Direto ao Ponto
O anjo-da-guarda da bandidagem federal mostra a falta que um Sobral Pinto faz
Augusto Nunes, Blog na Veja, 04/09/2010 às 22:44
Em julho de 2005, foi Márcio Thomaz Bastos, então ministro da Justiça, quem aconselhou o presidente da República e seus delinquentes de estimação a transformarem o escândalo do mensalão num edição revista e atualizada do velho caixa dois. Não houve uma roubalheira de dimensões siderais, ensinou o anjo-da-guarda da bandidagem federal. Houve apenas uma acumulação um tanto descuidada de “recursos não-contabilizados”.
Cinco invernos depois, foi Márcio Thomaz Bastos quem teve a ideia de transformar o estupro do sigilo fiscal de adversários do governo — um afrontoso pontapé na Constituição — como uma malandragem brasileiríssima, uma safadeza rotineira, generalizada e sem nada a ver com política ou eleições. É Márcio Thomaz Bastos quem dita o que andam declamando tanto o chefe de governo como o resto do palanque.
Quando, por exemplo, um Guido Mantega diz que nenhum sistema é inviolável (nem o da urna eletrônica, presume-se), pode-se ouvir com nitidez a voz do inventivo criminalista. Quando nasce aparentemente do nada uma lista que junta dezenas de anônimos e um punhado de figuras que nunca frequentaram comícios, é dele a mão que a balança no berço. Se até a apresentadora Ana Maria Braga entrou na trama do mafuá de Mauá, por que estranhar a presença na multidão de vítimas de Verônica Serra e alguns tucanos ligados ao candidato da oposição? Crime político, está avisando o truque, é coisa que só existe na cabeça da turma da teoria conspiratória.
Os amigos do doutor deveriam aproveitar a próxima festa de aniversário para ler em voz alta, na hora de apagar as velas, o trecho do post aqui publicado em maio de 2009. Trata de um episódio protagonizado pelo advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto e pelo poeta Augusto Schmidt. E merece ser ouvido ao menos uma vez por gente que se vale da competência profissional e da astúcia congênita para favorecer a institucionalização da injustiça, para impedir a punição dos culpados e para dar passagem aos inimigos do estado democrático de direito.
Sobral e Schmidt eram amigos de muitos anos quando conversaram por telefone em 16 de outubro de 1944. Além de versos, Schmidt sabia também fazer dinheiro como editor, intermediário de transações financeiras e ocupante de cargos públicos. Naquele dia, foi o empresário quem ligou, para pedir ao jurista que reservasse todo o dia 20 ao exame da documentação que lhe permitiria representá-lo numa causa de natureza trabalhista.
Sobral informou que, antes de aceitar o serviço, teria de verificar se o candidato a cliente tinha razão. Advogado não é juiz, replicou Schmidt. Ouviu outra vez que o convite só seria aceito depois do exame eliminatório. Como tudo teria de ser feito até o dia 21, ponderou Sobral, Schmidt talvez devesse contratar outro defensor. A conversa não deve ter terminado bem, atesta a carta remetida pelo advogado no dia seguinte. É uma luminosa aula de Direito. E uma irretocável lição de vida.
”O primeiro e mais fundamental dever do advogado é ser o juiz inicial da causa que lhe levam para patrocinar”, ensina o doutor Sobral. “Incumbe-lhe, antes de tudo, examinar minuciosamente a hipótese para ver se ela é realmente defensável em face dos preceitos da justiça. Só depois de que eu me convenço de que a justiça está com a parte que me procura é que me ponho à sua disposição”. A regra vale também para velhos amigos? Claro que sim: “Não seria a primeira vez que, procurado por um amigo para patrocinar a causa que me trazia, tive de dizer-lhe que a justiça não estava do seu lado, pelo que não me era lícito defender seus interesses”.
Vista por Sobral Pinto, “a advocacia não se destina à defesa de quaisquer interesses. Não basta a amizade ou honorários de vulto para que um advogado se sinta justificado diante de sua consciência pelo patrocínio de uma causa. (…) O advogado não é, assim, um técnico às ordens desta ou daquela pessoa que se dispõe a comparecer à Justiça. (…) O advogado é, necessariamente, uma consciência escrupulosa ao serviço tão só dos interesses da justiça, incumbindo-lhe, por isto, aconselhar àquelas partes que o procuram a que não discutam aqueles casos nos quais não lhes assiste nenhuma razão”.
A aula termina com palavras que deveriam ser reproduzidas em bronze nos pórticos das faculdades de Direito: ”É indispensável que os clientes procurem o advogado de suas preferências como um homem de bem a quem se vai pedir conselho. (…) Orientada neste sentido, a advocacia é, nos países moralizados, um elemento de ordem e um dos mais eficientes instrumentos de realização do bem comum da sociedade”.
Pelo que andam fazendo nestes tempos estranhos, raríssimos bachareis concordam com Sobral Pinto. Não lhes interessam atenuantes que abrandem o castigo merecido, não lhes passa pela cabeça dar razão a quem tem. Preferem recitar que todo acusado tem direito a um advogado — uma verdade que ninguém contesta — e imediatamente abrir o cortejo de mentiras promovido para manter em liberdade clientes sabidamente culpados.
No Brasil da Era Lula, os bachareis que cobram por hora assumem sem constrangimentos o papel de de cúmplice de bandidos irrecuperáveis. Pena que o doutor Sobral não tenha vivido para, em mais uma carta irretocável, dizer-lhes claramente o que são.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
domingo, 5 de setembro de 2010
Diplomacia de palanque - Embaixador Roberto Abdenur (Veja)
“A preocupação maior do Itamaraty tem sido armar palanques para o presidente”
Reinaldo Azevedo, 5.09.2010
Este escriba tem alguns orgulhos profissionais. Um deles é jamais ter-se deixado enganar por Celso Amorim, o Megalonanico das Relações Exteriores. “Nunca” quer dizer “nunca”. Já em 2003 a revista Primeira Leitura apontou a parolagem terceiro-mundista ou pobrista desse gigante e o desejo de transformar a política externa em palanque para o guia de Elio Gaspari. Desde 2003 a esta data, fui colecionando as sucessivas derrotas de Amorim e todas as besteiras que fez. Imaginem: uma votação de coleguinhas, em 2004 acho, o considerou “o melhor ministro de Lula”. Uau!
Vale a pena ler a entrevista de Roberto Abdenur, que foi embaixador do Brasil em Washington no primeiro mandato de Lula, nas Páginas Amarelas da VEJA desta semana. Não estou dizendo que pensemos rigorosamente a mesma coisa, mas parece que as críticas que sempre fiz neste blog à política externa tinham fundamento. Leiam trechos:

Das Páginas Amarelas da revista Veja desta semana:
Por Diogo Schelp:
“Aceita um copo d’água. um café ou, quem sabe, um pouco do caviar que me envia sempre um certo amigo iraniano?”, oferece Roberto Abdenur, de 68 anos, ao receber a reportagem de VEJA em seu agradável apartamento no Rio de Janeiro, No humor característico dos diplomatas, a referência ao caviar é apenas uma ironia sobre um dos temas que deixam estupefatos especialistas em política externa, a estreita relação do governo brasileiro com o regime do iraniano Mahmoud Ahmadinejad. As ambições nucleares e a violação assumida de direitos humanos, como o apedrejamento de mulheres por adultério, fizeram do Irã um pária internacional. Com seus 44 anos de carreira diplomática, três deles como embaixador em Washington durante o primeiro mandato do presidente Lula, Abdenur é uma das pessoas mais habilitadas para avaliar o Brasil no quadro diplomático mundial. Na entrevista a seguir, ele demonstra o seu assombro diante da maneira como os preconceitos ideológicos e o gosto de Lula por um palanque prejudicaram a imagem do Brasil no exterior.
Que balanço o senhor faz da política externa do governo Lula?
