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sábado, 7 de setembro de 2013

A Megera Domada? Calma, nao se trata de Shakespeare, mas de algo muito pior...

A "megera domada" referida aqui é a Ata do Banco Central, ou melhor, do último Copom, que parece ter sido abduzida pelos magos keynesianos do cerrado central, uma tropa de choque que continua achando que impulso fiscal, ou seja, incitação ao consumo pelo estímulo à demanda sempre é bom para fins de crescimento.
O Banco Central já não fala mais grosso, mas pia fino, pois quem manda mandou ele calar a boca e se enquadrar no discurso otimista segundo o qual não existe perigo de inflação e tudo caminha pelo melhor no melhor dos mundos. Que coisa, gente: o BC está acovardado ou castrado?, escolham...
Paulo Roberto de Almeida

Esqueçam o que escrevi

06 de setembro de 2013 | 2h 08
Celso Ming - O Estado de S.Paulo
O Banco Central parece ter-se encolhido às lambadas recebidas da área econômica do governo.
Depois de passar meses denunciando "o balanço do setor público em posição expansionista", ou seja, denunciando as despesas excessivas do governo como causa importante de inflação, a Ata do Copom ontem divulgada mostrou plácido enquadramento não só ao sentido, mas até mesmo às expressões usadas pelas autoridades da Fazenda.
Ao longo das últimas semanas, em oposição ao Banco Central, presidido por Alexandre Tombini, tanto o ministro da Fazenda, Guido Mantega, como o secretário do Tesouro, Arno Augustin, vinham insistindo em que "a política fiscal é neutra" enquanto fonte de inflação. É o jeito de dizer que a política fiscal não joga nem a favor nem contra a alta de preços. De julho para cá, a percepção geral é de que as condições fiscais, se não pioraram, pelo menos não melhoraram. No entanto, o parágrafo 21 da Ata não só deixou de qualificar como expansionista a condução das despesas públicas do governo, como, também, comprou o discurso de Mantega e de Augustin: "Para o Comitê, criam-se condições para que, no horizonte relevante para a política monetária, o balanço do setor público se desloque para a zona de neutralidade".
Tudo se passou como se, depois das queixas internas de que se tornara fonte propagadora do pessimismo sobre a economia, o Banco Central tratasse de desfazer essa impressão.
De todo modo, como das outras vezes, continua apontando outros fatores de inflação. O primeiro deles, "a estreita margem de ociosidade do mercado de trabalho", cujo maior risco é o aumento de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade. É o emprego aquecido demais.
Um segundo fator é a "depreciação cambial" (alta da moeda estrangeira em reais), que a curto prazo tende a puxar os preços para cima. A cotação de referência do câmbio deixou de ser R$ 2,25 por dólar e passou a R$ 2,40 por dólar. Faltou quantificar o repasse à inflação esperado e o impacto sobre a alteração dos preços relativos não apenas desses 15 pontos adicionais na cotação do dólar, mas, também, o dos outros 25 que aconteceram nos meses anteriores.
O Banco Central também volta a acusar dois agentes que perpetuam a alta de preços: a inflação elevada que, por si só, induz à excessiva utilização de mecanismos de reindexação (correções automáticas de preços) que realimenta e aumenta a resistência da inflação. E "a piora da percepção", ou seja, o crescimento do desânimo.
A Ata não esclareceu se o governo pretende ou não reajustar os preços dos combustíveis, fato que teria impacto relevante sobre os preços.
Desta vez, o Banco Central não contribuiu para a boa administração das expectativas em direção a uma inflação mais baixa em relação à hoje percebida pelo mercado. Ao contrário, ao retirar sem maiores justificativas as denúncias sobre a falta de colaboração da política fiscal no combate à inflação e ao acentuar que o que antes era ruim passou a ser bom, sem que nada tenha mudado, reforça a convicção de que a política de juros voltou a se pautar por outros critérios e não exclusivamente pelo de provocar a convergência da inflação à meta (veja ainda o Confira).

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Brasil: a economia do mundo da fantasia - Celso Ming

Acredite se quiser

30 de agosto de 2013 | 2h 23
Celso Ming - O Estado de S.Paulo
O governo federal divulgou ontem a peça de ficção que tem-se repetido: o Orçamento-Geral da União. É ficção não porque contenha erros de avaliação, tanto de arrecadação quanto de despesa, mas porque trabalha propositalmente com variáveis destituídas de senso de realismo.
Lá estão previstos para 2014 um avanço do PIB de 4,0%; uma inflação de 5,0%; e uma cotação do dólar (taxa de câmbio) de R$ 2,19. Qualquer administrador de patrimônio que precisa trabalhar com parâmetros macroeconômicos confiáveis sabe que esses números não têm consistência.
Não muda as coisas quando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, adverte, como ontem fez, que "esses números não devem ser tomados como previsões porque o governo não pode adivinhar" e, por isso, começa de alguma base para depois ir ajustando. Mas, se eles são inconsistentes, que valor podem ter? O governo não quer apontar suas verdadeiras estimativas provavelmente porque ainda imagina que é melhor esbanjar otimismo, para talvez com isso influenciar o estado de espírito dos formadores de opinião. Infelizmente, o resultado vai na direção oposta.
As projeções com que lidam cerca de 100 consultorias, departamentos econômicos de empresas e bancos auscultados semanalmente pelo Banco Central para a Pesquisa Focus, são bem diferentes: crescimento econômico de 2,9%, inflação de 5,8% e cotação do dólar (em fim de 2014) de R$ 2,35.
Desde 2011 é a mesma coisa: o ministro Mantega começa projetando o avanço do PIB em 4,0% ou 4,5% e termina entregando uma fração disso. Foi de 0,9% em 2012 e o próprio Mantega já não espera mais de 2,5% em 2013.
Como de tantas outras vezes, também agora o ministro condiciona o bom desempenho da atividade econômica brasileira à melhora do cenário mundial. No entanto, as principais limitações estão aqui dentro: distorções na economia, rombo progressivo nas contas externas, inflação alta, investimento baixo, mercado de trabalho aquecido demais, altos custos de produção e um desânimo crônico, que é, ao mesmo tempo, resultado e causa de tudo isso.
Para dar alguma racionalidade a uma inflação em 2014 de apenas 5,0% (acima da meta de 4,5%, mas, ainda assim, abaixo de todas as projeções que estão por aí), o governo se compromete a deixar uma sobra de arrecadação para pagamento da dívida (superávit primário) equivalente a 2,1% do PIB. Mas 2014 é um ano de eleições. Se a administração das contas públicas não passa confiança em anos comuns, como acreditar que em 2014 seja tudo diferente?
Mais uma vez, vai sobrar para o Banco Central a tarefa de segurar a inflação hoje pressionada pela esticada do câmbio e pelo represamento dos preços administrados, especialmente o das tarifas dos combustíveis.
Se repetir nas duas próximas reuniões do Copom (outubro e novembro) a mesma dose de alta dos juros básicos (Selic) definida quarta-feira, ainda neste ano poderemos ter de volta os dois dígitos (de 10% para cima), até agora tabu no governo Dilma. E, mesmo se a opção for por um último ajuste na Selic (no ano) de apenas 0,25 ponto porcentual, os dois dígitos podem perfeitamente acontecer de janeiro em diante, principalmente se o Banco Central continuar perseguindo a convergência da inflação à meta.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Brasil: o problema do cambio nao e' o cambio - Celso Ming

