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sábado, 17 de junho de 2017

Brasil: um pais em busca de uma grande estrategia (sera'?) - documento da SAE, analise Paulo Roberto de Almeida



Tendo elaborado uma análise crítica do “relatório de conjuntura n. 1”, da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, da Secretaria Geral da Presidência da República, intitulado “Brasil: um país em busca de uma grande estratégia”, da autoria do Secretário Especial e de seu Adjunto, respectivamente Hussein Kalout e Marcos Degaut, enviada com a mensagem transcrito in fine a determinados colegas e amigos, tenho recebido alguns comentários dos que tiveram acesso a essa minha análise, questionando qual seria, finalmente, uma estratégia adequada para o Brasil superar seus problemas atuais e projetar-se no cenário internacional com base nos recursos e ativos que legitimamente possui. Tenho respondido topicamente, mas talvez fosse útil explicar de maneira mais clara meu posicionamento em relação a esse tipo de exercício intelectual, que considero, de toda forma, uma colaboração importante à abertura de um debate bem informado sobre as grandes opções da nacionalidade.

O trabalho é este aqui: 
  Uma visão crítica da política externa brasileira: a da SAE-SG/PR”, Brasília, 17 junho 2017, 22 p. Considerações críticas sobre o documento da SAE, de autoria de Hussein Kalout e Marcos Degaut, sobre uma “grande estratégia” para o Brasil. Enviado aos autores e a certo número de interessados. Postado em Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/28ae2de83d/uma-visao-critica-da-politica-externa-brasileira-a-da-sae-sgpr?source=link) e em Research Gate (link: https://www.researchgate.net/publication/317636574_Uma_visao_critica_da_politica_externa_brasileira_a_da_SAE-SGPR).
 
Explico desde já o que me distancia da visão exibida nesse documento. Minha diferença fundamental, filosófica talvez, em relação aos autores do documento da SAE, é a de que eles estão interessados em construir um Estado grande e forte, capaz de projetar internacionalmente o Brasil, que nunca deixará de ser uma potência média, o que quer que façamos. O Brasil só seria um país medíocre, e decadente (como tantos outros na história), se não fizermos nada, ou melhor, deixar que elites predatórias se apossem do Estado, como estão fazendo com sanha de sanguessugas e ratazanas com redobrado vigor, desde a redemocratização. Não creio que os militares construíram um Estado impoluto, mas o patrimonialismo rentista era certamente menor no regime militar.

Na redemocratização, nos tornamos presas de uma casta de políticos rentistas e assaltantes dos recursos públicos, o que foi exacerbado no regime companheiro. Não creio que o reforço da fiscalização do Estado resolva esse problema de apropriação de bens públicos. Só a redução do Estado o fará. À diferença da visão grandiosa do documento da SAE, não creio que tal tipo de projeto estatal transforme significativamente o Brasil. Pessoalmente, estou interessado em construir uma nação próspera, e isso não passa pelo Estado, mas por uma sociedade livre.

Na verdade, eu não estou interessado em construir potência nenhuma, de qualquer tipo. Estou apenas interessado em que o Brasil seja uma sociedade integrada, desenvolvida, capaz de prover uma vida decente à maioria dos seus cidadãos, sem qualquer espírito igualitário, baseado na competição e na maior oportunidade de chances a todos. Sei que mesmo numa perspectiva smithiana, a defesa, a segurança, as relações exteriores passam inevitavelmente pelo Estado, e por isso concedo em que esses aspectos sejam fortalecidos no âmbito do Estado, mas sempre na perspectiva de que uma sociedade livre e competitiva fará isso melhor que exércitos de burocratas e tecnocratas estatais, que se transformam facilmente numa corporação que vive do Estado, para o Estado, no Estado, e para si e em si, o que vale também para os diplomatas.

Eu acho esse debate sobre uma grande estratégia um desvio de objetivos. Em lugar de focalizar o macro, como feito em tantos documentos de tecnocratas — inclusive o recente “Brasil 2035” do Ipea —, eu focaria o micro, para construir um ambiente de negócios condizente com os requerimentos de desenvolvimento do país. Em uma palavra, acho que os tecnocratas impedem o Brasil de se desenvolver. Por isso sou por “pequenas estratégias” focadas no ambiente de negócios para construir riquezas via mercado, não pela mão torta do Estado.



Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 17 de junho de 2017
Mensagem que acompanhou a remessa do documento:


Tenho por hábito acadêmico ler cuidadosamente, anotar, eventualmente discorrer sobre livros, artigos, textos que julgo relevantes para um debate bem informado sobre questões de políticas públicas do Brasil e do mundo.
Tenho também por hábito (mas pouco diplomático) dizer rigorosamente o que penso, registrar o que digo, e divulgar o que escrevo, sempre que possível, pelos meios apropriados.
Não por outras razões, dediquei-me, nos últimos dias, a ler o importante documento liberado (desajeitadamente) pela SAE-SG/PR, não porque acredite que ele vai transformar imediatamente certas políticas públicas, nas áreas da diplomacia, da inteligência, da governança em geral. Mas acredito que ele oferece uma boa introdução a um debate de alto nível sobre a política externa e a diplomacia brasileira, ainda que não concorde com muitos dos argumentos ali contidos.
Se não o julgasse importante não teria dedicado quase igual volume de páginas a analisar e criticar esse documento, que reputo de boa qualidade redacional, ainda que carente de uma distinção clara entre as peculiaridades das políticas exteriores das últimas duas décadas, e sobretudo deixando de registrar a grande ruptura representada pelo lulopetismo em diversos capítulos da vida nacional, inclusive na política externa e na diplomacia. 
Meu texto foi elaborado ao correr da pena, isto é, a partir de uma leitura linear do documento, com observações feitas de maneira tópica, ainda sem grandes desenvolvimentos conceituais, o que provavelmente ocorrerá no decorrer do debate (se houver, o que me parece necessário).
Quero cumprimentar os autores pela coragem de divulgar um documento que poderia ser interno, sem eludir, porém, meu profundo questionamento sobre vários de seus argumentos. Também convido os recipiendários desta análise a formularem suas observações sobre o documento em questão.

===============

Quando o documento foi publicado, eu o registrei nesta postagem de meu blog, informado por uma nota de jornal: 
http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/06/sae-critica-politica-externa-documento.html

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Google Alerts: politica externa: continua o massacre contra a diplomacia atual ("golpista")

Os companheiros e seus aliados, mercenários ou não, ou seja, voluntários na defesa da causa companheira, continuam o massacre contra a atual política externa, dominando completamente meu sistema de alertas sobre temas da área, como se pode perceber abaixo.
Quando é que a situação vai se equilibrar ou se inverter?
Não sei, os aliados dos "golpistas" são lentos a reagir...
Paulo Roberto de Almeida

Google Alert
    politica externa do Brasil
Atualização semanal ⋅ 22 de agosto de 2016
 
NOTÍCIAS   
Copa, Olimpíadas e a inserção internacional do Brasil
CartaCapital
Em meio ao Fla-Flu ideológico vivido pelo Brasil nas competições pelo ... Um desses casos é a chamada política externa altiva e ativa, ícone de ...
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Aécio defende trapalhadas de Serra no Mercosul
Brasil 247
O Brasil, como um todo, é que ganha com isso", afirmou Aécio. ... Ao submetermos a uma orientação bolivariana, o que fez a política externa ...
Serra tentou comprar o voto do Uruguai para prejudicar a Venezuela - Carta Maior
Acusação do Uruguai contra Serra causa bate-boca no Congresso - Jornal O Globo