(…) A política externa brasileira, nos últimos oito anos atuou com base na visão de que no mundo ainda há claramente uma contraposição entre ricos e pobres, norte e sul. Isso não faz mais sentido em um mundo globalizado (…) Apesar dessa nova realidade, a política externa de Lula tem procurado apresentar o Brasil como líder dos países pobres. É preciso abandonar essa visão.
O senhor escreveu que a diplomacia brasileira precisa recuperar o seu “lado ocidental”. Por quê?
O Brasil, nos últimos anos, relegou a um plano de quase irrelevância o compromisso com dois valores fundamentais para a política externa: a democracia e os direitos humanos. Estes são valores ocidentais e, também, brasileiros. (…)
O chanceler Celso Amorim disse que “negócios são negócios” ao justificar a visita de Lula a uma ditadura africana. Esse é o pragmatismo de que o senhor fala?
Não. Há limites para a diplomacia presidencial. Quando o presidente entra em cena, atribui-se à relação com determinado país um peso político muito maior. O presidente é a instância mais elevada da diplomacia, e é preciso dosar a sua exposição, pois ela traz consigo o endosso e a imagem de todo o país. O problema é que o Itamaraty não sabe dizer “não” a Lula, e isso cria situações como as que envolveram recentemente o Brasil e o Irã. (…) Não há benefício algum, no entanto, em aproximar-se do Irã, muito menos em nível presidencial. Ahmadinejad é o líder de um regime teocrático, violento e isolado internacionalmente. Apesar disso. Lula diz que tem uma relação de carinho com o iraniano.
(…)
O que explica essa atitude?
Há um palanquismo na política externa, algo que reflete muito a natureza pessoal de Lula. A preocupação maior do Itamaraty tem sido armar palanques para o presidente. Essa diplomacia cenográfica tinha até pouco tempo atrás um bom público lá fora. Até a eleição de Barack Obama, nos Estados Unidos, em 2008, Lula era o governante mais respeitado e estimado no exterior. Ele acumulou um bom capital político, principalmente pela conjuntura econômica favorável. (…)
Como Lula usou esse prestígio?
Lula. por sua sofreguidão em ser popular com todo o mundo e por ignorar as circunstâncias das situações em que se meteu, pôs a perder uma parte considerável do capital político adquirido para si e para o Brasil. Quando Ahmadinejad veio a Brasília e disse apoiar a candidatura do Brasil a uma vaga permanente no Conselho de Segurança, nós perdemos muito voto. (…) Dói imensamente ver as credenciais do Brasil para ocupar uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU serem seriamente prejudicadas por todos esses erros de política externa.(…)
Como o senhor avalia as relações do governo brasileiro com o presidente venezuelano Hugo Chávez?
É uma aberração diplomática. O Brasil é condescendente com Chávez. com Evo Morales, da Bolívia, e com Rafael Corrêa, do Equador, apenas por representarem regimes identificados como de esquerda. Isso é um erro. Porque não existe política externa de esquerda. A diplomacia tem de refletir os interesses do estado, não de um partido. O governo brasileiro é ativamente solidário e conivente com Chávez, um líder que está em etapa adiantada na consolidação de uma ditadura (…)
Reinaldo Azevedo, 5.09.2010
Este escriba tem alguns orgulhos profissionais. Um deles é jamais ter-se deixado enganar por Celso Amorim, o Megalonanico das Relações Exteriores. “Nunca” quer dizer “nunca”. Já em 2003 a revista Primeira Leitura apontou a parolagem terceiro-mundista ou pobrista desse gigante e o desejo de transformar a política externa em palanque para o guia de Elio Gaspari. Desde 2003 a esta data, fui colecionando as sucessivas derrotas de Amorim e todas as besteiras que fez. Imaginem: uma votação de coleguinhas, em 2004 acho, o considerou “o melhor ministro de Lula”. Uau!
Vale a pena ler a entrevista de Roberto Abdenur, que foi embaixador do Brasil em Washington no primeiro mandato de Lula, nas Páginas Amarelas da VEJA desta semana. Não estou dizendo que pensemos rigorosamente a mesma coisa, mas parece que as críticas que sempre fiz neste blog à política externa tinham fundamento. Leiam trechos:

Das Páginas Amarelas da revista Veja desta semana:
Por Diogo Schelp:
“Aceita um copo d’água. um café ou, quem sabe, um pouco do caviar que me envia sempre um certo amigo iraniano?”, oferece Roberto Abdenur, de 68 anos, ao receber a reportagem de VEJA em seu agradável apartamento no Rio de Janeiro, No humor característico dos diplomatas, a referência ao caviar é apenas uma ironia sobre um dos temas que deixam estupefatos especialistas em política externa, a estreita relação do governo brasileiro com o regime do iraniano Mahmoud Ahmadinejad. As ambições nucleares e a violação assumida de direitos humanos, como o apedrejamento de mulheres por adultério, fizeram do Irã um pária internacional. Com seus 44 anos de carreira diplomática, três deles como embaixador em Washington durante o primeiro mandato do presidente Lula, Abdenur é uma das pessoas mais habilitadas para avaliar o Brasil no quadro diplomático mundial. Na entrevista a seguir, ele demonstra o seu assombro diante da maneira como os preconceitos ideológicos e o gosto de Lula por um palanque prejudicaram a imagem do Brasil no exterior.
Que balanço o senhor faz da política externa do governo Lula?
(…) A política externa brasileira, nos últimos oito anos atuou com base na visão de que no mundo ainda há claramente uma contraposição entre ricos e pobres, norte e sul. Isso não faz mais sentido em um mundo globalizado (…) Apesar dessa nova realidade, a política externa de Lula tem procurado apresentar o Brasil como líder dos países pobres. É preciso abandonar essa visão.
O senhor escreveu que a diplomacia brasileira precisa recuperar o seu “lado ocidental”. Por quê?
O Brasil, nos últimos anos, relegou a um plano de quase irrelevância o compromisso com dois valores fundamentais para a política externa: a democracia e os direitos humanos. Estes são valores ocidentais e, também, brasileiros. (…)
O chanceler Celso Amorim disse que “negócios são negócios” ao justificar a visita de Lula a uma ditadura africana. Esse é o pragmatismo de que o senhor fala?
Não. Há limites para a diplomacia presidencial. Quando o presidente entra em cena, atribui-se à relação com determinado país um peso político muito maior. O presidente é a instância mais elevada da diplomacia, e é preciso dosar a sua exposição, pois ela traz consigo o endosso e a imagem de todo o país. O problema é que o Itamaraty não sabe dizer “não” a Lula, e isso cria situações como as que envolveram recentemente o Brasil e o Irã. (…) Não há benefício algum, no entanto, em aproximar-se do Irã, muito menos em nível presidencial. Ahmadinejad é o líder de um regime teocrático, violento e isolado internacionalmente. Apesar disso. Lula diz que tem uma relação de carinho com o iraniano.
(…)
O que explica essa atitude?
Há um palanquismo na política externa, algo que reflete muito a natureza pessoal de Lula. A preocupação maior do Itamaraty tem sido armar palanques para o presidente. Essa diplomacia cenográfica tinha até pouco tempo atrás um bom público lá fora. Até a eleição de Barack Obama, nos Estados Unidos, em 2008, Lula era o governante mais respeitado e estimado no exterior. Ele acumulou um bom capital político, principalmente pela conjuntura econômica favorável. (…)
Como Lula usou esse prestígio?
Lula. por sua sofreguidão em ser popular com todo o mundo e por ignorar as circunstâncias das situações em que se meteu, pôs a perder uma parte considerável do capital político adquirido para si e para o Brasil. Quando Ahmadinejad veio a Brasília e disse apoiar a candidatura do Brasil a uma vaga permanente no Conselho de Segurança, nós perdemos muito voto. (…) Dói imensamente ver as credenciais do Brasil para ocupar uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU serem seriamente prejudicadas por todos esses erros de política externa.(…)
Como o senhor avalia as relações do governo brasileiro com o presidente venezuelano Hugo Chávez?
