Cumpriu-se a primeira etapa que vai livrar o Brasil do governo de Dilma Rousseff. Atingidos às 23h07 os 342 votos necessários, dois terços do total, a Câmara vai autorizar o Senado a abrir o processo de impeachment contra a presidente. Bruno Araújo do PSDB de Pernambuco foi o voto que marcou a vitória. O placar final foi: 367 votos pelo “Sim” à abertura do processo de impeachment, 137 contra, 7 abstenções e 2 ausências. O contraste é simples: trata-se de uma vitória da verdade contra a empulhação. Como chegamos até aqui? É importante começar a contar direito essa história agora, não depois.
E não! Nem todos os que votaram em favor do impedimento da presidente são pessoas que possamos convidar para o jantar. Mas, atenção! Essa não é uma questão nem íntima nem pessoal. Trata-se apenas de saber se a presidente cometeu crime de responsabilidade: sim, ela cometeu! Não um, mas uma penca.
Dilma não deixa de ser uma mulher de sorte: vai cair porque violou a lei orçamentária, incidindo no Inciso VI do Artigo 85 da Constituição. É o que está na denúncia aceita pela Câmara e agora referendada pelo plenário.
Com um mínimo de rigor, poderia ser acusada de transgredir os outros seis: atentou contra a existência da União, contra o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário; contra a segurança interna no país; contra a probidade administrativa e contra o cumprimento de ordens judiciais.
A mistificação foi vencida: não é e nunca foi um golpe. O terrorismo foi derrotado: o Brasil não vai para o abismo; ao contrário, renovam-se as esperanças. Um mito foi derribado de forma vexaminosa: junto com Dilma, também se desmancha uma estátua de areia chamada Luiz Inácio Lula da Silva.
Como chegamos aqui?
O resultado deste domingo não nasce do acidente, mas da determinação; não é fruto do acaso, mas da convicção; não decorre do reacionarismo estúpido e encarquilhado, mas do conservadorismo virtuoso, que jamais havia encontrado sua devida expressão nas ruas: o que está em marcha é a revolução dos conservadores das instituições democráticas.
E A PRÓPRIA IMPRENSA, ATENÇÃO!, TOMADA PELO ESQUERDISMO SEM IMAGINAÇÃO, ESTAVA E ESTÁ DESPREPARADA PARA INFORMAR O SEU PÚBLICO SOBRE O QUE REALMENTE ESTÁ EM CURSO. O JORNALISMO BRASILEIRO MODERNIZOU AS SUAS PLATAFORMAS FÍSICAS. FALTA AGORA MODERNIZAR AS IDEIAS.
O começo
O impeachment de Dilma Rousseff não começou a ser pensado nos partidos de oposição. Ao contrário até: inicialmente, eles se mantiveram distantes da movimentação das ruas. E, se querem saber, isso foi bom. Fazia-se necessário que novos olhares, novos discursos e novos anseios buscassem seu lugar nas consciências. Também o modo de se opor ao petismo havia chegado à sua miséria.
Este domingo começou a ser gestado quando grupos da sociedade civil como o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra Rua (VPR) resolveram se organizar e convocar a população a expressar a sua indignação: em ordem e em paz.
A primeira grande manifestação, no dia 15 de março de 2015, anunciava uma sociedade que queria mudanças. No terceiro mês do segundo mandato de Dilma, a esmagadora maioria dos brasileiros já havia se dado conta de que tinha sido vítima do maior estelionato eleitoral da história.
Estava claro que a presidente havia cometido crime de responsabilidade em seu primeiro mandato. Uma interpretação obtusa da Constituição, no entanto, referendada pela Procuradoria Geral da República e pelo próprio STF, impedia que fosse processada.
Mas quiseram a arrogância, a imprudência e a glória de mandar que os atentados à lei fiscal tivessem continuidade no segundo mandato. E não há um só especialista honesto que deixe de reconhecer o crime cometido. E foi ele que embasou a denúncia apresentada por Miguel Reale Jr., Janaína Paschoal e Hélio Bicudo. Casavam-se, assim, a higidez jurídica da denúncia com a questão política.