Com Serra no Itamaraty, Brasil se torna um 'anão diplomático', diz Igor Fuser - Rede Brasil Atual
Cobertura completa
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Argentina, um Brasil que fala espanhol
CartaCapital
A política externa “ativa e altiva” iniciada com Lula da Silva e levada, a rigor, em banho-maria por Dilma, e que – apesar de rusgas bilaterais ...
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Serra transforma Itamaraty em bunker golpista
Brasil 247
... na relação com Estados estrangeiros e na execução da política externa. ... O governo golpista do Brasil patifa as regras do MERCOSUL e viola o ...
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Kennedy: com Serra, Itamaraty passou de bombeiro a incendiário
Brasil 247
"É um erro o Brasil adotar a diplomacia do porrete com a Venezuela. ... O governo interino não chegou ao poder para mudar a política externa.
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Governo interino quer exportar o golpe para o Mercosul
Brasil 247
Do ponto de vista do Brasil a união aduaneira, ainda que incompleta, ... A política externa brasileira está entregue a quem quer entregar o Brasil.
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Brasil busca seu retorno ao mundo através do comércio
Jornal Correio do Povo de Alagoas
Além disso, o otimismo levou a política externa a ser questionável. O Brasil bloqueou uma iniciativa liderada pelos EUA para abrir ainda mais o ...
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domingo, 1 de maio de 2016

A agenda perdida da area internacional - Marcos Sawaya Jank (FSP)

A agenda perdida da área internacional


 
É dramática a situação das representações brasileiras no exterior. Atrasos nos salários e benefícios dos funcionários, cortes de água e luz, dificuldade para custear viagens de trabalho e um inaceitável atraso nas contribuições para as Nações Unidas e outras organizações internacionais são exemplos de problemas correntes das 225 representações do país no exterior.
Após o aumento de mais de 40% no número de representações desde o governo Lula, o Brasil se vê hoje na constrangedora situação de ter de fechar postos e reduzir despesas correntes para não ser despejado em alguns países.
Acompanho o trabalho dos diplomatas brasileiros há mais de 20 anos e posso afirmar, com segurança, que a nossa diplomacia se posiciona entre as melhores do mundo. Trata-se de uma das poucas carreiras de Estado bem estruturadas no Brasil, marcada pela seleção criteriosa, pela formação sólida e pela reputação reconhecida no mundo todo.
Mas, apesar dos bons serviços prestados no exterior, muitas vezes de forma heroica e voluntária, a coordenação do governo como um todo deixa a desejar.
Os Ministérios das Relações Exteriores, Indústria e Comércio Exterior, Agricultura e a Apex (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos) precisam juntar esforços de forma mais eficiente, definindo claramente as suas atribuições e limites, somando recursos e evitando duplicidades.
Missões esporádicas ao exterior são necessárias, principalmente em nível presidencial e ministerial, mas datas e horários precisam ser respeitados e o follow-up do que foi acordado precisa ser cumprido. Falhas homéricas têm ocorrido –além de sucessivos cancelamentos e atrasos, quase sempre há muito barulho no momento da visita, mas pouco preparo prévio e uma execução deficiente na sequência.
Deveríamos reduzir a busca por holofotes passageiros em megaeventos de custo astronômico e cuidar melhor da relação cotidiana com nossos parceiros comerciais. Por exemplo, na Ásia, região mais dinâmica do mundo, a nossa presença física é tímida e desconectada, menos expressiva do que a de países bem menores do que o Brasil.
No caso das commodities, que representam dois terços das nossas exportações, mais importante do que participar esporadicamente de feiras e rodadas de negócios é direcionar recursos para a labuta diária nos órgãos reguladores dos países-chave: redução das barreiras comerciais, entrega rápida de questionários de habilitação de unidades produtivas, organização de visitas e missões, negociação de acordos bilaterais –sanitários, contra a dupla tributação, de facilitação de comércio e investimentos etc.
Precisamos ultrapassar a fase das demandas unilaterais de acesso ao país-alvo e desenvolver parcerias estratégicas de longo prazo que beneficiem os dois lados. As oportunidades de cooperação bilateral são imensas.
Mas nada disso é novidade, porque já estivemos em melhor posição no passado, inclusive no vasto universo das negociações para a formação de megablocos comerciais, à semelhança dos que hoje proliferam pelo mundo afora.
Não faltam no Brasil cabeças brilhantes para enfrentar o jogo internacional com desenvoltura. O que falta, sim, é organização e foco, envolvendo não apenas os diversos órgãos do governo como também as associações e as empresas do setor privado. É hora de recuperar a agenda perdida da área internacional.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Conflito Colombia-Venezuela: diplomacia do Brasil trata igual agressor e vitima - Clovis Rossi

A questão mais importante é a postura que o Brasil deveria assumir no conflito da Colômbia com a Venezuela (ou o contrário, pois foi a Venezuela quem agrediu colombianos, expulsando-os de maneira desumana e arbitrária).Segundo o jornalista, o Brasil não deveria colocar no mesmo plano agressor e vítima.
Pois é...
Paulo Roberto de Almeida

Em busca do "país que falta"
Clóvis Rossi
Folha de S. Paulo, 8/10/205

Visita de Dilma à Colômbia busca atrair para o Sul o olhar dos colombianos, hoje voltado para o Norte

A presidente Dilma Rousseff está hoje na Colômbia em busca do "país que nos falta", conforme se diz no Itamaraty. Tradução: a Colômbia, durante os últimos anos, olhava acima de tudo para o Norte (leia-se: Estados Unidos) e o Brasil quer que passe a olhar mais para o Sul.
Não que esse olhar já não exista: o intercâmbio comercial cresceu 165% de 2005 a 2014, passando de US$ 1,5 bilhão para US$ 4,1 bilhões.
Mas é pouco, acha a diplomacia brasileira, ainda mais quando se sabe que a Colômbia é a terceira maior economia da América do Sul, mas apenas o sétimo parceiro comercial do Brasil na região.
O olhar da Colômbia para o Norte tinha plena justificação nos anos da guerra contra as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia): os EUA financiavam o chamado "Plano Colômbia", essencial no combate aos guerrilheiros. Agora que o processo de paz está para ser concluído (a previsão é fevereiro de 2016), o Brasil pode ser mais útil.
De fato, já está sendo, informa o Itamaraty: "A contribuição brasileira concentra-se, sobretudo, na transferência da tecnologia social do Programa de Aquisição de Alimentos, que tem como objetivos principais fortalecer a agricultura familiar e promover o acesso à alimentação às populações em situação de insegurança alimentar".
Parece uma contribuição técnica, mas é também política, talvez acima de tudo.
Afinal, a guerra na Colômbia nasceu no campo e foi travada em boa medida em torno da questão fundiária. Tanto é que um dos pontos principais do acordo com as Farc girou exatamente em torno do problema agrário, que pressupõe reassentamentos, posse da terra e afins. Se a operação for bem sucedida, a paz terá mais chances de se afiançar.
Adicionalmente, o Brasil também coopera com os colombianos no processo de retirada das minas semeadas pelos guerrilheiros durante os anos de conflito.
O que não se comenta no Itamaraty é que a visita de Dilma visa também a desfazer um certo incômodo dos colombianos com a neutralidade do Brasil no confronto Colômbia/Venezuela em torno da fronteira, ainda aberto.
O Brasil absteve-se de votar, na Organização dos Estados Americanos, a proposta colombiana de se convocar uma reunião de chanceleres para discutir a crise. O Itamaraty ficou com medo de desagradar Nicolás Maduro, o presidente venezuelano –medo que explica a neutralidade na questão.
Para os colombianos não é uma posição aceitável porque consideram, com toda a razão, que há um lado agressor (a Venezuela, que tomou a iniciativa de fechar a fronteira e deportar ilegalmente colombianos) e uma vítima, a Colômbia.
Tratar igualmente vítima e agressor não é de fato decente, mas as autoridades colombianas não pretendem criar caso com o Brasil.
A crise fronteiriça é um problema conjuntural, ao passo que o processo de paz é a prioridade estrutural do presidente Juan Manuel Santos.
Nesse item, o Brasil pode e tem ajudado, ao contrário da omissão na crise da fronteira.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Governo mente sobre apoio na Venezuela - senador Ricardo Ferraco (Congresso em Foco)

Política
 
Governo mente sobre apoio na Venezuela, diz senador
Congresso em Foco, 23/06/2015 - as 13:00:00
Brasil - Ex-presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) era o único peemedebista presente na comitiva de oito senadores que voltou ao Brasil após ser hostilizada durante frustrada tentativa de visitar políticos presos na Venezuela. Integrante de um dos principais partidos da base aliada, Ferraço faz coro à oposição e acusa o governo brasileiro de mentir sobre o tratamento dispensado aos parlamentares em Caracas. O senador afirma que o grupo foi abandonado pelas autoridades diplomáticas do Brasil na Venezuela e, em momento algum, foi informado de que não seria acompanhado por representantes do consulado. “Isso é uma brutal mentira”, rebateu Ferraço, nesta entrevista concedida ao Congresso em Foco.