É uma aberração diplomática. O Brasil é condescendente com Chávez. com Evo Morales, da Bolívia, e com Rafael Corrêa, do Equador, apenas por representarem regimes identificados como de esquerda. Isso é um erro. Porque não existe política externa de esquerda. A diplomacia tem de refletir os interesses do estado, não de um partido. O governo brasileiro é ativamente solidário e conivente com Chávez, um líder que está em etapa adiantada na consolidação de uma ditadura (…)
John R. Russell-Wood: minha homenagem a um grande historiador
John Russell-Wood: obituário de um membro do Conselho da RBPI
Paulo Roberto de Almeida
A historiografia brasileira moderna muito deve aos historiadores ingleses, a começar pelo “patrão” da tribo, Robert Southey, com sua History of Brazil (em três volumes: 1810-19), a primeira escrita em inglês. Seguiram-se muitos outros nos séculos 19 e 20, entre os quais Charles Boxer, o grande especialista no mundo colonial português e seu império marítimo, com suas ramificações nas Américas, na África e na Ásia (onde ele, aliás, tinha servido como militar).

O historiador John Russell-Wood, nascido galês, educado na Inglaterra e radicado desde longos anos nos Estados Unidos, seguiu essa mesma tradição de estudos historiográficos centrados no mundo colonial português, sem no entanto ter passado pelas forças armadas de sua majestade britânica. Graduou-se em história moderna pela Universidade de Oxford (1961), onde também fez seu mestrado (1963) e doutorado (1967), e estudou na Universidade de Coimbra, onde consolidou definitivamente sua reputação de historiador do universo português. Ao falecer, aos 70 anos, no dia 13 de agosto de 2010, ele lecionava desde 1971 no departamento de História da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, onde se ocupava da América Latina colonial, com ênfase no mundo português. Foi justamente Charles Boxer, nos seus tempos de Oxford, quem o inspirou a se dedicar ao papel do Brasil no império colonial português.
Seus estudos nessa área foram muito ecléticos, incluindo pesquisas em história administrativa, das instituições, da arte, da tecnologia, da medicina, da família, das mulheres, sobre as raças e a escravidão. Um de seus mais destacados livros se ocupava, justamente, de Slavery and Freedom in Colonial Brazil: (1982, 1993 e 2002), no qual ele mostrava que as relações raciais no Brasil colonial estavam mais para o chiaroscuro (que é o título de um dos capítulos) do que para o black-and-white da experiência dos Estados Unidos. Ele tinha vivido no Brasil, concentrado em suas pesquisas sobre o período colonial, entre 1964 e 1970, quando percorreu muitos arquivos e leu inúmero relatórios sobre as irmandades e as casas de misericórdia (sobre a Santa Casa da Bahia publicou Fidalgos and Philantropists, em 1968). Entre seus outros livros, consolidando seu vasto conhecimento sobre o Brasil colonial e o império português, podem ser citados: Society and government in colonial Brazil, 1500-1822 (1992) e Portuguese empire, 1415-1808: a world on the move (1998).
Não contente em orientar seus muitos alunos em estudos brasileiros, ele os recebia em sua casa de Lutherville e mantinha relações pessoais com todos eles, organizando festas nos grandes feriados americanos. Eu o conheci pessoalmente nos encontros de brasilianistas que ajudei a organizar quando de minha estada na Embaixada em Washington (quando também sugeri o seu nome para a ordem de Rio Branco) e ele surpreendeu-me imediatamente pelo seu bom-humor e disposição em colaborar em nossos empreendimentos acadêmicos.
Paulo Roberto de Almeida
Nota preparada para a RBPI
Livros de Russell-Wood:
- Fidalgos and Philanthropists. The Santa Casa da Misericórdia of Bahia,1550-1755 (London: Macmillan's; Berkeley, University of California Press, 1968); Portuguese language edition: Fidalgos e Filantropos (Coleção temas brasileiros, vol. 20. Editora Universidade de Brasilia, 1982).
- From Colony to Nation. Essays on the Independence of Brazil (Baltimore & London:The Johns Hopkins University Press, 1975), co-author and editor.
- The Black Man in Slavery and Freedom in Colonial Brazil (London: Macmillan=s; New York: St. Martin's Press, 1982): Reprinted 1993.
Society and Government in Colonial Brazil, 1500-1822 (Aldershot:Variorum, 1992).
- A World on the Move: The Portuguese in Africa, Asia, and America, 1415-1808 (Manchester: Carcanet Press; New York: Macmillan's, 1992). In paperback as The Portuguese Empire, 1415-1808: A World on the Move, 1415-1808 (Baltimore:The Johns Hopkins University Press, 1998); Revised and enlarged Portuguese language edition Um Mundo em movimento: os Portugueses na Africa, Asia, e América, 1415-1825 (Lisbon: Difel,1998)
- Portugal and the Sea: A World Embraced / Portugal e o mar: Um mundo entrelaçado (Lisbon: Assírio & Alvim, 1997). Portuguese, Spanish, and English language editions.
- Local Government in European Overseas Empires, 1450-1800. 2 vols (Brookfield, VT: Ashgate. 1999). Edited with a 60 page introduction
- Government and Governance of European Empires, 1450-1800. 2 vols (Brookfield; VT: Ashgate; 2000 ). Edited with a 60 page introduction.
- Slavery and Freedom in Colonial Brazil (Oxford: OneWorld, 2002). New edition with a new preface "Free and Freed Persons of African Descent in Colonial Brazil:Trends and Historiography, 1982-2002"; Revised Portuguese language edition: Escravos e libertos no Brasil colonial (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005).
- Universalidade das Santas Casas. 500 anos de Cultura Lusófona (Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 2002). Booklet, pp. 75

Slavery and Freedom in Colonial Brazil
Table of Contents
Preface
Preface to the new edition: Free and freed persons of African descent in colonial Brazil: trends and historiography, 1982-2002
1 Africans and Europeans: historiography and perceptions of reality
2 Paths to freedom
3 Free blacks and free mulattos in the economy of Portuguese America
4 Free blacks and free mulattos in the society of Portuguese America
5 Voicing of aspirations by persons of African descent
6 The person of African descent in the culture of Portuguese America
7 The other slavery: gold mining and the 'peculiar institution'
8 Collective behaviour: the brotherhoods
9 Domestic behaviour: family and kinship
10 Chiaroscuro in colonial Brazil
Notes
Bibliography
Index
Paulo Roberto de Almeida
A historiografia brasileira moderna muito deve aos historiadores ingleses, a começar pelo “patrão” da tribo, Robert Southey, com sua History of Brazil (em três volumes: 1810-19), a primeira escrita em inglês. Seguiram-se muitos outros nos séculos 19 e 20, entre os quais Charles Boxer, o grande especialista no mundo colonial português e seu império marítimo, com suas ramificações nas Américas, na África e na Ásia (onde ele, aliás, tinha servido como militar).

O historiador John Russell-Wood, nascido galês, educado na Inglaterra e radicado desde longos anos nos Estados Unidos, seguiu essa mesma tradição de estudos historiográficos centrados no mundo colonial português, sem no entanto ter passado pelas forças armadas de sua majestade britânica. Graduou-se em história moderna pela Universidade de Oxford (1961), onde também fez seu mestrado (1963) e doutorado (1967), e estudou na Universidade de Coimbra, onde consolidou definitivamente sua reputação de historiador do universo português. Ao falecer, aos 70 anos, no dia 13 de agosto de 2010, ele lecionava desde 1971 no departamento de História da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, onde se ocupava da América Latina colonial, com ênfase no mundo português. Foi justamente Charles Boxer, nos seus tempos de Oxford, quem o inspirou a se dedicar ao papel do Brasil no império colonial português.
