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domingo, 27 de maio de 2012

Brasil: um pessimo comerciante global

Fazem anos e anos que se canta com altas glórias, nos círculos oficiais, a ladainha do Brasil como "global trader", ou comerciante global. Isso em função da diversificação geográfica do comércio exterior, anteriormente -- ou seja, até o ancien régime tucanês, antes daquela história do "nunca antes neste país" do nouveau régime petista -- bem distribuida, com aproximadamente um quinto para cada uma das grandes regiões geográficas do planeta. Hoje,  parece que ficamos muito "dependentes" da China, pelo menos em termos de preços das matérias primas que exportamos para o grande país asiático.
Mas essa conversa mole não diz absolutamente nada sobre a qualidade e as condições sob as quais são feitas esse "comércio global".
Pois bem, uma análise realista do posicionamento desse "comerciante global" nos deixa em muito má postura, em relação, por exemplo, ao Chile, sempre desprezado por certos companheiros economistas por ser apenas uma "economia diminuta", especializada em suas vantagens comparativas, enfim, aqueles argumentos derrogatórios, quase ao nível do desprezo.
Não custa lembrar que esse país "pequeno" tem, pelos seus acordos de livre comércio, seu acesso consolidado e assegurado aos mercados de 80% do PIB do planeta (todo o hemisfério americano, quase toda a Europa, ou pelo menos a UE, metade da Ásia e vários outros países).
Quanto ao Brasil, tem medíocres acordos de preferência comercial com alguns parceiros do Mercosul, e vem sendo deslocado do continente -- onde exportava 70% de manufaturas -- por concorrentes da China e dos EUA, que fizeram acordos comerciais com os países da região, ou então possuem estratégias comerciais bem mais eficientes e competitivas.
O editorial abaixo resume um pouco desses problemas, mas conviria consultar o original do relatório, neste link: 
http://www.weforum.org/reports/global-enabling-trade-report-2012 
Ou então aqui: 

The full version of the Report with profiles of all 132 economies is available at www.weforum.org/getr.

Despreparo comercial

Editorial, O Estado de S.Paulo, 27 de maio de 2012
Um levantamento do Fórum Econômico Mundial situa o Brasil em 84.º lugar em uma lista de 132 países classificados de acordo com sua capacitação comercial. Houve um avanço de três posições em relação à pesquisa anterior, de 2010, realizada com 125 países. Mas a melhora é quase insignificante, quando se considera a distância entre o Brasil e dezenas de competidores desenvolvidos e em desenvolvimento.
Vários dos principais obstáculos à competitividade das empresas brasileiras nem são mencionados no estudo. Há referencias a tarifas, por exemplo, mas não aparece, na pesquisa, uma comparação direta entre o sistema tributário brasileiro, complexo, pesado e incompatível com as necessidades de integração nos mercados globais, e os de outros países participantes do comércio internacional. Se esse e outros componentes importantes do custo Brasil fossem considerados, a classificação brasileira provavelmente seria ainda pior.
O relatório pode surpreender por causa da classificação nem sempre boa de algumas das maiores potencias econômicas e comerciais. Não há, no entanto, relação necessária entre a capacitação para o comércio e o tamanho da economia. Os Estados Unidos, maior potência do mundo, ocupam o 23.º posto.
Cingapura, Hong Kong, Dinamarca, Suécia e Nova Zelândia surgem nos cinco primeiros lugares. O Canadá só aparece em 9.º e o Reino Unido, em 11.º. Em 13.º está outra grande potência, a Alemanha, seguida imediatamente pelo pequeno Chile, em excelente posição no quadro geral. O latino-americano seguinte é o Uruguai, 40.º colocado. O preparo para o comércio é determinado por atributos independentes do tamanho, como a qualidade da política econômica, a burocracia, o ambiente regulatório e a infraestrutura.
A classificação do Chile, em 14.º lugar, à frente de várias das maiores e mais desenvolvidas economias e muito longe da maior parte dos latino-americanos, ressalta a importância de um governo leve, pouco intervencionista, comprometido com a integração internacional e bastante eficiente para manter um importante fundo soberano, conhecido por seus investimentos em vários países da região. A posição da Argentina, em 96.º lugar, ressalta o peso do intervencionismo e de uma burocracia montada para emperrar o comércio tanto à custa dos parceiros, como o Brasil, quanto dos empresários nacionais, protegidos por barreiras, mas com enormes dificuldades de acesso aos mercados externos.
O Brasil vai mal na maior parte dos requisitos considerados na pesquisa. A classificação geral de 84.º lugar é dada pela média das classificações de vários atributos. Quando se trata de disponibilidade e uso de tecnologias de informação e comunicação, por exemplo, a economia brasileira aparece em 53.º lugar. Um dos componentes desse item é o uso da internet para atividades de negócios e nesse aspecto a posição é a de número 28. Mas a situação é desastrosa, quando se trata de várias condições dependentes de forma direta da intervenção governamental.
O País aparece em 104.º lugar no item "acesso aos mercados interno e externo", porque as tarifas são muito altas pelos padrões internacionais (114.º posto). As barreiras já eram muito altas e algumas ainda foram elevadas no ano passado. O cenário também é muito ruim quando se examinam a eficiência da administração aduaneira (99.º lugar) e os procedimentos de importação e exportação (101.º posto).
Em outros estudos comparativos, elaborados com objetivos mais amplos, o Brasil também aparece em classificação muito ruim, principalmente por causa da qualidade da administração pública. O setor empresarial privado normalmente recebe uma avaliação bem mais favorável do que o governamental. Pode haver deficiências nas empresas, mas o poder de competição da indústria e da agropecuária é geralmente razoável - e em alguns casos muito bom - quando se consideram as atividades apenas no interior das unidades produtivas. Esse contraste aparece apenas parcialmente nesse estudo sobre capacitação nacional para o comércio, mas, ainda assim, é bastante sensível.