Ele disse que Henrique Capriles, um dos líderes da oposição venezuelana ao governo Maduro, é a prova viva de que a diplomacia brasileira mentiu no episódio. Fundador do partido Primero Justicia e governador do Estado de Miranda, Capriles pediu desculpas aos senadores brasileiros e confirmou que havia uma agenda pré-definida com eles na Venezuela, contrariando versão divulgada por governistas como o assessor especial da Presidência Marco Aurélio Garcia. Marco Aurélio acusou os senadores de tentar fazer da visita frustrada um embate ideológico.

“Há a manifestação pública do Capriles nessa direção. O Capriles, inclusive, virá ao Brasil agora em agosto, e poderá falar. No fundo, no fundo, não desejaríamos qualquer tipo de privilégio da embaixada brasileira lá em Caracas. O que desejávamos era ter o apoio institucional que nos faltou. Não apenas o embaixador, como nenhum membro da chancelaria do Brasil na Venezuela nos acompanhou. Nenhum conselheiro, nenhum diplomata esteve conosco, de modo que as ações deliberadas pelo governo da Venezuela contaram com a conivência, lamentavelmente, do Itamaraty”, protestou Ferraço.

Coincidências

“Foi uma ação deliberada. As coincidências são extraordinárias. A primeira delas é que, quando os oficiais do avião da Força Aérea Brasileira desejaram fechar o avião para irem almoçar, os membros da polícia nacional bolivariana da Venezuela disseram a eles: ‘Não precisa fechar, não precisa almoçar, eles [senadores] logo estarão voltando’. Foram muitos os fatos que se seguiram para impedir que nós pudéssemos cumprir a agenda que havíamos estabelecido”, declarou o senador.

A comitiva pretendia visitar prisioneiros como o líder do partido de oposição Vontade Popular, Leopoldo López; o ex-prefeito de Caracas Antonio Ledezma e o ex-prefeito de San Cristobal Daniel Ceballos. Entre outras acusações, eles estão presos por incitar a violência em protestos nacionais que paralisaram o país vizinho no início de 2014. Eles se queixam de não ter direito a ampla defesa. Preso desde fevereiro do ano passado, López está em greve de fome há quase um mês.

Segundo relatos ouvidos pelo Congresso em Foco de jornalistas brasileiros que estavam em Caracas, ficou evidente que o protesto foi armado propositadamente por simpatizantes de Maduro. O grupo, de acordo com esses profissionais, pretendia fazer os senadores voltarem ao país com agressões verbais e socos no veículo em que circulavam. Além disso, observam esses jornalistas, o bloqueio da pista foi seletivo. Figuras conhecidas que defendem o governo Maduro tiveram acesso livre. O deputado petista João Daniel (SE), que também estava em Caracas naquele dia, contestou a versão dos senadores. Segundo ele, um acidente é que impediu a passagem dos parlamentares.

Vídeo feito pelo líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), mostra homens esmurrando o micro-ônibus alugado pela Embaixada do Brasil e entoando palavras de ordem de apoio ao presidente venezuelano, Nicolás Maduro. Houve relatos de que pedras foram atiradas no veículo, que transitou por poucos quilômetros, a partir do aeroporto de Caracas, até ser parado por um bloqueio na pista.

Ditadura?

Herdeiro político de Hugo Chávez (1954-2013), Maduro é visto como ditador também pela oposição brasileira e por organismos internacionais como a Human Rights Watch, a Anistia Internacional e a própria Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo Ferraço, houve omissão por parte do governo Dilma Rousseff e uma ação orquestrada, inclusive com a participação de brasileiros, para impedir o cumprimento da agenda dos senadores, que incluía uma visita à prisão militar de Ramo Verde, onde López, Ledezma e Ceballos estão presos.

O incidente provocou imediata reação no Congresso brasileiro e teve repercussões na própria Venezuela e por todo o mundo. Moções de repúdio foram aprovadas na Câmara e no Senado, onde autoridades diplomáticas darão explicações à Comissão de Relações Exteriores – colegiado presidido por Ferraço entre 2013 e 2014. Diversos parlamentares já defendem a exclusão do país vizinho no Mercosul, bloco comercial que reúne, além do Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e, desde 2012, Venezuela. Com críticas ao grupo de senadores da oposição, uma nova comissão do Senado tentará manter o diálogo bilateral. O Ministério das Relações Exteriores, por meio de nota, lamentou o episódio e pediu esclarecimentos ao governo Maduro “pelos canais diplomáticos” e “à luz das tradicionais relações de amizade entre os dois países”.

“Existem questionamentos muito vigorosos de que todos nós que somos parte do bloco temos obrigações, deveres e responsabilidades. E, se a Venezuela não está cumprindo com essas pré-condições – e cláusulas democráticas são premissas –, o Senado vai discutir caminhos para que ou a Venezuela reveja todo esse modelo que está levando o país para o buraco, ou de fato tenhamos que discutir o afastamento dela do Mercosul”, emendou o senador capixaba, para quem os indicadores socioeconômicos venezuelanos são os piores possíveis.

Confira a íntegra da entrevista:

Congresso em Foco – Há ditadura na Venezuela?

Ricardo Ferraço - O déficit de democrático na Venezuela me faz afirmar que o não funcionamento das instituições e a escalada do autoritarismo, que a falta de uma Justiça neutra e independente e que a ausência de liberdade de expressão me dão a conclusão de que, sim, a Venezuela está mergulhada em uma ditadura.

Houve uma ação orquestrada pelo governo venezuelano em relação à comitiva?

Foi uma ação deliberada. As coincidências são extraordinárias. A primeira delas é que, quando os oficiais do avião da Força Aérea Brasileira desejaram fechar o avião para irem almoçar, os membros da polícia nacional bolivariana da Venezuela disseram a eles: “Não precisa fechar, não precisa almoçar, eles [senadores] logo estarão voltando”. Foram muitos os fatos que se seguiram para impedir que nós pudéssemos cumprir a agenda que havíamos estabelecido.

E a versão de que os senhores sabiam que não receberiam acompanhamento do consulado brasileiro em território venezuelano? Também foi falado que não havia agenda definida com os presos políticos…

Isso é uma brutal mentira. Já foi desmentido. Já há a manifestação pública do Capriles nessa direção. O Capriles, inclusive, virá ao Brasil agora em agosto, e poderá falar. No fundo, no fundo, não desejaríamos qualquer tipo de privilégio da Embaixada Brasileira lá em Caracas. O que desejávamos é que pudéssemos ter o apoio institucional que nos faltou. Não apenas o embaixador, como nenhum membro da chancelaria do Brasil na Venezuela nos acompanhou. Nenhum conselheiro, nenhum diplomata esteve conosco, de modo que as ações deliberadas pelo governo da Venezuela contaram com a conivência, lamentavelmente, do Itamaraty.

O aparato de segurança era suficiente?

Era uma piada. Nós fomos levados para um corredor polonês. E, nesse corredor polonês – uma espécie de funil –, os manifestantes milicianos contratados estavam lá na hora em que chegamos, no dia em que chegamos. Os batedores que nos estavam acompanhando assistiam a tudo pacificamente.