Câmbio justo
Celso Ming
O Estado de S.Paulo, 21/08/2013

A disparada da cotação do dólar nas últimas cinco semanas (veja o Confira), de repente, generalizou a percepção, até mesmo entre os que defendiam forte desvalorização do real com o objetivo de dar competitividade à indústria, de que o câmbio foi longe demais e de que é preciso parar esse trem.
Segunda-feira, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, se sentiu na obrigação de advertir de que os negócios com moeda estrangeira vinham pagando um prêmio excessivo. O economista Luiz Gonzaga Belluzzo, um dos que vinham sugerindo um dólar mais caro para reequilibrar o setor produtivo, também passou a pedir que as autoridades fossem mais incisivas em segurar determinado patamar do câmbio, aparentemente à altura dos R$ 2,30, nem que para isso fosse necessário recorrer à centralização do câmbio.
Isso aí é como aquele segurança que fica à porta para dizer quem pode e quem não pode entrar na festa. A centralização exigiria que o Banco Central arbitrasse caso por caso quem pode comprar dólares e em que quantidade.
No Brasil há sempre aqueles que, mesmo no regime de flutuação suja, têm opinião formada sobre qual deve ser "o câmbio justo", conceito que não existe em Economia. Entre esses, há aqueles que olham para as agruras da indústria e determinam que, "no estado da arte", para dar um mínimo de previsibilidade à indústria, o dólar precisa estar cotado, digamos, a R$ 2,60. Essa abordagem não leva em conta que o problema pode estar no atraso tecnológico ou no custo Brasil e que, portanto, um câmbio desvalorizado reforça distorções.
Outros olham para o estrago provocado pela inflação tanto sobre o real quanto sobre o dólar e, em seguida, concluem que, para equiparar-se ao câmbio, suponhamos de 2005, a desvalorização teria de ser de pelo menos 40%, ou de outra magnitude qualquer.
Essas duas abordagens se esquecem de que o preço de uma moeda em outra moeda depende principalmente das proporções da oferta e da procura, nas duas pontas do mercado. Se o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) ao longo dos cinco últimos anos injetou US$ 3,4 trilhões nos mercados, é óbvio que a liquidez, ou a oferta de dólares, se alterou profundamente para mais, fator que tem de ser levado em conta. Por outro lado, a oferta de moeda estrangeira num determinado câmbio depende também da qualidade da economia local. Com os sucessivos crescimentos nanicos do PIB, com essa inflação de 6% ao ano, com as enormes distorções do setor produtivo e crescente perda de confiança, como agora, é compreensível que o fluxo de moeda estrangeira para o Brasil passe por estrangulamentos.
Se o governo quer o câmbio num determinado lugar, como na China, tem de ter condições para isso. Não é para o Brasil, que tem baixo nível de poupança, de 17% do PIB, uma fração da poupança chinesa, de 51% do PIB.
Mais uma vez, desembocamos no mesmo beco. O problema do Brasil não é o câmbio; são as mazelas da política econômica, a começar pela leniência com que são conduzidas as contas públicas, passando por sucessivos incentivos ao consumo sem contrapartida no aumento da produção. O problema não é o ímpeto dos ventos nem o tamanho das ondas; é a fragilidade da embarcação.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O Dr. Pangloss da equipe economica; nao o Candide, mas o Pangloss...

Candide é o inefável encarregado da economia em geral, que só aprendeu economia em geral, mas não necessariamente a economia em particular. Ele aprendeu com Celso Furtado e outros cepalianos que entre a inflação e a recessão monetarista, era melhor ficar com um "pouquinho" de inflação, de forma a estimular a economia, e ter mais emprego e renda. Pois bem, acabou ficando com mais inflação e menos crescimento, mas ainda assim acreditando que não foi assim tão mal.
O Dr. Pangloss, como abaixo retratado, acredita que a realidade é melhor do que a versão que transmitem delas os meios de comunicação (ah, essa mídia golpista...). Em qualquer país sério, o Dr. Pangloss já teria sido despedido do cargo. No primeiro ano de governo, em 2011, portanto, como que se desculpando por uma inflação mais elevada -- pudera, seus colegas da área fiscal nunca colaboraram -- ele prometeu que no ano seguinte, em 2012, portanto, a inflação estaria dentro da meta. Não esteve, como não está agora, quando ele promete uma convergência não linear em direção à meta. Alguém acredita nisso?
Pois, viveremos entre mentiras e visões róseas da realidade...
Paulo Roberto de Almeida

Pessimismo e realismo

CELSO MING

O Estado de S.Paulo, 07 de agosto de 2013

Ontem, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, tentou demonstrar a empresários em São Paulo que "a percepção da economia pelo mercado e pelos agentes econômicos é mais pessimista do que a realidade".
Tombini limitou-se a apontar áreas da economia, especialmente a dos investimentos, cujo comportamento vem sendo mais promissor do que o esperado.
O levantamento mais abrangente das expectativas do mercado é realizado justamente pelo Banco Central, por meio do Relatório Focus, que semanalmente apresenta as projeções (pelas medianas) de cerca de cem instituições financeiras, consultorias e outras empresas sobre os principais itens da economia.
Ao contrário do que afirmou Tombini, em geral, as expectativas do mercado são bem mais otimistas do que o que afinal acaba acontecendo. Foi essa a observação que fez dia 4 de agosto, na Folha de S.Paulo, o economista da FGV Samuel Pessoa, após acompanhamento atento das projeções e dos resultados ao longo de cinco anos (veja o Confira).
O mercado quer acreditar. E quase sempre aposta em que tudo vá melhorar. O problema é que essa percepção otimista acaba sendo entortada pelas pauladas diárias que o mercado e os empresários acabam levando.
Se Tombini quer mesmo criticar a falta de realismo sobre a avaliação da economia tem de começar pelo que acontece dentro do governo. O campeão das projeções cor-de-rosa é reconhecidamente o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que começou os últimos três anos anunciando um crescimento econômico entre 4,5% e 5,0% e vai amargando decepções. Em 2011, o PIB cresceu 2,7%; em 2012, ficou em 0,9%; e em 2013, ele mesmo agora reconhece, será apenas "melhor que 2012".
Na área fiscal, há meses não se consegue pinçar uma única afirmação consistente do ministro Mantega. Depois do grande vexame do final do ano passado, quando o secretário do Tesouro, Arno Augustin, submeteu as contas públicas de 2012 a mágicas contábeis, o governo garantiu que o superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) não seria inferior a 3,1% do PIB, ou a R$ 159,9 bilhões. De lá para cá, esses números foram emagrecendo e, a esta altura, o ministro Mantega não consegue explicar como ainda pretende apresentar um resultado de 2,3% do PIB. E vejam que esse PIB não é o das projeções do início do ano; é também o PIB desidratado que, em 2013, provavelmente terá um crescimento ao redor dos 2%.
Quando se trata de avaliar o avanço futuro dos preços, não há nenhuma projeção confiável do governo - a não ser as do Banco Central, que desistiu de afirmar que a inflação convergiria para a meta (de 4,5%) "ainda que de forma não linear". Há três semanas, por exemplo, a presidente Dilma avisou que a inflação fecharia este ano "na meta", quando se sabe que a meta a que se refere não são os 4,5% definidos em lei, mas estes acrescidos da margem de tolerância de 2 pontos porcentuais.
Não há quem possa seguir otimista se o governo avisa que não vai mudar sua Nova Matriz Macroeconômica, que deu errado.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Cambio: a obsessao eterna dos brasileiros, o inferno atual dos companheiros... - Celso Ming, Roberto Azevedo

Até onde vai o dólar?

CELSO MING - O Estado de S.Paulo, 6/08/2013

O governo Dilma mantém um discurso e uma política ambíguos em relação ao câmbio. O resultado é mais insegurança que, por sua vez, tende a elevar mais as cotações do dólar.
De um lado, o governo vem defendendo uma desvalorização do real (alta do dólar) relativamente forte para blindar a indústria contra a competição, em muitos casos, predatória por parte do produto importado. De outro, teme os efeitos inflacionários e seu impacto sobre o custo das empresas que hoje estão muito dependentes de suprimento externo pago em dólares. O resultado é uma política destituída de escolhas claras.
Oficialmente, o Banco Central só atua para neutralizar a excessiva volatilidade das cotações, embora nem sempre seja coerente com esse princípio. Nas últimas semanas, quanto mais promove leilões de venda de dólares para entrega futura, mais aguça a demanda. E as cotações sobem (veja o gráfico).
É difícil que um banco central de país emergente consiga reverter uma tendência firme do câmbio. Durante os últimos oito anos (até 2012), por mais que amontoasse reservas, o Banco Central do Brasil não conseguiu reverter a tendência à entrada maciça de dólares e, portanto, a certa valorização do real. Depois disso, o jogo virou e isso, em parte, tem a ver com o que ocorre no mercado global e, com as distorções internas.
A conjuntura é de revoada de dólares para os Estados Unidos. Por duas razões: primeira, porque o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) começa a manobrar para reverter sua política de maciça emissão de moeda. O resultado será a valorização do dólar e a fuga de capitais de áreas de maior risco, sobretudo dos emergentes. A segunda razão é a revolução do gás de xisto, ofertado a preços tão baixos que deverá atrair mais investimentos para o país.
Afora isso, há o esgotamento do boom das commodities e das matérias-primas, seja porque a China entrou num ciclo de desaceleração do crescimento, seja porque a própria valorização do dólar tende a baixar as cotações. Como o Brasil é grande exportador de commodities, será inevitável o impacto sobre as receitas em moeda estrangeira. Essa tendência ao escape de dólares para fora do Brasil é acentuada pelo manejo inadequado da economia para enfrentar as mudanças.
A política consumista da presidente Dilma produziu a disparada do rombo externo (déficit em Conta Corrente) que foi de US$ 54 bilhões em 2012 e se projeta para perto dos US$ 80 bilhões em 2013. E rebaixou artificialmente os preços dos combustíveis, o que estimulou o consumo, corroeu o caixa da Petrobrás, tirou-lhe capacidade de investimento, ajudou a deteriorar a conta petróleo e a alargar o déficit externo.
Como a prioridade do governo Dilma é garantir a reeleição, não há sinal de que os ajustes necessários serão feitos neste e no próximo ano. Mas o governo está cada vez mais sensível ao impacto da inflação, porque teme perder votos. Sem disposição para conter as despesas públicas e dados os limites da política monetária (alta dos juros), cabe perguntar até que ponto o governo estaria disposto a queimar reservas (veja o Confira) para evitar a excessiva desvalorização do real.
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Câmbio não será resolvido na OMC, afirma Azevêdo

