O que vai fazer o nosso chanceler, ou melhor os chanceleres, o real e o nominal?
Imagino que, por seus instintos, escolheriam ficar do lado de Trump, o que seria um desastre, não necessariamente para o que pode acontecer em seguida. Independentemente disso, seria um desastre para nossa já arranhada credibilidade, para nossa já desgastada imagem internacional.
Um bookmaker inglês recomendaria, talvez, apostar na Lei de Murphy. Segundo esse tipo de especulador, nunca, ninguém, em qualquer época, perdeu dinheiro apostando na estupidez humana.
Segundo Einstein, por outro lado, existem duas coisas infinitas: a expansão do universo e a estupidez humana, e ele não tinha certeza quanto à primeira...
Paulo Roberto de Almeida
O Irã é, sim, assunto para o Brasil
Mas para entender, e não isolar o país persa
Se sobrou alguma vida inteligente no governo Bolsonaro, Israel ofereceu a ele uma bela oportunidade para sair das alucinações e da consequente paralisia. Pedir que o Brasil entre no complicado jogo do contencioso iraniano, como revelado nesta quarta-feira (15) pela Folha, é a chance para a diplomacia brasileira estudar o que fazer a respeito.
Para deixar claro: não se trata de o Brasil se alinhar automaticamente a Estados Unidos e Israel na ofensiva contra o Irã. Trata-se, isto sim, de definir uma política para a região. Não pode haver melhor momento para tanto, se se considerar o potencial explosivo da presente crise.
O Crisis Group, especialista em analisar crises e propor soluções para elas, faz um bom resumo do momento: "Um choque não é inevitável, mas bem pode ocorrer --deliberadamente ou como produto de erro de cálculo".
As consequências desse choque seriam calamitosas para os países da região mas também para a economia internacional, dada a alta dependência do livre fluxo de petróleo pelo golfo Pérsico.
Tudo o que o Brasil não precisa neste momento em que está no fundo do poço(segundo Paulo Guedes) é um conflito que sacuda a economia global.
Logo, entender o Irã é uma questão vital. Em primeiro lugar, cabe separar as perspectivas de EUA e Israel nessa questão. Para Israel, trata-se, sim, de uma ameaça existencial. O Irã dos aiatolás já fez incontáveis declarações de que gostaria de tirar do mapa o Estado judeu. Portanto, Israel tem mesmo que tomar todas as cautelas.
Já para os Estados Unidos, o Irã só é um problema no Iraque, mesmo assim porque a derrubada do governo de maioria sunita (de Saddam Hussein) levou a um país dominado pelos xiitas e, como tal, inevitavelmente sujeito à influência iraniana. É o que analisam, para Foreign Affairs, Steven Simon (Amherst College) e Jonathan Stevenson (Instituto Internacional de Estudos Estratégicos).
Mais: há aparente contradição entre o presidente Donald Trump, em tese pró-negociações desde que levem a um acordo talhado para os interesses de Washington, e seus assessores belicosos, Mike Pompeo e John Bolton.
Sanam Vakil, pesquisador da Chatham House, excelente centro britânico, procurou 75 analistas e formuladores de políticas de dez países (incluídos Irã e Estados Unidos), em busca de entender o quadro do contencioso.
Relatou também para Foreign Affairs que "alguns entrevistados, incluindo americanos, expressaram preocupação com a possibilidade de que Bolton e Pompeo minem o sucesso de qualquer discussão com o Irã".
Sugestão para o Itamaraty, se está interessado em algo mais do que as idiotices de Olavo de Carvalho: recuperar essa consulta da Chatham House. Fornecerá subsídios excelentes para entender o Irã.
Não é nada simples: se há divergências na administração americana, existem também no Irã, entre o moderado presidente Hassan Rouhani e a linha dura, conforme expôs para o israelense Haaretz Ariane Tabatabai, especialista no país persa.
Resumo da ópera: o Brasil deve, sim, atender ao pedido de Israel, mas não para participar do cerco ao Irã e, menos ainda, para estimular um conflito. Estudar o Irã é a melhor maneira —talvez a única— de distender uma situação com tanto potencial desestabilizador.
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