Houve um acidente com um caminhão de farinha na pista em que os senhores tentavam se deslocar? O deputado João Daniel (PT-SE), que estava lá, disse que o automóvel estava atravessado na rodovia, de maneira a impedir o tráfego…

O que houve, na prática, foi que na exata hora em que nós chegamos havia um congestionamento monstruoso em toda a região metropolitana de Caracas. Para sairmos do aeroporto para chegar a Caracas, tínhamos que passar por três túneis. Exatamente no dia em que chegamos, na hora em que chegamos, eles [membros do governo venezuelano] resolveram fazer manutenção nesses túneis. Essa manutenção impediu o livre trânsito. E nesse mesmo dia, nessa mesma hora, eles afirmam que estavam recebendo um criminoso venezuelano que cometeu um assassinato na Colômbia. Esse dois fatos levaram a uma paralisia da região metropolitana de Caracas. E tudo isso, ao meu juízo, foi deliberado. Uma ação absolutamente orquestrada.

O fato de o escritor brasileiro Fernando Morais ter cumprido agenda na Venezuela, nesse mesmo dia, com um grupo de esquerdistas alinhados ao governo Maduro tem a ver com essa confusão toda?

É evidente. Isso foi organizado de modo a neutralizar a nossa visita, que era uma visita de solidariedade a presos políticos – uma outra coisa que reforça essa minha convicção de ditadura: que país democrático tem preso político? E sem direito a defesa? Que país democrático cassa mandato de parlamentar sem direito a contraditório, sem direito a defesa, como foi o caso da Corína [Machado, líder oposicionista], que foi cassada? Que democracia cassa o mandato o prefeito da capital [Caracas], acusando-o de golpismo sem fundamentação de provas? Enfim, a produção em série desses fatos é que confirma que estamos, de fato, diante de uma ditadura.

Mas não há um numeroso contingente populacional que apóia o governo Maduro?

Mas nas poucas ditaduras que existem no mundo há manifestações favoráveis. Em Cuba há manifestações favoráveis ao regime. Porque, na verdade, o que o ditador [Hugo] Chávez fez, e o que o atual faz? O Chávez governou em um momento de preços extraordinários do barril de petróleo. A Venezuela é um país que depende, fundamentalmente, da produção de petróleo. Nada produz além de petróleo, e importa 70% de seus alimentos. O Chávez e o Maduro se favoreceram desse modelo em que os preços do petróleo estavam lá em cima para se apropriar da PDVSA e financiar um conjunto de programas sociais que, no começo, foi importante. Houve, nos últimos anos, avanços sociais na Venezuela, mas esses avanços foram financiados por programas que não são sustentáveis. É como você…

O senhor parece falar do Brasil…

Evidentemente que sim, porque também no Brasil o governo da presidente Dilma, nos últimos anos, meio que desafiou a Lei da Gravidade, meio que quis fazer chover debaixo para cima, convivei com a inflação, não respeitou as regras de governança fiscal, e estamos mergulhados aí nessa crise. Há pouquíssimos meses tínhamos a presidente falando na expansão do ProUni [Universidade para Todos], na expansão do Fies [financiamento estudantil], do Pronatec [ensino técnico]. E hoje, na verdade, todos esses programas estão sofrendo recessão. Por quê? Porque por trás desse programas não tinha uma estrutura consistente de manutenção de sua sustentabilidade por anos a fio. Então a Venezuela, durante alguns anos, produziu ganhos e conquistas sociais que estão se dissipando. A Venezuela deve ter, se não me engano, a maior inflação do mundo. A então está calculada entre 80% e 120%. Com um dólar, compra-se 400 bolívares! A miséria e a pobreza avançam a olhos nus na Venezuela. Aquilo ali está se desmanchando, porque esses governos que preconizam essa coisa de socialismo do século 21 se estabelecem por meio da mentira, do populismo e da demagogia. Esses são princípios e valores que não se sustentam no tempo.

Mas é apenas isso o que está por trás da situação na Venezuela?

Não apenas isso. Evidentemente, esses programas sociais só com porta de entrada e sem porta de saída são uma forma de se manter a dependência das pessoas do modelo e do regime. Em algum período, por algum momento, dá-se o peixe, mas isso tem de ser um processo progressivo para você ir substituindo o peixe pela vara, para as pessoas irem pescar – até porque, eu percebo também, as pessoas não querem viver de favor. Esses programas sociais e assistencialistas, na prática, são formas modernas, e até mesmo sofisticadas, de se manter o povo administrado pelo estômago.

O que será feito a partir de agora? A intenção é mesmo a exclusão da Venezuela do Mercosul?

Existem questionamentos muito vigorosos de que todos nós que somos parte do bloco temos obrigações, deveres e responsabilidades. Da mesma forma que o Brasil tem deveres e responsabilidades, o Paraguai, o Uruguai, a Argentina e a Venezuela também têm que ter. E, se a Venezuela não está cumprindo com essas pré-condições – e cláusulas democráticas são premissas –, o Senado vai discutir caminhos para que ou a Venezuela reveja todo esse modelo que está levando o país para o buraco, ou de fato tenhamos que discutir o afastamento dela do Mercosul. Isso é uma regra comum aos nossos países – se a Venezuela puder violar, significa dizer que o Brasil pode, também? Significa dizer que os outros podem? A regra precisa valer para todos. Esse debate vai se acelerar na medida em que a escalada da violência, da truculência e do autoritarismo na Venezuela está chegando a níveis insuportáveis. E não somos nós que falamos. Primeiro, nós constatamos isso lá. Mas são organismos insuspeitos que acompanham essas regras democráticas. Tem Cruz Vermelha, Anistia Internacional, OEA [Organização dos Estados Americanos], a própria ONU [Organização das Nações Unidas], a Human Watch, que é uma instituição de presença global, que fez um capítulo específico sobre Venezuela, colocando um conjunto de coisas que eles estão vendo.

Há espaço, no Congresso, para a expulsão da Venezuela?

Não posso afirmar que haja espaço para expulsão, mas ambiente para debater o tema já está posto, está colocado, formado. É preciso ver que o juízo de valor os senadores vão formar. Mas não dá para a gente assistir a tudo isso como se nada estivesse acontecendo.

O senhor foi presidente da Comissão de Relações Exteriores e integrou a comitiva que foi impedida de cumprir a missão oficial. No dia seguinte à tentativa frustrada, uma nova comitiva, com viés de esquerda, foi criada para visitar a Venezuela – na justificativa de criação do colegiado, senadores dizem que desfarão o atrito que teria sido provocado pela primeira comissão. Como o senhor reage a isso?

Meu desejo é que essa comitiva possa ser bem sucedida na sua missão. O que não tem cabimento é uma missão formada por simpatizantes do regime [venezuelano] sem bem recebida e uma missão que não é simpatizante ser mal recebida, como nós fomos. Isso não tem cabimento, é preciso haver respeito institucional.

Como a CRE procederá daqui em diante, no que diz respeito às futuras convocações?

Já esteve aqui a Maria Corína; já estiveram aqui as esposas do Antonio López, do Ledezma… O que está na pauta, na quinta-feira [25], é a deliberação para convocação do chanceler [DelcyRodriguez] e do embaixador [Ruy Pereira], para que a gente possa discutir não apenas as questões relacionadas a essa nossa missão e a omissão do Itamaraty em nos dar apoio institucional. O Itamaraty, efetivamente, nos entregou à própria sorte. Mas vamos discutir até mesmo as questões relacionadas à escalada do autoritarismo.

Há quem diga que os senhores fizeram uma espécie de intervenção na soberania nacional da Venezuela. Como o senhor responde a isso?

Isso é uma coisa absolutamente descabida. A nossa missão – e, agora, eu sou informado que o Parlamento Europeu está constituindo uma missão para visitar a Venezuela. É óbvio que não se trata de intervenção, até porque nossa Constituição define que nossa política externa será movida e presidida pela autodeterminação dos povos. Agora, na medida em que somos membros do mesmo bloco, e à medida que há, nesse bloco, algumas premissas e pré-condições como cláusulas democráticas, temos a obrigação e a responsabilidade de fiscalizar o cumprimento desse acordo. Por que o estamos fazendo? Porque o governo brasileiro tem sido omisso e tem silenciado diante das atrocidades que temos percebidos. E a Unasul [União de Nações Sul-Americanas], que poderia atuar nessa direção, se transformou em uma instituição absolutamente parcial.