MARIANA DURÃO
Agencia Estado06 de agosto de 2013
RIO - A questão cambial é um problema sério, mas não será resolvido no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) ou de outras organizações internacionais. A declaração foi feita nesta terça-feira, no Rio, pelo futuro diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, que assume o cargo em setembro, pelos próximos quatro anos.
"Não vamos encontrar uma solução sistêmica para o câmbio num organismo internacional. Isso terá que ser feito, se o for, no âmbito de chefes de Estado." O embaixador descartou que a OMC tenha instrumentos capazes de fazer ajustes cambiais e considerou difícil uma solução de curto prazo.
Azevêdo avaliou ainda que a reunião da OMC em Bali, marcada para dezembro, "não vai resolver todos os problemas", mas vai dar uma injeção de ânimo ao sistema multilateral e preparar terreno para a retomada das negociações da Rodada de Doha, estagnadas desde 2008. "O avanço nas negociações é possível, mas levará um tempinho. Bali vai ser importantíssimo para viabilizar a retomada dessas conversas."
Para Azevêdo, avançar nas discussões até Bali será um desafio enorme, mas não impossível. Ele citou boas perspectivas para propostas em pontos como facilitação do comércio, segurança alimentar e administração de cotas tarifárias. Ele rebateu críticas de que a OMC perdeu relevância em âmbito internacional e destacou o papel da entidade na solução de controvérsias. "A OMC vai continuar decidindo por consenso. No momento em que isso acabar, perde a relevância."
O embaixador disse ainda não ver problema no número de pontos envolvidos na Rodada de Doha. "O impasse que há é no pilar das negociações." Um dos desafios impostos, segundo ele, veio do aumento do vulto dos emergentes na economia global após a crise de 2008, aumentando as disputas por acesso a mercados e a visão dos desenvolvidos sobre esses países. "Isso muda a dinâmica das negociações em Genebra. Essa é uma divergência a meu ver ainda muito difícil de ser superada. Se queremos continuar as negociações da rodada, teremos que ser criativos. Vai tomar tempo e confiança."
Ele também reconheceu o aumento do protecionismo pós-2008, embora o classifique de moderado. Segundo a OMC, 80% das medidas restritivas tomadas no pós-crise continuam em vigor. Azevêdo participou de evento da Câmara de Comércio Americana do Rio de Janeiro (Amcham) e do Sistema Firjan.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Brasil: adivinhe quem produz volatilidade?; o proprio Governo - Celso Ming

Conhece aquela história dos capitais especulativos, de motel (como gostava de dizer um dos gênios econômicos deste governo) e que produziriam volatilidade na economia?
Pois bem: esqueça.
O principal responsável pelo caráter errático da economia brasileira é o próprio governo, com suas políticas econômicas esquizofrênicas, desencontradas, contraditórias...
Só não vê quem não quer...
Paulo Roberto de Almeida

Montanha-russa

CELSO MING - O Estado de S.Paulo, 02 de agosto de 2013
O desempenho da produção industrial medido pelo IBGE se transformou em montanha-russa. Junho apontou para um crescimento aparentemente forte, de 1,9% sobre o mês anterior que, no entanto, mostrara recuo de 1,8%. Os dados de julho não estão disponíveis, mas as indicações são de novo tombo (veja o gráfico).
Essa volatilidade sugere que se comparem estatísticas de prazo mais longo. E, no entanto, também elas não autorizam comemorações. Em todo o primeiro semestre, a produção industrial cresceu apenas 1,9% e, em 12 meses, 0,2%.
Difícil de discordar do pessimismo do diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp, Paulo Francini: "Não conseguimos enxergar sinais de recuperação", disse quarta-feira.
O único atenuante para o quadro pouco animador é o surpreendente desempenho da indústria de bens de capital (máquinas e equipamentos) que avançou 6,3% no semestre e 18% em 12 meses. Indica que os investimentos não pararam, o que se confirma com as estatísticas de importação (veja o Confira).
Os problemas de fundo são conhecidos e quase nada mudaram. Concentram-se na baixa competitividade do setor produtivo que, por sua vez, tem a ver com os custos altos demais, sobretudo dos impostos e dos juros; com a infraestrutura precária e cara; e com falta de abertura de novos mercados externos.
Em tese, a desvalorização cambial, de 15% nos últimos três meses, deveria devolver competitividade ao setor. Mas isso não está acontecendo, aparentemente pela forte dependência da indústria de fornecimentos externos: matérias-primas, componentes, máquinas e capital de giro (empréstimos externos).
Foi a razão pela qual ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou medida que reduz a alíquota do Imposto de Importação (tarifa alfandegária) de cerca de cem produtos. O objetivo declarado é compensar com menos imposto o aumento dos preços provocado pela alta do dólar no câmbio interno.
Em princípio, esta não é uma prática adequada. O Imposto de Importação tem funções regulatórias. Serve para calibrar o comércio exterior. Quando usado ou para arrecadar ou para fazer política de preços tende a provocar distorções. Se as tarifas estavam no tamanho adequado, uma redução leva a desequilíbrios no fluxo de mercadorias ou imediatos ou de médio prazo. Se não estavam, então teria sido necessário contemplar mais produtos. Além disso, como não podem alcançar todo o universo da pauta de importações, cortes pontuais causam desalinhamento de preços relativos. O barateamento de matérias-primas importadas para plásticos, por exemplo, pode prejudicar outros tipos de embalagem, como as de vidro ou de cerâmica.
No entanto, pouca coisa trava mais o desempenho da indústria do que a falta de confiança na economia. Quando pairam dúvidas, como hoje, sobre a solidez dos fundamentos; quando se vê que o governo não consegue levar adiante o que começa, como o processo de desoneração tributária; e quando o governo reage aos problemas com soluções improvisadas (puxadinhos) a recuperação fica mais difícil.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Total falta de confianca na politica economica esquizofrenica - CelsoMing

