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domingo, 16 de fevereiro de 2025

Trump: o destruidor dos Estados Unidos e o coveiro do Ocidente - Paulo Roberto Almeida

Trump: o destruidor dos Estados Unidos e o coveiro do Ocidente

  

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre os efeitos passageiros da ignorância e da idiotice.

 

 

        Uma das leis mais inconsequentes do mundo é, ironicamente, a famosa lei das consequências involuntárias, ou seja, o fato de o promotor da ação acabar criando, suscitando ou provocando o exato oposto do que ele pretendia inicialmente. 

Em certas pessoas, especialmente dotadas e preparadas para expressar sua própria estupidez em toda a sua extensão, essa é uma lei, como diríamos antigamente, matemática.

        Trump exibe, para o gozo fabulístico dos deuses do Olimpo (que brincavam, como se sabe, de desafiar a vanidade dos mortais), essa qualidade, não muito rara nos políticos pretensiosos, de levar ao extremo essa lei feita sob medida para exaltar todas as suas péssimas qualidades, acumuladas ao longo de décadas no exercício contínuo daquele hobby que os americanos chamam de “self-deprecating”, ou seja, a arte de depreciar a si próprio. 

        Acredito que não exista ninguém no mundo da política mundial, nenhum personagem conhecido na história da humanidade, que seja tão desprezado entre as pessoas e políticos sensatos como o personagem laranja que veio para destruir tudo o que os Estados Unidos fizeram de bom nos últimos 250 anos de trajetória do nosso planetinha. (Sim, os EUA fizeram muita coisa de mal, de feio, de terrível, ao longo desses anos, mas, num balanço honesto da história da humanidade desde o século XVIII, o país que se chama a si mesmo, de forma arrogante, de América, exibe uma nota altamente benéfica, começando pelo fato de ter salvo duas vezes a chamada Europa ocidental dos malvados demônios que ela mesma criou ao longo dos dois últimos séculos e meio, sobretudo no decorrer da “segunda Guerra dos Trinta Anos”; a destruição insana da primeira Guerra dos Trinta Anos foi bem antes da fundação do “farol da democracia”).

        Trump sempre foi um trambiqueiro imobiliário especialmente hábil em extorquir dinheiro dos incautos e dos oportunistas que o elegiam para ganhos imediatos de reputação duvidosa; antes eram os próprios americanos que caiam nos seus fabulosos trambiques, mas desde alguns anos Putin, o espião-tirano de funestos antecessores (Stalin e Hitler são dois) soube valer-se de sua burrice fenomenal para extrair vários ganhos apreciáveis em uma carreira de também destruidor de sua própria nação. Trump lhe faz companhia pelo lado involuntário das ações que respondem à famigerada lei, mais comum do que se pensa.

        Depois de destruir vários negócios próprios, Trump se arvorou em salvador-destruidor dos Estados Unidos. Mas não só isso: não contente com a esfera privada dos negócios duvidosos, e francamente desonestos, e de começar a desmantelar o que restava da reputação dos EUA (depois do Vietnã e do Iraque), ele passou a desmantelar o Ocidente, e, podendo, metade do mundo também.

        Por uma dessas ironias da História, o pretenso reconstrutor do poderio da América e o “salvador do Ocidente” (segundo um chanceler acidental que tivemos por aqui) acabou se revelando como o diminuidor dos EUA e o destruidor do que restava da imagem do Ocidente civilizador, antes que os novos mandarins da civilização chinesa consolidassem a boa reputação do antigo Império do Meio.

        Ninguém — nem Hitler — conseguiu, sem alguma grande guerra (até aqui) destruir de maneira tão eficaz a noção de que o Ocidente moderno fosse o herdeiro das melhores qualidades do Iluminismo e do humanismo tenazmente erigidos em modelos ideais de padrões civilizatórios (os palestinos de Gaza que o digam).

        Trump conseguiu, segundo a famosa lei matemática, desmentir qualquer resquício de boas intenções que os impérios ocidentais pudessem ter adquirido para si próprios nos últimos 250 anos (grosso modo, uma história relativamente benéfica, que o historiador escocês Niall Ferguson resumiu em duas de suas obras, Empire, sobre o majestoso império britânico, e Colossus, sobre o envergonhado império americano).

        Tudo que Trump prometeu aos ingênuos e espertalhões que o apoiaram em sua trajetória nacional redundará no exato contrário anunciado por ele: deixará um país mais diminuído e bastante frustrado em suas mais caras ambições: ser grande, forte e poderoso novamente.

        E tudo o que ele intenta fazer em escala mundial será desastroso para a noção já algo desgastada de Ocidente e talvez proveitoso para tiranos à la Hitler (e sabemos de quem se trata) tentarem construir para si próprios.

Trump é bem mais do que um simples “aprendiz de feiticeiro”. Ele corresponde à imagem mais verossimilhante daqueles personagens de romances distópicos, que sonham conquistar o mundo, mas que precipitam catástrofes evitáveis (quando existem adultos na sala). 

        Trump está livre, por enquanto, de pessoas que possam contê-lo nas suas mais loucas empreitadas. Só nos resta esperar que a destruição do seu próprio país o impeça de cavar a sepultura do Ocidente em seu conjunto, que fez obra meritória desde o Aufklärung, cabe reconhecer.

        Se algo de bom foi construído pelo Ocidente nos últimos séculos foi a contenção do despotismo oriental como filosofia de governo, assim como o cristianismo e o budismo foram positivos, como filosofia de vida, desde a preeminência anterior e posterior de algumas crenças bárbaras. 

        Com atrasos e percalços, o humanismo acaba prevalecendo. Trump é apenas um acidente da História, como Hitler já o foi e como Putin já se revelou que o é, atualmente. Passará, como já passaram todos os tiranos, sobretudo porque exibe uma qualidade que os tiranos geralmente não têm: é um ignorante e um idiota, exatamente como prescreve a lei das consequências involuntárias.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4850, 16 fevereiro 2025, 3 p.

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