Questiona-se, também, por que os senhores não vão visitar Guantánamo. Lá também é América…

É uma boa ideia. Esse tema pode ser discutido, sim, na Comissão de Relações Exteriores. Acho que faz sentido, sim, que a gente possa ampliar esse nosso protagonismo para que não pareça que estamos agindo seletivamente. Acho que a prisão de Guantánamo merece, sim, e acho que com essa sua pergunta eu vou fazer um requerimento na Comissão de Relações Exteriores visando fazer uma visita a Guantánamo. Não pode haver dois pesos e duas medidas.

O senador Aécio Neves está usando o episódio eleitoralmente, em um momento de fragilidade da presidenta Dilma Rousseff, como também o têm acusado?

Acho que não. O senador Aécio Neves está no exercício do seu mandato. Como senador da República, tem manifestado toda a preocupação com o futuro do Mercosul. E a nossa obrigação, como senadores, é fiscalizar o cumprimento das cláusulas constitutivas do Mercosul.

terça-feira, 29 de julho de 2014

Mais crônicas do nanismo diplomatico - Andres Oppenheimer (MH)

“O Brasil passou dos limites em relação a Israel”
Por Andres Oppenheimer
The Miami Herald, 28/07/2014

Enquanto a maioria dos países condenou a violência em Gaza, na maior parte dos casos culpando ambos os lados e dirigindo críticas em variados níveis a um e a outro, o Brasil passou dos limites ao simplesmente endossar a versão do grupo terrorista Hamas para o conflito — indo além até mesmo de países como o Egito e a Jordânia em suas ações contrárias a Israel.
Em nota emitida em 23 de julho, o governo da presidente brasileira Dilma Rousseff declarou: “Condenamos energicamente o uso desproporcional da força por Israel na Faixa de Gaza, do qual resultou elevado número de vítimas civis”.
E acrescentou que seu embaixador em Israel foi chamado ao Brasil para consultas — algo que nem mesmo países árabes como o Egito ou a Jordânia fizeram até este momento em que escrevo.
Tal comunicado alinha o Brasil com Cuba, Venezuela, Bolívia, Equador e outros países que automaticamente tomam o partido de ditaduras militares e violadores dos direitos humanos em todo o mundo. Agora, há rumores de que o Brasil pretende se manifestar contra Israel na Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul, em 29 de julho.
Muitos outros países condenaram o “uso desproporcional da força” por Israel, contudo a maioria deles — inclusive a Argentina, que normalmente acompanha os posicionamentos do Brasil — condenou simultaneamente o Hamas pelos ataques sistemáticos de foguetes contra alvos civis israelenses, que segundo Israel deflagraram o atual ciclo de violência.
Ademais, os Estados Unidos e os 28 membros da União Europeia, que consideram o Hamas um grupo terrorista, condenaram-no especificamente pelo uso de civis como escudos humanos.
Em 17 de julho, a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina, conhecida pela sigla UNRWA, anunciou ter encontrado 20 foguetes do Hamas escondidos numa escola da ONU em Gaza. Poucos dias depois, a UNRWA anunciou outra descoberta idêntica em outra escola da ONU.
Após a crítica do Brasil, dirigida unicamente a Israel, o ministro das Relações Exteriores israelense emitiu uma declaração, afirmando que a atitude do Brasil “demonstra a razão pela qual o gigante econômico e cultural continua sendo politicamente irrelevante” no cenário internacional. Representantes de Israel esclareceram que a reação incomumente enérgica foi provocada pela decisão do Brasil de convocar seu embaixador para consultas.
Em contraste, os Estados Unidos e os 28 integrantes da União Europeia iniciaram suas declarações sobre o conflito em Gaza destacando o direito de Israel a se defender.
O Conselho da União Europeia, que inclui a França, a Bélgica e vários outros países com populações muçulmanas numerosas, manifestou-se no dia 22 de julho no sentido de que “a União Europeia condena firmemente o disparo indiscriminado de foguetes pelo Hamas contra Israel”.
E completou: “A União Europeia condena veementemente a convocação (do Hamas) da população civil de Gaza para atuar como escudos humanos. Embora reconheça o legítimo direito de Israel a se defender contra quaisquer ataques, a UE enfatiza que a operação militar israelense deve ser proporcional e em consonância com a legislação humanitária internacional”.
O Brasil pode ter chamado seu embaixador por razões políticas internas, bem como pelo desejo de agradar aos estados radicais árabes e africanos, em sua busca pela obtenção de um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
José Miguel Vivanco, responsável pela divisão das Américas da organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch, ressalta que o ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva — mentor político de Rousseff — posicionou-se consistentemente em favor dos piores violadores dos direitos humanos do mundo nos anos em que ocupou a presidência.
Mais recentemente, com Dilma Rousseff, o Brasil melhorou significativamente sua participação nas votações sobre o tema no Conselho de Direitos Humanos da ONU, porém o mesmo não ocorreu em outros fóruns diplomáticos. Na América Latina, por exemplo, o Brasil permaneceu em silêncio em relação às inúmeras violações aos direitos humanos cometidas pelas forças de segurança da Venezuela, relata Vivanco.
“O Brasil está fazendo a coisa certa ao protestar com veemência contra Israel pelo uso desproporcional da força, que resultou num grande número de mortes de civis, mas ao mesmo tempo não podia deixar de condenar os ataques indiscriminados e constantes de foguetes do Hamas contra a população civil israelense”, disse-me Vivanco.
Minha opinião: Israel pode ser acusado de falhar ao evitar a morte de civis em casos específicos durante o conflito de Gaza, e o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu pode ser culpado por não fazer o bastante para acelerar a tão necessária criação de um Estado palestino, porém Israel não pode ser condenado por se defender.
Não se pode esperar de nenhum país no mundo que fique inerte enquanto um grupo terrorista dispara milhares de foguetes contra suas maiores cidades e, depois, usa civis como escudos humanos. E menos ainda quando, diferentemente do Al Fatah e outros grupos palestinos mais moderados, o Hamas conclama à aniquilação de Israel e ensina às crianças palestinas que matar judeus é uma prestação de serviço a Alá.
Se o Brasil quer ser levado a sério como uma democracia moderna e um ator internacional responsável, deveria agir como tal.

domingo, 27 de julho de 2014

Mais crônicas do nanismo diplomatico - Wandell Seixas e o conflito Israel-Hamas

Brasil é mesmo um “anão diplomático”

Wandell Seixas
Diário da Manhã, 26/07/2014

O governo brasileiro reagiu à pecha de "anão diplomático", feita pelo Ministério das Relações Exteriores de Israel. O Itamaraty, sediado em Brasília, fizera críticas à postura israelense no conflito com os palestinos na Faixa de Gaza, considerando "desproporcional" as forças entre os contendores. "Esta é uma demonstração lamentável de que o Brasil, um gigante econômico e cultural, continua sendo um anão diplomático", disse o porta-voz Yigal Palmor quinta-feira, conforme o jornal The Jerusalem Post.


O episódio provocou a ira do Ministério das Relações Exteriores do Brasil e chamou o embaixador brasileiro em Tel Aviv, Henrique Sardinha, para consultas. O comportamento brasileiro é deplorável, demonstrando uma atitude unilateral. A diplomacia brasileira procurou manifestar a "desproporcionalidade" na ofensiva israelense na região.


O governo Dilma Rousseff se esquece das atitudes insanas do Hamas, grupo terrorista com o apoio de outros grupos terroristas supostamente sustentados pelo Irã. Desde que o regime muçulmano tomou conta do Irã a palavra de ordem "é acabar com os judeus". Antes de tudo, a luta entre israelenses e parte do segmento árabe é milenar. Advém dos tempos bíblicos. Quantas vezes Jerusalém não foi palco de cenário de destruição?