Seus estudos nessa área foram muito ecléticos, incluindo pesquisas em história administrativa, das instituições, da arte, da tecnologia, da medicina, da família, das mulheres, sobre as raças e a escravidão. Um de seus mais destacados livros se ocupava, justamente, de Slavery and Freedom in Colonial Brazil: (1982, 1993 e 2002), no qual ele mostrava que as relações raciais no Brasil colonial estavam mais para o chiaroscuro (que é o título de um dos capítulos) do que para o black-and-white da experiência dos Estados Unidos. Ele tinha vivido no Brasil, concentrado em suas pesquisas sobre o período colonial, entre 1964 e 1970, quando percorreu muitos arquivos e leu inúmero relatórios sobre as irmandades e as casas de misericórdia (sobre a Santa Casa da Bahia publicou Fidalgos and Philantropists, em 1968). Entre seus outros livros, consolidando seu vasto conhecimento sobre o Brasil colonial e o império português, podem ser citados: Society and government in colonial Brazil, 1500-1822 (1992) e Portuguese empire, 1415-1808: a world on the move (1998).
Não contente em orientar seus muitos alunos em estudos brasileiros, ele os recebia em sua casa de Lutherville e mantinha relações pessoais com todos eles, organizando festas nos grandes feriados americanos. Eu o conheci pessoalmente nos encontros de brasilianistas que ajudei a organizar quando de minha estada na Embaixada em Washington (quando também sugeri o seu nome para a ordem de Rio Branco) e ele surpreendeu-me imediatamente pelo seu bom-humor e disposição em colaborar em nossos empreendimentos acadêmicos.
Paulo Roberto de Almeida
Nota preparada para a RBPI
Livros de Russell-Wood:
- Fidalgos and Philanthropists. The Santa Casa da Misericórdia of Bahia,1550-1755 (London: Macmillan's; Berkeley, University of California Press, 1968); Portuguese language edition: Fidalgos e Filantropos (Coleção temas brasileiros, vol. 20. Editora Universidade de Brasilia, 1982).
- From Colony to Nation. Essays on the Independence of Brazil (Baltimore & London:The Johns Hopkins University Press, 1975), co-author and editor.
- The Black Man in Slavery and Freedom in Colonial Brazil (London: Macmillan=s; New York: St. Martin's Press, 1982): Reprinted 1993.
Society and Government in Colonial Brazil, 1500-1822 (Aldershot:Variorum, 1992).
- A World on the Move: The Portuguese in Africa, Asia, and America, 1415-1808 (Manchester: Carcanet Press; New York: Macmillan's, 1992). In paperback as The Portuguese Empire, 1415-1808: A World on the Move, 1415-1808 (Baltimore:The Johns Hopkins University Press, 1998); Revised and enlarged Portuguese language edition Um Mundo em movimento: os Portugueses na Africa, Asia, e América, 1415-1825 (Lisbon: Difel,1998)
- Portugal and the Sea: A World Embraced / Portugal e o mar: Um mundo entrelaçado (Lisbon: Assírio & Alvim, 1997). Portuguese, Spanish, and English language editions.
- Local Government in European Overseas Empires, 1450-1800. 2 vols (Brookfield, VT: Ashgate. 1999). Edited with a 60 page introduction
- Government and Governance of European Empires, 1450-1800. 2 vols (Brookfield; VT: Ashgate; 2000 ). Edited with a 60 page introduction.
- Slavery and Freedom in Colonial Brazil (Oxford: OneWorld, 2002). New edition with a new preface "Free and Freed Persons of African Descent in Colonial Brazil:Trends and Historiography, 1982-2002"; Revised Portuguese language edition: Escravos e libertos no Brasil colonial (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005).
- Universalidade das Santas Casas. 500 anos de Cultura Lusófona (Salvador: Empresa Gráfica da Bahia, 2002). Booklet, pp. 75

Slavery and Freedom in Colonial Brazil
Table of Contents
Preface
Preface to the new edition: Free and freed persons of African descent in colonial Brazil: trends and historiography, 1982-2002
1 Africans and Europeans: historiography and perceptions of reality
2 Paths to freedom
3 Free blacks and free mulattos in the economy of Portuguese America
4 Free blacks and free mulattos in the society of Portuguese America
5 Voicing of aspirations by persons of African descent
6 The person of African descent in the culture of Portuguese America
7 The other slavery: gold mining and the 'peculiar institution'
8 Collective behaviour: the brotherhoods
9 Domestic behaviour: family and kinship
10 Chiaroscuro in colonial Brazil
Notes
Bibliography
Index
Um imperio sem um tostao... - Tom Friedman
...ou quase.
Como alerta Tom Friedman, se os "anti-imperialistas" de carteirinha - e temos muitos representantes dessa espécie no Brasil -- não gostam de um mundo dominado pelo imperialismo americano, eles provavelmente vão gostar menos ainda de um mundo fragmentado entre candidatos a potência muito mais erráticos e prejudiciais aos interesses da comunidade internacional do que o velho imperialismo americano.
O mundo vai se tornar um lugar mais imprevisível e conflituoso do que o era com essa potência arrogante, já que os alternativos, ou substitutos constituem alternativas muito piores do que o original.
Paulo Roberto de Almeida
Superbroke, Superfrugal, Superpower?
By THOMAS L. FRIEDMAN
The New York Times, September 4, 2010
In recent years, I have often said to European friends: So, you didn’t like a world of too much American power? See how you like a world of too little American power — because it is coming to a geopolitical theater near you. Yes, America has gone from being the supreme victor of World War II, with guns and butter for all, to one of two superpowers during the cold war, to the indispensable nation after winning the cold war, to “The Frugal Superpower” of today. Get used to it. That’s our new nickname. American pacifists need not worry any more about “wars of choice.” We’re not doing that again. We can’t afford to invade Grenada today.
Ever since the onset of the Great Recession of 2008, it has been clear that the nature of being a leader — political or corporate — was changing in America. During most of the post-World War II era, being a leader meant, on balance, giving things away to people. Today, and for the next decade at least, being a leader in America will mean, on balance, taking things away from people.
And there is simply no way that America’s leaders, as they have to take more things away from their own voters, are not going to look to save money on foreign policy and foreign wars. Foreign and defense policy is a lagging indicator. A lot of other things get cut first. But the cuts are coming — you can already hear the warnings from Secretary of Defense Robert Gates. And a frugal American superpower is sure to have ripple effects around the globe.
“The Frugal Superpower: America’s Global Leadership in a Cash-Strapped Era” is actually the title of a very timely new book by my tutor and friend Michael Mandelbaum, the Johns Hopkins University foreign policy expert. “In 2008,” Mandelbaum notes, “all forms of government-supplied pensions and health care (including Medicaid) constituted about 4 percent of total American output.” At present rates, and with the baby boomers soon starting to draw on Social Security and Medicare, by 2050 “they will account for a full 18 percent of everything the United States produces.”
This — on top of all the costs of bailing ourselves out of this recession — “will fundamentally transform the public life of the United States and therefore the country’s foreign policy.” For the past seven decades, in both foreign affairs and domestic policy, our defining watchword was “more,” argues Mandelbaum. “The defining fact of foreign policy in the second decade of the 21st century and beyond will be ‘less.’ ”
When the world’s only superpower gets weighed down with this much debt — to itself and other nations — everyone will feel it. How? Hard to predict. But all I know is that the most unique and important feature of U.S. foreign policy over the last century has been the degree to which America’s diplomats and naval, air and ground forces provided global public goods — from open seas to open trade and from containment to counterterrorism — that benefited many others besides us. U.S. power has been the key force maintaining global stability, and providing global governance, for the last 70 years. That role will not disappear, but it will almost certainly shrink.
Great powers have retrenched before: Britain for instance. But, as Mandelbaum notes, “When Britain could no longer provide global governance, the United States stepped in to replace it. No country now stands ready to replace the United States, so the loss to international peace and prosperity has the potential to be greater as America pulls back than when Britain did.”
