e novo aprofundamento da crise econômica.
    Em face disso, o que recomendei foi uma revolta empresarial, pois imagino que o Sr. também concorde comigo que o Estado extrai recursos em montantes exagerados do nosso empresariado.
    Foi isso basicamente. Grato pela mensagem.
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Paulo Roberto de Almeida

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