A primeira fase
E insisto no ponto: os movimentos surgidos na sociedade civil, como MBL e VPR, identificaram o descontentamento com muito mais rapidez do que as oposições oficiais: “A rainha cometeu um crime; cortem-lhe a cabeça!” Tanto é assim que lideranças oposicionistas se mantiveram a uma prudente distância dos protestos iniciais.
E eu saudei isso aqui. Consultem os arquivos. Onde muitos viam a fraqueza das ruas — “são desorganizados”; “não têm eixo”; “não têm uma hierarquia” —, eu via virtudes. Eu e quem se mostrava disposto a ver o novo.
A segunda fase
Se as ruas precisavam renovar o espírito das oposições formais, as estruturas formais da política precisavam conferir musculatura institucional aos movimentos de rua. E essa foi a fase mais difícil, mas delicada, dessa trajetória.
Foi preciso que o MBL e o VPR se aproximassem dos partidos de oposição e passassem a falar diretamente com os políticos, sem, no entanto, se misturar com eles. Não vai aqui um juízo negativo sobre os políticos, não. Ocorre que é preciso que a sociedade civil mantenha a sua identidade.
Estava claro que, sem essa parceria, não havia futuro para o movimento de rua. Nem as oposições formais conseguiriam vencer o aparato de propaganda do governismo.
Vencendo as hostes da desqualificação
Quando essa aproximação se deu, foi preciso vencer distintas e combinadas hostes de desqualificação. Foi necessário combater o preconceito da imprensa largamente contaminada pelo esquerdismo velho e burro, por mais jovens que sejam os militantes disfarçados de jornalistas.
Foi preciso enfrentar, como sempre, a patrulha das esquerdas organizadas. Mas essas já são velhas conhecidas.
E, ora vejam, foi preciso trombar com a direita cretina, mistificadora, estúpida e, sim, golpista, que acusava o MBL e o VPR de estarem se vendendo aos políticos.
Segundo esses trogloditas de Facebook, que pretendem comandar o mundo com um teclado nas mãos e algumas ideias tortas na cabeça, meia-dúzia de militares entusiasmados resolveriam a questão. Não odeiam a democracia menos do que o PT. Aliás, nada mais são do que o petismo com sinal trocado.
O MBL e o VPR tinham razão
Como está claro a esta altura, o MBL e o VPR tinham razão.
Tinha razão quando não esperaram que as oposições formais se mobilizassem para chamar a população para ocupar as ruas. Tinham razão quando advogaram um espaço próprio de militância política, que não se subordinava — nem pode se subordinar — à pauta dos partidos. E tinham razão quando decidiriam que era chegada a hora de trabalhar COM os políticos, não PARA os políticos.
A imprensa, com raras exceções, não entendeu nada e não entende ainda.
As esquerdas, como de hábito, não entenderam nada.
E a direita babona, para não fugir ao costume, babou o seu rancor e também não entendeu nada.
Encerro este post
O impeachment de Dilma Rousseff será o segundo da nossa história. Mas não se trata de uma repetição. Nem o primeiro foi uma tragédia nem esse é uma farsa. O evento que temos aí é único.
Sabem por quê? Collor foi deposto com o apoio unânime das esquerdas e da imprensa. E boa parte das manifestações de rua mobilizavam as correntes de opinião ditas “progressistas”. Havia muito pouca gente na rua que não carregasse bandeiras.
Desta feita, não! O impeachment se fez contra o espírito dominante nas redações e contra os movimentos embandeirados.
A população de verdade, que fala por si e não em nome de um partido, está depondo Dilma Rousseff. E jovens que, felizmente, nada devem às ideias mortas que oprimem o cérebro dos vivos tiveram a coragem de dizer: “Vem pra rua em nome de um Brasil livre”.
E a coisa se deu!
É a vitória dos conservadores de instituições democráticas.
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