Confiança abalada
Celso Ming
O Estado de S.Paulo, 31/07/2013

Em dois dias, três índices diferentes, medidos por institutos diferentes, apontaram para uma forte redução da confiança no governo por parte do consumidor, da indústria e do comércio.
Há duas semanas, a presidente Dilma Rousseff, criticou os propagadores do pessimismo que azedam tudo e criam um ambiente ruim para recuperação da atividade econômica. E culpou os analistas da economia, sem precisar melhor o seu alvo.
O governo é incapaz de reconhecer seus erros na condução da economia, divulga só o que lhe interessa, maquia resultados e distorce fatos.
Nenhum estrago à credibilidade do governo foi maior do que as práticas argentinas do secretário do Tesouro, Arno Augustin, de submeter as contas públicas de 2012 a artifícios contábeis. Até agora, ninguém entendeu como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pode garantir um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida), em 2013, de 2,3% do PIB.
As contas públicas são opacas. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, admitiu em entrevista ao Estadão (21/7) que "a política fiscal não é clara". E, antes dele, o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto declarou ao Estadão (8/6) que a percepção do mercado é de que "a situação fiscal do Brasil é uma esculhambação". E, ainda ontem, o próprio Delfim advertiu que essa contabilidade criativa distorce as estatísticas da dívida pública líquida.
Também ontem, o economista-chefe do Grupo Credit Suisse, Nilson Teixeira, advertiu que, para a recuperação da confiança é necessário que o governo aponte o resultado real das contas públicas, "sem manobras contábeis".
O governo não apenas gasta demais, mas, sobretudo, gasta mal; investe pouco e administra pior ainda seus projetos de investimento. Em praticamente todos eles, temos a síndrome das obras de transposição do Rio São Francisco, que não terminam nunca e custam cada vez mais, para benefício sabe-se lá de quem.
Por que, por exemplo, a presidente Dilma insiste em afirmar que a inflação fechará este ano "na meta", quando se sabe que a meta de inflação é de 4,5% e não os 6,5% (que incluem a margem extra de tolerância) a que ela se refere? Todas as projeções apontam para uma inflação acima dos 5,5% em 2013. Por que não admitir que esse estouro é gol contra e não uma vitória sobre a alta de preços, especialmente quando se leva em conta a deterioração do poder aquisitivo do assalariado.
Não há comentário da área econômica do governo que não atribua os números ruins da atividade econômica aos graves problemas externos - que os analistas, é claro, acabam piorando com seu pessimismo. Apesar disso, também o governo garante que a virada vem vindo aí e que tudo vai melhorar, inclusive as avaliações da população em relação ao desempenho da presidente Dilma. Ora, se estamos mal porque o mundo vai mal, então como é que se pode esperar pela melhora, se os prognósticos são de uma piora do comportamento da economia mundial?
A maneira como o governo administra a economia e as contas públicas é parte essencial do problema da falta de confiança. E as críticas que lança a esmo contribuem para a prostração.

terça-feira, 30 de julho de 2013

A lampada apagada do governo federal: executivo anda tateando nas trevas - Editorial Estadao, Celso Ming

Nas histórias em quadrinhos, nas charges humorísticas, uma ideia genial, ou até qualquer ideia, é representada por uma lâmpada acesa acima da cabeça de quem a formula.
Pois bem, a julgar por essa simbologia, o governo só produz lâmpadas apagadas, ou lâmpada nenhuma.
Incapaz de ter alguma ideia sensata, qualquer ideia, o governo lulo-petista vem acumulando desastres econômicos sobre catástrofes anunciadas, deixando uma enorme herança maldita a ser paga por toda a sociedade durante anos a fio.
Pode até ser perseguição minha, ou do PIG, o Partido da Imprensa Golpista -- como os desonestos companheiros chamam qualquer imprensa independente, ou que não seja a eles subordinada e submetida -- mas o fato é que os companheiros não acertam uma...
Paulo Roberto de Almeida

Plano da conta de luz queimou

30 de julho de 2013 Editorial O Estado de S.Paulo
O governo está enrolado financeiramente em mais uma operação mal planejada, mal executada e concebida para objetivos errados - subsidiar a conta de luz para maquiar os custos e a inflação. Como falta dinheiro em fundos setoriais para pagar as indenizações devidas a empresas de eletricidade, o Tesouro tem de entrar em cena para pagar R$ 6,7 bilhões em quatro anos, segundo estimativa divulgada ontem pelo Estado. Com apenas uma iniciativa, anunciada em setembro do ano passado pela presidente Dilma Rousseff, o Executivo federal cometeu três erros: distorceu custos, disfarçou a inflação, empurrando para a frente um problema de enorme importância econômica, e sobrecarregou mais uma vez as finanças do setor público.
O governo decidiu no ano passado antecipar a renovação das concessões às companhias do setor elétrico. Uma das condições seria a redução média de 20% do valor das tarifas. A Cemig, a Cesp e a Copel, no entanto, recusaram a proposta. Por isso, o governo teve de assumir encargos maiores para garantir o benefício prometido a todos os consumidores. A situação ainda se complicou quando a seca, no fim de 2012, tornou necessário o uso da energia mais cara produzida por usinas térmicas. Seria preciso neutralizar também esse aumento de custo, para cumprir a promessa de reduzir a conta de eletricidade.
A maior parte do dinheiro para cobrir o subsídio deveria sair da Reserva Global de Reversão, criada para indenizar concessionárias no caso de suspensão do contrato. Com o novo plano, o dinheiro seria usado principalmente para financiar a nova e confusa iniciativa do governo. Havia R$ 15,2 bilhões disponíveis em janeiro. Em maio o saldo estava reduzido a R$ 6,4 bilhões. O valor atualizado, segundo estimativa extraoficial, é de R$ 2,4 bilhões.
Entre janeiro e maio, a Conta de Desenvolvimento Energético, destinada a financiar, entre outros, o programa Luz para Todos, foi reduzida de R$ 2,5 bilhões para R$ 223,3 milhões. Como essa conta era alimentada pelos consumidores, via conta de luz, a redução das tarifas praticamente extinguiu essa fonte. Em maio, R$ 2,5 bilhões saíram da Reserva Global de Reversão para esse fundo, em operação mantida em sigilo e recém-descoberta pelo Estado. Todos esses detalhes foram mostrados na reportagem.
Dos R$ 20 bilhões devidos às empresas participantes do plano de renovação antecipada, o governo pagou R$ 7,69 bilhões em janeiro e provavelmente - faltam informações atualizadas - mais R$ 3 bilhões até junho. O dinheiro disponível nos fundos setoriais é obviamente insuficiente para a liquidação do restante, com desembolso médio estimado em R$ 500 milhões por mês. A esse valor é preciso acrescentar uma remuneração de capital de 5,59% ao ano.
A aventura anunciada em setembro pela presidente Dilma Rousseff converteu-se em problema orçamentário, com graves implicações para os resultados fiscais. Isso explica a decisão do governo de antecipar o recebimento de recursos da Itaipu Binacional. Seria mais um truque para maquiar o resultado das contas públicas. Diante das críticas, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, já anunciou o abandono dessa ideia.
O balanço é inequívoco. Mais uma vez o governo se meteu em dificuldades ao cuidar de maneira errada de dois problemas importantes. Um deles é o alto custo da eletricidade para todos os consumidores. Esse é um componente importante do custo Brasil e um encargo muito pesado para a maioria dos consumidores. Além disso, o subsídio à conta de luz disfarçaria, a curto prazo, a inflação acelerada.
Em vez de atacar as causas dos problemas - o alto custo da energia, uma questão estrutural, e a aceleração dos preços ao consumidor, um desafio imediato -, o governo preferiu disfarçar a realidade. Como sempre, agravou os problemas ao tentar contorná-los. Nada se resolverá sem a execução eficiente de projetos para a produção de energia, sem a revisão dos componentes de custos (a começar pelos tributos) e, a curto prazo, sem um ataque mais firme às causas da inflação.
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Se eu quero, eu posso

30 de julho de 2013 | 2h 13
Os críticos da atual política econômica vêm apontando como principais causas dos desacertos tanto problemas de gerenciamento quanto barreiras de ordem ideológica.
Com algumas exceções, talvez não se possa falar propriamente de barreiras ideológicas, mas de posturas equivocadas de governo.
As resistências desta administração em chamar o setor privado a participar mais agressivamente de projetos de infraestrutura e de outros serviços públicos são provavelmente um dos poucos entraves de ordem ideológica propriamente dita. Mesmo depois de ter trombado tantas vezes com as limitações de recursos públicos, o governo Dilma ainda não superou antigos preconceitos contra quaisquer formas de privatização, inclusive as Participações Público-Privadas (PPPs) que muitos ainda insistem em chamar de "privataria".
Entre as posturas equivocadas do governo está a concepção de que mais importante do que a solidez dos fundamentos da economia é a vontade política, na base do "se eu quero, eu posso", em que a decisão transformadora supera qualquer obstáculo. Daí a enorme dose de voluntarismo que perpassa a administração Dilma.
Faz parte desse jogo a ideia de que basta garantir o avanço do consumo e aumentar a escala da economia para que o resto venha junto. Logo se viu que a criação de mercado interno por meio de políticas de transferência de renda não foi suficiente para puxar pela produção e pelos investimentos, porque os produtores nacionais estão atolados na baixa competitividade.
Outro equívoco dessa natureza foi a política de derrubada sistemática dos juros, prevalecente de agosto de 2011 a abril de 2013, independentemente das exigências da política de metas de inflação. O pressuposto foi de que ganhariam as contas públicas, pela queda do serviço (juros) da dívida pública, e ganharia a inflação, pela redução dos custos financeiros. Mas a política fiscal ficou defeituosa e a inflação disparou.
A postura voluntarista seguinte foi a de que, ao contrário do que aponta a maioria dos estudos sobre a matéria, valeria a pena sacrificar a inflação em benefício de mais crescimento econômico. O resultado, como advertiu no Estadão de ontem o ex-diretor do Banco Central Alberto Furuguem, foi apenas mais inflação.
Para tentar consertar distorções desse tipo, o governo Dilma apelou para expedientes de política de preços. Segurou e subsidiou os reajustes dos combustíveis, forçou a redução das tarifas de energia elétrica (que agora terão de ser cobertas com recursos do Tesouro), postergou e, agora, removeu a correção das tarifas dos transportes públicos e até mesmo usou certas reduções de impostos (como a dos veículos e dos aparelhos domésticos) para conter a inflação. Em seguida, vieram as distorções já conhecidas.
Não dá para deixar de enumerar entre as práticas voluntaristas do governo certos procedimentos de política industrial. O abuso das exigências de conteúdo local (instalações, bens de capital, peças e componentes a serem obrigatoriamente produzidos no País); a criação de reservas de mercado; e a escolha de campeões do futuro para receber subsídios, financiamentos a juros favorecidos e encomendas generosas também fazem parte dessa política.
Essas coisas produzem consequências. E entre elas estão as enormes distorções que travam o sistema produtivo e tiram eficácia da economia. 