Israel é um país do tamanho de Sergipe, com uma população de cerca de seis milhões de pessoas. Foi criado com a participação de um brasileiro, que presidia a sessão das Nações Unidas. Osvaldo Aranha é venerado naquele país, que já deu oito prêmios Nobel a seus ilustres cidadãos. Pela sua pequena dimensão exige segurança porque está cercado praticamente de inimigos por todos os lados. Só a Síria dispõe de um exército de mais de 500 mil soldados preparados para a guerra. Em decorrência da constante ameaça que pesa sobre Israel, suas forças armadas são as mais preparadas do mundo e seu serviço de informações, como o Mossad, amplamente articulados.


O país é essencialmente democrático, dispondo de inteira liberdade de imprensa e de religião. As mulheres participam ativamente da política e servem ao exército. Golda Meir, foi eleita presidente. O eleitor tem optado mais pelo Likud, mais conservador, em detrimento do Partido Trabalhista, mais liberal, justamente por causa da interminável guerra. Nos países vizinhos, a modernidade anda devagar. Nem todas as mulheres podem chegar às escolas. Seu papel ainda é de mulher parideira e de forno e fogão.


Os moshave e os kibutzim, que serviram inclusive de experiência agrária no Nordeste de Goiás no governo Mauro Borges, são modelos de produção cooperativista. O colono hebreu precisava dispor de sistemas de irrigação por controle remoto por causa dos constantes ataques inimigos. Grande parte das casas necessita de abrigo subterrâneo também por causa das bombas, dos foguetes e dos mísseis dos praticantes do terrorismo.


É deplorável que o governo petista em momento algum tenha condenado ou mesmo censurado o comportamento do Hamas. Sua maneira de agir é odiosa. Só mesmo quem acompanha o conflito entre israelenses e palestinos mais de perto, quem conheceu a vida desses povos, sabe. Os agentes do Hamas se utilizam das escolas e dos hospitais justamente para sofrerem ataques das forças de Israel. A morte de civis, sobretudo crianças e idosos, é o eles querem, para ganhar espaço na mídia internacional, protestos no mundo e reações intempestivas como a da diplomacia brasileira.


Que moral o governo petista tem para condenar Israel? É só lembrar um pouco dos grevistas de fome em Cuba contra o regime de Fidel Castro? O Lula estava em Havana e não movimentou uma palha em favor desses pobres desgraçados? Os jogadores de basquetebol e os judocas cubanos numa temporada no Brasil pedirem asilo e o governo mandou-os de volta à Havana? Os direitos humanos estão sendo feridos na Venezuela, desde Hugo Chaves e Maduro e onde está o apoio diplomático aos venezuelanos? O senador de oposição boliviano Roger Pinto Molina mofou na Embaixada do Brasil em La Paz. Precisou fazer uma aventura para passar pelas fronteiras dos dois países. Em Brasília, precisou do apoio do Congresso Nacional, liderado pelo deputado federal Ronaldo Caiado, para que lhe fosse assegurado o direito de permanência no Brasil.


O governo brasileiro devia isto sim, participar das negociações entre Israel e Palestina para um acordo de paz duradoura. Afinal, o Brasil se comporta mesmo como um anão diplomático.




(Wandell Seixas, jornalista voltado para o agro, bacharel em Direito e Economia pela PUC-Goiás, bolsista em cooperativista agrícola pela Histradut, Tel Aviv, Israel, e autor do livro O Agronegócio passa pelo Centro-Oeste)

sábado, 26 de julho de 2014

Jacob Dolinger reage 'a diplomacia brasileira sobre o conflito em Gaza

Cabe deixar claro, em primeiro lugar, que existe uma guerra em Gaza, nao um genérico conflito Israel-Palestina. Cabe, em segundo lugar, esclarecer os diversos sentidos da palavra proporcionalidade. Se, por hipótese, mas plausível, os 2 mil foguetes do Hamas tivessem vitimado centenas de civis inocentes israelenses, inclusive mulheres e crianças, a nota brasileira não poderia mais usar o argumento da "desproporcionalidade", certo?
O Brasil teoricamente deseja um maior número de vítimas israelenses para aí estar conforme à sua "teoria" da proporcionalidade?
Paulo Roberto de Almeida 

A propósito do ‘anão diplomático’



Israel colocou em perigo seus soldados, sacrificando alguns deles, no esforço de minorar ao máximo as vítimas civis do inimigo
Assim que o Ministério das Relações Exteriores do Brasil condenou energicamente Israel pelo “desproporcional uso de força na Faixa de Gaza” e convocou seu embaixador em Tel Aviv a retornar a Brasília para consultas, o governo israelense, por seu Ministério do Exterior, lamentou que o “Brasil, um gigante cultural e econômico, permaneça um anão diplomático”.
Realmente lamentável o comportamento do governo da sra. Dilma.
Gostaria que nosso chanceler explicasse como ele mede “proporcionalidade” no campo bélico. Saberia ele que se Israel enviasse o mesmo número de mísseis que o Hamas lançou sobre Israel nos últimos anos, Gaza estaria totalmente destruída?
Sabe ele os cuidados que Israel tomou na semana passada avisando centenas de milhares de palestinos para abandonarem suas residências, possibilitando com isso que o Hamas soubesse exatamente onde o Exército israelense se preparava para atacar e causando assim quedas que não ocorreriam se os ataques fossem realizados de surpresa? Ou seja, Israel colocou em perigo seus soldados, sacrificando alguns deles, no esforço de minorar ao máximo as vítimas civis do inimigo.
Têm Sua Excelência e a presidente que ele serve a menor noção da barbárie dos dirigentes de Hamas forçando seu povo a permanecer em casa, enviando mísseis de hospitais e de áreas residenciais, para conseguir que a reação defensiva israelense cause vítimas civis entre o povo palestino?
Aliás, conhece o ministro alguma guerra que não causou vítimas civis? E que sempre houve desproporcionalidade entre o número de vítimas das partes envolvidas no conflito?
Não compreende o chefe do Itamaraty que em Israel praticamente não caem vítimas civis porque o Estado protege seus cidadãos, com o mais sofisticado sistema de alarme e refúgio?
Não está evidente aos olhos do governo brasileiro que esta, como as anteriores guerras entre Israel e Hamas, foi provocada pelos terroristas fanáticos que governam a Faixa de Gaza como déspotas medievais?
Fez o chanceler a mais elementar pesquisa para se assenhorar do que diz a Constituição do Hamas sobre seu desiderato de destruir Israel e eliminar toda a sua população?
A equipe do Ministério de Relações Exteriores se assenhorou dos longos e sofisticados túneis pelos quais os bárbaros se preparavam para atacar covardemente a população civil do Sul de Israel? Qual o nível do sistema de informação de que dispõe nossa chancelaria?
E tem o governo brasileiro uma equipe jurídica sofisticada que poderia adverti-lo de que condenar Israel por sua defesa contra o terrorismo pode perfeitamente constituir cumplicidade com os terroristas e as atrocidades que praticam? Aliás, o mesmo se aplica aos governos dos países da União Europeia. Será que isso traz conforto ao governo brasileiro?
E o povo brasileiro, os intelectuais, os estudantes universitários, os jornalistas, saberão aquilatar o fenômeno psíquico que reside atrás desta discriminação contra Israel?
Quanto mais o Estado de Israel progride em alta tecnologia, no avanço de sua medicina, de sua ciência; quanto mais Israel comparece para ajudar populações vitimadas por desastres naturais; quanto mais Israel contribui para minorar o sofrimento de certas populações africanas via todo tipo de assistência, quanto mais os judeus concentrados em Israel lutam por uma paz séria e duradoura com seus vizinhos — apresentando propostas irrecusáveis — sempre ignoradas pelos árabes, que por sua vez nunca oferecem contrapropostas; quanto mais Israel se revela um pais com o mais alto nível de democracia; quanto mais a Suprema Corte israelense atende a reclamações de palestinos; enfim, quanto mais Israel se destaca no plano intelectual, moral e jurídico, mais é vitimado pela hipocrisia das potências democráticas que, em vez de apoiar o Estado Judeu, lançam-se contra ele com mentiras, cinismo e má-fé.
Qual a razão mais profunda desta injustiça gritante e vergonhosa? Ninguem desconfia?
Que cada um examine sua alma, sua história familiar, sua educação, sua visão do mundo e responda honestamente por que a demonização do Estado Judeu, por que a campanha injusta, cruel e perversa contra o Estado construído pelos sobreviventes do Holocausto?
Jacob Dolinger é professor