After all, Europe is rich but wimpy. China is rich nationally but still dirt poor on a per capita basis and, therefore, will be compelled to remain focused inwardly and regionally. Russia, drunk on oil, can cause trouble but not project power. “Therefore, the world will be a more disorderly and dangerous place,” Mandelbaum predicts.
How to mitigate this trend? Mandelbaum argues for three things: First, we need to get ourselves back on a sustainable path to economic growth and reindustrialization, with whatever sacrifices, hard work and political consensus that requires. Second, we need to set priorities. We have enjoyed a century in which we could have, in foreign policy terms, both what is vital and what is desirable. For instance, I presume that with infinite men and money we can succeed in Afghanistan. But is it vital? I am sure it is desirable, but vital? Finally, we need to shore up our balance sheet and weaken that of our enemies, and the best way to do that in one move is with a much higher gasoline tax.
America is about to learn a very hard lesson: You can borrow your way to prosperity over the short run but not to geopolitical power over the long run. That requires a real and growing economic engine. And, for us, the short run is now over. There was a time when thinking seriously about American foreign policy did not require thinking seriously about economic policy. That time is also over.
An America in hock will have no hawks — or at least none that anyone will take seriously.
Como alerta Tom Friedman, se os "anti-imperialistas" de carteirinha - e temos muitos representantes dessa espécie no Brasil -- não gostam de um mundo dominado pelo imperialismo americano, eles provavelmente vão gostar menos ainda de um mundo fragmentado entre candidatos a potência muito mais erráticos e prejudiciais aos interesses da comunidade internacional do que o velho imperialismo americano.
O mundo vai se tornar um lugar mais imprevisível e conflituoso do que o era com essa potência arrogante, já que os alternativos, ou substitutos constituem alternativas muito piores do que o original.
Paulo Roberto de Almeida
Superbroke, Superfrugal, Superpower?
By THOMAS L. FRIEDMAN
The New York Times, September 4, 2010
In recent years, I have often said to European friends: So, you didn’t like a world of too much American power? See how you like a world of too little American power — because it is coming to a geopolitical theater near you. Yes, America has gone from being the supreme victor of World War II, with guns and butter for all, to one of two superpowers during the cold war, to the indispensable nation after winning the cold war, to “The Frugal Superpower” of today. Get used to it. That’s our new nickname. American pacifists need not worry any more about “wars of choice.” We’re not doing that again. We can’t afford to invade Grenada today.
Ever since the onset of the Great Recession of 2008, it has been clear that the nature of being a leader — political or corporate — was changing in America. During most of the post-World War II era, being a leader meant, on balance, giving things away to people. Today, and for the next decade at least, being a leader in America will mean, on balance, taking things away from people.
And there is simply no way that America’s leaders, as they have to take more things away from their own voters, are not going to look to save money on foreign policy and foreign wars. Foreign and defense policy is a lagging indicator. A lot of other things get cut first. But the cuts are coming — you can already hear the warnings from Secretary of Defense Robert Gates. And a frugal American superpower is sure to have ripple effects around the globe.
“The Frugal Superpower: America’s Global Leadership in a Cash-Strapped Era” is actually the title of a very timely new book by my tutor and friend Michael Mandelbaum, the Johns Hopkins University foreign policy expert. “In 2008,” Mandelbaum notes, “all forms of government-supplied pensions and health care (including Medicaid) constituted about 4 percent of total American output.” At present rates, and with the baby boomers soon starting to draw on Social Security and Medicare, by 2050 “they will account for a full 18 percent of everything the United States produces.”
This — on top of all the costs of bailing ourselves out of this recession — “will fundamentally transform the public life of the United States and therefore the country’s foreign policy.” For the past seven decades, in both foreign affairs and domestic policy, our defining watchword was “more,” argues Mandelbaum. “The defining fact of foreign policy in the second decade of the 21st century and beyond will be ‘less.’ ”
When the world’s only superpower gets weighed down with this much debt — to itself and other nations — everyone will feel it. How? Hard to predict. But all I know is that the most unique and important feature of U.S. foreign policy over the last century has been the degree to which America’s diplomats and naval, air and ground forces provided global public goods — from open seas to open trade and from containment to counterterrorism — that benefited many others besides us. U.S. power has been the key force maintaining global stability, and providing global governance, for the last 70 years. That role will not disappear, but it will almost certainly shrink.
Great powers have retrenched before: Britain for instance. But, as Mandelbaum notes, “When Britain could no longer provide global governance, the United States stepped in to replace it. No country now stands ready to replace the United States, so the loss to international peace and prosperity has the potential to be greater as America pulls back than when Britain did.”
After all, Europe is rich but wimpy. China is rich nationally but still dirt poor on a per capita basis and, therefore, will be compelled to remain focused inwardly and regionally. Russia, drunk on oil, can cause trouble but not project power. “Therefore, the world will be a more disorderly and dangerous place,” Mandelbaum predicts.
How to mitigate this trend? Mandelbaum argues for three things: First, we need to get ourselves back on a sustainable path to economic growth and reindustrialization, with whatever sacrifices, hard work and political consensus that requires. Second, we need to set priorities. We have enjoyed a century in which we could have, in foreign policy terms, both what is vital and what is desirable. For instance, I presume that with infinite men and money we can succeed in Afghanistan. But is it vital? I am sure it is desirable, but vital? Finally, we need to shore up our balance sheet and weaken that of our enemies, and the best way to do that in one move is with a much higher gasoline tax.
America is about to learn a very hard lesson: You can borrow your way to prosperity over the short run but not to geopolitical power over the long run. That requires a real and growing economic engine. And, for us, the short run is now over. There was a time when thinking seriously about American foreign policy did not require thinking seriously about economic policy. That time is also over.
An America in hock will have no hawks — or at least none that anyone will take seriously.
O império dos oprimidos - Guilherme Fiuza
Apenas um caso de impostura eleitoral...
O império dos oprimidos
Guilherme Fiuza
O Globo, 04/09/2010
Quando estourou o escândalo do mensalão, em 2005, o companheiro Delúbio foi logo avisando que aquilo era uma tentativa de golpe da direita contra o governo popular. Agora, com o escândalo da espionagem na Receita Federal, a companheira Dilma alerta que "estão tentando virar a mesa da democracia". O enredo da esquerda oprimida, como se vê, é inesgotável.
É dura a tarefa de se perpetuar no poder e continuar oprimido. Requer uma formidável ginástica conceitual, quase um presépio de fetiches - o papai pobre, a mamãe heroica, o filho do Brasil, a manjedoura estatal. Foi penoso para o então tesoureiro Delúbio Soares interromper as baforadas no charuto cubano para gritar, empanturrado de verbas públicas privatizadas pelo PT, que precisava de socorro contra a ameaça das elites. Não deve ser fácil passar a vida erguendo barricadas imaginárias.
Dilma Rousseff que o diga. As operações na penumbra para detonar adversários políticos - como o dossiê Ruth Cardoso, montado em seu gabinete na Casa Civil - não lhe deixaram feridas. O famigerado "banco de dados" sobre as despesas pessoais da falecida ex-primeira-dama, que é exemplo de dignidade na política brasileira, parece até que não existiu. Sumiu na poeira da mitologia eleitoral, onde Dilma é apenas a mulher valente que luta pelos pobres.
O caso Lina Vieira também ficou invisível nesse presépio. A ex-secretária da Receita Federal denunciou Dilma por tráfico de influência, afirmando que a então ministra ordenou-lhe tratamento especial a um processo envolvendo a família Sarney. Lina sumiu, e a investigação também. O Brasil deixou para trás um indício grave de interferência política da ministra-chefe da Casa Civil na Receita Federal. Um belo habeas corpus para a conspiração.