sábado, 27 de julho de 2013

Brasil: economia fragilizada - Celso Ming


Embarcação frágil



Celso Ming
O Estado de S.Paulo, 26 de julho de 2013

A falta de compromisso com a solidez da economia por parte do governo Dilma é por si só um risco para os próximos meses, quando se esperam desdobramentos negativos na economia mundial.
Apesar dos inegáveis avanços no sentido de dar mais consistência institucional, o bloco do euro dá sinais insistentes de estagnação e de aumento dos desequilíbrios, sobretudo fiscais, para os quais ontem advertiu o Fundo Monetário Internacional (FMI). Também preocupa a fragilidade patrimonial dos bancos da área. Como carregam enormes volumes de títulos de dívida dos países da região, uma eventual deterioração das condições fiscais em certos países, que coloque em risco o resgate de dívidas públicas, pode exigir dos bancos ainda mais reforços de capitalização que, em última análise, pressionarão ainda mais as finanças públicas.
Mas o principal epicentro de turbulência provável é o impacto sobre os mercados a ser disparado pelo desmonte já anunciado da política monetária altamente expansionista do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos). Por mais cuidadosa que venha a ser, essa operação tende a provocar uma importante valorização do dólar e uma forte migração de capitais para os Estados Unidos.
O governo Dilma não está em condições de afirmar que a economia brasileira resistirá impávida a esses e a outros eventuais trancos, como aconteceu em 2008, quando sucessivas ondas de pânico, provocadas pela quebra do Lehman Brothers, chegaram ao Brasil "como uma marolinha" - como então alardeou o presidente Lula -, embora não tenha sido exatamente assim.
A economia brasileira apresenta hoje fragilidades preocupantes. Não consegue crescer mais do que 2% ao ano; enfrenta uma inflação anual renitente próxima dos 6%; vai aprofundando o rombo nas contas externas; apresenta uma política fiscal confusa e pouco previsível; e continua gerando custos que tiram competitividade da indústria.
Ainda assim, a embarcação brasileira apresentaria um mínimo de consistência, se o objetivo fosse enfrentar mar calmo e céu azul. No entanto, se confirmadas as turbulências que o próprio governo vem prevendo, nada garante o mesmo resultado.
Se lá fora, por exemplo, voltasse a quebrar um banco importante ou se outras forças provocassem forte aversão ao risco, a fuga de capitais do Brasil poderia ser letal, por mais robusta que esteja a posição em reservas externas. No mínimo, a economia teria de enfrentar novas altas do dólar no câmbio interno, com o devido preço a ser pago em mais inflação.
Até agora, a presidente Dilma não parece motivada a reforçar os fundamentos macroeconômicos e a produzir mais confiança. As decisões sobre política fiscal anunciadas na segunda-feira mostraram que as correções de rumo continuam superficiais e não passam firmeza. Não há nenhum interesse do governo federal em trocar o atual arranjo de políticas macroeconômicas, que não deu certo, por outro mais consistente, que inspire credibilidade.
A atual estratégia consiste em ganhar tempo, confiar na sorte e evitar convulsões que possam colocar em risco as eleições de 2014. É pouco.

domingo, 14 de julho de 2013

Brasil, o pais da meia-entrada, ou da boquinha - Celso Ming

Cadê minha boquinha
Celso Ming
O Estado de S.Paulo14 de julho de 2013
Desde 5 de dezembro, quem realizou cirurgia bariátrica (redução do estômago) tem direito a meia porção e/ou a desconto correspondente em qualquer restaurante de Campinas (Lei Municipal 14.524).
Em março, o ex-ministro Maílson da Nóbrega observava na revista Veja que, "pela mesma lógica, os restaurantes deveriam ser autorizados a cobrar o dobro dos obesos".
Esse caso de Campinas é uma ilustração de um estado geral de espírito e de cultura que há décadas permeia a sociedade brasileira. Segmentos de todos os tamanhos da população estão sempre à procura de uma vantagem especial dos governos.
Como já analisado pelo comentarista da Agência Estado, Fernando Dantas, é o fenômeno que o professor Samuel Pessoa, da Fundação Getúlio Vargas, chama de "país da meia-entrada".
São aqueles que se beneficiam das pensões vitalícias por morte; são os idosos que podem rodar no metrô e nos ônibus sem terem de pagar tarifa; os estudantes ou os aposentados que pagam meia-entrada no cinema; é o empresário que sempre espera subsídios para sua indústria e reservas de mercado para seus negócios; é a categoria dos jornalistas que arrancou uma lei que autoriza a se aposentar aos 30 anos de trabalho e não aos 35; é o chefe político que se julga no direito de usar jatos da FAB para ir a casamentos de amigos ou, então, no direito a financiamentos preferenciais da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil, que ele pagará, ou talvez não, quando der...
Muitos desses benefícios são justos ou encontram plena justificativa técnica. De mais a mais, os mecanismos de decisão política estão aí para arbitrar esses e outros direitos adquiridos.
O problema é que "no país da meia entrada" todos querem algum benefício equivalente, sem levar em conta que, justos ou injustos, esses benefícios acabam sendo pagos por aqueles que não podem escapar da fatura. Só é possível cobrar tanta meia-entrada no cinema ou em outras coisas da vida, se para os demais a entrada inteira custar mais, para compensar o que deixar de ser arrecadado. O passe livre, tanto quanto a educação pública e a saúde básica, não sai de graça. O contribuinte acaba sendo chamado a dar cobertura para essas despesas.
Não é possível democratizar plenamente boquinhas e meias-entradas sem democratizar também as contas a pagar. No cruzamento dessas faturas, a aritmética é inexorável, com uma agravante: esses processos de expansão de benefícios e de cobranças adicionais geram subsídios cruzados de baixa transparência. E, em tudo isso, sempre se criam distorções que, por sua vez, criam outras.
É como aquela rede de mecanismos de compensação de perda de renda (indexação), criada no tempo da megainflação. Eram os hábitos do dinheiro quente, que exigiam compras concentradas no dia do recebimento do salário (antes das remarcações de preços) ou impunham reajustes automáticos, de preferência diários, que tentavam proteger patrimônio e renda. A corrida para não perder demais da inflação se encarregava de realimentá-la, traste do qual a economia brasileira ainda não se livrou totalmente. O tiro mais certeiro nessa roda viva foi a criação da Unidade Real de Valor (URV), que transformou em moeda a própria indexação da economia.
Como reduzir a avalanche das meias- entradas a uma proporção aceitável é uma questão e tanto. Nenhum economista brasileiro se dedicou a criar uma URV para acabar com isso. Nenhum político apresentou projeto para disciplinar a concessão de tantas boquinhas.

