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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Impérios: longevidade e preeminência (ou hegemonia) - Paulo Roberto de Almeida

Impérios: longevidade e preeminência (ou hegemonia)

Paulo Roberto de Almeida

        Nunca houve nenhum império universal, apenas impérios regionais, embora alguns tenham tido longa dominação sobre territórios mais amplos do que o seu núcleo étnico e cultural original. Pensemos por exemplo no império chinês, mais de duas dúzias de dinastias ao longo de mais de 2.500 anos. Ou no Império Romano, mais 600 anos, entre República consular e Império monocrático. O Império Otomano também durou mais de 600 anos e quase conquista a Europa, a partir dos Balcãs: foram contidos em Lepanto, no Mediterrâneo, e às portas de Viena, assim como os árabes, bem antes, foram contidos nos Pirineus, mas contiveram os reinos cristãos da Europa no Oriente Médio (mais precisamente em Jerusalém, ou Palestina).

        Dinastias europeias, monarquias ou repúblicas, tiveram alguma projeção imperial em momentos diversos da história moderna e contemporânea, sobre partes do próprio continente e, separadamente, sobre imensas porções do mundo durante cinco séculos a partir das grandes navegações e “descobertas” marítimas: colonialismo e imperialismo foram as formas predominantes dos impérios europeus até o inicio do século XX: portugueses, espanhóis, holandeses, franceses, britânicos dividiram grandes porções do mundo, ao lado dos impérios territoriais russo e chinês, mas estes dois foram suplantados economicamente, tecnologicamente e militarmente pelos imperialismos da Europa ocidental, e até pelo “último chegado” fora do Ocidente, o império japonês.

O império americano teve uma ascensão fulgurante na passagem do século XX, mas tem no máximo cento e poucos anos, ao lado de dois outros impérios mais longevos, o russo e o chinês, com diversas mudanças estruturais em cada um deles, não tanto territoriais, mas em tipos de governança. No século XX, ambos assumiram o formato de um totalitarismo leninista, mas isso teve e tem nuances institucionais. Digamos que são despotismos burocráticos, por vezes ditaduras personalistas (Stalin, Mao, agora Putin e Xi).

        O império americano, relativamente democrático para dentro, se impôs sobre todos eles, inclusive sobre o “meio império” da Europa Ocidental (UE), e ainda permanece hegemônico dados seu potencial econômico, dominação tecnológica e cultural nos últimos 80 anos (coincidindo com o sistema multilateral contemporâneo, por ele mesmo criado e mantido de forma razoavelmente livre e aberta).

Isso agora parece estar mudando, por dois fatores não especialmente conjugados: a ascensão aparentemente irresistível do império chinês e o declínio da hegemonia americana, não necessariamente desafiada a partir de fora, mas produzida internamente. Por erros políticos grotescos dos EUA, os dois outros impérios subsistentes, o russo (predominantemente militar) e o chinês (essencialmente econômico e tecnológico), se aliaram contra a hegemonia americana, e parecem dispostos a implementar um projeto (até aqui largamente indefinido) de uma “nova ordem global multipolar”, com a eventual ajuda de alguns representantes do assim chamado “Sul Global” e, sobretudo, desse grupo em expansão agora denominado de Brics+.

        A atual e futura geopolítica mundial, baseada necessária e logicamente nos impérios existentes, ainda permanece indefinida em suas grandes linhas, mas analistas das relações internacionais falam cada vez mais da oposição (algumas vezes chamada de “segunda Guerra Fria”) entre o tradicional bloco Ocidental e o novo bloco dos regimes autoritários.

        Pretendo tratar desses contornos em próxima oportunidade, mas não poderia encerrar sem mencionar a postura do atual governo brasileiro — Lula 3 — em face dessa conformação de uma nova geopolítica, na verdade, por enquanto, uma simples contestação do ainda dominante (mas cada vez menos) “bloco ocidental”. Não existe ainda uma tomada de posição oficial no plano da política externa (em bases doutrinais ou pragmáticas), mas o chefe de Estado (e da diplomacia) já proclamou diversas vezes sua opção preferencial pela chamada nova ordem anti ocidental. 

        Pretendo abordar essa importante questão num futuro texto exploratório.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 28 de fevereiro de 2025

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