O escândalo da invasão do sigilo da filha de José Serra na Receita, portanto, pode ser tudo - menos surpreendente. O roteiro do filme estava pronto, na cara de todos. Já tinha até trailer, com o caso Eduardo Jorge, o vice-presidente do PSDB cujo sigilo fiscal foi igualmente socializado. Há meses o país assiste a esse trailer soturno: como um cidadão de segunda classe, Eduardo Jorge persegue por conta própria a reparação por seus direitos violados, diante de uma Receita Federal impávida, fingindo-se de morta.
O caso Verônica Serra já começava a ser cozinhado no mesmo fogo lento. O secretário da Receita - o diligente substituto de Lina Vieira - chegara a informar que os dados de Verônica tinham sido solicitados por ela mesma. Aí entrou em ação a imprensa, essa entidade que existe para atrapalhar a química entre o governo de esquerda e o povo. E veio à tona a informação inconveniente: não só a procuração apresentada à Receita era falsa, como a essa altura a própria Receita já sabia disso. Sabia, mas não contou para ninguém. Deve ser uma outra concepção de sigilo.
Os percursos do valerioduto entre as estatais brasileiras e o partido do presidente, os bancos de dados extraoficiais, a conduta temperamental de órgãos técnicos capitais como a Receita Federal - para ficar só no universo da máquina pública - compõem uma literatura republicana no mínimo intrigante. Em circunstâncias normais, este seria um governo sob suspeita. Ou talvez, acossado pela vigilância democrática, já tivesse corrigido esses desvios - curando-se da obsessão de submeter o Estado ao cabresto partidário.
Mas as circunstâncias não são normais. Dificilmente haverá um paralelo, em toda a história da democracia, de um governo quase à prova de desgaste, que chega ao fim de um exercício de oito anos com menos de 5% da população a reprová-lo. E em regime de plena liberdade. Esta é a façanha de Lula, legítima, que todos precisam reconhecer - mesmo os que discordam de suas políticas. O problema é o que será feito com essa fortuna de popularidade.
O caminho da mistificação populista, simbolizado pela lavagem cerebral do "nunca antes na história deste país", provavelmente já estaria abrandado se o cenário da sucessão de Lula fosse outro. A necessidade de inventar Dilma Rousseff, uma militante despreparada, insegura e absolutamente desprovida de magnetismo e propensão ao diálogo, fez recrudescer a blindagem mitológica. A alta vulnerabilidade da candidata ressuscitou os instintos mais autoritários do PT.
O pesadelo de todos os envolvidos no Plano Dilma é que sua fragilidade e mediocridade acabem expostas em praça pública. E que o paraíso do lulismo acima do bem e do mal chegue ao fim, com a inevitável percepção geral dos problemas reais - como a bagunça institucional que avança no setor público, vide o escândalo da Receita, entre outros desmandos.
Resta a Dilma gritar que estão querendo virar a mesa da democracia, evocando os totens do oprimido para manter a hipnose coletiva. O risco para ela e seus companheiros é perder o poder. O risco para o Brasil é perder a liberdade.
O império dos oprimidos
Guilherme Fiuza
O Globo, 04/09/2010
Quando estourou o escândalo do mensalão, em 2005, o companheiro Delúbio foi logo avisando que aquilo era uma tentativa de golpe da direita contra o governo popular. Agora, com o escândalo da espionagem na Receita Federal, a companheira Dilma alerta que "estão tentando virar a mesa da democracia". O enredo da esquerda oprimida, como se vê, é inesgotável.
É dura a tarefa de se perpetuar no poder e continuar oprimido. Requer uma formidável ginástica conceitual, quase um presépio de fetiches - o papai pobre, a mamãe heroica, o filho do Brasil, a manjedoura estatal. Foi penoso para o então tesoureiro Delúbio Soares interromper as baforadas no charuto cubano para gritar, empanturrado de verbas públicas privatizadas pelo PT, que precisava de socorro contra a ameaça das elites. Não deve ser fácil passar a vida erguendo barricadas imaginárias.
Dilma Rousseff que o diga. As operações na penumbra para detonar adversários políticos - como o dossiê Ruth Cardoso, montado em seu gabinete na Casa Civil - não lhe deixaram feridas. O famigerado "banco de dados" sobre as despesas pessoais da falecida ex-primeira-dama, que é exemplo de dignidade na política brasileira, parece até que não existiu. Sumiu na poeira da mitologia eleitoral, onde Dilma é apenas a mulher valente que luta pelos pobres.
O caso Lina Vieira também ficou invisível nesse presépio. A ex-secretária da Receita Federal denunciou Dilma por tráfico de influência, afirmando que a então ministra ordenou-lhe tratamento especial a um processo envolvendo a família Sarney. Lina sumiu, e a investigação também. O Brasil deixou para trás um indício grave de interferência política da ministra-chefe da Casa Civil na Receita Federal. Um belo habeas corpus para a conspiração.
O escândalo da invasão do sigilo da filha de José Serra na Receita, portanto, pode ser tudo - menos surpreendente. O roteiro do filme estava pronto, na cara de todos. Já tinha até trailer, com o caso Eduardo Jorge, o vice-presidente do PSDB cujo sigilo fiscal foi igualmente socializado. Há meses o país assiste a esse trailer soturno: como um cidadão de segunda classe, Eduardo Jorge persegue por conta própria a reparação por seus direitos violados, diante de uma Receita Federal impávida, fingindo-se de morta.
O caso Verônica Serra já começava a ser cozinhado no mesmo fogo lento. O secretário da Receita - o diligente substituto de Lina Vieira - chegara a informar que os dados de Verônica tinham sido solicitados por ela mesma. Aí entrou em ação a imprensa, essa entidade que existe para atrapalhar a química entre o governo de esquerda e o povo. E veio à tona a informação inconveniente: não só a procuração apresentada à Receita era falsa, como a essa altura a própria Receita já sabia disso. Sabia, mas não contou para ninguém. Deve ser uma outra concepção de sigilo.
Os percursos do valerioduto entre as estatais brasileiras e o partido do presidente, os bancos de dados extraoficiais, a conduta temperamental de órgãos técnicos capitais como a Receita Federal - para ficar só no universo da máquina pública - compõem uma literatura republicana no mínimo intrigante. Em circunstâncias normais, este seria um governo sob suspeita. Ou talvez, acossado pela vigilância democrática, já tivesse corrigido esses desvios - curando-se da obsessão de submeter o Estado ao cabresto partidário.
Mas as circunstâncias não são normais. Dificilmente haverá um paralelo, em toda a história da democracia, de um governo quase à prova de desgaste, que chega ao fim de um exercício de oito anos com menos de 5% da população a reprová-lo. E em regime de plena liberdade. Esta é a façanha de Lula, legítima, que todos precisam reconhecer - mesmo os que discordam de suas políticas. O problema é o que será feito com essa fortuna de popularidade.
O caminho da mistificação populista, simbolizado pela lavagem cerebral do "nunca antes na história deste país", provavelmente já estaria abrandado se o cenário da sucessão de Lula fosse outro. A necessidade de inventar Dilma Rousseff, uma militante despreparada, insegura e absolutamente desprovida de magnetismo e propensão ao diálogo, fez recrudescer a blindagem mitológica. A alta vulnerabilidade da candidata ressuscitou os instintos mais autoritários do PT.
O pesadelo de todos os envolvidos no Plano Dilma é que sua fragilidade e mediocridade acabem expostas em praça pública. E que o paraíso do lulismo acima do bem e do mal chegue ao fim, com a inevitável percepção geral dos problemas reais - como a bagunça institucional que avança no setor público, vide o escândalo da Receita, entre outros desmandos.
Resta a Dilma gritar que estão querendo virar a mesa da democracia, evocando os totens do oprimido para manter a hipnose coletiva. O risco para ela e seus companheiros é perder o poder. O risco para o Brasil é perder a liberdade.
sábado, 4 de setembro de 2010
Totalitarismo em acao - Ricardo Vélez-Rodríguez
Tudo, ou quase tudo, está dito. Eu acrescentaria, talvez, o elemento da associação para delinquir, que parece ser o princípio base da ação de determinados grupos. O que combina com minha hipótese da república mafiosa do Brasil. Infelizmente.
