INSTITUTO LIBERAL-RJ
Arrogância Fatal
Por João Luiz Mauad em 15/10/2014
“A tarefa mais curiosa da economia é demonstrar aos homens quão pouco
eles sabem sobre aquilo imaginam poder planejar’. F V Hayek
Não tive como esconder um certo desânimo depois de assistir ao debate
entre os presidenciáveis, ontem na TV. Nenhum dos dois pretendentes,
embora isso fosse muito mais claro na postura da atual presidente,
conseguiam esconder aquela arrogância fatal, de que nos fala Hayek.
Ambos são por demais crentes em suas respectivas habilidades e
capacidades de planificar a sociedade, de modo que ela possa alcançar
os mais elevados níveis de prosperidade e bem estar. Penso que os
dois estão absolutamente equivocados, malgrado, por motivos óbvios, eu
tenha muito mais medo da prepotência desmedida da atual ocupante do
cargo.
Segundo Adam Smith, os indivíduos não buscam conscientemente
benefícios econômicos para a sociedade. No entanto, conduzidos pela
pressão da competição e pelos incentivos dos ganhos pessoais, esses
benefícios surgiriam espontaneamente, através das interações efetuadas
no mercado. Os benefícios sociais seriam, portanto, derivados do
funcionamento de um sistema e não de um propósito consciente.
Na perspectiva de Adam Smith, as limitações morais do homem em geral,
e seu egoísmo em particular, não são lamentadas nem tampouco vistas
como algo que se deva modificar. Pelo contrário, são tratadas como
fatos, vale dizer, como características intrínsecas e próprias da
vida. O objetivo fundamental de um bom sistema de organização social
e econômico seria perseguir os melhores resultados possíveis (sociais
e morais) a partir das limitações existentes, e não dissipar energias
tentando alterar a natureza humana, um intento que Smith considerava
tão vão quanto sem sentido.
Já Hayek, em contraposição às pretensiosas e mirabolantes teses em
favor da planificação econômica, tão comuns e festejadas no seu tempo,
sustentava que o funcionamento da sociedade depende da ligação
coordenada de milhões de fatos e ações individuais, cujo conjunto
ninguém seria capaz de conhecer. Segundo ele, o conhecimento humano
abrange toda a multiplicidade da experiência do homem através dos
tempos, algo demasiado complexo para uma articulação explícita que se
pudesse apreender. Trata-se de uma “sabedoria sem reflexão, inculcada
tão profundamente que se converte praticamente em reflexos
inconscientes”. Segundo o austríaco, este conhecimento esparso, não
raro manifestado de forma não articulada, teria mais probabilidade de
gerar frutos do que as arrogantes visões de uns poucos intelectuais.
Só a cooperação voluntária, através do mercado, permite-nos processar
e transmitir as informações e os conhecimentos dispersos entre milhões
de pessoas. Isso jamais seria conseguido por qualquer “planejador”,
por mais inteligente e gabaritado que fosse.
Por isso, na concepção de Hayek a sociedade é comparada a um organismo
vivo, que não pode ser reconstruído sem conseqüências fatais, como,
aliás, restou comprovado através das diversas experiências
coletivistas malsucedidas do Século XX.
Essa visão do mundo não pretende, de forma nenhuma, negar a relativa
superioridade dos chamados “especialistas” dentro de um determinado
setor do conhecimento humano. O que ela refuta, com certa veemência
até, é que tal superioridade, principalmente em virtude do seu cunho
limitado e restrito, possa estender-se por sobre outros tipos de
conhecimento amplamente fragmentados e difusos. É dentro dessa
perspectiva que a interação sistêmica de muitos deve ser sempre
considerada superior à sabedoria específica de poucos.
Ortega y Gasset resumiu bem o perigo que representa a arrogância do
conhecimento especializado quando asseverou que o especialista “não é
um sábio, porque ignora formalmente o que não entra na sua
especialidade; mas tampouco é um ignorante, porque é “um homem de
ciência” e conhece muito bem a sua fração de universo. Devemos dizer
que é um sábio ignorante, coisa sobremodo grave, pois significa que é
um senhor que se comportará em todas as questões que ignora não como
um ignorante, mas com toda a petulância de quem, na sua questão
especial, é um sábio.”
Sob todos os ângulos que se possa olhar, as vantagens da liberdade
sobre a planificação econômica e social são marcantes. Entretanto, o
seu maior mérito, conforme dizia Roberto Campos, é ser este o processo
mais democrático que existe.
Sobre o autor - Administrador de Empresas e Diretor do Instituto Liberal
João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ,
profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto
Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero
Hora e Gazeta do Povo.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
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