Resultados do Mercosul: protestos sobre aviao e espionagem; e o comercio? - Celso Ming

Esqueceram do comércio?
Abandonaram de vez a economia?
Deixaram de lado as tarifas externas e a liberalização interna?
Nada sobre negociações comerciais relevantes?
Enfim, isso tudo é secundário e na verdade não tem a menor importância.
O principal, o urgente, o fundamental é reclamar dos europeus por causa do avião do Morales, e do Big Brother do norte que fica metendo o bedelho nas nossas comunicações.
É justamente isso aí que justifica, legitima, potencializa as reuniões presidenciais.
Afinal de contas, presidentes não precisam ficar tratando de assuntos menores, isso pode ficar para os burocratas.
Presidentes, e presidentas, tem mesmo é de se ocupar de questões importantes como essas...
Paulo Roberto de Almeida

Desfigurado

13 de julho de 2013 | 2h 09
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
Desta vez, a pauta política caiu das nuvens sobre o colo dos dirigentes do Mercosul, no encontro de ontem em Montevidéu, capital do Uruguai.
As denúncias e os protestos contra a espionagem sistemática dos Estados Unidos e contra a inexplicável interdição do avião do presidente Evo Morales, da Bolívia, na Europa foram o ponto alto das intervenções da reunião.
E isso tem o lado ruim, na medida em que o Mercosul vai perdendo de vista seu principal objetivo, que é a integração econômica e comercial, para se tornar um organismo político de eficácia duvidosa.
Antes que alguém possa ter um entendimento equivocado sobre o que ficou dito, convém pontuar que a política de espionagem sistemática do Grande Irmão, exercida pelo Prêmio Nobel da Paz, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, merece o repúdio dos governantes e das instituições. Mas, decididamente, o Mercosul não é o fórum adequado para o que tem de ser feito.
Há questões econômicas e comerciais relevantes a discutir e colocar em ordem. A Argentina, por exemplo, vem impondo travas injustificáveis ao comércio intrabloco, que pelos tratados precisa ter livre fluxo.
A Tarifa Externa Comum (TEC), o conjunto de tarifas alfandegárias que incidem sobre mercadorias de fora do bloco e que teriam de ser uniformes para os países sócios, está hoje inteiramente desfigurada. O presidente do Uruguai, José Mujica, já observou que a TEC "virou um chiclete".
A integração comercial dentro do Mercosul não só deixou de evoluir; está em retração. Pior ainda, as negociações do bloco com o resto do mundo seguem bloqueadas. A condição de união aduaneira implica união comercial. Impede que cada um dos seus membros negocie acordos comerciais em separado com outras áreas e outros parceiros comerciais.
Com isso, o Brasil não consegue nem sequer abrir negociações. É um dos fatores que vêm fechando mercados para a indústria, num momento em que outros países seguem acertando acessos preferenciais entre si. Esta é a ocasião em que os dois maiores mercados do mundo, Estados Unidos e União Europeia, por exemplo, negociam o maior acordo de abertura comercial do Planeta. Também se forma agora outro bloco latino-americano, a Aliança para o Pacífico, que engloba México, Chile, Peru e Colômbia, com muito mais dinamismo que o Mercosul. E sempre que se abre preferência à indústria dos outros, a indústria nacional é que sai perdendo.
A solução imediata para o Mercosul, não custa repetir, é seu rebaixamento temporário à condição de área de livre-comércio, estágio de integração anterior ao da união aduaneira, que está longe de ter sido completado. Teria por objetivo liberar cada um dos seus membros para novas negociações, essenciais para garantir mercado e competitividade para a indústria.
Na falta de ações concretas, as cúpulas do Mercosul vêm-se limitando a ser encontros destinados à foto tradicional, à produção de espuma e a alguma performance política, quase sempre de impacto insignificante, porque destituída de densidade econômica.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Agendas confusas para um governo mais que confuso, atarantado - Celso Ming

Em defesa do governo

11 de julho de 2013 | 2h 07
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
A ideia do PT para as manifestações de hoje, no "Dia Nacional de Lutas" convocado pelas centrais sindicais, seria aproveitar a oportunidade para fazer a defesa do governo. Seria dar uma resposta aos protestos populares de rua que tomaram o País desde o início de junho. Mas, afinal, quais seriam as bandeiras que poderiam ser defendidas hoje, como quer o PT?
A primeira reação da presidente Dilma às manifestações, que ficou sem defesa, foi o lançamento de um conjunto de cinco pactos nacionais, que ninguém mais lembra quais são, até porque o governo não os vem retomando. Ah, sim, o primeiro da lista é o Pacto Fiscal. Mas, como brandir palavra de ordem pelo pacto fiscal, se esta é uma das políticas mais questionadas do governo, especialmente a partir de dezembro, quando inventou e aplicou sobre as contas públicas a tal contabilidade criativa?
A segunda resposta da presidente Dilma à crise nasceu morta. Foi a ideia da criação de uma Constituinte com plenos poderes para definir uma reforma política. Não haverá nenhum cartaz com essa proposta.
A que veio quase junto com essa foi a convocação de um plebiscito, com o objetivo de colocar em vigor uma reforma política ainda antes das eleições do ano que vem. Embora viesse sendo sustentada como "ponto de honra do PT", a ideia foi enterrada pelo Congresso.
Vai ser difícil também incluir na agenda das lutas sindicais a contratação de milhares de médicos estrangeiros e a imposição de trabalhos forçados por dois anos aos formandos em Medicina, como acaba de anunciar o governo.
Bandeira popular poderosa é o "diga não à inflação". A escalada dos preços foi um dos principais fatores que mobilizaram tanta gente. A reivindicação pelo fim do reajuste dos transportes coletivos está intimamente relacionada aos estragos no poder aquisitivo provocado pela forte alta de preços. No entanto, como dizer não à inflação sem exigir enormes mudanças na política econômica? Ninguém mais é capaz de sustentar que a inflação brasileira seja causada por fontes externas. A crise global colocou a inflação no chão. A inflação brasileira é coisa nossa e tem a ver com mazelas nossas, especialmente com a política fiscal expansionista do governo, como vem repetindo o Banco Central do Brasil.
E aí chegamos à última hipótese: a de que o Dia Nacional de Lutas saia em defesa da atual política econômica, ou seja, da "Nova Matriz de Política Econômica" colocada em prática pelo governo Dilma. Ocorre que, pela qualidade dos seus frutos, já sabemos que esta é uma árvore má, difícil de defender. Produziu a conhecida sucessão de pibinhos, atirou a inflação no teto da meta, provocou rombos enormes nas contas externas e deixou a indústria de cócoras. Estragos demais para contrapor aos propalados gols a favor: consumo robusto, pleno emprego e desempenho estupendo do agronegócio, que os companheiros do PT não apreciam.
Quer dizer, ou o Dia Nacional de Lutas retomará temas sindicais, como a redução da jornada de trabalho e o fim do fator previdenciário, ou repetirá as bandeiras das manifestações populares e, então, a política econômica será criticada. Ficará complicado apoiar a agenda da presidente Dilma.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Mais inflacao, menos crescimento: havera plebiscito para isto?

O governo está se enrolando todo no tal de plebiscito da reforma política; os feiticeiros do Planalto nem sabem o que perguntar ao povo, essa entidade mítica capaz de compreender, num átimo, a diferença entre voto proporcional, distrital, distrital misto, listas fechadas, abertas, financiamento público exclusivo, parcial, privado, etc, enfim, essas coisas fáceis de responder por sim ou não.
Que tal se ele perguntasse se a população quer voto obrigatório ou livre, ou seja, facultativo?
Mas o governo também poderia perguntar se o povo quer mais ou menos crescimento, se ele quer mais, ou menos inflação. Acho que o povão perceberia melhor onde está o seu interesse.
Um governo incapaz de responder a estas perguntas simples, não merece organizar plebiscito nenhum.
Paulo Roberto de Almeida