Concurso de gigantes do nanismo diplomatico - Bolivar Lamounier

Parece que as expressões colaram. Mas como o Brasil é grande por sua própria natureza, cabe sempre acrescentar a expressão gigante...
Paulo Roberto de Almeida

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De Messina a Tel Aviv: crônica do nanismo diplomático

Já tivemos diplomacia de melhor calibre. O que temos hoje é patético.
Bolivar Lamounier
Amálgama, 25/07/2014


diplomacia
por Bolívar Lamounier (25/07/2014)
em Brasil

Messina é o estreito que separa a Sicília, uma ilha, da Calábria, na Itália continental. Há milênios, sua “estreiteza” tem dado ensejo a uma vasta mitologia sobre os riscos a que aí estariam sujeitos os navegantes. Na Eneida, por exemplo, Virgílio discorre sobre a ameaça que os rochedos de ambos os lados representavam para a frágil felicidade de Enéas. A origem dos perigos seriam Cila e Caríbdis, entidades do mal que habitavam as profundezas e de tudo faziam para arremessar de um lado ao outro os incautos marinheiros que viam se aproximar. Vem daí a expressão “viver entre Cila e Caríbdis”: viver entre perigos contrapostos, mas interligados, simultâneos e complementares.
Equivocados em praticamente tudo o que fazem, os “estadistas” do PT quiseram experimentar as emoções da travessia, mas perderam-se e foram parar em Israel. Em tese, tal desnorteio deveria tê-los deixado no lucro: mais vale bater-se contra figuras semânticas que contra os temíveis rochedos de Messina. Mas para eles, o barato saiu caro. Colhidos em cheio pelo revolto mar da ignorância, uma parte de sua expedição esborrachou na pedreira do ridículo; atirada ao lado oposto, foi a outra parar nas alturas da empáfia e da megalomania.
A malfadada embarcação que se espatifou no ridículo tinha no comando o então presidente Luís Inácio Lula da Silva. O fato ocorreu nos idos de março de 2010. Desprovido do mais elementar sentido de proporção, Lula se propôs, nem mais e nem menos, a produzir a tão desejada paz entre israelenses e palestinos. Não lhe ocorreu que um feito dessa ordem, se fosse possível, faria a glória dos chefes de Estado do planeta inteiro, a começar pelos das superpotências. Em questão de minutos, os presidentes dos Estados Unidos e da Rússia e o “cumpanhero” Secretário Geral do PC chinês desembarcariam em Tel Aviv – de mãos dadas e saltitando e cantarolando como personagens de um filme de Doris Day.
Mas Lula não percebeu isso; não percebeu porque seu agigantado umbigo às vezes não lhe permite reconhecer a existência de um mundo real – um mundo “externo à consciência”, se posso aqui lembrar o Marx das Teses sobre Feuerbach. Não tendo ele mesmo se dado conta da atroz patetice que estava para encenar, teria havido entre os convidados a integrar a comitiva – ministros, assessores e puxa-sacos em geral – um pelo menos que o alertasse e tentasse demover de tamanho despropósito? Eu adoraria saber a resposta, mas deixo a questão para os estudiosos da diplomacia lulista. O desfecho, como não poderia deixar de ser, foi o único concebível. Querendo se fazer passar por um leão, o rato tudo o que conseguiu foi ficar rouco.
A segunda parte da história aconteceu na última quarta, e confesso que escrever sobre ela não me é menos penoso que rememorar o besteirol lulista de 2010. Tentei caracterizá-la como um caso de empáfia e megalomania, mas não sei se chego a apreendê-la em sua essência. Uma tragicomédia, talvez? Não, não.
Comecemos pelo cenário, no que ele tem de mais triste e assustador. De um lado o Hamas, em seus esconderijos na faixa de Gaza, disparando mísseis contra as cidades israelenses; do outro a aviação e o exército de Israel devolvendo a carga com juros e correção monetária. O número de vítimas palestinas – inclusive crianças – é muito maior que o de vítimas israelenses, mas quem em sã consciência apostaria no contrário? Deflagre-se mil vezes tal processo e mil vezes será esse o resultado, dada a desproporção entre as forças contendoras. O Hamas ignorava isso?
Voltemos porém à nossa história, quero dizer, a essa “apagada e vil tristeza” que tem sido a política externa brasileira na era petista. Depois do papelão (ou pastelão, se preferem) de 2010, já não tínhamos o direito de subestimar a ignorância das realidades internacionais por parte de Lula e seu partido – e não será agora, diante da pancada que Dilma Rousseff nos desferiu quarta-feira, que o vamos ter. A “presidenta” simplesmente mandou chamar o nosso embaixador em Israel. Para quê? Para protestar contra as ações militares do país nos últimos dias, obviamente.
No protocolo diplomático, é isso o que retirar o embaixador significa. Conto com a paciência do amigo leitor e da amiga leitora que hajam me acompanhado até aqui, sei que este meu ralentando pode ser irritante, mas não vejo saída. Tenho para mim que a missão pacificadora do Lula em 2010 é imbatível como candidata ao título de episódio mais ridículo da história diplomática brasileira. Pelos mesmos critérios, a retirada do embaixador por Dilma Rousseff é poule de dez na disputa pelo título de mais idiota.
Pensemos juntos. Descontada a fanfarronice, a missão do Lula partia de uma premissa correta: quem não sobe ao palco não participa do espetáculo. Numa situação inacreditavelmente complexa e séria como a que no momento vivem israelenses e palestinos, é improvável que o Brasil possa ter um papel relevante, mas assumindo uma posição unilateral e retirando o embaixador, com certeza não terá papel algum. A chance de ganhar na loteria é infinitesimal, mas se você não joga, é zero. Queremos ter um papel, exercer alguma influência, participar de negociações? Com o parti pris ideológico demonstrado e sem um representante sur place, esqueça.
Não vem ao caso especular sobre se a decisão de ontem foi mesmo da doutora Dilma ou se ela, consciente (?) de suas limitações, aceitou o que lhe foi sugerido sabe Deus por quem. Fato é que a dura represália diplomática israelense foi mais que merecida. Sim, meus senhores e senhoras, já tivemos diplomacia de melhor calibre. O que temos hoje é patético. A nota israelense qualificou o Brasil como um “anão diplomático” – e não é? Dessa vergonha a doutora Dilma poderia ter se poupado, na física e na jurídica – e nos poupado, evidentemente, visto que na jurídica não tem jeito, estamos no mesmo barco.