Paulo Roberto de Almeida
TOTALITARISMO EM AÇÃO
Ricardo Vélez-Rodríguez
Blog Rocinante, sexta-feira, 3 de setembro de 2010
Está sendo implantado pelo atual governo, no Brasil, agressivo modelo de Estado patrimonial, que privatiza ainda mais as instituições republicanas em benefício da militância partidária petista e dos que se acolhem a essa sigla. Essa não seria senão mais uma etapa do nosso arcaico patrimonialismo, não fosse o viés totalitário que assoma por entre as frestas dos acontecimentos ao longo destes oito anos, manifestação que se torna mais translúcida em momentos de pugna eleitoral, como os que estamos vivendo.
Três aspectos na política do atual governo são preocupantes, porquanto conduzem direto a uma etapa, totalitária, do processo de hegemonia petista: primeiro: a tentativa de Lula de conseguir maioria no Senado, com a finalidade de ver aberta a porta para uma reforma de tipo chavista à Constituição. Segundo: a progressiva tendência policial da militância que, não contente com ter aparelhado ministérios, secretarias e autarquias, monta, a partir desses espaços, políticas de caça às bruxas, colocando todos os cidadãos com a corda no pescoço. Após as repetidas quebras de sigilo dos dados da declaração de imposto de renda, pela Receita Federal, de cidadãos pertencentes à oposição ou próximos dela, todos os brasileiros viramos candidatos a Francenildos. Em terceiro lugar, a costumeira desfaçatez do presidente Lula, pronto para dar cobertura aos contumazes “aloprados”, neste episódio e nos anteriores ocorridos ao ensejo das eleições de 2006, bem como no caso do “mensalão”, rebatizado pela inteligentsia petista como um reles caso de “caixa dois”, que todo mundo pratica.
A imprensa brasileira tem reagido à altura diante desses atentados à democracia. O editorial do Estadão (03-09) foi certeiro ao apontar para onde apontam as responsabilidades da quebra de sigilo: “O crime comum e o crime político se complementam. Agora, destampada a devassa nas declarações de Verônica Serra, vem o presidente Lula falar em bandidagem. Se quiser saber quem é o responsável último por essa degenerescência, basta se olhar no espelho”. E o jornal O Globo, nessa mesma data, não fez por menos, no seu editorial, destacando a causa do clima de liberou-geral implantado no país: "É a impunidade existente no PT que incentiva a militância a agir como delinqüentes espiões. O partido estimula o crime quando dá tratamento de herói a mensaleiros".
Como vários comentaristas têm destacado, caracteriza-se a atual onda de utilização criminosa dos mecanismos do Estado em benefício da candidata oficial, pelo fato de se alicerçar em modelo de comportamento que é caracterizado como de “ética totalitária”, segundo a qual os fins justificam os meios. A pretensão não é nova na história. Após a formulação do modelo de “messianismo político” por Jean-Jacques Rousseau, estabeleceu-se agressiva doutrina que pode ser resumida rapidamente nos seguintes itens:
1 – A finalidade da vida em sociedade consiste em garantir a felicidade dos indivíduos.
2 – Somente será possível atingir a felicidade dos indivíduos em sociedade, se estes renunciarem à defesa dos seus interesses individuais, a fim de que todos se identifiquem com o interesse ou o bem público.
3 – Como os indivíduos tornaram-se egoístas por força do individualismo materialista dominante na sociedade, torna-se necessário que uma minoria de puros, identificados com o bem público (definido por eles próprios), os submeta a um banho catártico que os limpe das impurezas do individualismo.
4 – A comunidade dos indivíduos despidos dos seus interesses individuais constitui a vontade geral.
5 - Nessa comunidade de homens puros vigora a unanimidade, sendo a dissidência considerada como um atentado à felicidade geral, devendo ser rigorosamente eliminada. Como ensinava Rousseau no seu Contrato Social, todos os meios seriam válidos para a elite de puros implantar a unanimidade.
6 – Na organização do Estado deve ser levada em consideração a busca daquele modelo que melhor garanta a unanimidade, mediante a eliminação da oposição. Como conseqüência dessa proposta, a Humanidade viveu, entre 1917 e 1989, o século do totalitarismo, com os milhões de vítimas que causou a implantação da vontade geral por minorias fanáticas, na Rússia, na Ásia e na Europa, ao ensejo das ditaduras nazi-fascista e comunista. A prévia desse filme de horror tinha sido apresentada na Revolução Francesa e no ciclo denominado de Terror Jacobino, com a maquininha infernal de eliminar dissidentes funcionando a pleno vapor, pela França afora.
Neste início de milênio, consolidam-se experiências de populismo que se aproximam, na América Latina e alhures, dessa versão totalitária. Os dois mais importantes rebentos da nova realidade são a revolução bolivariana do presidente Chávez, na Venezuela, e o agressivo fundamentalismo islâmico praticado no Irã por Ahmadinejad e os aiatolás. Totalitarismos e populismos fundamentalistas seriam o reino da paz perpétua, não no sentido liberal que Kant conferiu a esta expressão, mas na acepção literal que o gênio de Königsberg viu inscrita na porta do cemitério da sua cidade, circunstância que o inspirou, aliás, na formulação da pergunta de se não haveria outra paz a que os seres humanos pudéssemos aspirar, diferente da dos túmulos.
É curioso observar a tendência do presidente Lula a confraternizar exatamente com esses regimes, louvando Chávez pelo fato de existir democracia “até demais” na Venezuela e defendendo os interesses nucleares do Irã, com sério risco para a paz mundial e arranhando a imagem da nossa diplomacia.
Paulo Roberto de Almeida
TOTALITARISMO EM AÇÃO
Ricardo Vélez-Rodríguez
Blog Rocinante, sexta-feira, 3 de setembro de 2010
Está sendo implantado pelo atual governo, no Brasil, agressivo modelo de Estado patrimonial, que privatiza ainda mais as instituições republicanas em benefício da militância partidária petista e dos que se acolhem a essa sigla. Essa não seria senão mais uma etapa do nosso arcaico patrimonialismo, não fosse o viés totalitário que assoma por entre as frestas dos acontecimentos ao longo destes oito anos, manifestação que se torna mais translúcida em momentos de pugna eleitoral, como os que estamos vivendo.
Três aspectos na política do atual governo são preocupantes, porquanto conduzem direto a uma etapa, totalitária, do processo de hegemonia petista: primeiro: a tentativa de Lula de conseguir maioria no Senado, com a finalidade de ver aberta a porta para uma reforma de tipo chavista à Constituição. Segundo: a progressiva tendência policial da militância que, não contente com ter aparelhado ministérios, secretarias e autarquias, monta, a partir desses espaços, políticas de caça às bruxas, colocando todos os cidadãos com a corda no pescoço. Após as repetidas quebras de sigilo dos dados da declaração de imposto de renda, pela Receita Federal, de cidadãos pertencentes à oposição ou próximos dela, todos os brasileiros viramos candidatos a Francenildos. Em terceiro lugar, a costumeira desfaçatez do presidente Lula, pronto para dar cobertura aos contumazes “aloprados”, neste episódio e nos anteriores ocorridos ao ensejo das eleições de 2006, bem como no caso do “mensalão”, rebatizado pela inteligentsia petista como um reles caso de “caixa dois”, que todo mundo pratica.
A imprensa brasileira tem reagido à altura diante desses atentados à democracia. O editorial do Estadão (03-09) foi certeiro ao apontar para onde apontam as responsabilidades da quebra de sigilo: “O crime comum e o crime político se complementam. Agora, destampada a devassa nas declarações de Verônica Serra, vem o presidente Lula falar em bandidagem. Se quiser saber quem é o responsável último por essa degenerescência, basta se olhar no espelho”. E o jornal O Globo, nessa mesma data, não fez por menos, no seu editorial, destacando a causa do clima de liberou-geral implantado no país: "É a impunidade existente no PT que incentiva a militância a agir como delinqüentes espiões. O partido estimula o crime quando dá tratamento de herói a mensaleiros".