Em deterioração

O Estado de S.Paulo, 27 de junho de 2013
Celso Ming

O Banco Central está fazendo certo esforço para recuperar credibilidade e voltar a conduzir as expectativas de inflação, tarefa que vinha prejudicada. E começa a conseguir, apesar da adoção de critérios discutíveis e das lacunas de comunicação.
O Relatório de Inflação divulgado nesta quinta-feira é o oposto da visão rosicler que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, expôs no dia anterior, no Comitê de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.
O Banco Central admite que a inflação segue em deterioração. Além de crescente, está muito espalhada (“alto índice de dispersão”). Mas nega que esteja fora de controle. Ao contrário, afiança que a política monetária (política de juros) continuará sendo inexoravelmente acionada para conter a velocidade da alta.
As causas da inflação para o Banco Central são as mesmas apontadas há alguns meses: despesas excessivas do governo (“política fiscal expansionista”), demanda forte demais em relação à oferta e mercado de trabalho aquecido, que puxa os salários mais do que comportaria o aumento da produtividade do Trabalho.
De abril para cá, muita coisa mudou na atitude do Banco Central. Antes, vinha com conversa muito parecida com a que ainda mantém o ministro Mantega. Afirmava com todas as letras que a inflação era fenômeno temporário e que, mais adiante, confluiria mais ou menos naturalmente para a meta de 4,5% ao ano. Agora, fique bem entendido, a inflação só recuará à custa de aplicação dos corretivos.
No entanto, mantidas as coisas como previstas até agora (câmbio a R$ 2,10 por dólar e juros básicos a 8,0% ao ano), a inflação terminaria 2013 no nível dos 6,0%, portanto acima dos 5,84% em que ficou em 2012, e acima da meta de 4,5%. Não tem razão o ministro Mantega quando afirma que a inflação está recuando.
O Banco Central omitiu-se na avaliação do tamanho do repasse da alta do dólar sobre a inflação, no momento uma das principais causas de alta dos preços. O diretor de Política Econômica do Banco Central, José Hamilton de Araújo, limitou-se a dizer que o fator câmbio já não tem a mesma força de tempos atrás. Em todo o caso, disse ele, esse repasse deve ser hoje em torno de 6% a cada 12 meses. Ou seja, para cada 10 pontos porcentuais de alta do dólar em 12 meses, a inflação, no mesmo período, aumenta 0,6 ponto porcentual. Nos últimos 12 meses, até esta quinta-feira, o dólar ficou 5% mais caro em reais.
Ficou estranho que o Banco Central tenha incluído nos seus cálculos o impacto da baixa das tarifas dos transportes coletivos, mas não tenha incluído a alta do dólar.
O Banco Central reviu as projeções de evolução do PIB deste ano. O crescimento não será mais de 3,0% (segundo estimativa do Relatório de Inflação de março), mas de 2,7%.
Embora o Banco Central trabalhe hoje com mais realismo, não dá para embarcar de olho fechado nas suas projeções. Todas elas (de inflação, contas públicas, avanço do PIB e rombo nas contas externas) vêm sendo sistematicamente revisadas para pior e não se sabe até quando.
Os juros básicos continuarão subindo porque o governo não faz o suficiente para controlar a inflação.
CONFIRA:
Aí está a evolução do IGP-M em 12 meses.
A força do atacado. A escapada do IGP-M em junho, de 0,75% sobre maio, quando foi de zero por cento, mostra que há nova safra de inflação em formação. O IGP-M tem forte participação dos preços no atacado (60%) e um avanço desse componente tende a ser repassado para o custo de vida, medido pelo IPCA. A alta está relacionada com a esticada das cotações do dólar no câmbio interno. É o que transparece, também, no crescimento dos preços agrícolas no mercado atacadista.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Onde estao os que propunham desvalorizacao cambial? Sumiram? - Celso Ming

As consequências sempre vêm depois, já dizia um filósofo popular (não me perguntem quem).
Pois é, os luminares da economia competitiva -- sejam eles os da FIESP, o Bresser Pereira, os economistas keynesianos de botequim -- tanto pediram desvalorização do câmbio que ela veio, sem avisar, assim meio sorrateira, mas decisiva, o que já empurrou o real lá para baixo, e o dólar lá para cima.
Acharam que seria bom para todos: para os exportadores, para os industriais, para os consumidores (ao premiar a produção nacional e, portanto, o emprego) e sobretudo esses economistas que sempre prevêem catástrofes quando o real está muito valorizado.
Eles gostam de povo pobre, e de economia desvalorizada.
Enfim, quase não pensaram na inflação.
Agora aí está o governo, que antes reclamava da guerra cambial, e do tsunami monetário, que valorizava a nossa moeda, que passou a reclamar da valorização "excessiva" do dólar.
O castigo vem a cavalo, se dizia antigamente. Agora acho que vem nas telas dos computadores, e nas bancas de feiras, por mais humildes que sejam...
Paulo Roberto de Almeida

O fator câmbio

27 de junho de 2013 | 2h 07
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
A disparada da cotação da moeda estrangeira no câmbio interno passou a ser um dos maiores focos de inflação. Falta saber o tamanho dessa conta, que, afinal, será repassada para os brasileiros.
Um dólar mais caro, é fácil entender, aumenta em reais os preços dos produtos importados e as dívidas em moeda estrangeira. Mas há um número considerável de itens aqui produzidos e também consumidos internamente que são cotados em dólares. São, em geral, as commodities, mercadorias cujos preços são formados em dólares no mercado internacional, como soja, milho, café, alumínio, cobre e fertilizantes.
Sempre tem gente que estranha explicações de que os preços dos ovos e da carne de frango ou de porco estejam subindo em consequência da alta do dólar. No entanto, frango e porco são organismos vivos que transformam proteína vegetal (soja e milho, principais componentes das rações animais) em proteína animal. Como soja e milho são commodities cotadas em dólares na Bolsa de Chicago, lá vai o câmbio para os preços da omelete, do frango assado e da linguiça.
Nos últimos anos aumentou a dependência brasileira dos importados. Em vez de produzir aqui dentro, a indústria achou mais conveniente intensificar a importação de máquinas, componentes, peças, capital de giro e tantas coisas mais. A Zona Franca de Manaus, por exemplo, não passa hoje de uma zona de processamento de importações. Limita-se quase exclusivamente a montar aparelhos eletrônicos, eletrodomésticos e motocicletas a partir de peças, chips e componentes importados, pagos em dólar. O impacto da alta do dólar sobre o custo do produto final será inevitável, tanto mais quanto maior for a dependência de fornecimentos externos.
O cálculo do impacto da oscilação do câmbio nos preços, aquilo que naquela linguagem empolada os economistas chamam de pass-through (repasse) é um exercício complicado, sempre sujeito a erros. Hoje, os analistas tendem a concluir que cada dez pontos porcentuais de alta ou baixa do dólar no câmbio interno produz 0,70 ponto porcentual de inflação mais alta ou mais baixa ao longo de um tempo.
Quando roda seus computadores para definir o tamanho dos juros básicos para empurrar a inflação para dentro da meta, o Banco Central tem de avaliar qual o impacto do câmbio na formação dos preços da economia. No Relatório de Inflação do primeiro trimestre, editado em março, o Banco Central trabalhou com um câmbio médio, em 2013, de R$ 1,95 e projetara uma inflação para o ano de 5,7%. Na última Ata do Copom, já havia revisto esse número para R$ 2,05. De lá para cá, o câmbio deu uma esticada de 8,3% e ainda não se estabilizou, fator que complica as novas projeções.
Hoje sai nova edição do Relatório de Inflação em que se espera que o Banco Central organize com mais clareza todos esses números que, por sua vez, devem definir a dosagem da alta dos juros, que tende a ficar próxima dos 10% ao ano no final de 2013.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Governo enxugando gelo, tratando dos efeitos, nao das causas - Celso Ming

E as questões de fundo?

25 de junho de 2013 | 2h 10
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
Tanto o governo federal como os estaduais apressam-se a atender a algumas das reivindicações apresentadas nas manifestações que acontecem há três semanas pelo Brasil. O risco é de que se limitem a resolver apenas os problemas imediatos e não os de fundo, que são as distorções da economia, como os gastos públicos desordenados e a inflação.
Na semana passada, em ação coordenada pelo governo federal, governadores e prefeitos trataram de cancelar os reajustes da condução. Em São Paulo, por exemplo, o aumento de R$ 0,20 nas tarifas de ônibus e metrô foi sumariamente cancelado e não apenas adiado, como já tinha sido. E, ontem, o governador Geraldo Alckmin antecipou-se às manifestações e tratou de cancelar novo reajuste do pedágio.
Além disso, a presidente Dilma, governadores e prefeitos se dispuseram a dialogar com as lideranças dos movimentos para terem melhores condições de atender às reivindicações. Paralelamente a essas iniciativas, aumenta a pressão para resolver as principais questões políticas mostradas pela rua, como a falta de representação dos jovens e das novas classes médias nos fóruns de decisão política e econômica. Daí as inúmeras declarações de que deva ser necessário apressar a reforma política, pleito com que ainda no período Lula o governo já se havia comprometido, mas ao qual não deu seguimento.
São providências necessárias e, até certo ponto, inadiáveis. Portanto, têm de ser levadas adiante. No entanto, infelizmente, não se vê a mesma disposição das autoridades em atender às mais importantes questões econômicas de fundo, que são as causas do descontentamento.
No discurso de sexta-feira em cadeia de rádio e TV, a presidente Dilma não se referiu a nenhuma das questões econômicas que permeiam a falta de confiança e a insatisfação da sociedade.
É óbvio que os reajustes das tarifas de condução não são o problema principal. Ele está na inflação que impôs os reajustes. A inflação, por sua vez, voltou a disparar em consequência de outros desajustes, sobre os quais até mesmo o Banco Central tem se manifestado reiteradamente e que permanecem sem resposta.
No pronunciamento de sexta-feira, a presidente Dilma não fez nenhuma referência, nem explícita nem implícita, às causas econômicas dos atuais distúrbios políticos e sociais. Isso não significa que as ignore. Mas, à falta desse foco, a sociedade corre o risco de que as doenças subjacentes permaneçam sem tratamento.
A simples eliminação dos reajustes da condução e do pedágio, por exemplo, tende a aprofundar os atuais desequilíbrios orçamentários. As receitas serão mais baixas e as subvenções tendem a aumentar. Como o impacto sobre a atividade econômica tende a ser ainda mais acentuado pelo crescimento mais baixo, as receitas públicas sofrerão ainda mais. E, se a tudo isso se juntar a crescente deterioração da confiança no governo, então estamos diante de um quadro que exige bem mais atenção das autoridades do que a que vem sendo dispensada. Ontem, a presidente Dilma anunciou a amarração de um Pacto de Estabilidade Fiscal. Pode ser um bom recomeço, embora não se saiba ainda o que isso significa.

