Hoje tive o prazer de receber não um, o mais recente, mas QUATRO livros editados pela LVM, todos eles sob o emblema unificado de "Breves Lições", ensaios organizados pelo professor Dennys Garcia Xavier em torno da vida e da obra de quatro grandes economistas liberais: Friedrich Hayek (também um filósofo), Hans Hoppe (igualmente filósofo e sociólogo), Ayn Rand (mais uma romancista e filósofa do que propriamente economista) e, sobretudo, Thomas Sowell, um livro que tive a honra e o privilégio de prefaciar.
Thomas Sowell é, possivelmente, um dos maiores economistas americanos vivos, e já
deveria ter recebido o Prêmio Nobel, não tanto por suas elaborações "matemáticas", mas sobretudo pelo seu imenso trabalho de "educação popular" nas mais variadas vertentes da economia, não só relativas a problemas tipicamente americanas, como o racismo, por exemplo, mas sobretudo pelo trabalho enciclopédico que ele desenvolve em escala universal, de "pedagogia econômica" num terreno que os franceses chamariam de haute vulgarisation, ou seja, traduzir fenômenos complexos em linguagem acessível ao leigo, ao leitor não especializado. Tenho vários livros dele, sobretudo o Thomas Sowell Reader, que é um compêndio de seus mais importantes ensaios e artigos de opinião, todos eles rigorosamente embasados num enorme conhecimento da história do mundo, em todas as épocas.
Dennys Xavier conduziu um trabalho primoroso de coordenação de ensaios sobre os grandes pensadores da liberdade em seus quatro livros até agora produzidos sobre esses gigantes da filosofia social de cunho liberal, até libertário.
Meu prefácio ao livro de Thomas Sowell começa por uma confissão: demorei muito tempo a descobri-lo, mas também quando o fiz, comecei a comprar os seus livros sequencialmente.
“Thomas Sowell: um intelectual completo”; Brasília, 12 julho 2019, 9 p. Prefácio a livro organizado por Dennys Garcia Xavier com contribuições de estudos sobre o grande economista americano por estudiosos do Brasil. Publicado no livro intitulado Thomas Sowell e a aniquilação de falácias ideológicas: Breves Lições, com organização de Dennys Xavier (São Paulo: LVM, 2019, 312 p.; ISBN: 978-6550520168).
Nele eu digo basicamente o seguinte:
"Um dos livros de Sowell que mais aprecio, porque talvez também combine com meu espírito contrarianista, é o seu famoso Economic Facts and Fallacies (2008), na verdade um tipo de abordagem que ele seguiu, invariavelmente, em muitos dos seus demais livros, em especial aqueles voltados a desmentir políticas distributivistas, ações afirmativas, supostos efeitos do racismo ou das disparidades sociais, demonstrando aos incautos, com base em certezas acachapantes, como nosso julgamento superficial sobre a aparente “racionalidade” de certas opções políticas não fazem nenhum sentido do ponto de vista da eficiência ou da consistência econômica. O frontispício dessa obra, uma citação de John Adams, deixa transparecer sua atitude básica em face de opiniões subjetivas ou de percepções de senso comum:
Fatos são coisas teimosas; e quaisquer que sejam nossos desejos, nossas preferências, ou os ditados de nossas paixões, eles não podem alterar o estado dos fatos e das evidências.
Paradoxalmente, ele trata os principais postulados econômicos como evidências de alcance geral, tal como revelado no título de seus livros mais conhecidos, e mais usados como text-books: Basic Economics: A Citizen's Guide to the Economy (2000) e Basic Economics: A Common Sense Guide to the Economy (3ª. edição, 2007). Em consonância com essa atitude inerente à sua metodologia, ele nunca hesitou em marchar contra a corrente, seja nas questões raciais – um tema especialmente delicado num país com remorso de seu apartheid passado, talvez nunca terminado, e que empreendeu uma cruzada nas ações “afirmativas” –, seja nos problemas de desigualdades de renda dentro e entre os países. Ele não apenas toma posição contra essas verdades de senso comum, que nada mais são do que pensamento politicamente correto envelopado em belas frases progressistas, como demonstra, com apoio em estudos empiricamente embasados, como a visão dos bem pensantes e das almas caridosas não passam no teste da realidade prática ou da eficiência econômica. Nisso ele se aproxima de um outro intelectual que também nadou contra a corrente durante a maior parte da sua vida: o francês Raymond Aron, tão denegrido em sua terra natal quanto, entre nós, Roberto Campos ou Eugênio Gudin, dois liberais clamando no deserto.
O debate econômico nos Estados Unidos – em grande medida graças aos grandes bastiões do liberalismo clássico que são os think tanks da linha hayekiana ou miseniana, e escolas de pensamento econômico como Chicago – nunca foi tão dominado pela vertente social-democrática quanto o foi na Europa continental, em especial na França e nos países latinos. Na França, por sinal, durante muito tempo se repetiu que era “melhor estar errado com Jean-Paul Sartre do que ter razão com Raymond Aron”, mas é também verdade que a praga do politicamente correto teve início nas universidades americanas para depois se espalhar como erva daninha por instituições congêneres de quase todos os países do mundo. Na América Latina, a chegada da praga foi mais delongada, pois o desenvolvimentismo estava na linha de frente do debate público, sujeito às controvérsias conhecidas e que foi abordado em várias das obras tipicamente econômicas de Sowell: como seria de se esperar ele recusa as teorias vulgares da dependência e da exploração como causas do atraso.
A maior parte das falácias econômicas é partilhada por pessoas não formalmente instruídas na teoria ou na história econômica. Mas mesmo economistas podem ser levados a defender algumas falácias simplesmente por ignorar certos fatos econômicos – a verdadeira obsessão de Sowell com a fundamentação empírica de todas as suas demonstrações – ou por operar um corte seletivo na realidade econômica, sem observar uma metodologia rigorosa que os teria levado a outras “descobertas” ou argumentos. No caso da América Latina, por exemplo, não só a opinião pública educada (entre elas políticos e acadêmicos), mas também economistas se deixaram seduzir pela “teoria”, aparentemente “comprovada pela evidência histórica”, da “deterioração dos termos do intercâmbio”, ou seja, a baixa relativa e contínua dos preços das matérias primas comparativamente ao valor dos produtos industrializados. O confronto tendências opostas entre preços de commodities e de manufaturas alimentou vários programas de industrialização substitutiva, com todas as consequências criadas pelo excesso de protecionismo e de dirigismo estatal nas décadas seguintes à disseminação dessa “teoria” a partir de suas fontes cepaliana e prebischianas. A França, por sua vez, é um dos poucos países do Ocidente avançado onde livros de economistas recomendando a adoção explícita e aberta do protecionismo recebem certa adesão entre colegas."
Eu recomendaria a todos os meus leitores que adquirissem não só o Thomas Sowell, mas os três outros: Hayek, Rand, Hoppe, pois os ensaios neles contidos – dezenas de brilhantes textos de intelectuais brasileiros – equivalem a uma grande aula de economia.
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