Como vários comentaristas têm destacado, caracteriza-se a atual onda de utilização criminosa dos mecanismos do Estado em benefício da candidata oficial, pelo fato de se alicerçar em modelo de comportamento que é caracterizado como de “ética totalitária”, segundo a qual os fins justificam os meios. A pretensão não é nova na história. Após a formulação do modelo de “messianismo político” por Jean-Jacques Rousseau, estabeleceu-se agressiva doutrina que pode ser resumida rapidamente nos seguintes itens:
1 – A finalidade da vida em sociedade consiste em garantir a felicidade dos indivíduos.
2 – Somente será possível atingir a felicidade dos indivíduos em sociedade, se estes renunciarem à defesa dos seus interesses individuais, a fim de que todos se identifiquem com o interesse ou o bem público.
3 – Como os indivíduos tornaram-se egoístas por força do individualismo materialista dominante na sociedade, torna-se necessário que uma minoria de puros, identificados com o bem público (definido por eles próprios), os submeta a um banho catártico que os limpe das impurezas do individualismo.
4 – A comunidade dos indivíduos despidos dos seus interesses individuais constitui a vontade geral.
5 - Nessa comunidade de homens puros vigora a unanimidade, sendo a dissidência considerada como um atentado à felicidade geral, devendo ser rigorosamente eliminada. Como ensinava Rousseau no seu Contrato Social, todos os meios seriam válidos para a elite de puros implantar a unanimidade.
6 – Na organização do Estado deve ser levada em consideração a busca daquele modelo que melhor garanta a unanimidade, mediante a eliminação da oposição. Como conseqüência dessa proposta, a Humanidade viveu, entre 1917 e 1989, o século do totalitarismo, com os milhões de vítimas que causou a implantação da vontade geral por minorias fanáticas, na Rússia, na Ásia e na Europa, ao ensejo das ditaduras nazi-fascista e comunista. A prévia desse filme de horror tinha sido apresentada na Revolução Francesa e no ciclo denominado de Terror Jacobino, com a maquininha infernal de eliminar dissidentes funcionando a pleno vapor, pela França afora.
Neste início de milênio, consolidam-se experiências de populismo que se aproximam, na América Latina e alhures, dessa versão totalitária. Os dois mais importantes rebentos da nova realidade são a revolução bolivariana do presidente Chávez, na Venezuela, e o agressivo fundamentalismo islâmico praticado no Irã por Ahmadinejad e os aiatolás. Totalitarismos e populismos fundamentalistas seriam o reino da paz perpétua, não no sentido liberal que Kant conferiu a esta expressão, mas na acepção literal que o gênio de Königsberg viu inscrita na porta do cemitério da sua cidade, circunstância que o inspirou, aliás, na formulação da pergunta de se não haveria outra paz a que os seres humanos pudéssemos aspirar, diferente da dos túmulos.
É curioso observar a tendência do presidente Lula a confraternizar exatamente com esses regimes, louvando Chávez pelo fato de existir democracia “até demais” na Venezuela e defendendo os interesses nucleares do Irã, com sério risco para a paz mundial e arranhando a imagem da nossa diplomacia.
O Espirito de Chicago: alguns principios interessantes
Estou lendo, como distração entre trabalhos, este livro:
Johan Van Overtveldt:
The Chicago School: How the University of Chicago Assembled the Thinkers Who Revolutionized Economics and Business
(Chicago: Agate, 2001)
O autor sintetiza o que lhe pareceu serem os grandes princípios que fizeram a distinção daquela universidade e lhe deram mais prêmios Nobel do que qualquer outra universidade.
Esses elementos são os seguintes:
1) uma ética do trabalho duro, incansável;
2) forte ênfase na excelência acadêmica;
3) liberdade ilimitada para a crítica acadêmica em bases científicas;
4) o reconhecimento de que a teoria dos preços, de base neoclássica, constitui uma ciência;
5) a necessidade de constantemente apoiar as construções teóricas em evidências empíricas;
6) o isolamento geográfico da Universidade de Chicago (p. 358).
Com exceção do último elemento, qualquer outra universidade poderia exibir as mesmas características que Chicago. Que nenhuma outra o tenha feito com tanta intensidade representa justamente o elemento distintivo que permitiu a Chicago se sobressair sobre todas as demais universidades.
Na verdade, todos esses princípios poderiam ser resumidos num único: a necessidade constante de sustentar proposições teóricas com evidências empíricas (p. 185).
A regra de ouro aplicada pelos economistas de Chicago é que a competição leva aos melhores resultados, o que talvez pareça a alguns como a aplicação de uma suposta crença darwiniana da sobrevivência dos mais aptos.
O sistema de seminários acadêmicos desenvolvido em Chicago levou a um estilo de trabalho universitário que promove e distingue a investigação crítica; ali não existe lugar para prestígio indevido, hierarquias, honras passadas ou sensibilidades pessoais. A disciplina acadêmica e o rigor intelectual sempre estiveram presentes nos seminários de Chicago.
Quanto mais eu leio o livro, e mais eu aplico seus ensinamentos às universidades brasileiras, mais eu me convenço de que elas estão a anos-luz de distância dos princípios de Chicago, e não seria por uma simples questão de isolamento geográfico, pois as universidades brasileiras também se isolaram da vida social e econômica do Brasil.
Acredito que ainda tenhamos um largo caminho a percorrer para conseguir um único prêmio Nobel, em economia ou em outras áreas.
Johan Van Overtveldt:
The Chicago School: How the University of Chicago Assembled the Thinkers Who Revolutionized Economics and Business
(Chicago: Agate, 2001)
O autor sintetiza o que lhe pareceu serem os grandes princípios que fizeram a distinção daquela universidade e lhe deram mais prêmios Nobel do que qualquer outra universidade.
Esses elementos são os seguintes:
1) uma ética do trabalho duro, incansável;
2) forte ênfase na excelência acadêmica;
3) liberdade ilimitada para a crítica acadêmica em bases científicas;
4) o reconhecimento de que a teoria dos preços, de base neoclássica, constitui uma ciência;
5) a necessidade de constantemente apoiar as construções teóricas em evidências empíricas;
6) o isolamento geográfico da Universidade de Chicago (p. 358).
Com exceção do último elemento, qualquer outra universidade poderia exibir as mesmas características que Chicago. Que nenhuma outra o tenha feito com tanta intensidade representa justamente o elemento distintivo que permitiu a Chicago se sobressair sobre todas as demais universidades.
Na verdade, todos esses princípios poderiam ser resumidos num único: a necessidade constante de sustentar proposições teóricas com evidências empíricas (p. 185).
A regra de ouro aplicada pelos economistas de Chicago é que a competição leva aos melhores resultados, o que talvez pareça a alguns como a aplicação de uma suposta crença darwiniana da sobrevivência dos mais aptos.
O sistema de seminários acadêmicos desenvolvido em Chicago levou a um estilo de trabalho universitário que promove e distingue a investigação crítica; ali não existe lugar para prestígio indevido, hierarquias, honras passadas ou sensibilidades pessoais. A disciplina acadêmica e o rigor intelectual sempre estiveram presentes nos seminários de Chicago.
Quanto mais eu leio o livro, e mais eu aplico seus ensinamentos às universidades brasileiras, mais eu me convenço de que elas estão a anos-luz de distância dos princípios de Chicago, e não seria por uma simples questão de isolamento geográfico, pois as universidades brasileiras também se isolaram da vida social e econômica do Brasil.
Acredito que ainda tenhamos um largo caminho a percorrer para conseguir um único prêmio Nobel, em economia ou em outras áreas.
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