domingo, 23 de junho de 2013

Oui, apres mois le deluge, et sauve qui peut - Celso Ming

Déficit de credibilidade

CELSO MING

O Estado de S.Paulo, 23 de junho de 2013 

De nada serviu à presidente Dilma adotar certas práticas da presidente Cristina Kirchner e chamar os críticos de sua política econômica de terroristas. Ela já deve ter elementos para entender que seu governo enfrenta sério déficit de credibilidade.
Ao longo dos dois últimos anos se atirou ao desmonte dos fundamentos da economia que haviam dado certo nos anos anteriores. O compromisso com uma política fiscal responsável foi substituído por uma sucessão aleatória de contratação de despesas públicas destituídas de um programa estratégico que lhes desse solidez. As metas passaram a ser atropeladas por resultados construídos por truques contábeis. E o resto é opaco. Ninguém entendeu, por exemplo, como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, vai construir o prometido superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) de 2,3% do PIB.
As manifestações que tomaram as ruas das grandes capitais questionam os critérios que determinaram as prioridades das despesas públicas. O governo do PT, que lá atrás pregava as excelências do orçamento participativo, conduz suas pautas de uma maneira errática, à base de desonerações temporárias e discriminatórias e de transferências de dezenas de bilhões de reais do Tesouro para o Banco do Brasil, para a Caixa Econômica Federal e para o BNDES.
Até agora, os estragos provocados pela inflação no orçamento do trabalhador foram considerados irrelevantes. O importante era perseguir o "pibão grandão", que não acontece. A escalada de preços foi entendida como consequência de choques externos, de impacto temporário. A política monetária (política de juros) que deveria ater-se a levar a inflação à meta de 4,5% ao ano, foi reorientada para perseguir uma meta de juros. A obsessão da presidente Dilma foi derrubar os juros reais (descontada a inflação) para o nível dos 2% ao ano, não importando se as condições o comportavam.
Mas o momento não é só de desarrumação das contas públicas e de impacto inflacionário. É também de deterioração das contas externas. O rombo nas contas correntes (comércio exterior de mercadorias e serviços mais transferências unilaterais) passou de 2,4% para 3,2% em apenas cinco meses (veja o Confira). E, pior, tende a alargar-se para acima do afluxo de capitais de investimento. Esse é o principal fator que vai puxando as cotações do dólar para o alto.
Ainda na quinta-feira, o governo Dilma desmentiu categoricamente a substituição de peças-chave no comando da política econômica, como manobra destinada a recuperar credibilidade. Não basta a simples troca de nomes. É preciso primeiro admitir a substituição do atual arranjo experimentalista de política econômica por outro que garanta estabilidade e confiança.
Até agora, o governo Dilma descartou peremptoriamente quaisquer mudanças radicais de rumo. A opção foi ir tocando as coisas, do jeito que der, de maneira a não colocar em risco a recondução da presidente Dilma a um segundo mandato nas eleições de 2014. Mas essa é uma aposta em que nenhuma reviravolta política acontecerá até lá. As manifestações pelo País parecem dizer o contrário.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

A percepcao geral e' a de que a política fiscal do governo Dilma e' uma bagunca - Celso Ming

Essa é a consequência da ideologia aplicada à política econômica: excesso de "furtadismo" -- o economista que achava que um pouco de inflação não fazia mal, e que era melhor isso do que desemprego -- e de keynesianismo de botequim (por vezes de hospício) redundaram nisso que estamos vendo: baixo crescimento, alta inflação, queda do equilíbrio fiscal e de transações correntes, enfim, ameaça de descontrole econômico grave, gerando aceleração da inflação, fuga de capitais, mais inflação, e depois crise generalizada.
Não que estejamos prevendo tudo isso, mas já vimos esse filme antes, e ele não termina bem.
Tudo isso em função da incompetência do governo -- e dos seus dirigentes máximos em matéria de economia -- em lidar com a dinâmica do jogo econômico, que eles não percebem e não sabem administrar.
Primeiro, não sabem nem fazer um diagnóstico correto da situação.
Segundo, aplicam o remédio errado para o diagnóstico errado.
Parece que estão colocando mais gasolina no fogo.
Gente brilhante...
Paulo Roberto de Almeida

Hora de mudar

CELSO MING

O Estado de S.Paulo, 20 de junho de 2013

Se foi mesmo sincera quando, ao elogiar as manifestações e suas reivindicações por mudanças, garantiu que fará essas mudanças, a presidente Dilma tem de começar a mudar o diagnóstico e o tratamento que vinha dando à inflação.
Embora não se saiba onde e como vão desembocar, os protestos começaram com a revolta com o reajuste de R$ 0,20 nas tarifas da condução cobradas em São Paulo.
Ora, o problema não é o reajuste, ontem revogado. É a inflação, que exigiu o reajuste. Ela vem corroendo o poder aquisitivo e em algum lugar do bolso do consumidor teve mesmo de começar a pressionar.
Um eventual recuo dos administradores na cobrança desse reajuste, como já aconteceu em São Paulo e em outras sete capitais, não resolve o problema central. Vai continuar faltando salário antes de chegar o fim do mês.
Até agora, o governo Dilma fez uma avaliação arrogante da inflação. Ignorou sua importância e seus estragos. Atribuiu o problema a causas externas (choques de oferta produzidos pelas secas nos Estados Unidos em 2012) ou a fenômenos temporários internos. A partir desse diagnóstico, não havia o que fazer. Era esperar pelo refluxo espontâneo da inflação. Durante meses, o Banco Central fez o mesmo jogo. Mas, desde abril, passou a admitir que a inflação tem causas internas relevantes. Entre elas, os gastos excessivos do setor público (política fiscal expansionista), consumo acima da capacidade de oferta da economia e mercado de trabalho excessivamente aquecido, que vinha proporcionando pagamento de salários acima da expansão da produtividade do trabalho.
Traído no compromisso quebrado pelo governo de manter uma política orçamentária responsável, a partir de abril o Banco Central se sentiu liberado para acionar sua política monetária (alta dos juros) até então teimosamente mantida a serviço do arranjo voluntarista de política econômica que vem produzindo as conhecidas distorções. Já se vê que uma política de juros mais restritiva desacompanhada de uma política fiscal responsável pode pouco contra a inflação.
Depois de muita vacilação e uma tentativa de sacramentar a adoção de uma política fiscal que denominou de anticíclica (que implica mais despesas agora), o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu que entregará ao final deste ano um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) correspondente a 2,3% do PIB. Mas ninguém sabe, provavelmente nem ele, como conseguirá esse resultado nem se será suficiente.
A percepção geral é a de que a política fiscal do governo Dilma é uma bagunça. E este é um fator adicional que tira a credibilidade da política econômica e trabalha contra a virada.
A inflação sofre agora os ataques de outro fator: o da disparada das cotações do dólar no câmbio interno. É o que vai encarecer ainda mais os produtos importados e as dívidas em moeda estrangeira, numa proporção incerta, mas que provavelmente não será inferior a 0,5 ponto porcentual de inflação ao ano para cada alta de 10% na cotação do dólar.
Enfim, falta saber o que mudará na condução da política econômica do governo Dilma. E se de fato mudará.