Troca de cartas entre Israel Klabin e o chanceler Luis Figueiredo

Troca de cartas entre Israel Klabin e o ministro Luiz Alberto Figueiredo

Ao Excelentíssimo Senhor
Ministro das Relações Exteriores
Luiz Alberto Figueiredo Machado
Sempre tive, bem como a minha família, íntima relação com o Itamaraty através de dois chanceleres: Horácio Lafer e Celso Lafer, ambos judeus, que honraram não apenas o nome da família, mas o Brasil e sua política externa.
Não preciso lembrá-lo também da importância de Oswaldo Aranha, quando Embaixador junto a ONU, na criação do Estado de Israel, trazendo com isso o agradecimento de todos os judeus do mundo.
É, portanto, com estranheza que acabei de ler a séria ofensa feita ao Estado de Israel e a todos nós judeus, pelo Itamaraty, quando “chamou o Embaixador para consulta”.
Tanto meus pais quanto eu, fazemos parte das gerações que atravessaram o holocausto e herdaram a missão de prestar serviços à humanidade e aos países que agasalharam os judeus na fuga milenar das perseguições oriundas de preconceitos, de ódios raciais e religiosos.
A nota do Itamaraty demonstra claramente um retrocesso da política fracassada de levar o Brasil para um envolvimento errado e desnecessário, antagônico ao princípio de não intervenção, o que tem sido um dos pilares da política externa brasileira através dos tempos.
A análise preconceituosa do que realmente está acontecendo no conflito em Gaza, seguramente levou o Itamaraty a conclusões apressadas e equivocadas.
Israel se defende de ataques de grupos terroristas, do Hamas associado ao Hezbollah, ao Irã e de tudo aquilo que é mais odiento na evolução política do Oriente Médio. Estranho o Brasil omitir-se em relação a esses grupos que tentam, pelo terror, “jogar os judeus ao mar”. Isto seguramente não acontecerá.
Ninguém mais do que o próprio Estado de Israel e as comunidades judaicas do mundo lamentam a perda inútil de vidas humanas provocadas pelo uso suicida das populações civis de Gaza, pelos terroristas de Hamas. Por outro lado, choramos também pelos soldados israelenses que tombaram lutando pela segurança do Estado e de suas famílias.
Pela admiração que tenho por V. Exª., gostaria que fosse levado em conta não apenas pressões políticas imediatistas, internas ou externas ao Itamaraty, mas também os grandes serviços que a comunidade judaica brasileira vem prestando ao nosso país no passado, no presente, bem como nosso compromisso com o futuro do Brasil, nosso país, e de Israel como centro da nossa cultura.
Respeitosos cumprimentos,


Meu querido Israel,
Muito agradeço sua mensagem, pois me permite dar explicações ao amigo de tantos anos, a quem sempre respeitei e respeitarei. Sinto muito ter causado ofensa, pois isto jamais foi minha intenção. Peço sua paciência para arrolar algumas considerações:
- Em nota do dia 17 deste mes o Itamaraty condenou tanto os ataques de foguetes pelo Hamas contra Israel, quanto o ataque desproporcional israelense a Gaza, mantendo nossa postura de equilíbrio e reclamando o cessar fogo imediato e a solução de dois Estados, Israel e Palestina, vivendo em paz e segurança;
- a nova nota, datada de ontem, se prende à tragédia humanitária da morte de crianças, mulheres e idosos, em grande número, como consequência da luta;
- hoje dei várias declarações à imprensa, em que ressalto e reitero nossa condenação aos ataques do Hamas e defendi o direito de auto-defesa de Israel. Esclarecei que nossa nota se prende à proporcionalidade da resposta israelense, diante da elevada perda de vidas na população civil. Morreram cerca de 200 crianças palestinas. Sejam palestinas, sejam israelenses, são 200 crianças.
- apesar de declarações destemperadas de um porta-voz israelense, optei por não polemizar, dizendo que povos e países amigos podem discordar eventualmente, e que isso deve ser feito sempre de maneira respeitosa;
- ressaltei que a amizade e as relações com Israel devem ser preservadas.
Você me conhece e sabe que não sou dado a radicalismos. Nem teria por que fazê-lo com relação a Israel. O Brasil é um belo exemplo de como as comunidades de origem judaica e árabe convivem em paz e harmonia.
Acho apenas que criticar as ações de um governo não quer dizer criticar um país ou um povo. Não aceito que essas coisas se confundam. Tenho muitos amigos de origem judaica que são críticos do atual governo israelense, e em termos muito duros. Nem por isso suas críticas são consideradas ofensas.
Eu agradeço muito sua franqueza e respeito suas colocações. Peço ao amigo que também aceite as explicações que dou. Muito longe de mim ofender amigos tão queridos como meus amigos judeus. Muito menos, ofender uma pessoa como você.
Mas quero ter o direito de discordar respeitosamente do governo israelense, quando for o caso, sem que isso seja lido como uma ofensa a todo um povo. A morte de um número elevado de mulheres, crianças e idosos é uma perda para todos, pouco importa sua origem.
Um abraço muito afetuoso 
Luis Figueiredo

Militancia diplomatica - Ruy Fabiano (O Globo)

Militância diplomática

Ruy Fabiano
O Globo, 26/07/2014
Diplomacia, como se sabe, não é exatamente campo adequado para exercícios de militância.
O Itamaraty, desde os tempos do Barão do Rio Branco, cultivou o que veio a se chamar de pragmatismo responsável, o que o tornou considerado nos fóruns internacionais.
Sendo o Brasil um país ainda periférico, sem grandeza bélica, sempre evitou entrar em briga de cachorro grande. 
Seu ingresso na Segunda Guerra Mundial foi precedido de amplas negociações com os Estados Unidos, que resultaram na Siderúrgica de Volta Redonda, na Eletrobras e no consequente up grade em sua infraestrutura industrial.
Mesmo assim, só o fez, já na etapa final do conflito, depois de ter navios em sua costa bombardeados pelos nazistas. Cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. Mas esse era o Itamaraty pré-PT, cujas linhas-mestras sobreviveram aos mais variados governos, incluindo os da ditadura militar.
O PT introduziu na diplomacia brasileira o vírus da militância. O país deixou de lado seus interesses - comerciais, políticos, estratégicos -, perdendo mesmo a noção de sua desimportância relativa, e passou a orientar sua conduta pelo viés ideológico.
A adesão ao bolivarismo chavista – de cuja gênese o PT participou, via Foro de São Paulo – o distanciou de parceiros tradicionais, como Estados Unidos e União Europeia.
Em compensação, o país passou a apoiar – e financiar – ditaduras, como as de Cuba e do Sudão, que contabiliza assassinatos numa ordem de grandeza que supera a soma de diversas Faixas de Gaza. Seus aliados preferenciais, na geopolítica global, são países como Coréia do Norte e Irã.
Alia-se a forças criminosas como as Farc, que mantêm campos de concentração na selva e vivem do que apuram com sequestros e venda de drogas. O chanceler de fato, Marco Aurélio Garcia, recusou-se a admiti-las como grupo terrorista, optando pela expressão oblíqua de “forças insurgentes”.
É compreensível, já que suas lideranças sentavam-se lado a lado do PT no Foro de São Paulo. Grande parte dos assassinatos que ocorrem anualmente no Brasil – mais de 50 mil, a maioria pobres e jovens – decorre dessa aliança sinistra, que igualmente supera em muito os até aqui sacrificados da Faixa de Gaza.
Eis, porém, que, não satisfeito em protagonizar uma diplomacia pelo avesso no continente, o Itamaraty decide incursionar pelo Oriente Médio. Lula já havia aparecido por lá, quando presidente, sustentando que sua experiência de sindicalista, habituado a negociar, seria suficiente para clarear um conflito que há décadas desafia as maiores diplomacias do planeta.
Expôs-se (e nos expôs) ao ridículo, sobretudo porque, além de não negociar coisa alguma, optou claramente por uma das partes – no caso, os palestinos. Eis que agora o ridículo se repete. E, de certa forma, com maior gravidade, pois a militância diplomática se dá em pleno conflito.
Diplomacia não comporta amadorismo. O Brasil não integra o grupo de países com expressão geopolítica, que exercem influência na região e nos fóruns internacionais. O primeiro dever da diplomacia é o desconfiômetro, isto é, perceber o seu tamanho. Foi mais ou menos isso que, para nosso constrangimento, nos disse o porta-voz do governo israelense, ao nos qualificar de “anões”.
O conflito de Gaza tem complexidade bem maior que uma negociação sindical. Não começou hoje e nem se sabe quando, como e se terminará. Apelar ao cessar-fogo – gesto-clichê que as grandes potências fazem enquanto buscam uma saída - implica não julgar as partes em conflito.
O Itamaraty valeu-se do jargão, para, em seguida, condenar apenas uma das partes, exatamente a que não teve a iniciativa do presente embate. Militância e diplomacia são práticas que se repelem e, quando se insiste em misturá-las resulta no que se viu: vexame.